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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

AEROPORTO 77 (1977)


Nos sete anos anteriores, a Universal produzira dois filmes envolvendo desastres aéreos ("Aeroporto" e "Aeroporto 75") que foram muito bem nas bilheterias, especialmente o primeiro. Os produtores achavam que o tema "aviões em perigo" ainda tinha fôlego para um terceiro episódio. Nos dois anteriores, as ameaças aéreas foram, respectivamente, uma bomba que abria um rombo na fuselagem de um avião e o choque de uma aeronave comercial com um jatinho, que matava a tripulação e forçava a aeromoça a tomar o controle.

Assim, tudo considerado, qual seria a escolha mais lógica para o argumento de um terceiro "Aeroporto"?
a-) Um avião que cai no meio do oceano e afunda, ameaçando afogar todos os passageiros quando a água invadir a aeronave?
b-) Uma tragédia aérea no temido Triângulo das Bermudas?
c-) Um avião particular, que está sendo usado como palco para uma festa de ricaços, colide com uma plataforma de petróleo, colocando a vida de todos em risco?
d-) Criminosos que sequestram um avião para roubar sua valiosa carga?
e-) Todas as alternativas acima?


Pode até parecer inacreditável, mas a resposta para a pergunta é a opção"e"! Não sei de qual hospício a Universal tirou os roteiristas Michael Scheff e David Spector, mas a dupla simplesmente misturou todos esses argumentos num único filme, e o resultado foi AEROPORTO 77 - disparado o melhor filme da franquia.

Inacreditável, também, é que um negócio chamado AEROPORTO 77 tenha tão poucas cenas no próprio aeroporto ou nos ares. Porque se nas aventuras anteriores o desastre aéreo era controlado pelos protagonistas, aqui a tragédia finalmente se consuma e o avião cai. Felizmente (ou não), a aeronave cai no meio do oceano, afunda e cria toda uma nova situação de perigo para tripulação e passageiros: como sair dessa fria antes que o oxigênio no interior do avião acabe, ou que a fuselagem arrebente, matando a todos afogados?


Não precisa pensar muito para perceber de onde veio a inspiração para um filme de avião que se passa debaixo d'água (!!!): em 1972, logo depois do sucesso do "Aeroporto" original, a 20th Century Fox lançou "O Destino do Poseidon", de Ronald Neame, sobre o naufrágio de um transatlântico e o drama de celebridades como Gene Hackman, Ernest Borgnine e Shelley Winters para escapar da terrível morte por afogamento. Foi outro grande sucesso de bilheteria (refilmado por Wolfgang Petersen em 2006).

Além disso, já não havia mais muito a acrescentar depois de dois "Aeroporto" e dos diversos filmes para a TV mostrando aviões em perigo, como "Assassinato no Voo 502" (1975), de George McCowan, com Robert Stack e Farrah Fawcett, e "Voo para o Holocausto" (1977), de Bernard L. Kowalski, com Christopher Mitchum e Desi Arnaz Jr.

Espertinha, a Universal resolveu fazer uma espécie de "crossover" unindo as duas tragédias, aérea e naval. E se parte do público já sofria com a situação claustrofóbica de passageiros indefesos à mercê de uma aeronave em perigo, o que dizer da duplamente claustrofóbica sensação de estar preso dentro de um avião em perigo SUBMERSO?


Novamente produzido por Jennings Lang e William Frye (a dupla responsável pelo anterior "Aeroporto 75"), e dessa vez dirigido por Jerry Jameson, AEROPORTO 77 descarta logo de cara o tradicional voo comercial dos filmes anteriores. Aqui, somos levados a bordo de um luxuoso Boeing 747-100 particular, modificado por um bilionário para ser seu brinquedinho particular, com direito a piano-bar, jogos eletrônicos, escritórios e até quartos para seus distintos convidados.

