WebsiteVoice

Mostrando postagens com marcador Mel Welles. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Mel Welles. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

SORVETE DE LIMÃO (1978) e O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM (1982)


Desde 1978, pelo menos três gerações de pré-adolescentes aprenderam que, como diz aquela música, “love hurts” e toda mulher é ou uma vadia que só quer trepar sem compromisso, ou uma salafrária sem coração que vai partir seu coração quando você menos esperar. As culpadas por esta aula de gosto duvidoso sobre relacionamentos amorosos foram a comédia israelense SORVETE DE LIMÃO, de 1978, e principalmente a sua refilmagem norte-americana O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM, de 1982, ambas escritas e dirigidas pelo israelense de Tel-Aviv Boaz Davidson.

Claro, depois você vai crescendo e descobre que, na vida real, as mulheres não se dividem apenas nestas duas categorias mostradas nos filmes, embora existam muitas representantes de ambas as categorias zanzando por aí e um montão de homens tão ou mais terríveis. Mesmo assim, é difícil não simpatizar (e até se identificar) com o protagonista das duas obras, Benzi no original e Gary no remake, devido à forma de partir o coração como os filmes terminam.


Inclusive eu nunca me esqueço da primeira vez que vi O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM. Ainda era um moleque na faixa dos 10 ou 12 anos, e quando os créditos finais começaram a subir, sobre uma imagem do protagonista dirigindo sozinho e derramando lágrimas de decepção, eu pensei comigo mesmo: “Não acredito que o filme vai terminar assim!”.

Pois até hoje este mesmo pensamento passa pela minha cabeça toda vez que revejo o filme, motivo pelo qual já citei a conclusão de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM como uma das mais tristes já filmadas. Além de comédias juvenis sobre sexo, tanto SORVETE DE LIMÃO quanto O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM podem ser encarados como dramas comoventes sobre um primeiro amor não-correspondido, incluindo até um caso de aborto no clímax das tramas de ambos os filmes.


E nossa "Sessão Dupla" de hoje é justamente sobre as duas versões dessa história saída da cabeça de Boaz Davidson. Como são igualzinhas (trata-se de uma daquelas refilmagens praticamente cena a cena), não havia razão para eu escrever resenhas separadas sobre cada filme, até porque iria acabar me repetindo. Sem contar que é muito divertido assistir às duas versões no mesmo dia para comparar onde as piadas e situações funcionam melhor, se em Israel ou nos Estados Unidos.

Por esse motivo, usei imagens tiradas das mesmas cenas nos dois filmes, para que o leitor possa conferir in loco como a refilmagem é fiel ao original até nos ângulos de câmera! Mas convém preparar os lenços; afinal, um coração partido dói tanto em Israel quanto nos Estados Unidos, e em qualquer lugar deste planeta.

(Uma boa dica é usar como trilha sonora da leitura este ótimo podcast da Daniela Monteiro, contendo a EXCELENTE trilha sonora dos dois filmes!)


SORVETE DE LIMÃO (1978)


Muita gente nem sabe que é o clássico do Cinema em Casa "O Último Americano Virgem" é a versão norte-americana de um grande sucesso do cinema israelense, a comédia "Eskimo Limon", popular no resto do mundo pelo título em inglês "Lemon Popsicle", e lançada em nossos cinemas em 1980 como SORVETE DE LIMÃO.

Trata-se da mesmíssima trama de "O Último Americano Virgem", mas com uma grande diferença: enquanto a versão norte-americana se passa na Los Angeles dos anos 80, mesma época em que o filme foi feito, o original tem um olhar mais nostálgico, com a trama situando-se na Israel da década de 50, nos moldes do que George Lucas fez em "American Graffiti - Loucuras de Verão" (1973).


É nesta época que acompanhamos as aventuras e desventuras de três jovens em busca de garotas fáceis e aventuras sexuais. Eles são Benzi (Yftach Katzur), que trabalha distribuindo blocos de gelo pelo bairro, numa época em que as geladeiras não eram iguais às de hoje; Momo (Jonathan Sagall, que depois teria papel de destaque em... "A Lista de Schindler"!), o comedor da turma, que passa o rodo geral nas meninas, e Yudale (Zachi Noy, de "Ninja, A Máquina Assassina"), o típico gordo atrapalhado estilo John Belushi.

