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terça-feira, 2 de abril de 2013

UM HOMEM CHAMADO DJANGO (1971)


Um verdadeiro abismo de qualidade separa a primeira aventura não-oficial de Django dirigida por Edoardo Mulargia (o péssimo "Django Não Espera... Mata", 1967) de sua segunda incursão por essas veredas, UM HOMEM CHAMADO DJANGO. Apenas quatro anos se passaram, mas é como se as duas obras fossem dirigidas por pessoas completamente diferentes; ou isso, ou Mulargia aprendeu muito sobre técnica cinematográfica e narrativa no período (aliás, neste curto espaço de tempo entre um Django e outro, o sujeito dirigiu mais seis obras diferentes!).

Não estou dizendo que UM HOMEM CHAMADO DJANGO seja um filmaço, muito menos que figura entre os melhores "sotto-Djangos" daquele áureo período do western spaghetti. O que mais salta aos olhos ao final do filme é a notável evolução no trabalho do diretor Mulargia em comparação a "Django Não Espera... Mata", já que esta sua segunda aventura do personagem é muito mais movimentada, violenta e principalmente DIVERTIDA do que a anterior.


Se lá em 1967 Mulargia havia desperdiçado um adequado Ivan Rassimov numa trama soporífera e cheia de reviravoltas, personagens e complicações desnecessárias, dessa vez ele se atém ao básico: o roteiro de Nino Stresa requenta aquela velha e manjada trama de vingança, inclusive retomando as origens do personagem no "Django" de Sergio Corbucci: aqui também o herói está em busca dos assassinos da sua esposa.

A diferença é que enquanto no filme original havia um único assassino (o Major Jackson), aqui são quatro os homens responsáveis pela morte da pobre mulher - apenas morte, mas sem estupro, ao contrário do que informam algumas fontes desavisadas. Esta é a cena que abre o filme, e há um mistério envolvendo a atriz não-creditada que aparece rapidamente interpretando a esposa do herói (há quem jure que trata-se de Ida Galli, famosa mocinha dos westerns de Giuliano Gemma, mas tudo não passa de especulação).


Como Django estava fora de casa no momento do crime (na guerra?), ele agora precisa resgatar um ladrão mexicano de quinta categoria, Carranza (Glauco Onorato), o único que conhece a identidade dos assassinos. Juntos, eles partem em busca da vingança, este tema tão comum no universo do western spaghetti.

É claro que não será nada fácil: aqueles bandidos pé-de-chinelo e assassinos de esposas de um ano atrás agora viraram militares corruptos, poderosos traficantes de armas ou grandes reis do crime como Jeff (Chris Avram, o arquiteto do clássico "Banho de Sangue", de Mario Bava), que controla uma cidade inteira com sua quadrilha. E embora Django busque vingança contra apenas quatro homens, o filme ironicamente termina com uma contagem de corpos estratosférica!


UM HOMEM CHAMADO DJANGO não é apenas o segundo "sotto-Django" do diretor Mulargia (novamente assinando com seu tradicional pseudônimo americanizado, "Edward G. Muller"), mas também a segunda vez que o astro mezzo italiano, mezzo brasileiro Anthony Steffen interpreta o anti-herói do título, depois do superior "Django, O Bastardo" (1969), de Sergio Garrone.

Pouca gente se dá conta, mas, depois de Franco Nero, Steffen foi o ator que mais ficou marcado como Django, mesmo que um não-oficial. Além destes dois filmes em que ele encarnou personagens que efetivamente são chamados de Django em algum momento da narrativa, Steffen também estrelou vários outros westerns cujos títulos foram posteriormente alterados (principalmente na Alemanha) para se transformar em aventuras de Django, mesmo que os personagens principais tivessem outros nomes. Logo, se contabilizarmos também esses "falsos Djangos", o astro com sangue brasileiro interpretou o famoso pistoleiro em nada mais nada menos de sete filmes! Nada mau...


Se em "Django, O Bastardo" o velho Antonio De Teffé (nome de batismo de Steffen) compôs um personagem calado, misterioso e fantasmagórico, aqui em UM HOMEM CHAMADO DJANGO ele mostra que também pode ser versátil (apesar de notório canastrão), interpretando seu segundo Django de uma forma completamente diferente, dessa vez fanfarrão e engraçadinho, inclusive usando divertidos artifícios para despachar seus desafetos.