O dinheirudo em questão é Philip Stevens (James Stewart, que em 1951 enfrentou problemas aéreos em "Na Estrada do Céu", mas aqui nem chega perto do avião). Ele convida amigos da alta sociedade, celebridades e familiares para fazer a viagem inaugural do luxuoso avião, entre Washington e Palm Beach. Não bastasse transportar boa parte do PIB da região, o 747 também leva, no compartimento de carga, a coleção particular de arte de Stevens, de valor incalculável, que está sendo transferida para um novo museu.


É claro que isso atrai a cobiça de uma organizadíssima quadrilha de ladrões profissionais, que infiltra-se entre a tripulação e coloca todo mundo para dormir com gás durante a travessia do Atlântico. O co-piloto Chambers (Robert Foxworth), que está mancomunado com os bandidos, desce com a aeronave para voar rente ao nível do oceano, fazendo-a desaparecer do radar.

O plano dos ladrões era pousar na pista abandonada de uma ilha próxima antes que todo mundo acordasse, mas é óbvio que a coisa não vai ser tão simples: bem no meio da região conhecida como Triângulo das Bermudas (coincidência??? hein? hein? hein?), Chambers desvia tarde demais de uma plataforma de petróleo escondida pela densa neblina, e o choque destrói os motores de uma das asas.

O avião descontrolado acaba caindo no oceano e afunda rapidamente. Para piorar, as equipes de resgate sequer sabem o local onde a aeronave naufragou, já que os bandidos fizeram com que ela sumisse do radar e saíram do curso normal por um bom tempo!


Num daqueles casos clássicos de justiça poética, dois dos criminosos são mortos na queda do avião, e apenas Chambers sobrevive. Os demais passageiros acordam e, horrorizados, percebem que estão submersos a 30 metros da superfície e dentro de um negócio cuja fuselagem não foi projetada para aguentar a pressão da água - ou seja: pode arrebentar a qualquer momento e afogar todo mundo, até porque o avião parou na beira de um abismo e ainda corre o risco de despencar para uma profundidade desconhecida!

A única esperança dos desafortunados ricaços reside no intrépido piloto Don Gallagher (Jack Lemmon!!!), o único que consegue manter a cabeça no lugar e pensar com a lógica em meio a uma situação tão complicada. Ainda há o problema de vários passageiros terem se ferido gravemente na queda, e o fato de o único "médico" a bordo ser um veterinário! E agora, José? Como sair dessa?


AEROPORTO 77 não apenas tem o maior número de desastres consecutivos (queda de avião E naufrágio no mesmo filme!), mas também possui, de longe, o elenco mais estelar da franquia. Além dos lendários James Stewart e Jack Lemmon, que eu jamais imaginei que veria num filme-catástrofe, vários astros surgem em pequenas participações interpretando os passageiros do fatídico voo naufragado, e todos eles com seus próprios dramas pessoais, claro.

Temos, por exemplo, o casal em crise formado pela oscarizada Lee Grant e por... putzgrila! Christopher Lee (que dessa vez, acredite se quiser, NÃO é um dos vilões!!!). Temos um pianista cego (Tom Sullivan) e a garota que é apaixonada por ele (Kathleen Quinlan). Temos Lisa, a filha do milionário (Pamela Bellwood), e seu próprio filho, Benjy (Anthony Battaglia), que viaja para conhecer o avô. Temos a coroa em crise (Olivia de Havilland) que encontra um velho admirador a bordo (Joseph Cotten). Temos o garçom negro (Robert Hooks) que espera o telefonema da esposa grávida e prestes a dar à luz. E ainda Brenda Vaccaro, M. Emmeth Walsh, Darren McGavin, Michael Pataki (como um dos ladrões, é claro!) e o eterno coadjuvante da série, George Kennedy, mais uma vez dando as caras como Joe Patroni, que era mecânico em "Aeroporto", vice-presidente de outra companhia aérea em "Aeroporto 75" e aqui aparece trabalhando numa terceira empresa!!!


Ok, é preciso dar um desconto para a premissa absurda, já que a situação representada no filme jamais poderia acontecer na vida real por dois motivos: primeiro, o impacto de uma "aterrissagem" no mar àquela velocidade arrebentaria o avião no meio; segundo, a aeronave não afundaria tão rápido como mostrado no filme, pois o interior pressurizado a manteria mais leve que a água durante tempo suficiente para providenciar o desembarque dos passageiros, mesmo com o buraco na fuselagem provocado pela colisão na plataforma de petróleo.

