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terça-feira, 2 de abril de 2013

UM HOMEM CHAMADO DJANGO (1971)


Um verdadeiro abismo de qualidade separa a primeira aventura não-oficial de Django dirigida por Edoardo Mulargia (o péssimo "Django Não Espera... Mata", 1967) de sua segunda incursão por essas veredas, UM HOMEM CHAMADO DJANGO. Apenas quatro anos se passaram, mas é como se as duas obras fossem dirigidas por pessoas completamente diferentes; ou isso, ou Mulargia aprendeu muito sobre técnica cinematográfica e narrativa no período (aliás, neste curto espaço de tempo entre um Django e outro, o sujeito dirigiu mais seis obras diferentes!).

Não estou dizendo que UM HOMEM CHAMADO DJANGO seja um filmaço, muito menos que figura entre os melhores "sotto-Djangos" daquele áureo período do western spaghetti. O que mais salta aos olhos ao final do filme é a notável evolução no trabalho do diretor Mulargia em comparação a "Django Não Espera... Mata", já que esta sua segunda aventura do personagem é muito mais movimentada, violenta e principalmente DIVERTIDA do que a anterior.


Se lá em 1967 Mulargia havia desperdiçado um adequado Ivan Rassimov numa trama soporífera e cheia de reviravoltas, personagens e complicações desnecessárias, dessa vez ele se atém ao básico: o roteiro de Nino Stresa requenta aquela velha e manjada trama de vingança, inclusive retomando as origens do personagem no "Django" de Sergio Corbucci: aqui também o herói está em busca dos assassinos da sua esposa.

A diferença é que enquanto no filme original havia um único assassino (o Major Jackson), aqui são quatro os homens responsáveis pela morte da pobre mulher - apenas morte, mas sem estupro, ao contrário do que informam algumas fontes desavisadas. Esta é a cena que abre o filme, e há um mistério envolvendo a atriz não-creditada que aparece rapidamente interpretando a esposa do herói (há quem jure que trata-se de Ida Galli, famosa mocinha dos westerns de Giuliano Gemma, mas tudo não passa de especulação).


Como Django estava fora de casa no momento do crime (na guerra?), ele agora precisa resgatar um ladrão mexicano de quinta categoria, Carranza (Glauco Onorato), o único que conhece a identidade dos assassinos. Juntos, eles partem em busca da vingança, este tema tão comum no universo do western spaghetti.

É claro que não será nada fácil: aqueles bandidos pé-de-chinelo e assassinos de esposas de um ano atrás agora viraram militares corruptos, poderosos traficantes de armas ou grandes reis do crime como Jeff (Chris Avram, o arquiteto do clássico "Banho de Sangue", de Mario Bava), que controla uma cidade inteira com sua quadrilha. E embora Django busque vingança contra apenas quatro homens, o filme ironicamente termina com uma contagem de corpos estratosférica!


UM HOMEM CHAMADO DJANGO não é apenas o segundo "sotto-Django" do diretor Mulargia (novamente assinando com seu tradicional pseudônimo americanizado, "Edward G. Muller"), mas também a segunda vez que o astro mezzo italiano, mezzo brasileiro Anthony Steffen interpreta o anti-herói do título, depois do superior "Django, O Bastardo" (1969), de Sergio Garrone.

Pouca gente se dá conta, mas, depois de Franco Nero, Steffen foi o ator que mais ficou marcado como Django, mesmo que um não-oficial. Além destes dois filmes em que ele encarnou personagens que efetivamente são chamados de Django em algum momento da narrativa, Steffen também estrelou vários outros westerns cujos títulos foram posteriormente alterados (principalmente na Alemanha) para se transformar em aventuras de Django, mesmo que os personagens principais tivessem outros nomes. Logo, se contabilizarmos também esses "falsos Djangos", o astro com sangue brasileiro interpretou o famoso pistoleiro em nada mais nada menos de sete filmes! Nada mau...


Se em "Django, O Bastardo" o velho Antonio De Teffé (nome de batismo de Steffen) compôs um personagem calado, misterioso e fantasmagórico, aqui em UM HOMEM CHAMADO DJANGO ele mostra que também pode ser versátil (apesar de notório canastrão), interpretando seu segundo Django de uma forma completamente diferente, dessa vez fanfarrão e engraçadinho, inclusive usando divertidos artifícios para despachar seus desafetos.