Perceba que o filme de Mulargia é de 1971, época em que o western spaghetti tentava se reinventar apelando para o cômico, o burlesco e o absurdo. No ano anterior, "Trinity é o Meu Nome", de Enzo Barboni, foi um grande sucesso de bilheteria apresentando as palhaçadas de Terence Hill e Bud Spencer no Velho Oeste (eles já tinham feito outros filmes antes, mas sem a mesma repercussão). E diretores como Giuliano Carnimeo passaram a explorar esta fórmula até cansar, criando personagens cada vez mais cartunescos e absurdos, tipo o Aleluia vivido por George Hilton em dois filmes.


Esse contexto da época talvez explique as fanfarronices e gracinhas de UM HOMEM CHAMADO DJANGO, que nunca se decide entre ser uma história séria sobre busca de vingança ou uma comédia escrachada.

Algumas cenas até parecem ter saído de um desenho animado, como aquela em que um sujeito joga uma banana de dinamite em Django. Calmamente, nosso herói pega a bomba e usa a chama do pavio para acender seu cigarro. Depois, quando ela está para explodir, ele atira de volta contra seu agressor, explodindo-o, mas não em pedacinhos: no momento seguinte vemos a vítima inteirinha, apenas meio atordoada, soltando fumaça e com o rosto e as roupas chamuscadas pela explosão! Só faltava escrever "Indústrias Acme" na banana de dinamite para ficar mais cartunesco...


Django também usa uma série de truques sujos e cômicos dignos de Trinity, Aleluia, Espírito Santo ou Trissete (os principais pistoleiros engraçadinhos do western spaghetti), e bem diferentes de esconder uma metralhadora num caixão, como fez no original. Para salvar Carranza da forca, por exemplo, ele se veste de monge e pede para um dos seus inimigos segurar uma vela - na verdade, uma banana de dinamite!

Mais além, o herói se esconde atrás de um cadáver para atirar nos companheiros do finado (colocando um dos seus braços no lugar do braço do desencarnado!), e até usa um braço falso para fingir que está desarmado, quando na verdade esconde o verdadeiro, com a arma em punho, por baixo do casaco! Coincidência ou não, Johnny Depp usa o mesmo artifício em "Era Uma Vez no México", de Robert Rodriguez, feito mais de 30 anos depois.


Steffen não é o único nome conhecido para os fãs de western spaghetti. Seu parceiro em cena, Glauco Onorato, foi um grande dublador nas versões em italiano de filmes gravados em inglês, e bastante conhecido como a "voz italiana" do grandalhão Bud Spencer nas primeiras obras do ator.

Também aparecem Benito Stefanelli, figurante em quase todos os westerns mais importantes do período ("Por um Punhado de Dólares", "O Dólar Furado", "Três Homens em Conflito", "Era Uma Vez no Oeste", "Quando Explode a Vingança"...), Riccardo Pizzuti (um habitué nas aventuras de Terence Hill e Bud Spencer) e a linda Simonetta Vitelli, filha do diretor Demofilo Fidani, novamente usando seu pseudônimo americanizado "Simone Blondel". Momento Nelson Rubens: consta que Simonetta se apaixonou por Steffen em meio às filmagens, mas o galã pulou fora porque ela era muito jovem (uma famigerada "chave de cadeia").


Como já acontecera com várias outras imitações anteriores de "Django", esta também reaproveita mais elementos da "Trilogia do Dólar", de Sergio Leone, do que do filme original de Corbucci. Por exemplo, o herói leva uma caixinha de música com a foto da esposa assassinada, que lembra muito o relógio com a foto da irmã morto de Lee Van Cleef em "Por uns Dólares a Mais". E Django salva Carranza de ser enforcado no último segundo, atirando na corda estendida, como Clint Eastwood fez com Eli Wallach em "Três Homens em Conflito".