(Quando o filme foi lançado nos cinemas norte-americanos, e dublado em inglês, os nomes "muito israelenses" dos três jovens foram mudados para versões americanizadas, pelas quais eles são mais conhecidos até hoje: Benzi virou Benji, Momo virou Bobbie, e Yudale passou a atender pela alcunha de Hughie!).


SORVETE DE LIMÃO começa com o trio reunido numa daquelas lanchonetes típicas dos anos 50, que tocavam rock-and-roll para animar os flertes da garotada. Os rapazes conseguem convencer duas meninas para uma sessão de cinema, mera desculpa para poderem bolinar as moças no escurinho, mas as trapalhadas começam desde cedo: sem dinheiro para comprar o ingresso, eles entram por uma porta lateral e são expulsos pelo lanterninha bem na hora em que a coisa está esquentando.

A partir de então, seguem-se várias confusões envolvendo sexo e promiscuidade, incluindo o encontro com uma prostituta daquelas em fim de carreira, que passa pediculose púbica (o popular "chato") para os três rapazes, e uma orgia com uma italiana fogosa que gosta de homens mais novos, interrompida na hora H quando seu namorado marinheiro volta de viagem. Tudo bem grosseiro, mas ainda assim engraçado, e com um olhar até meio ingênuo sobre a coisa toda.


A história muda de tom quando Benzi conhece uma garota nova na cidade, Nili (Anat Atzmon), e se apaixona por ela. Só que a moça também é cobiçada pelo pegador Momo, e o triângulo amoroso coloca em xeque a amizade entre os dois. Principalmente quando Momo tira a virgindade de Nili, e depois a abandona grávida e desamparada.

Benzi, que já tinha passado a maior parte do filme tentando fazer com que Nili abrisse os olhos e se apaixonasse por ele, resolve aproveitar a oportunidade para ajudar a moça: vende suas coisas, levanta uma grana e paga um aborto para que ela não se torne mãe solteira (suicídio social naqueles tempos repressores). Parece que a coisa vai entrar nos eixos e Benzi finalmente ficará com Nili, mas a história termina com a já mencionada cena final de estragar o dia de qualquer um. Embora seja uma comédia, não há nada sequer parecido com um final feliz, ou engraçado, em SORVETE DE LIMÃO...


Duvido que em pleno século 21 ninguém saiba como é que a história acaba (ou pelo menos como o remake "O Último Americano Virgem" acaba), mas vamos recapitular: Benzi vai à festa de aniversário de Nili com uma jóia que comprou e que lhe custou os olhos da cara, apenas para encontrá-la aos beijos e abraços na cozinha com... Momo!?! Exatamente, aquele mesmo cafajeste que semanas antes abandonou a garota depois de engravidá-la!

E sem direito a segunda chance: ao som da balada triste "Mr. Lonely", de Bobby Vinton (“Solitário... / Sou o Sr. Solitário / Não tenho ninguém / Para chamar de meu”), Benzi dá as costas para o (aparentemente) feliz casal e sai da festa com o caríssimo presente nunca entregue nas mãos, chorando, enquanto os créditos sobem devagar, sem uma última cena que redima os personagens ou pelo menos dê um mínimo de final feliz para o protagonista! Muita gente deve ter saído do cinema com a certeza de que mulher não presta, e convenhamos que o filme não ajuda a criar qualquer simpatia pela principal personagem feminina com esta conclusão...


O mais interessante é saber que a triste história de Benzi foi baseada num acontecimento da juventude do próprio diretor-roteirista Boaz Davidson, que também teve uma Nili em sua vida e também acabou com o coração partido no desfecho - motivo pelo qual ele deve ter lutado para filmar o inesperado final triste de SORVETE DE LIMÃO.

Talvez por isso, também, o enfoque no caso de aborto seja muito maior nesta versão do que no remake norte-americano (em que rápidas cenas da menina sendo preparada para a operação aparecem ao som de rock-and-roll). Aqui o processo é mostrado mais detalhadamente, quem sabe até com propósitos moralistas, tipo assustar a molecada da época para fazer sexo seguro.


Numa entrevista que consta como extra no DVD japonês de SORVETE DE LIMÃO, Davidson explica: "Quando eu era jovem, sofri com as dores da idade como todo mundo, e acho que algumas delas me acompanharam até a idade adulta, quando eu decidi voltar a elas e encerrar o ciclo, encerrar a história. O filme é baseado na minha vida: Benzi sou eu, seus pais são meus pais, os outros caras são os meus amigos da época e a garota por quem ele se apaixona é a garota por quem eu me apaixonei. Portanto, é um filme muito importante para mim".