Perceba que o filme de Mulargia é de 1971, época em que o western spaghetti tentava se reinventar apelando para o cômico, o burlesco e o absurdo. No ano anterior, "Trinity é o Meu Nome", de Enzo Barboni, foi um grande sucesso de bilheteria apresentando as palhaçadas de Terence Hill e Bud Spencer no Velho Oeste (eles já tinham feito outros filmes antes, mas sem a mesma repercussão). E diretores como Giuliano Carnimeo passaram a explorar esta fórmula até cansar, criando personagens cada vez mais cartunescos e absurdos, tipo o Aleluia vivido por George Hilton em dois filmes.


Esse contexto da época talvez explique as fanfarronices e gracinhas de UM HOMEM CHAMADO DJANGO, que nunca se decide entre ser uma história séria sobre busca de vingança ou uma comédia escrachada.

Algumas cenas até parecem ter saído de um desenho animado, como aquela em que um sujeito joga uma banana de dinamite em Django. Calmamente, nosso herói pega a bomba e usa a chama do pavio para acender seu cigarro. Depois, quando ela está para explodir, ele atira de volta contra seu agressor, explodindo-o, mas não em pedacinhos: no momento seguinte vemos a vítima inteirinha, apenas meio atordoada, soltando fumaça e com o rosto e as roupas chamuscadas pela explosão! Só faltava escrever "Indústrias Acme" na banana de dinamite para ficar mais cartunesco...


Django também usa uma série de truques sujos e cômicos dignos de Trinity, Aleluia, Espírito Santo ou Trissete (os principais pistoleiros engraçadinhos do western spaghetti), e bem diferentes de esconder uma metralhadora num caixão, como fez no original. Para salvar Carranza da forca, por exemplo, ele se veste de monge e pede para um dos seus inimigos segurar uma vela - na verdade, uma banana de dinamite!

Mais além, o herói se esconde atrás de um cadáver para atirar nos companheiros do finado (colocando um dos seus braços no lugar do braço do desencarnado!), e até usa um braço falso para fingir que está desarmado, quando na verdade esconde o verdadeiro, com a arma em punho, por baixo do casaco! Coincidência ou não, Johnny Depp usa o mesmo artifício em "Era Uma Vez no México", de Robert Rodriguez, feito mais de 30 anos depois.


Steffen não é o único nome conhecido para os fãs de western spaghetti. Seu parceiro em cena, Glauco Onorato, foi um grande dublador nas versões em italiano de filmes gravados em inglês, e bastante conhecido como a "voz italiana" do grandalhão Bud Spencer nas primeiras obras do ator.

Também aparecem Benito Stefanelli, figurante em quase todos os westerns mais importantes do período ("Por um Punhado de Dólares", "O Dólar Furado", "Três Homens em Conflito", "Era Uma Vez no Oeste", "Quando Explode a Vingança"...), Riccardo Pizzuti (um habitué nas aventuras de Terence Hill e Bud Spencer) e a linda Simonetta Vitelli, filha do diretor Demofilo Fidani, novamente usando seu pseudônimo americanizado "Simone Blondel". Momento Nelson Rubens: consta que Simonetta se apaixonou por Steffen em meio às filmagens, mas o galã pulou fora porque ela era muito jovem (uma famigerada "chave de cadeia").


Como já acontecera com várias outras imitações anteriores de "Django", esta também reaproveita mais elementos da "Trilogia do Dólar", de Sergio Leone, do que do filme original de Corbucci. Por exemplo, o herói leva uma caixinha de música com a foto da esposa assassinada, que lembra muito o relógio com a foto da irmã morto de Lee Van Cleef em "Por uns Dólares a Mais". E Django salva Carranza de ser enforcado no último segundo, atirando na corda estendida, como Clint Eastwood fez com Eli Wallach em "Três Homens em Conflito".

O próprio relacionamento de amor e ódio entre Django e Carranza lembra uma versão podreira dos personagens de Eastwood e Wallach naquele clássico de Leone, e os créditos iniciais são com vinhetas coloridas à la Leone, embora aqui o diretor use imagens do filme em negativo, ao invés de desenhos, como nas aberturas da "Trilogia do Dólar".


O engraçado é que tanto o diretor Mulargia quanto o roteirista Stresa parecem ter um mínimo de conhecimento do filme de Corbucci, já que volta-e-meia também o citam: Steffen entra na cidade a pé e carregando sua sela numa longa cena inicial que lembra Franco Nero caminhando e arrastando seu caixão na abertura de "Django" (ou seja, em nenhum dos filmes o herói conta sequer com um cavalo), e um dos assassinos procurados pelo herói também é major, como o Major Jackson do original.