Mas e quem diabos espera realismo numa aventura tosqueira como essa? O que importa é que o filme funciona e, dos quatro episódios oficiais da série "Aeroporto", este é o que traz mais situações de tensão e perigo e menos dramalhão. Até porque, nos outros, o avião fica no ar e os personagens não têm muito o que fazer além de ficar sentadinhos, gritar e confiar nos pilotos (ou na aeromoça); aqui já há uma interação muito maior entre todos, e também mais momentos de suspense, principalmente quando a água começa lentamente a invadir o interior da aeronave.


Quando filmou AEROPORTO 77, o diretor Jameson já era praticamente um especialista em cinema-catástrofe, tendo dirigido várias produções televisivas com histórias do gênero: "Heat Wave!", sobre um casal tentando sobreviver durante uma implacável onda de calor que secou todas as fontes de água da sua cidadezinha; "The Elevator", sobre o drama de pessoas presas dentro de um elevador no topo de um arranha-céu (?!?); "Hurricane", uma história sobre caçadores de tornados filmada 20 anos antes de "Twister"; "Terror on the 40th Floor", que era uma cópia barata de "Inferno na Torre", e até "The Deadly Tower", baseado no episódio real do sniper Charles Whitman, aqui interpretado por... um jovem Kurt Russell!

Enfim, com tantos trabalhos pregressos nessa linha, Jameson já estava mais do que preparado para dirigir uma superprodução "catastrófica" como essa, e não faz feio. Pelo contrário: em comparação com a direção burocrática dos outros episódios, ele até que se sai bem demais, colocando seus personagens em constantes situações arriscadas, matando vários deles sem dó e até criando algumas cenas de roer as unhas.


Um dos pontos altos envolve Jack Lemmon e Christopher Lee enfrentando um arriscado mergulho, em que o Drácula acaba se dando mal (imagens acima). Sem nenhuma frescura, o próprio Lee fez as cenas em que seu cadáver afogado aparece flutuando! A meia hora final do filme também é ótima, e envolve a tentativa de resgate do avião submerso. Para isso, a Marinha norte-americana põe em prática um plano mirabolante, usando mergulhadores e balões cheios de gás.

Consta que a produção primou pelo realismo nesse aspecto, e os procedimentos mostrados estariam dentro dos padrões usados para resgates semelhantes (ou pelo menos assim confirma o letreiro no fim do filme). Isso provavelmente credenciou Jameson para dirigir o posterior "O Resgate do Titanic" (1980), sobre outra operação delicada de resgate cujo título já entrega (mas, apesar da ideia interessante, este outro filme é bem ruim).


AEROPORTO 77 teve um orçamento maior que o da segunda parte (cerca de 6 milhões de dólares) e repetiu o sucesso de bilheteria, embora arrecadando menos que as aventuras anteriores (em torno de 30 milhões nos cinemas norte-americanos). Também foi o segundo filme da série a chegar à entrega do Oscar, sendo indicado a duas estatuetas: Melhor Direção de Arte e Melhor Figurino (perdeu os dois prêmios para um tal de "Guerra nas Estrelas"...).

O sucesso de público comprovou que ainda havia potencial para histórias sobre aviões em perigo, e até surgiram mais algumas imitações feitas para a TV: "Ameaça no Supersônico" (1977), de David Lowell Rich, com Burgess Meredith, Peter Graves e um jovem Billy Cristal; "A Queda do Voo 401" (1978), de Barry Shear, com William Shatner e Adrienne Barbeau; e "O Fantasma do Voo 401" (1978), dirigido por Steven Hilliard Stern e com Ernest Borgnine e uma jovem Kim Basinger.


