
Uma dupla de policiais da Narcóticos de Los Angeles, que trabalha sob disfarce, descobre o esconderijo de uma fortuna em drogas no depósito de uma loja de departamentos. Infelizmente, eles não vivem tempo suficiente para poder denunciar o flagrante: ambos são mortos na mesma hora, com fulminantes golpes de karatê, por um psicopata com máscara de esqui.
Os outros policiais da equipe ficam desnorteados, principalmente quando mais colegas começam a aparecer mortos e com ossos quebrados a golpes de artes marciais. Afinal, como enfrentar um assassino cujos punhos são armas mortais e eles nem ao menos têm tempo de sacar seus revólveres?
A solução encontrada pelo comandante da equipe é simples e hilária: contratar um especialista na coisa para ensinar os tiras e prepará-los para enfrentar o tal assassino karateka!
Em linhas gerais, este é o enredo risível de FORÇA DESTRUIDORA, uma curiosa mistura de trama policial com artes marciais para aproveitar a febre pelos filmes de karatê que havia atingido o público norte-americano nos anos 1970.
FORÇA DESTRUIDORA também é um veículo bem melhor para Chuck Norris como herói de ação do que seu trabalho anterior, o sonolento "Os Bons Se Vestem de Negro": aqui, Chuck não apenas tem mais oportunidades para demonstrar seus talentos como lutador, mas também interpreta um personagem muito parecido com ele mesmo!
No filme, seu personagem se chama Matt Logan. Mas depois de algum tempo fica muito evidente que Logan é o próprio Norris: um campeão de karatê (como Chuck na vida real) e proprietário e professor numa escola de artes marciais (também como Chuck na vida real). Inclusive acho que os realizadores deveriam ter assumido as semelhanças e deixado Norris como ele mesmo. Já pensou que legal um filme em que a polícia pede a ajuda do astro de cinema Chuck Norris?
(Exatos 30 anos depois, Steven Seagal passou a estrelar um reality show na TV americana chamado "Steven Seagal: Lawman", que mostra exatamente sua colaboração, como especialista em artes marciais, na delegacia de polícia de uma pequena cidade na Louisiana!)
Além de mestre do karatê, Matt Logan é representado no filme como um cara legal, que adotou um jovem negro ex-viciado e que resolve ajudar a polícia mesmo estando no meio dos treinamentos para a final de um importante torneio de artes marciais - compadecido quando uma das agentes da Narcóticos lhe apresenta uma garota "de menor" que se prostitui por umas doses de heroína.
É muito mais fácil engolir Norris num papel desses do que como o caminhoneiro de "Comboio de Carga Pesada" ou o professor de ciências políticas (!!!) de "Os Bons Se Vestem de Negro". Até porque, na vida real, ele tem um amplo trabalho de propaganda anti-drogas.
Aliás, mantendo o bom nível do trabalho anterior do astro, FORÇA DESTRUIDORA também tem produção caprichada e um elenco cheio de caras conhecidas: o interesse romântico de Norris é a policial interpretada pela gracinha Jennifer O'Neill, de "Verão de 42" e "Scanners" (que, pouca gente sabe, nasceu no Rio de Janeiro); o delegado que pede a ajuda do herói é vivido pelo sempre eficiente Clu Gulager ("A Volta dos Mortos-vivos"), e também há pequenas participações de Pepe Serna, G.W. Bailey (o Capitão Harris da série "Loucademia de Polícia") e Charles Cyphers (ator que está em quase todos os filmes de John Carpenter).
O roteiro segue a estrutura das aventuras do lutador mexicano El Santo: a trama começa com o personagem de Norris no ringue, apresentando suas habilidades como lutador; depois mostra o herói sendo recrutado para ajudar a polícia num caso, e finalmente termina com ele outra vez no ringue, dessa vez enfrentando o "grande vilão".
Este é interpretado por Bill "Superfoot" Wallace, um dos mais respeitados campeões de artes marciais da época, o que garante uma luta bem caprichada com Chuck. Talvez Wallace também tivesse se tornado um herói de ação na época se fosse mais bonitão (pronto, eis o meu "Momento Rubens Ewald Filho"); mas, como é bem feio, geralmente só o chamavam para papéis de vilão karateka - ele inclusive lutou contra Jackie Chan em "A Fúria do Protetor", de James Glickenhaus.
O mais surpreendente em FORÇA DESTRUIDORA é o fato de o roteiro ter sido assinado por Ernest Tidyman, falecido autor dos livros do detetive negro Shaft (também roteirista dos filmes com o personagem feitos nos anos 70), e mais conhecido por ter ganhado o Oscar de Melhor Roteiro pelo excelente "Operação França", de William Friedkin, em 1971.