Mas a inspiração em Leone é tão mais evidente que, ao gravar a versão em inglês dos diálogos de UM HOMEM CHAMADO DJANGO, os dubladores não resistiram e fizeram uma brincadeira de cinéfilo: na já citada cena em que Django joga a dinamite num inimigo, o herói depois comenta "Este truque vale um punhado de dólares", em diálogo inexistente na versão original em italiano!


Mas, apesar das piadinhas e absurdos, não se engane: em número total de mortos, esse é um dos títulos mais violentos da "série"! Franco Nero matava 95 inimigos em "Django", que tinha uma contagem de cadáveres geral entre 138 e 163 vítimas (as fontes variam e eu que não sou louco para contar).

Em comparação com Nero, nosso representante "quase brasileiro" no universo do personagem faz bonito: entre os mais de 90 exterminados em UM HOMEM CHAMADO DJANGO, significativos 57 desencarnam graças ao implacável Django - exato, aquele que só queria se vingar de QUATRO HOMENS! Não perca as contas: ele matou "apenas" 15 vezes isso! Menos mal que Mulargia nos relembra da verdadeira missão do protagonista ao fazê-lo abrir a caixinha de música da esposa diante dos cadáveres dos seus assassinos...


O roteiro de Stresa tenta uma reviravolta bem batida no ato final, quando descobrimos que Carranza na verdade era o quarto homem entre os assassinos da mulher de Django, obrigando o herói a duelar contra seu próprio companheiro. Na verdade não é nenhuma surpresa, pois há evidências nada discretas disso ao longo do filme (como quando Carranza mata um dos seus ex-cúmplices antes que ele possa revelar toda a verdade a Django).

Felizmente, o conflito é resolvido de maneira eficiente e sem frescura: (SPOILER) sem sequer dar uma chance para que o ex-parceiro se defenda, Django dispara quatro tiros contra ele após pronunciar um melancólico "Adios, amigo", esquecendo que ambos passaram por diversas aventuras juntos ao longo do filme! A cena é bem legal, usando freeze-frames do bandido se contorcendo a cada disparo. (FIM DO SPOILER)


Mas não se engane: Mulargia não é um Leone, nem sequer um Corbucci, e UM HOMEM CHAMADO DJANGO sofre, em diversos momentos, com as bobagens típicas do diretor. Além da indefinição entre ser comédia ou filme sério, há problemas técnicos graves - embora nada tão absurdo quanto a casa sem telhado do anterior "Django Não Espera... Mata", lembra?

Repare, por exemplo, no bonecão vagabundo que se estatela no chão, e que deveria ser uma pessoa (foto abaixo). Ou na cena em que Carranza amarra diversas bananas de dinamite numa roda de carruagem e põe a dita cuja para girar, mas ela simplesmente explode a alguns metros sem atingir nada de importante ou matar nenhum inimigo!


E mesmo que não tenha todas aquelas incompreensíveis tramas secundárias do anterior "Django Não Espera... Mata", a narrativa acaba perdendo tempo com personagens e situações completamente desnecessárias, como aquela envolvendo o dono do saloon e sua esposa infiel (interpretada pela brasileira Esmeralda Barros, em pequena e apagada participação, depois de ter sido uma vilão com bastante tempo em cena no anterior "Django Contra 4 Irmãos").

Felizmente, essas bobagens não comprometem a diversão, já que Mulargia dirige o filme com o pé no acelerador, saltando rapidamente de uma cena de ação para outra, e colocando até um velho calhambeque numa cena para fazer o contraste entre o "Velho Oeste" e o "Novo Oeste" (como Sam Peckinpah já havia feito, de forma bem mais eficiente, no clássico "Meu Ódio Será Sua Herança").


Agora, uma coisa que eu até hoje não consigo entender - e nenhum site ou fórum de discussão sobre western spaghetti se preocupou em explicar - é o título original do filme, "W Django!". O que diabos significa esse "W"? Será que ficaram sem inspiração para títulos genéricos e colocaram simplesmente uma letra qualquer para diferenciar do "Django" de Corbucci? Por que não "A Vingança de Django"?

Em outros países, como o Brasil, a obra foi sabiamente rebatizada como "A Man Called Django". Mas, para aumentar a confusão, algumas distribuidoras novamente o rebatizaram como "Viva Django!", ignorando que por esse título já era conhecido o anterior "Preparati la Bara", de Ferdinando Baldi (estrelado por Terence Hill). Por isso, é muito fácil baixar um filme e descobrir que na verdade é o outro!