Embora subverta a situação básica dos outros filmes (o avião fica pouquíssimo tempo no ar, para o alívio dos que têm medo de voar), este terceiro filme mantém as principais características da franquia. Traz, por exemplo, a tradicional atriz veterana homenageada. Enquanto nos anteriores essa "honra" coube a Helen Hayes, Gloria Swanson e Mirna Loy, aqui a distinção foi aplicada a Olivia de Havilland (abaixo), que estreou como atriz em 1935 e, entre outros filmes, atuou no clássico "E o Vento Levou...".

Só que ela não foi a primeira opção para o papel: outra veterana, Joan Crawford, foi convidada mas pulou fora). Olivia já não trabalha no cinema desde 1988, mas, "até o fechamento desta edição" (dezembro/2013), ainda estava viva, aos 97 anos de idade! Antes de AEROPORTO 77, ela já tinha sido convidada para ser a "celebridade das antigas em perigo" em "Inferno da Torre" (1974), mas recusou. Acabou cumprindo essa função aqui e também no péssimo "O Enxame", de Irwin Allen, lançado em 1978.


Outra característica da série "Aeroporto" que se repete aqui são os astros que cospem no prato em que comeram, arrependendo-se de ter aparecido no filme e fazendo campanha contra ele. No original, essa responsabilidade ficou a cargo de Burt Lancaster; em AEROPORTO 77, tanto Jack Lemmon quanto Christopher Lee assumiram em entrevistas que acharam "um erro" fazer o filme. Lee inclusive declarou que só aceitou participar para ter a oportunidade de atuar ao lado de Lemmon, cujo trabalho admirava.

Finalmente, o roteiro também está inbuído de todo aquele melodrama e moralismo típicos da franquia. Os malvados são castigados pela tragédia, assim como a mulher adúltera, enquanto pouquíssimos dos personagens inocentes morrem, e muito menos a criança que passa a história toda moribunda e prestes a bater as botas - essa se salva, óbvio, porque "Deus é grande".


Mesmo que Lemmon tenha se arrependido de estrelar o filme, ele está muito bem como o piloto que protagoniza pelo menos duas grandes cenas de ação: a primeira quando precisa sair do avião submerso pela área de carga inundada para assinalar a localização da aeronave; a segunda durante o resgate dos passageiros, quando enfrenta a água que invade rapidamente o interior do avião. Tudo somado, ele é o mais heroíco e atuante dos pilotos da série "Aeroporto".

Já Patroni, o personagem pau-pra-toda-obra de George Kennedy, não faz muita coisa aqui, e nem participa diretamente da operação de resgate da aeronave. Ele parece estar de má vontade depois de ter ajudado a salvar o dia nos dois filmes anteriores. Mas tudo bem: Patroni voltaria em alto estilo no quarto e último filme da série, dessa vez promovido a piloto (?!?).


AEROPORTO 77 foi lançado numa época em que a franquia já era bastante popular na televisão. Assim, os produtores decidiram filmar mais uma hora de cenas adicionais (!!!) que foram depois inseridas numa versão mais longa para a TV. E bota longa nisso: a versão televisiva ficou com 190 minutos (1h10min a mais que na versão de cinema!), e foi exibida pela emissora NBC em dois dias (!!!), 18 e 20 de setembro de 1978, como se fosse uma minissérie.

A tal versão estendida virou uma espécie de raridade. Como nunca foi lançada comercialmente, ela até hoje circula em versões com imagem bem ruim que foram gravadas da TV na época da sua exibição. Os 70 minutos a mais tentam tornar os personagens-passageiros mais "humanos", dando-lhes flashbacks que explicam seu passado e suas motivações (a história de Kathleen Quinlan com o pianista cego é muito melhor desenvolvida nessa versão, por exemplo); também mostram algumas novas cenas de ação, incluindo a invasão dos bandidos a um laboratório de segurança máxima para roubar o gás utilizado para "apagar" os passageiros do avião posteriormente.


George Kennedy e seu Joe Patroni também aparecem mais na versão televisiva de AEROPORTO 77, que inclusive resgata o filho do personagem, Joe Jr., que havia aparecido moleque em "Aeroporto 75", mas aqui já está crescido. Nas cenas adicionais, Patroni precisa faltar à formatura do filho para tratar da terceira tragédia aérea da sua carreira.