Na mesma entrevista, Davidson assume que "American Graffiti" foi uma grande inspiração até para a escolha da trilha sonora, repleta de pérolas das décadas de 50-60, como "My Little One", de George Fenton, "Long Tall Sally", de Little Richard, "Rock Around The Clock", de Bill Haley and the Comets, "Lollipop", na voz das The Chordettes, e "Put Your Head On My Shoulder", de Paul Anka. Sabe-se lá se os israelenses pagaram direitos autorais para toda essa gente, mas a trilha é de primeira (você está escutando o DanyCast nesse momento, não está?).


SORVETE DE LIMÃO foi um grande sucesso no mundo inteiro na época do seu lançamento. Apesar de hoje ser visto (de forma preconceituosa e incorreta) como uma comédia rasteira de baixaria e mulher pelada, no final dos anos 70 o filme chegou até o circuito dos festivais de respeito, concorrendo ao Urso de Ouro no Festival de Berlim em 1978 e ao Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro em 1979!!! Digamos apenas que imitações posteriores, tipo o canadense "Porky's" (1982), jamais chegaram tão longe.

Para aproveitar o sucesso, foram produzidas nada menos de OITO continuações entre 1979 e 2001, quase todas estreladas pelo mesmo trio de atores na pele dos mesmos personagens (e sem nunca explicar como Benzi e Momo continuaram sendo amigos depois do que aconteceu na conclusão do filme original!).


Boaz Davidson dirigiu as três primeiras: "Yotzim Kavua/Going Steady" (1979), que é basicamente mais do mesmo; "Shifshuf Naim/Hot Bubblegum" (1981), que mostra Benzi voltando a se envolver com a mesma Nili do original (e se ferrando outra vez), e "Sapiches/Private Popsicle" (1983), em que os três amigos entram no Serviço Militar, mas continuam se metendo em confusões sexuais.

As sequências seguintes foram "Roman Za'ir/Baby Love" (1984), dirigida por Dan Wolman, em que Benzi se apaixona pela irmã de Momo; "Harimu Ogen/Up Your Anchor" (1985), em que Benzi e Yudale vão trabalhar como marinheiros num cruzeiro (desta vez sem Momo, pois o ator pulou fora); "Ahava Tzeira/Young Love" (1987), dirigido por Walter Bannert, reunindo outra vez os três amigos e colocando-os para trabalhar num resort de férias; e finalmente "Summertime Blues: Lemon Popsicle VIII" (1988), uma bizarra co-produção Israel-Alemanha (!!!) dirigida por Reinhard Schwabenitzky, e a última sequência a trazer os três atores principais da série (na época já acima dos 30 anos, mas ainda fazendo papel de adolescentes!).

Um nono filme foi produzido em 2001, "Lemon Popsicle 9: The Party Goes On", dirigido por
Tzvi Shissel, e com uma trama que se passa nos anos 60. Outros atores assumiram os papéis principais, já que os astros originais eram quarentões àquela altura.


Apesar de hoje a franquia ser praticamente desconhecida no Brasil, seus filmes foram muito populares nas grandes cidades nos tempos das salas de cinema de rua, e alguns também chegaram às nossas locadoras ou às telinhas via SBT. Para não se perder, confira o que chegou ao nosso país e o que permanece inédito:
* "Eskimo Lemon/Lemon Popsicle": exibido apenas nos cinemas como "Sorvete de Limão"; inédito na TV e em VHS/DVD.
* "Yotzim Kavua/Going Steady": lançado em VHS pela América Vídeo como "Ritmo Alucinante".
* "Shifshuf Naim/Hot Bubblegum": exibido em nossos cinemas e no SBT como "Paquera e Curtição", mas lançado em VHS pela América Vídeo com um título escalafobético: "Os Americanos Virgens Agora Chupam Sorvetes" (!!!).
* "Sapiches/Private Popsicle": inédito nos cinemas e na TV, mas lançado em VHS pela América Vídeo como  "Recrutas da Pesada" (mesmo título de uma comédia estrelada por Bill Murray).
* "Roman Za'ir/Baby Love": exibido nos cinemas como "Doce Baby Love" e pelo SBT como "Amor de Menina"; lançado em VHS pela LK-Tel como "Baby Love - Um Jogo Inocente".
* "Harimu Ogen/Up Your Anchor": exibido nos cinemas e lançado em VHS pela América Vídeo com o título picareta "O Último Americano Virgem 2"!!! (Lembro que loquei esta fita para ver se a história realmente iria continuar do final de "O Último Americano Virgem", e obviamente me decepcionei bastante ao descobrir que era uma história completamente diferente.)
* "Ahava Tzeira/Young Love": exibido pelo SBT e lançado em VHS pela América Vídeo como "Loucuras de Verão" (mesmo nome brasileiro de "American Graffiti"!).
* "Summertime Blues: Lemon Popsicle VIII": inédito no Brasil.
* "Lemon Popsicle 9: The Party Goes On": inédito no Brasil.