O próprio relacionamento de amor e ódio entre Django e Carranza lembra uma versão podreira dos personagens de Eastwood e Wallach naquele clássico de Leone, e os créditos iniciais são com vinhetas coloridas à la Leone, embora aqui o diretor use imagens do filme em negativo, ao invés de desenhos, como nas aberturas da "Trilogia do Dólar".


O engraçado é que tanto o diretor Mulargia quanto o roteirista Stresa parecem ter um mínimo de conhecimento do filme de Corbucci, já que volta-e-meia também o citam: Steffen entra na cidade a pé e carregando sua sela numa longa cena inicial que lembra Franco Nero caminhando e arrastando seu caixão na abertura de "Django" (ou seja, em nenhum dos filmes o herói conta sequer com um cavalo), e um dos assassinos procurados pelo herói também é major, como o Major Jackson do original.

Mas a inspiração em Leone é tão mais evidente que, ao gravar a versão em inglês dos diálogos de UM HOMEM CHAMADO DJANGO, os dubladores não resistiram e fizeram uma brincadeira de cinéfilo: na já citada cena em que Django joga a dinamite num inimigo, o herói depois comenta "Este truque vale um punhado de dólares", em diálogo inexistente na versão original em italiano!


Mas, apesar das piadinhas e absurdos, não se engane: em número total de mortos, esse é um dos títulos mais violentos da "série"! Franco Nero matava 95 inimigos em "Django", que tinha uma contagem de cadáveres geral entre 138 e 163 vítimas (as fontes variam e eu que não sou louco para contar).

Em comparação com Nero, nosso representante "quase brasileiro" no universo do personagem faz bonito: entre os mais de 90 exterminados em UM HOMEM CHAMADO DJANGO, significativos 57 desencarnam graças ao implacável Django - exato, aquele que só queria se vingar de QUATRO HOMENS! Não perca as contas: ele matou "apenas" 15 vezes isso! Menos mal que Mulargia nos relembra da verdadeira missão do protagonista ao fazê-lo abrir a caixinha de música da esposa diante dos cadáveres dos seus assassinos...


O roteiro de Stresa tenta uma reviravolta bem batida no ato final, quando descobrimos que Carranza na verdade era o quarto homem entre os assassinos da mulher de Django, obrigando o herói a duelar contra seu próprio companheiro. Na verdade não é nenhuma surpresa, pois há evidências nada discretas disso ao longo do filme (como quando Carranza mata um dos seus ex-cúmplices antes que ele possa revelar toda a verdade a Django).

Felizmente, o conflito é resolvido de maneira eficiente e sem frescura: (SPOILER) sem sequer dar uma chance para que o ex-parceiro se defenda, Django dispara quatro tiros contra ele após pronunciar um melancólico "Adios, amigo", esquecendo que ambos passaram por diversas aventuras juntos ao longo do filme! A cena é bem legal, usando freeze-frames do bandido se contorcendo a cada disparo. (FIM DO SPOILER)


Mas não se engane: Mulargia não é um Leone, nem sequer um Corbucci, e UM HOMEM CHAMADO DJANGO sofre, em diversos momentos, com as bobagens típicas do diretor. Além da indefinição entre ser comédia ou filme sério, há problemas técnicos graves - embora nada tão absurdo quanto a casa sem telhado do anterior "Django Não Espera... Mata", lembra?

Repare, por exemplo, no bonecão vagabundo que se estatela no chão, e que deveria ser uma pessoa (foto abaixo). Ou na cena em que Carranza amarra diversas bananas de dinamite numa roda de carruagem e põe a dita cuja para girar, mas ela simplesmente explode a alguns metros sem atingir nada de importante ou matar nenhum inimigo!


E mesmo que não tenha todas aquelas incompreensíveis tramas secundárias do anterior "Django Não Espera... Mata", a narrativa acaba perdendo tempo com personagens e situações completamente desnecessárias, como aquela envolvendo o dono do saloon e sua esposa infiel (interpretada pela brasileira Esmeralda Barros, em pequena e apagada participação, depois de ter sido uma vilão com bastante tempo em cena no anterior "Django Contra 4 Irmãos").