Bem, se você também achou que a presença de Tidyman era garantia de um roteiro de qualidade, pode esquecer: FORÇA DESTRUIDORA é, do começo ao fim, uma ode à estupidez humana. Tudo bem que os roteiros dos posteriores "Braddock" e "Invasão USA" não são exatamente obras-primas, mas este aqui abusa da boa fé do espectador.
Não bastasse a ridícula ideia de policiais procurarem por aulas de karatê ao invés de simplesmente tomar mais cuidado (um revólver continua sendo mais eficiente contra um sujeito desarmado, e karatê não me parece algo que se domine com meia dúzia de aulas!), os personagens vivem cometendo erros imbecis, como os tiras que descobrem o esconderijo das drogas e vão vistoriar o local sem pedir reforço ou pelo menos avisar alguém sobre onde estão indo, para o caso de morrerem no processo (o que acaba acontecendo não uma, mas DUAS VEZES ao longo do filme).
Mais tarde, o jovem parceiro de Logan também vai "checar uma informação" sem avisar ninguém, descobre a identidade dos vilões, mas é morto logo em seguida - sem deixar nenhuma pista sobre onde tinha ido para ajudar o herói ou a polícia nas investigações!
Além disso, o assassino karateka mascarado é praticamente onipresente, como se o sujeito vivesse escondido num cantinho escuro do esconderijo de drogas, só esperando alguém aparecer para poder matar!
Parece até que Tidyman ganhou uma graninha para simplesmente colocar seu nome num roteiro escrito pelo Zé da Padaria, porque é absurdo que um cara possa criar algo como "Operação França" e logo em seguida ser autor de uma aventura tão absurda e mal-desenvolvida!
Um detalhe curioso é o fato de FORÇA DESTRUIDORA ter sido dirigido por Paul Aaron, um sujeito inexperiente (era apenas o seu segundo filme), sem grandes referências em matéria de cinema de ação, mas que se saiu muito melhor que um veterano do gênero, Ted Post, no filme anterior de Norris.
Diz a lenda que Paul foi contratado apenas para fazer algumas alterações no roteiro original (a parte do filho adotivo do herói foi invenção dele), mas acabou conquistando a cadeira de diretor. Depois sumiu sem deixar vestígios, dirigindo mais alguns poucos trabalhos - entre eles um policial com Wings Hauser e a comédia "Maxie", com Glenn Close.
Se como trama policial o filme é risível, pelo menos não nega fogo para quem espera ver Norris em ação. Principalmente pela luta final com Bill Wallace: são dois astros das artes marciais em ação, e em câmera lenta! O confronto já começa violento no ringue onde ocorre a final do torneio de karatê, e termina fora dele, quando o vilão tenta escapar com uma fortuna em heroína.
Novamente, a coreografia das cenas de luta é assinada pelo próprio Chuck e por seu irmão e futuro diretor Aaron Norris, que tem uma pequena participação no filme como assistente do herói na academia. E como nepotismo pouco é bobagem, o filho do astro, Mike Norris, ainda moleque, também faz uma ponta como um entregador de pizza!
É interessante observar como os realizadores fizeram de tudo para transformar o personagem de Matt Logan em uma figura quase sobrenatural: ele não apenas tem uma destreza praticamente sobre-humana, mas também é visto por todos os outros personagens, inclusive os vilões, como um sujeito invencível.
Para isso também contribui o título original ("A Force of One" poderia ser traduzido como "Exército de um Homem Só") e o pôster de cinema, que mostra um mítico Chuck Norris sentado em posição de lótus dentro de um triângulo, e com a seguinte frase: "Ele escuta no silêncio, ele enxerga na escuridão. Ele é o único que pode deter a matança".
Talvez FORÇA DESTRUIDORA pudesse ser um filmaço se tivesse um roteiro melhorzinho, e principalmente com menos tempos-mortos na narrativa.
Do jeito que está, pelo menos já dá uma bela amostra do que Chuck Norris poderia fazer como herói de ação, tanto que todos os seus próximos filmes começaram a ficar mais exagerados e movimentados a partir daqui. E foi com seu trabalho seguinte - "Octagon" - que Norris transformou-se definitivamente em astro.
PS: O velho Guia de Filmes Nova Cultural, que durante anos foi a grande referência para os cinéfilos brasileiros, informou erroneamente que FORÇA DESTRUIDORA seria continuação de "Os Bons Se Vestem de Negro". Na verdade, os dois filmes não têm absolutamente nenhuma relação, e os personagens vividos por Norris até têm nomes diferentes, mas consta que foram lançados pela mesma distribuidora como programa duplo em alguns cinemas norte-americanos, o que pode ter gerado a confusão.