Além dos flashbacks dos personagens, a edição mais longa inclui ainda mais cenas de cadáveres submersos das vítimas da tragédia, que estranhamente foram cortadas da versão para o cinema (geralmente acontecia o contrário). Para ver imagens dessas cenas adicionais, vale a pena conferir esse site especializado em "disaster-movies".


Para finalizar, duas curiosidades. Primeiro, o fato de AEROPORTO 77 ter virado uma atração no mínimo excêntrica do Universal Studios Tour: até a metade dos anos 80, os visitantes do estúdio podiam participar como "atores" de uma recriação das principais cenas do filme, em cenários bastante parecidos com os da própria produção! 

Toda a brincadeira era filmada e editada na hora, e depois os visitantes podiam levar para casa sua participação em AEROPORTO 77 em vídeo ou película 8mm. No YouTube é possível ver uma dessas recriações, devidamente capturada por alguém que visitou a atração na época.

A outra curiosidade é a oportunidade de ver toda a tecnologia do final dos anos 70 disponível no super-avião do milionário (abaixo), incluindo jogos de videogame (o clássico Pong da época pré-Atari, que aqui no Brasil foi jogado por quem teve o pré-histórico "Telejogo Philco"!) e até um rudimentar aparelho reprodutor de laser-disc, o Magnavox Magnavision VLP, usado para projetar um filme com um disco laser do tamanho de um bolachão em vinil (este era o avô do aparelho de DVD, mas na época não colou por causa do preço muito alto).


E se você acha que depois do drama de uma bomba a bordo, de uma aeromoça promovida a piloto e de um avião submerso no oceano os produtores de "Aeroporto" não teriam mais o que inventar, saiba que, poucos meses após a estreia de AEROPORTO 77, o produtor Jennings Lang já estava dando sinal verde para a produção do quarto e último filme da série, "Aeroporto 80 - O Concorde".

Mas digamos apenas que este não é um daqueles casos em que guardaram o melhor para o final: a última aventura da franquia é tão trash, mas tão trash, que faz com que as anteriores pareçam "Cidadão Kane"! Porque se AEROPORTO 77 é o melhor da série como filme de suspense e aventura, "Aeroporto 80" é definitivamente o mais divertido e mais involuntariamente cômico!


PS 1: Diversas cenas de AEROPORTO 77 foram "emprestadas" por Fred Olen Ray e editadas em seu filme "Resgate nas Profundezas" (2000), com Fred Williamson e Tim Thomerson. Na verdade, o que Fred fez foi reaproveitar todas as cenas do avião sobrevoando o oceano, caindo, afundando, enchendo de água e sendo resgatado. Ele só filmou os takes com seus atores para substituir os do filme original, e nada mais. Ah, a magia do cinema (e da edição)...

PS 2: Se fazer uma festa de ricaços dentro de um avião em pleno voo parece ideia de jerico, saiba que a franquia "Turbulência", aquela imitação barata da série "Aeroporto" produzida nos anos 90, foi ainda mais longe: em "Turbulência 3" (2001), de Jorge Montesi, um show de heavy metal é realizado em uma aeronave em movimento!!! Menos mal que o avião dessa vez não chega a cair no oceano, mas isso não poupa do mico gente boa e conhecida como Gabrielle Anwar, Rutger Hauer e Joe Mantegna!


Trailer de AEROPORTO 77



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Airport 77 (1977, EUA)
Direção: Jerry Jameson
Elenco: Jack Lemmon, Lee Grant, George Kennedy,
James Stewart, Joseph Cotten, Christopher Lee,
Olivia de Havilland e Robert Foxworth.

domingo, 8 de janeiro de 2012

AJUSTE DE CONTAS (1981)


Se os primeiros quatro filmes que traziam o karateka barbudão como protagonista variam do ruim ao bonzinho (com muita generosidade), não se pode reclamar dos quatro seguintes, que antecederam a bem-sucedida "fase Cannon Films" do astro. AJUSTE DE CONTAS (1981), "Fúria Silenciosa" (1982, sobre o qual falaremos num futuro próximo), "Golpe Mortal" (1982) e "McQuade, O Lobo Solitário" (1983) continuam uns filmaços até hoje, e dão de laço em muita produção recente.