É curioso constatar que UM HOMEM CHAMADO DJANGO é o último "sotto-Django" da chamada Era de Ouro do western spaghetti. Tudo bem, Demofilo Fidani lançou "Uma Balada para Django" no ano seguinte, mas esta é basicamente uma colagem de filmes antigos; e a única sequência oficial do clássico de Corbucci, "Django, A Volta do Vingador", foi feita nos anos 80, quando o sub-gênero já estava morto e enterrado.

Ao longo dos anos 70, a injeção de humor e exagero nos westerns da Terra da Bota acabou espantando uma boa parte do público que gostava daqueles filmes mais sérios e violentos. Em suma: não havia mais espaço para Djangos, oficiais ou imitadores. A partir de 1971, piadistas como Trinity e Aleluia tomaram conta do western spaghetti, mas felizmente os produtores tiveram a decência de aposentar Django antes de também transformá-lo em herói engraçadinho.


Trailer de UM HOMEM CHAMADO DJANGO



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W Django! / A Man Called Django (1971, Itália)
Direção: Edoardo Mulargia (aka Edward G. Muller)
Elenco: Anthony Steffen, Glauco Onorato, Stelio Candelli,
Chris Avram, Esmeralda Barros, Benito Stefanelli, Riccardo
Pizzuti, Simonetta Vitelli e Furio Meniconi.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

DJANGO, O BASTARDO (1969)


(Este filme foi o único "Sotto-Django" que já havia sido resenhado aqui no FILMES PARA DOIDOS antes da MARATONA VIVA DJANGO!, no longínquo 16 de fevereiro de 2009! Para os novos leitores, que não acompanham o blog desde o começo, e para não deixar incompleta esta ambiciosa Maratona, resolvi republicar a resenha, agora em versão revisada e ampliada.)

"Eu vou te matar, Murdok. Lentamente... Vou fazer você morrer mil mortes, como os seus homens", ameaça Django, no clímax de DJANGO, O BASTARDO, uma daquelas ótimas surpresas para quem acha que já viu tudo em matéria de western spaghetti. Sem nenhuma relação com o "Django" de Sergio Corbucci além do nome do personagem, o filme difere de outras aventuras não-oficias do personagem porque foge do lugar-comum ao apresentar uma curiosa mistura de faroeste e horror, dando a Django uma certa aura sobrenatural.

Produzido em 1969 (apenas três anos depois do original), DJANGO, O BASTARDO tem outro destaque além do toque fantasmagórico: a presença, no papel principal, de Anthony Steffen, pseudônimo "americanizado" do italiano filho de brasileiros Antonio Luiz de Teffé. (O quê? Você ainda não leu o livro que Daniel Camargo, Fábio Vellozo e Rodrigo Pereira escreveram sobre o ator? Então saia JÁ da internet e vá em busca deste livro obrigatório!!!).


Já a direção é de Sergio Garrone, que dirigiu vários westerns, mas hoje é mais conhecido no "underground" pelas suas lamentáveis contribuições ao ciclo "nazisploitation" italiano, como "SS Experiment Camp" (1976) e "SS Camp 5: Women's Hell" (1977). Garrone já havia dirigido dois faroestes cujo personagem principal foi rebatizado como "Django" em alguns países ("Atirar para Viver", de 1968, e "Uma Longa Fila de Cruzes", em 1969, este último também estrelado por Steffen).

DJANGO, O BASTARDO é a primeira produção de Garrone realmente pensada e produzida para ser uma aventura não-oficial de Django (e não algum outro western qualquer que ganhou novo título com o nome do personagem). O roteiro foi escrito em parceria entre o diretor e seu astro, marcando também a estreia de Steffen como co-roteirista (função que ele exerceria em outras três produções). Em entrevistas, Garrone diria que este era o seu filme preferido entre os diversos que dirigiu; Steffen também tinha um carinho muito grande por ele.


Nossa aventura começa com vários takes mostrando um personagem misterioso caminhando, mas sempre sem mostrar o rosto do sujeito. Sua caminhada, que parece durar uma eternidade, acaba na frente de uma bela cabana, onde o misterioso homem finca no chão uma cruz com o nome "Sam Hawkins" e a data daquele dia. Os capangas de Sam ficam apavorados com aquela aparição e saem da cabana para confrontar o desconhecido.