Felizmente, essas bobagens não comprometem a diversão, já que Mulargia dirige o filme com o pé no acelerador, saltando rapidamente de uma cena de ação para outra, e colocando até um velho calhambeque numa cena para fazer o contraste entre o "Velho Oeste" e o "Novo Oeste" (como Sam Peckinpah já havia feito, de forma bem mais eficiente, no clássico "Meu Ódio Será Sua Herança").


Agora, uma coisa que eu até hoje não consigo entender - e nenhum site ou fórum de discussão sobre western spaghetti se preocupou em explicar - é o título original do filme, "W Django!". O que diabos significa esse "W"? Será que ficaram sem inspiração para títulos genéricos e colocaram simplesmente uma letra qualquer para diferenciar do "Django" de Corbucci? Por que não "A Vingança de Django"?

Em outros países, como o Brasil, a obra foi sabiamente rebatizada como "A Man Called Django". Mas, para aumentar a confusão, algumas distribuidoras novamente o rebatizaram como "Viva Django!", ignorando que por esse título já era conhecido o anterior "Preparati la Bara", de Ferdinando Baldi (estrelado por Terence Hill). Por isso, é muito fácil baixar um filme e descobrir que na verdade é o outro!


É curioso constatar que UM HOMEM CHAMADO DJANGO é o último "sotto-Django" da chamada Era de Ouro do western spaghetti. Tudo bem, Demofilo Fidani lançou "Uma Balada para Django" no ano seguinte, mas esta é basicamente uma colagem de filmes antigos; e a única sequência oficial do clássico de Corbucci, "Django, A Volta do Vingador", foi feita nos anos 80, quando o sub-gênero já estava morto e enterrado.

Ao longo dos anos 70, a injeção de humor e exagero nos westerns da Terra da Bota acabou espantando uma boa parte do público que gostava daqueles filmes mais sérios e violentos. Em suma: não havia mais espaço para Djangos, oficiais ou imitadores. A partir de 1971, piadistas como Trinity e Aleluia tomaram conta do western spaghetti, mas felizmente os produtores tiveram a decência de aposentar Django antes de também transformá-lo em herói engraçadinho.


Trailer de UM HOMEM CHAMADO DJANGO



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W Django! / A Man Called Django (1971, Itália)
Direção: Edoardo Mulargia (aka Edward G. Muller)
Elenco: Anthony Steffen, Glauco Onorato, Stelio Candelli,
Chris Avram, Esmeralda Barros, Benito Stefanelli, Riccardo
Pizzuti, Simonetta Vitelli e Furio Meniconi.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

DJANGO NÃO ESPERA... MATA (1967)


O italiano Edoardo Mulargia deve ter gostado muito do "Django" de Sergio Corbucci. Ou então - o que é mais provável - era malandro e sabia que podia faturar uma bela graninha em cima do sucesso deste filme. Num período de quatro anos, entre 1967 e 1971, Mulargia dirigiu (e às vezes escreveu) quatro faroestes diretamente relacionados com "Django": dois traziam novos personagens com nomes bem parecidos, como "Cjamango - O Vingador" (1967) e "Shango - A Pistola Infalível" (1970), enquanto os outros dois eram assumidamente aventuras não-oficiais do personagem: "Um Homem Chamado Django" (1971) e o alvo da nossa análise de hoje, DJANGO NÃO ESPERA... MATA (1967).

Trata-se do último filme da parceria entre Mulargia e Vincenzo Musolino, que produziu e escreveu os três westerns anteriores de Edoardo ("Só Contra Todos", "Vá com Deus, Gringo" e "Cjamango - O Vingador"). O problema é que se Mulargia não era exatamente o melhor dos diretores, tampouco Musolino era o mais inspirado dos roteiristas. Nos sites sobre western spaghetti, há quem compare estes quatro filmes da dupla com os trabalhos do notório Ed Wood, tal a ruindade e a quantidade de problemas graves, tanto técnicos quanto narrativos.


Se "Django Atira Primeiro", de Alberto De Martino, ainda era um western qualquer que foi adaptado para virar aventura de Django, neste aqui o personagem já tem mais em comum com Franco Nero no filme de Corbucci. Em sua nova encarnação, Django é interpretado por Ivan Rassimov, que já havia sido Cjamango sob o comando de Mulargia e Musolino.