Comecemos com AJUSTE DE CONTAS, título que o filme recebeu ao ser lançado em VHS pela Globo Vídeo, mas quem era moleque nos anos 1980 certamente vai lembrar de tê-lo visto no SBT com uma tradução literal do nome original, "Olho por Olho".


Como posteriormente muitos outros filmes ganharam o mesmo título "Olho por Olho" no Brasil (tipo "Steele Justice", com o Martin Kove, e aquele filme de vingança dirigido por John Schlesinger, com Sally Field e Kiefer Shuterland), é até bom usarmos o nome dos tempos da Globo Vídeo para diferenciar.

Na minha resenha de "Os Bons Se Vestem de Negro", eu citei uma frase dita por Chuck numa entrevista, confessando que em seus primeiros filmes tentava copiar o modelo de cinema de ação realizado por Clint Eastwood na época.


Pois depois de interpretar veteranos do Vietnã e karatekas nos seus quatro trabalhos anteriores, em AJUSTE DE CONTAS ele tem a sua primeira oportunidade de interpretar um policial durão e implacável à la Dirty Harry - um papel que ele levaria à perfeição num dos melhores filmes da sua carreira, "Código do Silêncio", de 1985.

Mas o mais curioso desse belo policial é o fato de vermos Chuck Norris enfrentando... Drácula?!? Exato: o grande vilão, acredite se quiser, é interpretado por Christopher Lee, que alguns anos antes também tinha dado dores de cabeça a James Bond em "007 Contra o Homem com a Pistola de Ouro".


Quem diria: o cara que foi Drácula, Scaramanga, Saruman, Conde Dooku e uma infinidade de outros vilões fodões também já tomou uns cascudos de Chuck Norris...

(Engraçado é que a trama tenta fazer mistério, revelando apenas no final que o personagem de Lee é o sujeito por trás de tudo. Até parece que ninguém desconfiava! Eu vi o filme pela primeira vez na TV, quando moleque, com minha mãe do lado. Só ao ver o nome do ator nos créditos iniciais, ela disse algo assim: "Christopher Lee? Esse cara fazia o Drácula, aposto que é ele o bandido!".)


Em AJUSTE DE CONTAS, Chucko interpreta Sean Kane, um policial da Narcóticos de San Francisco (sim, o astro voltou à cidade depois do patético "Massacre em San Francisco"!), que atua disfarçado para desbaratar uma quadrilha de traficantes. Dessa vez o ator raspou seu tradicional bigodão e atua de cara limpa, como nos tempos de "Comboio de Carga Pesada".

Durante uma missão arriscada, ele e o parceiro Dave (Terry Kiser, de "Um Morto Muito Louco") caem numa emboscada armada por um informante corrupto. Tiros voam para todos os lados, carros explodem, e o pobre parceiro morre horrivelmente, queimado vivo, sem que Sean possa fazer algo para salvá-lo.


Furioso ao descobrir que a justiça está de mãos amarradas, nosso herói surta, mata um suspeito após um "interrogatório" na base da pancada e toma a maior mijada do seu superior. Aí, entrega o distintivo (claro!) e sai numa vendeta pessoal contra os traficantes.

Vendeta esta que se torna ainda mais pessoal quando os mesmos sujeitos matam brutalmente uma outra amiga sua, a repórter Linda Chan (Rosalind Chao, de "O Grande Lutador"), que era esposa de Dave. A moça estava justamente preparando uma reportagem sobre a conexão entre os traficantes de San Francisco e as Tríades de Hong Kong e Bangkok.


Para fazer frente aos perigosos inimigos, que parecem estar por toda parte, Sean é obrigado a unir forças com o pai da finada Linda, um velhote especialista em artes marciais interpretado pelo lendário Mako (de "Conan, o Bárbaro", "Resposta Armada" e tantos outros filmes legais). Seu personagem, James Chan, funciona como um eficiente alívio cômico, sempre resmungando de todas as atitudes do herói.