Neste momento, a câmera acompanha o homem enquanto ele levanta o rosto, revelando finalmente os olhos frios e o rosto desprovido de emoção. Trata-se de Django, nosso protagonista, e antes que os seus antagonistas possam sequer trocar algumas palavras, ele atira rapidamente, eliminando todos em cena; Hawkins, claro, cai perto da cruz de madeira com seu nome.


Corta para uma luxuosa mansão onde encontramos os dois outros personagens centrais da trama: o banqueiro Ross Howard (Jean Louis) e o vilão, um poderoso fazendeiro chamado Rod Murdok (Paolo Gozlino), que vive ali com o irmão psicótico, Luke (Luciano Rossi, vilão habitual dos westerns e policiais da época, aqui creditado como "Lu Kamonte" e numa perfeita interpretação de desequilibrado, à la Klaus Kinski!!!).

Quando conhecemos os malvadões, eles estão assistindo a um bizarro jogo onde dois homens atiram, um para o outro, uma banana de dinamite com o pavio em chamas - numa ideia bastante inspirada, que rende uma cena tensa que Garrone estica até deixar o espectador na maior agonia, esperando pela iminente explosão da bomba!


Descobrimos que Murdok e Ross têm negócios fraudulentos em comum, e também parecem ligados por um segredo do passado. Logo, chega à cidade o misterioso Django, que vai procurar um marceneiro e lhe pede para construir uma cruz de madeira. Segue-se um diálogo impagável:

- É apenas um dólar. Que nome e data quer que eu grave?
- O nome é Ross Howard. E a data é de hoje.
- Ross Howard? Então pode guardar o seu dólar! É de graça!



Naquela noite, Django visita Howard em sua casa. O banqueiro é atraído pelo pistoleiro até um velho cemitério. Durante o trajeto, Howard só sabe repetir: "Eu não tive culpa, Django! Eu não tive culpa!". Mas é inútil. Levado até uma sepultura aberta, onde está a cruz de madeira com seu nome e a data daquele dia, Howard é impiedosamente baleado por Django. Ah, antes que você pense que estou indo longe demais na descrição da trama, isso tudo acontece nos primeiros 20 minutos do filme!

É quando o diretor freia o ritmo. Ficamos sabendo mais sobre os irmãos Murdok - Rod e Luke. Assustado com a possibilidade de ser a próxima vítima, já que uma cruz de madeira com seu nome apareceu do lado de fora do rancho, Rod contrata dezenas de pistoleiros mercenários para protegerem sua pele. Eles inclusive expulsam todos os moradores da cidadezinha para que possam ter controle total da situação (uma desculpa para justificar a falta de dinheiro para contratar figurantes, claro...).

Só que, numa noite escura, o fantasmagórico Django aparecerá para acertar as contas com Murdok e todo o seu exército de mercenários, ajudado/atrapalhado pela própria esposa do vilão, a ambiciosa Alida (Rada Rassimov, irmã de outro Django não-oficial, Ivan Rassimov, e que já havia aparecido em "Django Não Espera... Mata")


O grande acerto de DJANGO, O BASTARDO é apresentar o personagem-título como um carrasco misterioso e impiedoso, e circulando na tênue linha entre uma ameaça humana e real e uma invencível aparição sobrenatural. Por meio de um flashback, descobrimos que o herói era um soldado durante a Guerra Civil - e, ironicamente, um soldado confederado, enquanto o Django de Corbucci lutava pela União! Certo dia, todo o seu batalhão foi traído pelos seus superiores, Hawkins, Howard e Murdok, e exterminados sem piedade (incluindo outro ator com sangue brasileiro, o paulista Celso Faria, figurinha carimbada nos "Sotto-Djangos").

Vemos, ainda no flashback, Django caindo após ser alvejado pelas costas. Mas terá morrido e virado um fantasma vingador, ou sobrevivido ao atentado para dar o troco? Boa pergunta. Até os 15 minutos finais, o espectador não tem nenhuma dúvida de que Django é um fantasma vindo do passado para vingar-se dos homens que o mataram. Mas aí o "fantasma" é ferido e sangra no confronto final com seus inimigos, desmistificando aquela aura de assombração que o acompanhara até então. Real ou sobrenatural? No livro "Dizionario del Western All'Italiana", de Marco Giusti, o diretor Garrone não dá nenhuma explicação conclusiva: "Ao final você não sabe se Django é real ou não, se é um sonho ou um fantasma", disse.