É comum ler por aí que "O Último Americano Virgem" teria sido influenciado pela comédia canadense "Porky's". Mas a verdade é que foi "Porky's" quem se inspirou em SORVETE DE LIMÃO. O filme de Bob Clark também trata das aventuras sexuais de adolescentes nos anos 50, e tem até algumas cenas bem parecidas com a comédia israelense.

Aqui, por exemplo, há um momento em que a garotada do colégio faz uma competição para ver quem tem o maior pinto, e Benzi e Yudale medem todos os membros da rapaziada com uma régua para eleger o vencedor. Pois a cena inicial de "Porky's" mostra justamente o looser Pee-Wee medindo o próprio pinto com uma régua e analisando o resultado num "gráfico de crescimento" que guarda debaixo da cama!


SORVETE DE LIMÃO provavelmente foi um dos precursores das comédias juvenis sobre sexo, um subgênero que seria explorado à exaustão nos Estados Unidos na década de 80, sempre mostrando jovens idiotas e tarados correndo atrás de belas garotas peladas. "Férias do Barulho", "Quando a Turma Sai de Férias" e "A Grande Encrenca" são alguns dos títulos mais conhecidos desse ciclo, que nos anos 90/2000 renderia ainda a série "American Pie".

Ironicamente, o filme israelense nem é tão safado assim - pelo menos não tanto quanto os que vieram depois, incluindo suas continuações. O nível de nudez é bem baixo, o sexo é bastante tímido, e quando um moleque espia as meninas do colégio tomando banho por um buraco na parede do vestiário, por exemplo, as garotas aparecem apenas de calcinha e sutiã. A única cena mais cabeluda é a visita dos rapazes à italiana ninfomaníaca, que aparece completamente nua. Fora isso, SORVETE DE LIMÃO é uma comédia até bem inocente para os padrões atuais.


Mas embora eu goste muito do filme de Boaz Davidson (principalmente por causa da sua trilha sonora, e da forma como as músicas casam com as cenas, uma coisa de gênio!), tenho que confessar que prefiro a versão norte-americana "O Último Americano Virgem". Talvez porque este aqui mostre um momento bem particular do seu diretor-roteirista, que teve a infância e a juventude nos anos 50, enquanto eu me identifico muito mais com a molecada anos 80 mostrada na refilmagem.

A ideia de refilmar SORVETE DE LIMÃO veio da cabeça dos primos Yoram Globus e Menahen Golan, que produziram a série original em Israel. Quando eles montaram a Cannon Films para fazer seus próprios projetos nos Estados Unidos, o remake de SORVETE DE LIMÃO foi um dos primeiros da lista, já que os originais faziam grande sucesso também nos EUA (onde eram dublados em inglês).

Inclusive "O Último Americano Virgem" seria o primeiro episódio da série "Eskimo Limon" norte-americana, mas infelizmente não fez o mesmo sucesso dos originais e acabou ficando somente neste único episódio mesmo. Portanto, vamos a ele...


O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM (1982)


Quando moleque, eu interpretava O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM simplesmente como uma comédia sobre sexo. Afinal, o filme trazia todas aquelas confusões típicas envolvendo jovens cabaços que tentam pegar meninas fáceis, piadas machistas como a competição de medir o tamanho do pinto ou o rapaz que espiona as garotas tomando banho no vestiário do colégio, e por aí vai.