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A Force of One (1979, EUA)
Direção: Paul Aaron
Elenco: Chuck Norris, Jennifer O'Neill, Clu Gulager,
Ron O'Neal, Bill Wallace, Eric Laneuville, Pepe Serna,
James Whitmore Jr. e Clint Ritchie.
* A quem interessar possa, esta foi a capinha do filme quando lançado em VHS no Brasil pela Hipervídeo. Recentemente, ele foi relançado em DVD pela Spectra Nova:

11 comentários:
Chuck Norris é um mito. Você vai atualizar o blog no domingo?
Este filme vale mesmo pela luta entre Norris e Bill Wallace. Fora isso, como o Felipe disse, é "risível".
Sobre o nome do personagem (Booker)de Norris em "Os bons se vestem de preto", uma coincidência: em Mercenários 2, o personagem de Chuck se chama Booker. O mesmo personagem mais velho? coincidência ou homenagem?
Ótimo texto, Felipe! "Força destruidora" ainda possui aquele ranço de subproduto de cinema empoeirado dos anos 70, mas "Octagon" e "An eye for an eye" já prenunciam o Norris action hero dos 80's. Ah, adorei a citação ao Rubens Ewald Filho, o Leão Lobo da crítica de cinema, rsrs.
Mal posso esperar pra ver o Chuck Norris enfrentando o Christopher Lee em "An Eye for an Eye"
Eu lembro bem da capinha desse filme na locadora onde eu locava filmes.
caralho, que blog divertido, conhecendo muita coisa por aqui e é sempre bom lembrar desses filmes que passavam nos horários mais ínfimos ou estavam bem escondidos nas locadoras (alguns dos quais, só conheço pela capinha). Abraço
Assim como os Bons se vestem de negro eu gosto muito desse filme, apesar da citada narrativa chata, as luats desse filme são muito legais, principalmente a final. Sobre a crítica, legal a comparação estrutural com os filmes do El Santo hahhahaha, mas o Norris só derrotou o Capeta, o santo derrotou lobisomens, assassinos, espiões, vampiros, alienigenas e o caralho, ou seja: ele arregaça o Norris( minha opinião) hahahaha
Nascida no Brasil mas com carreira principalmente nos EUA, a belíssima Jennifer O´Neil (cuja melhor interpretação, no meu ver, foi em SETTE NOTE IN NERO, do talentoso mas muito desprestigiado, Lucio Fulci), tbm trabalhou no Brasil, mais precisamente no início dos anos 90, no drama erótico DISCRETION ASSURED, com Michael York e participação de Vanusa Spindler (se não me engano, ela é nascida em Esteio).
Convertida ao Cristianismo há alguns anos, ela hj em dia anda bem envolvida em filmes com temática cristã.
Acabei de ver este filme num DVD duplex com Crying Freeman, com uma imagem horrível.
O Chuck não pode nem reclamar da fama e das piadas absurdas sobre ele que rodam pela internet, debochando dessa tendência de imbatividade que permeiam os seus filmes
Sou praticante de artes marciais e confirmo: nenhuma arte marcial o sujeito vai aprender em poucos meses.
Você pode até aprender em alguns meses uns golpes básicos para lidar com agressores leigos tipo o drogadito batedor de carteira. Há cursos de defesa pessoal básica para policiais nesse sentido.
Mas lidar com um lutador experiente, como um Conor MacGregor ou os "ninjas" desse filme, é outra historia. De jeito nenhum um policial conseguirá tal feito apenas fazendo um cursinho básico.
O roteiro parece se aproveitar da ignorância do público americano quanto a realidade das artes marciais. Nos EUA é muito comum academias picaretas de artes marciais prometerem transformar o sujeito num ninja da noite para o dia, chegando ao cúmulo de dar uma faixa preta em seis meses (!). Tem até um termo para esse tipo de academia nos EUA: McDojo, numa referência ao MacDonald.
Por incrível que pareça, as academias de artes marciais no Brasil são infinitamente superiores que as dos EUA, famosas no meio marcial pelas picaretagens. Para se ter uma ideia, o karatê brasileiro é considerado um dos melhores do mundo, produzindo campeões de MMA como Lioto Machida (ele é brasileiro, apesar do nome), enquanto o karatê americano é motivo de chacota, inclusive gerando camisetas famosas nos EUA com os dizeres "karatê will get you killed", em referência à péssima qualidade do karatê USA.
Não duvido que filmes como esse tenham contribuído para a má fama do karatê nos EUA e a proliferação de academias McDojo na terra do tio Sam.
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