Para reforçar o "toque sobrenatural" da trama, Garrone usa diferentes artifícios cênicos, alguns bem simples, mas ainda eficientes. Por exemplo: poucas vezes, ao longo do filme, vemos o rosto de Django, que aparece quase sempre envolto pela escuridão. Em algumas cenas, apenas um pequeno facho de luz ilumina seus olhos! Tem também um inspirado momento em que um oponente de Django é "engolido" pela enorme sombra do herói projetada em uma parede. Por essas e outras, entre todas as obras de Garrone que vi, esta é a mais e bem filmada e visualmente criativa.

Apesar de ter um ritmo bastante irregular, DJANGO, O BASTARDO é um excelente bangue-bangue, que tenta - e consegue - escapar das armadilhas e clichês típicos do gênero. Embora os tiroteios não sejam tão inspirados, a forma como Django surge e elimina seus oponentes rende alguns bons momentos. Não raras vezes ele usa bonecos feitos com suas roupas para enganar os adversários e pegá-los pelas costas. E há ainda alguns toques bastante macabros, como três pistoleiros mortos pelo herói que voltam à cidade levados por seus cavalos, crucificados sobre as selas!


O grande ponto fraco do filme é a inexistência de um duelo final mais criativo entre Django e o grande vilão, Murdok, pois Garrone se limita ao batido e pouco emocionante "mano a mano" de quem saca mais rápido. É uma pena, porque em vários momentos constatamos que Murdok é um grande espadachim, e por um momento imaginei que ele fosse usar suas habilidades no manejo da espada contra o herói - coisa que nunca acontece.

Para terminar, vale lembrar que este é um raro caso de produção italiana "copiada" anos depois numa grande produção norte-americana, e não o contrário. Acontece que quatro anos depois, em 1973, Clint Eastwood dirigiu e estrelou "O Estranho Sem Nome", um faroeste com tom "sobrenatural" bastante parecido com o de DJANGO, O BASTARDO, e cujo roteiro (assinado por Ernest Tidyman) traz Eastwood como um xerife que supostamente volta da morte para se vingar dos seus algozes.


Graças ao sucesso do filme com Eastwood, o produtor norte-americano Herman Cohen comprou os direitos de exibição da obra de Garrone e remontou-a para sua estreia nos cinemas dos Estados Unidos, dando-lhe um título, "The Stranger's Gundown". A única diferença perceptível é que a cena em que os soldados confederados são exterminados foi jogada lá para o meio do filme, como flashback, enquanto na versão original italiana o massacre acontecia logo no começo, antes mesmo dos créditos iniciais (esta resenha foi baseada na montagem norte-americana).

Considerando que as aventuras não-oficiais baseadas no clássico de Sergio Corbucci raramente fugiam do lugar-comum, DJANGO, O BASTARDO foi um sopro de criatividade muito bem-vindo no universo dos "Sub-Djangos". Não só é um dos grandes trabalhos do diretor Garrone, como um dos melhores filmes com o personagem. Steffen voltaria a ele em "Um Homem Chamado Django" (1971), de Edoardo Mulargia, mas dessa vez sem nenhum toque sobrenatural.


E embora Garrone não tenha feito outro filme com um herói de nome Django, pelo menos mais um filme dele foi rebatizado para parecer aventura não-oficial do personagem: a co-produção Itália-Espanha "Tequila" (1971), que, mesmo com um herói chamado Johnny), foi distribuída na Itália, França e Estados Unidos com o enganoso título "Mate, Django... Mate Primeiro!".

PS: Este é um dos primeiros filmes do técnico em efeitos especiais Paolo Ricci, que depois comandaria as barbaridades e sangrentas mutilações de filmes como "A Montanha dos Canibais" e "A Ilha dos Homens-Peixe", de Sergio Martino, e "Paganini Horror", de Luigi Cozzi.


Cena inicial de DJANGO, O BASTARDO



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Django, Il Bastardo (1969, Itália)
Direção: Sergio Garrone
Elenco: Anthony Steffen, Rada Rassimov, Luciano Rossi, 

Paolo Gozlino, Furio Meniconi, Celso Faria, Teodoro 
Corrà, Jean Louis e Emy Rossi Scotti.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA (1983)


Um casal de lésbicas se chupando durante um banho de cachoeira. Uma bela garota retalhada a navalhadas no chuveiro. Anthony Steffen comendo Rossana Ghessa e logo depois Fátima Leite comendo Rossana Ghessa! Será que sou só eu tenho saudade exatamente DESTE tipo de cinema nacional que não se faz mais? Sexo, violência explícita, lesbianismo e tanta mulher pelada que o cara quase enjoa de ver peitos, bundas e pererecas (ênfase beeeeeem grande no "quase"); assim é MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA, um daquele raros filmes de suspense estilo "whodunit" (quem é o assassino?) feitos no Brasil.