Mas hoje a minha visão sobre O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM é completamente diferente: sim, o sexo e a safadeza estão lá, e em doses muito maiores que no original israelense "Sorvete de Limão". Porém o filme parece muito mais triste e melancólico do que eu me lembrava. E a conclusão... cacetada! Já escrevi no começo, mas vale lembrar que poucos finais me chocaram tanto na minha longa vida de cinéfilo quanto o desta comédia - talvez porque ninguém vai ver um filme chamado O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM esperando levar uma cacetada na cabeça no final!


Concebido como o primeiro filme da série "Lemon Popsicle" norte-americana (acabou sendo o único, pois os originais faziam mais sucesso que a refilmagem), O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM também foi escrito e dirigido pelo israelense Boaz Davidson, com algumas pequenas modificações aqui e ali.

A principal delas é que enquanto "Sorvete de Limão" se passava nos anos 50, a trama aqui se desenrola na própria década das filmagens, os anos 80. Por isso alguns espectadores (eu incluso) vão se identificar muito mais com a história e os personagens.


A ambientação também mudou: sai Israel, entra Los Angeles, onde mais uma vez acompanhamos as aventuras e desventuras de três jovens em busca de garotas fáceis e aventuras sexuais. Agora eles já andam de carro (e não de bicicleta, como no original) e trabalham em pizzarias (e não como entregadores de gelo), mas, na essência, são igualzinhos às suas versões israelenses lá de 1978.

O trio agora é formado por Gary (Lawrence Monoson, que também interpretou um cabação que se dá mal em "Sexta-feira 13 Parte 4 - O Capítulo Final), um tímido entregador de pizza; Rick (Steve Antin, vilão juvenil em "Os Goonies"), o comedor que passa o rodo geral sem ligar para os sentimentos das moças ou para a possibilidade de elas engravidarem, e David (Joe Rubbo), o gordo atrapalhado versão EUA.


Se "Sorvete de Limão" começava com o trio convencendo duas meninas a pegar um cineminha, mas cheios de segundas intenções, aqui a parada é mais pesada: eles convencem três garotas assanhadas a irem até a casa de Gary (cujos pais vão passar a noite fora) para uma festa que não existe regada a drogas que não existem (eles chegam a fazer linhas de açúcar para imitar cocaína, em cena que costumava ser cortada nas exibições na TV). Rick é o único que consegue transar com uma das garotas, enquanto os amigos se ferram quando os pais de Gary voltam para casa mais cedo.

(Esta é uma das poucas cenas de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM que não existe no original israelense. Mas o diretor Davidson pegou-a emprestada do terceiro filme da série "Lemon Popsicle", mais conhecido por aqui como "Paquera e Curtição".)


O restante do filme segue fielmente o roteiro de "Sorvete de Limão", inclusive na ordem das cenas: o concurso de maior pinto, o encontro com uma coroa ninfomaníaca (aqui latina ao invés de italiana), a transa com a prostituta que rende chatos ao trio, e até a cena em que eles roubam o carro de um amigo nerd para ir namorar na praia e acabam afundando o conversível no mar!

Como também acontecia no original, a história começa a se complicar quando Gary se apaixona por Karen (Diane Franklin, de "Amityville 2 - A Possessão"), que por sua vez está na mira do pegador Rick. Apesar dos constantes esforços do tímido virgem para se declarar à menina, é Rick quem transa com Karen. E a engravida. Aí Gary tenta resolver a situação e... o final é aquele mesmo de "Sorvete de Limão", mas a versão "modernizada" parece ainda mais filha da puta do que a original!


Por que mais filha da puta? Bem, aqui a cena mostra Gary encontrando Karen e Rick aos beijos ao som de "Just Once", de James Ingram (“Eu dei o meu melhor / Mas eu acho / Que o meu melhor não foi bom o suficiente”). A diferença em relação à conclusão do original israelense é que lá o diretor fazia questão de mostrar que a personagem da menina (Nili) percebia que tinha pisado na bola, e até ficava consternada ao perceber que Benzi a pegara no flagra voltando para o outro rapaz; aqui, em compensação, Karen olha para Gary com um sorrisinho um tanto cínico, como se estivesse perguntando “Mas e o que você esperava, otário?”. Assim como já acontecia no original israelense, fica difícil simpatizar com a personagem considerando a forma como ela trata o ingênuo protagonista - talvez um simples diálogo com a menina tentando justificar a escolha, ou pelo menos um "Sinto muito", tornasse a situação menos pesada.