Este "novo" Django não tem caixão nem metralhadora, mas em compensação (?) tem um sobrenome (Foster) e uma família, constituída por pai, tio e a irmã Mary (que, numa bela sacada dos realizadores, é interpretada por Rada Rassimov, irmã de Ivan na vida real). O único problema é que, num western spaghetti, ter família geralmente envolve luto, porque é claro que alguém vai aprontar alguma com os familiares do herói para que ele possa entrar em ação e vingar-se.


No caso aqui, quem se dá mal é o patriarca Foster (Gino Turini), um criador de cavalos que comete o grande erro de envolver-se com um grupo de bandoleiros mexicanos (talvez numa referência aos vilões chicanos de "Django"). O que era para ser uma negociação comum se transforma numa chacina quando o líder do grupo, Navarro (César Ojinaga), mata Papai Foster e rouba 10.000 dólares do finado.

Para o azar de Navarro, o filho da vítima, Django Foster, acabou de voltar à cidade. Quando chega no rancho da família e descobre sobre o assassinato do pai, nosso herói jura vingança e sai no encalço dos bandidos. É quando a história começa a se complicar...


Acontece que o filho de Navarro, Nico (Alfredo Rizzo), decide passar a perna no próprio pai e fugir com as 10 mil doletas, escondendo-se numa pequena vila mexicana. Navarro segue o fujão até lá, mas o encontra morto. Para piorar, o dinheiro sumiu novamente, fazendo valer aquela máxima popular de que "ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão".

Furioso, Navarro e seus homens começam a matar aleatoriamente os pobres moradores da vila, para descarregar a raiva pela morte do filho e pelo roubo do dinheiro. É quando aparece o próprio Django e enche os mexicanos de chumbo. Pronto: com Navarro e seus homens mortos, o herói completou sua vingança em tempo recorde e pode voltar para o rancho e descansar com o que restou da sua família, certo? Errado!


Acontece que isso tudo acontece nos primeiros 20 minutos de DJANGO NÃO ESPERA... MATA, e o filme não é um curta-metragem; portanto, ainda tem pelo menos mais uma hora e uns quebrados pela frente! E é claro que Django não vai ficar satisfeito com uma vingancinha tão mixuruca enquanto não reaver também a grana originalmente roubada do seu pai (e, desde então, roubada mais duas vezes... que confusão!).

O herói irá descobrir que quem matou Nico para roubar-lhe o dinheiro foi um espertinho chamado Gray (o brasileiro Celso Faria!), que pretende aproveitar a fortuna ao lado da namorada Judy (Marisa Traversi). Mas Django descobre o plano, encontra o ladrãozinho e mata-o num duelo, recuperando o dinheiro da família. Vingança consumada, dinheiro recuperado, fim do filme, certo? Errado! Acredite se quiser, ainda estamos nos quarenta e poucos do primeiro tempo!


Acontece que Navarro, o bandido mexicano que roubou a grana em primeiro lugar lá no começo do filme e depois foi morto por Django (ainda lembra de tudo isso?), trabalhava originalmente para um rico e poderoso fazendeiro da região, Don Alvarez (Gino Buzzanca), que não pretende desistir dos cobiçados 10.000 dólares que julga serem seus de direito.

Por isso, o figurão contrata o melhor pistoleiro daquelas bandas, Hondo (interpretado pelo próprio roteirista-produtor Musolino, este da imagem abaixo), para que sequestre a irmã de Django, obrigando-o a trocar a grana pela garota. Infelizmente, no processo de sequestrar a garota, Hondo também acaba matando o tio do herói, dando-lhe um duplo motivo para se vingar!


Se lendo assim já parece confuso, saiba que ao resumir a trama eu tentei dar um mínimo de sentido e coerência ao que acontece no filme, pois a narrativa de DJANGO NÃO ESPERA... MATA é incompreensível: são tantos personagens entrando e saindo de cena sem dizer ao que vieram que eu passei a maior parte da trama boiando, até finalmente desistir de entender; só fui entender minimamente a história ao ler algumas resenhas sobre o filme depois, e então reassisti-lo com outros olhos.