Eventualmente, Sean também se envolverá com a bela Heather (Maggie Cooper, em seu único trabalho fora da TV), uma amiga da jornalista assassinada. Juntos, eles descobrirão que o responsável por tudo é o próprio patrão de Linda, o magnata da imprensa Morgan Canfield (Christopher Lee, quem mais?), que usa de sua posição e de sua influência para dominar o tráfico de entorpecentes na cidade.


AJUSTE DE CONTAS pode não trazer nada de tão novo na trama, principalmente em comparação aos filmes anteriores (e até posteriores) de Norris: ele mais uma vez interpreta um sujeito legal forçado a reagir com chutes giratórios quando os bandidos começam a matar seus conhecidos.

A diferença para seus trabalhos até então é que este funciona que é uma beleza, ao contrário dos quatro anteriores, que ou têm ação de menos ou roteiro ruim demais.


Por coincidência, esta é a primeira colaboração do astro com dois sujeitos que seriam responsáveis pelos melhores filmes da sua carreira. O primeiro é o roteirista James Bruner, que co-escreveu AJUSTE DE CONTAS ao lado de William Gray ("Projeto Filadélfia"). Este aqui foi o primeiro roteiro de Bruner, e depois ele escreveu outros cinco sucessos de Chuck (entre eles, "Braddock", "Invasão USA" e "Comando Delta"!).

O outro parceirão é o diretor Steve Carver, um eficiente cineasta saído da "Escola Roger Corman de Produção de Filmes Baratos". Para Corman, ele dirigiu filmes como "Big Bad Mama" (1974) e "Capone, o Gângster" (1975, com um jovem Sylvester Stallone no elenco). Com Chuck, ele fez depois "McQuade, O Lobo Solitário", outro dos grandes trabalhos da carreira do astro.


E como vários dos primeiros filmes de Norris, este também tem um elenco impressionante, cheio de caras conhecidas. Além de todos os já citados (Lee, Kiser, Mako), também aparecem Richard Roundtree (o Shaft original!) como o superior casca-grossa do herói; Matt Clark ("Candyman 2") como um policial corrupto, e o monstruoso Professor Toru Tanaka como, claro, um monstruoso capanga do vilão.

O falecido Tanaka inclusive rouba a cena toda vez que aparece, e se você ainda não ligou o nome à pessoa, pense no gigantesco Subzero, um dos lutadores que enfrenta Schwarzenegger no ótimo "O Sobrevivente".

Em AJUSTE DE CONTAS, Tanaka protagoniza pelo menos duas cenas antológicas: quando persegue Rosalind Chao numa estação de metrô destruindo tudo que aparece pela frente, inclusive um Fusca (!!!), e o duelo final, primeiro contra Mako, depois contra Norris. O violentíssimo confronto entre o herói e Tanaka, embora rápido, pode ser incluído tranquilamente entre os melhores momentos de toda a carreira de Chuck.


Por sua vez, Norris está muito bem como policial durão. Se nos seus filmes anteriores ainda faltava definir um estilo, e os realizadores sempre levavam sua persona muito a sério, aqui ele adota pela primeira vez aquele jeito fanfarrão que levaria pelo resto da sua carreira.

Ok, na primeira meia hora de AJUSTE DE CONTAS, Chuck ainda está copiando a fórmula Eastwood-Dirty Harry, interpretando um policial durão e implacável. A cena inicial, da emboscada num beco escuro durante uma chuva que não pára, é muito boa e poderia estar em qualquer filme do Dirty Harry. Sua furiosa retaliação contra os bandidos depois da morte do parceiro também.


Mas aí o filme tem um ponto de virada, a partir do encontro do herói com Mako, e o policial durão e mais realista se transforma numa espécie de herói absurdo de história em quadrinhos. Só para dar uma ideia: ele vive numa casa à beira-mar que é uma verdadeira fortaleza, acompanhado apenas de um cachorro com quem conversa como se fosse gente (!!!).