(Você pode comparar o final dos dois filmes nos vídeos abaixo, mas convém preparar-se para o choque, porque ambos são de rasgar e pisotear o coração!)

Cena final de "O Último Americano Virgem"



Cena final de "Sorvete de Limão"



Além de Monoson, que depois apareceu em "Sexta-feira 13 Parte 4", dois outros nomes ligados ao horror bateram cartão em O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM: o veterano Mel Welles, ator em "A Pequena Loja dos Horrores" e diretor de "A Mulher de Frankenstein", aparece como um farmacêutico, e Brian Peck faz o papel do nerd Victor. Para quem não ligou o nome à pessoa, Peck integrou o elenco dos três primeiros filmes da série "A Volta dos Mortos-Vivos", mas sempre em papéis diferentes, sendo mais lembrado como o punk Scuz no original (depois ele fez pontas como zumbis nas duas sequências).

E não dá para deixar de registrar a presença de Kimmy Robertson como Rose, amiguinha feia de Karen que acaba se apaixonando por Gary. Kimmy ficou imortalizada na cultura popular como a secretária da delegacia do seriado "Twin Peaks", e aqui já dá uma demonstração da sua voz chata, que depois seria tão marcante na série criada por David Lynch.


Ah, outra informação curiosa: Steve Antin na vida real era gay assumido, e inclusive namorou com o famoso executivo da música David Geffen em meio aos anos 80. O cara está bem convincente como pegador no filme, mas já era homossexual na época das filmagens. Mais recentemente, Antin abandonou a carreira de ator para concentrar-se na de diretor-roteirista: foi ele que assinou o musical "Burlesque" (2010), com Cher e Christina Aguilera. Assim, do elenco do filme, foi provavelmente o que chegou mais longe.

Por sinal, alguns sites alegam que Lawrence Monoson também saiu do armário nos anos 80, o que tornaria o triângulo amoroso mostrado em O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM bem suspeito (talvez os dois moleques no fundo estivessem disputando um ao outro, e não a mocinha!). Entretanto, como não encontrei referências confiáveis de que Monoson morde a fronha, fica a dúvida no ar. Já o gordinho Joe Rubbo apareceu como gordinho trapalhão (claro!) em outra comédia adolescente sobre sexo, "Férias Ardentes" (1985), e depois abandonou o cinema para virar corretor. Dizem as más línguas que chegou a ser preso por crimes contra a Receita.


Se "Sorvete de Limão" chamava a atenção pela qualidade da trilha sonora, repleta de pérola dos anos 50-60, aqui os realizadores repetiram a dose com outra trilha maravilhosa, agora formada por sucessos das décadas de 70-80, como The Police ("De Do Do Do, De Da Da Da"), K.C. and The Sunshine Band ("That's the Way I Like It"), Oingo Boingo ("Better Luck Next Time") e REO Speedwagon ("Keep on Loving You"), entre outros.

Também vale destacar algumas poucas mudanças feitas aqui, em comparação com o original israelense. Em "Sorvete de Limão", havia mais cenas em que Benzi era cobrado por sua família para tomar jeito e dar um rumo à sua vida, que não estão aqui. Já quando os amigos iam na farmácia comprar remédio para matar chatos, eram atendidos primeiro por uma funcionária, o que deixava a situação ainda mais constrangedora. Aqui, eles já são atendidos direto por um homem, mas aparentemente a cena foi filmada igualzinho à versão israelense e depois diminuída, pois os créditos finais indicam Sylvia Lawler, que não aparece no filme, como "Assistant Druggist".


Talvez o inesperado fracasso de bilheteria de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM possa ser explicado pelo fato de o filme ter estreado nos cinemas no mesmo ano que "Picardias Estudantis", excelente comédia dirigida por Amy Heckerling, que ficou com todos os holofotes.

Como "Picardias Estudantis" também tem um toque dramático envolvendo o aborto feito por uma das personagens (Jennifer Jason Leigh), muitos críticos da época erroneamente afirmaram que O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM era uma cópia barata do filme de Heckerling, ignorando que na verdade era remake de um filme de 1978, e portanto se alguém copiou alguém foi o próprio "Picardias Estudantis"!