Mas, mesmo usando um "manual de instruções" como eu fiz, a trama continua desnecessariamente complicada e enrolada, com um excesso de traições e personagens se enganando e roubando o dinheiro uns dos outros. Em resumo, só para dar uma ideia de como o roteiro é estupidamente complexo: Navarro mata o pai de Django e rouba seu dinheiro; o filho de Navarro, Nico, rouba o dinheiro e foge; Gray mata Nico e rouba o dinheiro uma terceira vez; Django mata Navarro e depois mata Gray, recuperando o dinheiro; Don Alvarez manda Hondo sequestrar a irmã de Django para roubar o dinheiro pela... sei lá, quarta vez?


Cada uma dessas situações já renderia seu próprio filme, então imagine ver tantas voltas e reviravoltas numa mesma aventura com menos de 90 minutos. E sem sequer se preocupar em explicar ao espectador quem são aqueles personagens todos ou suas intenções. Complicado, hein?

Alguns críticos escreveram que o roteiro parece ter sido escrito numa noite para filmar no dia seguinte, mas eu já acho que nem havia roteiro, e as cenas foram sendo improvisadas na hora da filmagem mesmo! O fato de Django "vingar-se" do assassino do pai (o mexicano Navarro) ainda nos primeiros 20 minutos também estraga aquela expectativa pelo grande duelo final. E, com tantos vilões em cena, nem sequer existe um único bandidão memorável para o espectador ficar de olho.


Embora Django Foster seja um pistoleiro bem mais próximo do Django de Franco Nero do que Glenn Saxson em "Django Atira Primeiro", as semelhanças não são lá tão expressivas. Além de ter família e uma irmã, coisas que faltavam ao herói "forever alone" do filme de Corbucci, o Django de Mulargia e Musolino também tem um sidekick, um mexicano chamado Barrica (interpretado por Ignazio Spalla).

Pelo menos o carrancudo Rassimov está ótimo como Django genérico, e acertou até no tom misterioso/silencioso do personagem - embora a ridícula luvinha de couro que ele usa numa das mãos nunca se justifique. Coincidentemente, o ator também havia integrado o elenco de "A Bíblia", de John Huston, de onde saiu o Django oficial, Franco Nero.


É uma pena que o filme seja bem ruinzinho e não lhe faça justiça, e que essa seja sua única interpretação do herói (adoraria vê-lo interpretar Django em mãos mais habilidosas, de um Ferdinando Baldi ou Enzo G. Castellari, por exemplo). Quer dizer, única interpretação oficialmente, porque se considerarmos também as redublagens e títulos em outros países (e eu, pelo menos, não considero), este seria o segundo dos quatro "Djangos" de Rassimov!

Acontece que "Cjamango - O Vingador" foi lançado como "Django e as Cruzes na Areia Sangrenta" na Alemanha, onde o pistoleiro Cjamango também foi renomeado Django (ora, o nome já era bem parecido mesmo!); "Atirar para Viver" (1968), de Sergio Garrone, virou "Façam Suas Preces... Django Atira!" para o público alemão (mesmo que o personagem de Rassimov se chamasse Johnny Dall na versão original); por fim, "Sua Lei Era a Vingança" (1969), de Mario Siciliano, foi rebatizado "Django Não Reza" na França (Rassimov originalmente interpretava um herói chamado Daniel neste filme).


Os créditos iniciais de DJANGO NÃO ESPERA... MATA identificam Ivan com um nome artístico americanizado, "Sean Todd", que ele usou também em seus outros faroestes, como era comum aos atores da época para se passarem por "astros norte-americanos". O engraçado é que eu sempre achei que "Ivan Rassimov" também fosse um nome artístico (referência ao escritor russo Ivan Assimov, talvez). Bem, não deixa de ser, já que o nome de batismo deste italiano de origem sérvia era Ivan Djerassimovic!

Rassimov teve uma longa carreira no cinema italiano, sendo bastante lembrado pelos fãs de horror por ter aparecido em três títulos do notório ciclo de filmes sobre canibais: "The Man from the Deep River" (1972), "O Último Mundo dos Canibais" (1977) e "Os Vivos Serão Devorados" (1980), o primeiro e o último dirigidos por Umberto Lenzi, e o segundo por Ruggero Deodato.