A bem da verdade, esta produção escrita e dirigida por Adnor Pitanga é quase um giallo - se o assassino usasse luvas negras e os atores fossem dublados em italiano, o filme poderia muito bem ser lançado como um legítimo giallo made in Italy que ninguém iria perceber!


Ajuda, para criar este elo com o cinema de mistério italiano, a rara presença do galã Steffen numa produção brasileira. "Anthony Steffen" é o pseudônimo americanizado de Antonio de Teffé, filho de brasileiros criado na Itália, e que se transformou num astro do western spaghetti europeu - entre outros filmes, estrelou "Django, O Bastardo", de Sergio Garrone. O ator também pôde ser visto em alguns filmes do ciclo giallo, como "The Crimes of the Black Cat" e "The Night Evelyn Came Out of the Grave".

MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA é único filme 100% brasileiro que Steffen estrelou. O IMDB informa que o ator também estaria no brasileiríssimo "Mulheres Liberadas", também dirigido por Adnor Pitanga, mas o especialista na carreira do astro Rodrigo Pereira garantiu que a informação é equivocada. Assim, com uma única produção realmente brasileira no seu currículo, Anthony Steffen morreu vitimado por câncer em 2004, quando morava no Brasil e vivia praticamente esquecido.


Consta no obrigatório livro sobre a carreira de Anthony Steffen, escrito por Daniel Camargo, Fábio Vellozo, Rodrigo Pereira, que o ator não gostava destas suas produções brasileiras, nem fazia muita questão de falar sobre elas, o que é estranho, pois este suspense pelo menos é muito bem realizado e produzido, ao contrário de algumas tralhas que ele fez com os italianos. No mesmo livro, consta que Steffen brigou o tempo todo com a estrela e produtora Rossana Ghessa.

Dublado, Steffen interpreta Rodolfo, um rico fazendeiro do interior do Rio de Janeiro que vive obcecado com a idéia da velhice e da proximidade da morte. Ele namora Marília (Rossana Ghessa, de "Fêmeas em Fuga", que na época era um MULHERÃO, em maiúsculas mesmo!), uma professora que deixou os tumultos da cidade grande para viver no interior, onde também pretende esquecer o fim da sua relação lésbica com a amiga Renata (Fátima Leite, de "Eu Matei Lúcio Flávio").


Sem saber, Marília despertou a paixão de uma aluna da sua turma, Leila (Leila Correia, em seu único filme), que, apesar de namorar o capataz da fazenda de Rodolfo, Lauro (Rinaldo Gines, de "Bye Bye Brasil"), tem dúvidas sobre a própria sexualidade.

Certo dia, voltando para casa depois da aula, Leila corta caminho pelo bosque e encontra o acampamento de duas amigas lésbicas, Lucinha (Helena Andrea) e Rose (Ismênia Kreis). Observa enquanto ambas, após o tradicional banho de cachoeira peladas, transam animadamente. Excitada, Leila vai para um ponto mais isolado do bosque, onde se despe e se masturba pensando na cena.


Paralelamente, chega à cidade a ex-amante de Marília, Renata, agora casada com Hartur (o gaúcho Marco Wainberg, de "A Pantera Nua"), que é cego. O retorno provoca o caos no pequeno universo rural, deixando Rodolfo enciumado. Logo, o corpo nu de Leila é encontrado no bosque, coberto de ferimentos de facão. O principal suspeito é o namorado Lauro, mas a professora começa a suspeitar que Renata está tentando reatar o romance entre elas eliminando todos os obstáculos pela frente.

Novos crimes se sucedem, sempre violentos. Quem será o assassino? A enciumada Renata? O possessivo Rodolfo? Lauro, que se diverte mutilando as galinhas da fazenda? O casal de lésbicas acampado no bosque? Ou Hartur, que na verdade pode nem ser cego? A identidade só será revelada no final, mas não será uma grande surpresa para quem já conhece as tradicionais armadilhas do gênero.


MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA certamente não pode ser acusado de propaganda enganosa, já que são 90 minutos com exatamente isso que o título anuncia: muito sexo (prazer) e algumas mortes e sangueira explícita (agonia).