E ainda faz todo tipo de palhaçada, como colocar um travesseiro debaixo da cabeça de um bandido depois de nocauteá-lo, ou ameaçar quebrar uma caríssima antiguidade enquanto interroga seu proprietário! Norris continuaria investindo nesse tipo de personagem a partir daqui, atingindo o ápice do cartunesco com o herói Matt Hunter, de "Invasão USA".


O exagero e o inverossímil se estendem à trama. O roteiro de Bruner e Gray começa emulando os policiais sérios da década anterior (tipo as aventuras de Dirty Harry, que eu não parei de citar), mas vai ficando progressivamente mais absurdo à medida que o tempo passa.

Quando Norris vai encontrar Mako, por exemplo, bandidos pipocam de todos os lados e até um helicóptero aparece disparando rajadas de metralhadora. Na conclusão explosiva, a dupla de heróis invade a fortaleza dos vilões distribuindo golpes de karatê, sendo seguida por policiais da Swat, que colaboram na "limpeza" do local.


Os intermináveis tiroteios no final, com bandidos de terninho e gravata sendo chacinados a rajadas de metralhadora, lembram o que John Woo faria quase uma década depois em filmes como "Alvo Duplo".

Assim, de certa forma, AJUSTE DE CONTAS parece fazer uma ponte entre aqueles policiais mais contidos e realistas dos anos 1970 e as aventuras violentas e exageradas que virariam moda ao longo da década de 80, como "Comando para Matar" e seu massacre de centenas na cena final.


Infelizmente, o grande vilão Christopher Lee escapa de tomar um castigo mais violento no final: Sean apenas estrangula o bandido "um pouquinho" até a chegada da polícia, que o impede de ir além e leva o malvado para a cadeia. E ou Lee é um puta ator, ou Norris estava apertando o pescoço dele muito forte, pois parece que os olhos do velhote vão saltar das órbitas! Seria mítico ver o Drácula tomando um Roundhouse Kick de Chuck, mas é o que temos para hoje...

É uma pena que o SBT e a TV aberta em geral tenham deixado de exibir AJUSTE DE CONTAS (ou "Olho por Olho", como preferirem) há uns bons anos. Porque o lugar certo para essas aventuras canastronas de Chuck Norris é o Domingo Maior, ou a Sessão das Dez.

Hoje, filmes modernos bem inferiores ocuparam o espaço antes reservado ao astro barbudo, que durante anos reinou absoluto nas videolocadoras e sessões de "filmes para macho" das nossas emissoras.


Aliás, AJUSTE DE CONTAS também é uma ausência muito sentida no nosso mercado de DVD, já que a fitinha da Globo Vídeo virou fumaça há mais de uma década!

Lá fora existe uma edição em DVD lançada pela MGM, mas a qualidade de imagem é pavorosa e os caras ainda cortaram 40 segundos do filme, uma ceninha quase inocente em que Norris transa com Maggie Cooper no chuveiro e aparecem os peitinhos da moça (abaixo tem uma foto da cena como está no VHS). Não faço ideia do porquê do corte, mas talvez tenha sido pelo vergonhoso "diálogo de filme pornô" entre o casal:
- Como está a água, meu bem?
- Quente.
- Hmmmm, do jeito que eu gosto!



Se você é daqueles que só conhece Chuck Norris de fama, mas nunca preocupou-se em analisar profundamente a filmografia do ator, este aqui é um bom ponto de partida. Até porque é a aventura que define o estilo caricatural e "super-macho" que ele adotaria a partir de então.

De lambuja, também é uma bela mistura entre trama policial e filme de ação oitentista, com uma contagem absurda de cadáveres e todos aqueles exageros típicos do período.

E convenhamos: não é todo dia MESMO que você vê o Drácula apanhando do Chuck Norris...

Trailer de AJUSTE DE CONTAS



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An Eye for an Eye (1981, EUA)
Direção: Steve Carver
Elenco: Chuck Norris, Christopher Lee, Maggie Cooper,
Mako, Matt Clark, Richard Roundtree, Rosalind Chao,
Terry Kiser e Professor Toru Tanaka.