O restante do elenco não tem muita chance para mostrar serviço, graças à direção inepta de Mulargia (creditado como "Edward G. Muller") e ao roteiro bisonho do produtor Musolino (que assina com o pseudônimo "Glenn Vincent Davis"). E olha que se o filme não fosse tão enrolado e tão chato, poderia ter algum valor como comédia involuntária, como acontece com as obras do igualmente ruim Demofilo Fidani (logo chegaremos a elas).

Motivos para rir de DJANGO NÃO ESPERA... MATA não faltam: além da pobreza geral da produção (cenários e figurinos parecem ter sido improvisados no próprio dia da filmagem), e da incompetência geral de todos os envolvidos na parte técnica, há um problema crônico com a iluminação, que ganha contornos surreais em diversas cenas. Repare, por exemplo, na imagem abaixo, que mostra Django caminhando à noite e sendo diretamente iluminado pela luz de um refletor!


Outro detalhe hilário envolvendo a iluminação é que ela diversas vezes entrega a utilização de cenários. O rancho da família Foster, por exemplo, é um cenário tão óbvio, sem teto ou paredes, que em várias das internas filmadas ali vemos a luz do sol incidir diretamente sobre os personagens, vinda por cima e pelos lados, comprovando que não há telhado na casa, como você pode conferir nas imagens abaixo.

O leitor do FILMES PARA DOIDOS sabe que eu não costumo me deter a estes aspectos tão técnicos, mas é que o problema nesse caso é tão grave que fica impossível não rir da incompetência geral, e é incrível que o diretor não tenha percebido a luz estourando enquanto filmava estas cenas - ou então percebeu, mas achou que o filme já era tão ruim que ninguém iria ligar para mais este "detalhe"!


DJANGO NÃO ESPERA... MATA também é fraquinho no quesito ação. Os duelos e tiroteios são bem básicos, e a narrativa se resume a mostrar Rassimov chegando (geralmente de lugar nenhum), encontrando um grupo aleatório de inimigos e sacando seu revólver mais rápido para matar todos os rivais, não importando seu número. Depois da terceira ou quarta vez que isso acontece, fica redundante e provoca até bocejos.

Não há nada sequer próximo do massacre com metralhadora em "Django", mas pelo menos a conclusão envolve um gigantesco tiroteio na fazenda de Don Alvarez, com farta contagem de cadáveres, no estilo do que Lucio Fulci tinha feito no ano anterior em "Tempo de Massacre" (1966) - com destaque para o improvisado "colete à prova de balas" usado por Barrica, que só pode ser citação a "Por um Punhado de Dólares".


Enfim, deve ter um bom filme em algum lugar de DJANGO NÃO ESPERA... MATA, mas o roteiro incompreensível e as limitações da produção comprometem bastante o resultado final. E é uma pena, porque Rassimov poderia ter sido um ótimo Django caso contasse com diretor e roteiro melhores.

A parceria entre Mulargia e Musolino pode ter encerrado aqui, mas ambos seguiram seu próprio caminho. O produtor resolveu escrever e dirigir seus próprios filmes, talvez por ter percebido a inépcia do seu parceiro habitual. Ele mesmo assinou os westerns "Peça Perdão a Deus, Nunca a Mim" (1968) e "Quintana", este lançado no mesmo ano em que Musolino faleceu, 1969.

Já Mulargia deve ter aprendido algumas coisas com DJANGO NÃO ESPERA... MATA, considerando que a sua outra aventura não-oficial do personagem, o posterior "Um Homem Chamado Django" (estrelado por Anthony Steffen), é infinitamente superior e muito mais divertido, conforme veremos mais adiante em nossa MARATONA VIVA DJANGO!.


Cena de DJANGO NÃO ESPERA... MATA



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Non Aspettare, Django... Spara 

(1967, Itália)
Direção: Edoardo Mulargia
Elenco: Ivan Rassimov, Rada Rassimov, Ignazio Spalla,
Vincenzo Musolino, Gino Buzzanca, Franco Pesce, Celso
Faria, Alfredo Rizzo e Marisa Traversi.