Eu acho até que mudaria o título para "MUITOS Momentos de Prazer e ALGUNS de Agonia": temos duas longas e calientes cenas de sexo "normal" (entre Steffen e Rossana e entre Rinaldo e Ismênia), duas longas e calientes cenas de sexo lésbico (entre Rossana e Fátima e entre Helena e Ismênia), e até duas cenas de masturbação feminina quase explícita (protagonizadas pela gatinha Leila).

Isso sem contar o fato de a câmera de Adnor Pitanga dar closes quase ginecológicos nas pererecas e não poupar detalhes quando filma as relações sexuais, com simulações bem realistas de sexo oral (tanto hetero quanto lésbico), deixando o filme às raias do pornô.


Mas a produção é requintada e não cai nessas armadilhas de muitas produções brasileiras do período. As cenas de sexo são filmadas com muito bom gosto, de maneira que soam mais eróticas, quase poéticas, do que vulgares ou pornográficas, como podiam ficar nas mãos de um diretor "pau pra toda obra" como Ody Fraga ou Fauzi Mansur.

A cena em que Renata seduz e transa com a ex-namorada Marília em frente a Hartur, o marido cego, é de longe uma das mais bonitas - e cruéis, obviamente - cenas do filme, e rodada num nível de realismo que fiquei me perguntando se as duas atrizes não estavam REALMENTE se comendo!!!


E quem tem saudade dos tempos em que havia sexo e mulher pelada no cinema nacional não vai poder reclamar desse filme do Pitanga, já que todo o elenco passa a maior parte do tempo SEM a roupa. Isso não só nas cenas de sexo, mas também nos incontáveis banhos de rio e cachoeira (por que será que todo diretor de cinema acha que no interior o pessoal toma banho de rio pelado???), e até nos momentos em que as mocinhas precisam fugir do assassino correndo pelo meio do mato, e sempre acabam com a blusa rasgada e os peitinhos de fora! Sinceramente, é tanta mulher pelada em 1h30min que quase cansa (ênfase beeeeeem grande no "quase").

Quanto aos "momentos de agonia", estes também são razoavelmente bem executados, com efeitos simples e cortes rápidos, sem investir muito na maquiagem nas cenas de morte. Até que o filme tem bastante sangue, com a já citada morte a navalhadas lembrando ao mesmo tempo "Psicose", de Hitchcock, e "Vestida para Matar", do Brian DePalma. O destino final do(a) assassino(a) é bastante violento, e há inclusive duas cenas de mutilação (real, é claro) de galinhas que deverão provocar arrepios em quem não mora no interior e não vê isso normalmente.


Sabe aquele preconceito bem comum do espectador brasileiro, de dizer que o cinema nacional pré-Retomada era uma porcaria, tecnicamente inclusive? Pois MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA é um belo argumento para calar a boca desses ignorantes: tudo no filme é de ótimo nível, desde a forma como são filmadas as cenas de sexo até a fotografia de Ruy Santos, passando pela bela trilha sonora (composta por Antônio Krisna e interpreta pela própria Rossana Ghessa) e pelo som, que é alto e claro - você entende perfeitamente TODOS os diálogos, algo que não era muito comum nas produções da época.

Claro, alguns metidinhos poderão questionar se era realmente necessária a grande quantidade de sexo e de nudez mostrada no filme. Quer saber? Era sim, porra! O nome do filme não é "Momentos de PRAZER e de Agonia"? É bom lembrar também que, naquela época (entre 1982 e 1983), diversos realizadores brasileiros estavam descambando para o sexo explícito, devido à grande dificuldade de produzir filmes "normais", e mesmo diretores "sérios" enchiam suas obras de mulher pelada para atrair o público, cada vez mais distante das salas de cinema.


Eu, pelo menos, não tenho problema algum com nudez no cinema brasileiro, e acho ridículos protestos como aquele absurdo feito pelo Pedro Cardoso recentemente. Mas cada macaco no seu galho, não é?

Fica o aviso: se você não curte sexo e nudez em filme nacional, é melhor ficar bem longe de MOMENTOS DE PRAZER E AGONIA. Já quem não tem preconceito pode encarar numa boa: em 1h30min, você vai ver todo sexo e mulher pelada que o cinema brasileiro não mostrou nos últimos 15 anos!

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Momentos de Prazer e Agonia
(1983, Brasil)

Direção: Adnor Pitanga
Elenco: Rossana Ghessa, Anthony Steffen,
Fátima Leite, Helena Andrea, Rinaldo Gines,
Ismênia Kreis e Leila Correia.