Pelo menos o tempo fez justiça à comédia de Davidson, transformando-a numa espécie de clássico cult, não só pelas incontáveis reprises na TV ao redor do mundo, mas principalmente pelo fato de o filme ser muito mais interessante e maduro (acredite se quiser!) do que várias outras comédias adolescentes sobre sexo do mesmo período.

Há alguns anos, um reencontro do elenco de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM foi realizado nos Estados Unidos, juntando no mesmo palco alguns dos atores principais e secundários do filme, e reuniu uma multidão de fãs. O moderador dos debates foi ninguém menos que o cineasta Eli Roth, de "Hostel" e "Cabana do Inferno"!


Eu já disse antes que prefiro e me identifico muito mais com O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM, embora goste bastante de "Sorvete de Limão" também, e explico o porquê: enquanto o original era uma comédia farsesca mais descarada e escrachada, aqui existe uma química legal entre os protagonistas, como se os três fossem amigos de verdade na vida real, e não apenas jovens tarados em busca de sexo.

Além disso, quem nunca passou por situações parecidas com as de Gary e sua turma? Não estou me referindo a pagar abortos para meninas mal-agradecidas, mas de aspectos específicos da trama que são bem realistas, ao contrário dos exageros e absurdos vistos em filmes como "Porky's" e, mais recentemente, "American Pie". Se na vida real ninguém enfia o pinto em tortas (ou pelo menos eu gostaria de acreditar que não), é muito fácil identificar-se com algumas das situações apresentadas na comédia de Boaz Davidson.


Nunca esqueci, por exemplo, da noite em que eu, ainda um garoto em meus 14 ou 15 anos, fui a uma festa e encontrei a menina por quem eu era apaixonado aos beijos com um amigo meu, e aí enchi a cara até não conseguir ficar de pé, voltei para casa e fiz o maior fiasco diante dos meus pais. No filme há uma cena muito parecida, quando Gary "bebe para esquecer" ao ver Rick e Karen numa festinha e depois apronta todas ao chegar doidão em casa bem na hora de uma inesperada reunião de família!

E quem nunca fez um favor para um amigo ficando com a amiga feia da bela garota com quem ele iria sair, pois as duas só sairiam juntas? Lembro, desta vez com certo desgosto, que certa vez fui um verdadeiro herói encarando um tribufú daqueles só para que um amigo meu pudesse se dar bem. Pois aqui tem uma cena muito parecida, quando Gary precisa sair com Rose à força - e na verdade ele reclama de barriga cheia, pois Rose nem é tão feia assim, e certamente é uma Gisele Bündchen perto do tribufú que EU encarei para ajudar meu amigo!


Enfim, são esses pequenos momentos parecidos com a vida de gente como a gente que fazem de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM uma comédia romântica clássica, ora safada e sem-vergonha, ora triste e melancólica. Pena que, hoje, os filmes sobre a iniciação sexual da rapaziada sejam tão moralistas e tão cheios de dedos, tipo as continuações de "American Pie" (o primeiro até se salva por alguns momentos mais sem-vergonha).

Pois se dependesse de mim, O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM teria exibição obrigatória para a molecada nas escolas. Afinal, a forma como o filme enfoca o sexo (in)seguro e suas consequências (aqui ninguém usa camisinha ou faz qualquer menção a preservativos, ao contrário do que acontecia em "Sorvete de Limão") é muito mais eficiente na educação sexual da garotada do que qualquer aula ou vídeo institucional.

Sem contar que a conclusão ainda prepara a meninada para ser um pouquinho mais forte e insensível nas inevitáveis desilusões amorosas que virão pela frente...


Trailer de SORVETE DE LIMÃO



Trailer de O ÚLTIMO AMERICANO VIRGEM



*******************************************************
Eskimo Lemon / Lemon Popsicle (1978, Israel)
Direção: Boaz Davidson
Elenco: Yftach Katzur, Anat Atzmon, Jonathan Sagall,
Zachi Noy, Ophelia Shtruhl, Dvora Kedar, Avi Hadash,
Rachel Steiner e Yehoshua Luff.

The Last American Virgin (1982, EUA)
Direção: Boaz Davidson
Elenco: Lawrence Monoson, Diane Franklin, Steve Antin,
Joe Rubbo, Louisa Moritz, Brian Peck, Tessa Richarde,
Kimmy Robertson, Mel Welles e Phil Rubenstein.