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sexta-feira, 22 de junho de 2012

HAMBURGER - O FILME (1986)


Na aurora desse nosso século 21, alguns cineastas miraram suas câmeras e dedos acusadores para uma instituição norte-americana por excelência: o hambúrguer. Os riscos do consumo de fast food para a saúde e suas implicações sociais e sanitárias (como o uso de mão-de-obra barata e a falta de higiene na manipulação dos alimentos) foram dissecados em filmes como "Super Size Me" (2004), de Morgan Spurlock, e "Nação Fast Food" (2006), de Richard Linklater.

Ironicamente, na inconsequente década de 80, a indústria da fast food não era acusada e nem analisada criticamente; pelo contrário, era motivo de escárnio em comédias debilóides como "O Segredo Está no Molho" e este inacreditável HAMBURGER - O FILME - uma comédia tão escrota que faz os filmes atuais do Adam Sandler e do Rob Schneider parecerem algo escrito pela Jane Austen!


HAMBURGER - O FILME se encaixa dentro de um subgênero bem popular nos anos 1980: os "filmes de escolinha", em que um grupo de alunos desajustados ingressava em algum curso temático e enfrentava situações absurdas envolvendo sexo, drogas e alguma autoridade que eles combatiam e ridicularizavam.

Tivemos "filmes de escolinha" sobre academias de polícia (a franquia "Loucademia de Polícia" e sua cópia genérica, "Esquadrão de Recrutas"), sobre escolas militares ("Rebeldes da Academia", "Loucademia de Combate"), sobre auto-escolas ("Trânsito Muito Louco", "Loucademia de Trânsito"), e tudo mais que pudesse gerar piadas imbecis: "Loucademia de Bombeiros", "Loucademia de Ninjas" (!!!), "Loucademia de Esqui" e, a cereja do bolo, "Loucademia Funerária"!!!


Era questão de tempo para que algum cabeça-de-bagre pensasse em tirar sarro das cadeias de fast food adotando o formato "loucademia", e assim surgiu HAMBURGER - O FILME e sua inacreditável "Universidade Buster Burger", onde os alunos são iniciados nos segredos da produção e comercialização de hambúrgueres!

O filme começa com uma sequência de créditos muito divertida, que sintetiza a paixão nacional dos ianques por fast food de maneira apaixonada e sem a crítica ácida dos tempos atuais (chegando ao ponto de mostrar uma mãe alimentando seu bebê de colo com um sanduíche!), ao som de uma música grudenta que celebra o consumo desse tipo de alimento. O refrão diz: "Sliced tomatoes, cheese and bacon / Soda pop, and shakes a shakin' / And while you're listening and lookin' / It makes them proud, that they're a-cookin' / Hamburgers, for America!".


Logo em seguida, sem perda de tempo, HAMBURGER - O FILME nos transporta diretamente para o terreno da comédia grosseira e sexista típica da década de 80: somos apresentados ao nosso protagonista, Russell, enquanto ele está transando com uma gatinha no chuveiro da sua faculdade.

Pego no flagra, é enviado direto à psiquiatra da escola (a deliciosa Karen Mayo-Chandler, já falecida), que lembra o fato de o rapaz ter sido expulso de quatro universidades porque prefere transar com as colegas do que frequentar as aulas. Russell é diagnosticado como viciado em sexo, e, surpreendentemente, a própria psiquiatra tenta seduzi-lo, até que o reitor chega, pega o rapaz novamente no flagra e o expulsa da sua quinta faculdade!


Um rápido parêntese: Russell, um jovem universitário, é interpretado por Leigh McCloskey, que muitos devem lembrar como o protagonista de "Mansão do Inferno" (1980), de Dario Argento. Em 1986, quando HAMBURGER - O FILME foi feito, McCloskey já tinha 31 anos (!!!), e não convence nem minha vó míope como "jovem universitário"!

De todo jeito, nosso herói é estrangulado pelo pai após a quinta expulsão, pois está para ganhar uma polpuda herança, só que o dinheiro será liberado apenas se ele tiver um diploma de ensino superior. Como seus pais não têm mais dinheiro para mandá-lo a uma sexta faculdade, Russell vê uma única saída: ingressar na tal Universidade Buster Burger, administrada por uma famosa cadeia de fast food, e que oferece um curso superior gratuito para a formação de gerentes de lanchonetes!


É óbvio que os seus colegas de turma na "universidade" são aqueles escrachados estereótipos típicos dos filmes estilo "loucademia": tem uma freira, um gordão que controla seu apetite através de violentos choques elétricos, um nerd apaixonado por fast food, uma guerrilheira latina, um sósia de Michael Jackson e um outro viciado em sexo, Fred (Sandy Hackett), que, obviamente, acaba se tornando colega de quarto de Russell.

A universidade é radicalmente contra drogas, sexo e o consumo de outros alimentos que não a fast food servida pela cadeia Buster Burger, e quem garante a disciplina é o Sargento Drootin (Dick Butkus, o cara que batia em Jerry Lewis sempre que ele acendia um cigarro em "Cracking Up - As Loucuras de Jerry Lewis"). Vestido como militar e sempre levando uma espátula na mão, Drootin é a versão "fast food" do Capitão Harris, da série "Loucademia de Polícia".


As confusões começam quando Russell se apaixona por Mia, a filha do proprietário da cadeia de lanchonetes (interpretada pela gracinha Debra Blee, de "Ruas Selvagens"); já seu colega de quarto Fred começa a ter uma relação assanhada com a própria esposa do dono do lugar, a voluptuosa e ninfomaníaca Sra. Vunk (Randi Brooks).

OK, antes de mais nada, vou ser sincero: caso não tenha dado para perceber até agora, HAMBURGER - O FILME é uma comédia pavorosamente ridícula sobre fast food e que, para piorar, vem embalada nesse ridículo formato de "escolinha" - os alunos da Universidade Buster Burger têm aulas de "oniologia" (às lágrimas por causa da cebola), sobre cortes de carne, "medicina" do picles (uma cena tão estúpida que fiquei com medo de ter um derrame), e por aí vai.


E o motivo pelo qual essa tralha é um autêntico "Filme Para Doidos" é justamente a sua ruindade: HAMBURGER - O FILME é tão estúpido e tão grosseiro que se torna realmente divertido. Você provavelmente vai sentir a maior vergonha alheia se assisti-lo sozinho em casa num sábado à noite; mas tente colocar o filme para rodar quando tiver um grupo de amigos bêbados em casa, e prepare-se para gargalhar alto até o estômago doer.

Se as piadinhas prontas raramente são engraçadas, é possível cavocar algumas pérolas como a da velhinha que tem um ataque cardíaco no drive-thru da lanchonete. Apavorada, uma das meninas do caixa procura o gerente avisando sobre a mulher morta no estacionamento, e o rapaz apenas comenta despreocupadamente: "Bem, então cancele o pedido dela".


A Universidade Buster Burger também é um caso tão grotesco de vergonha alheia que rende algumas boas gargalhadas: os alunos precisam usar uniforme vermelho e boné com chifrinhos imitando boi (a freira, claro, usará um hábito vermelho!), e dormem em quartos decorados com motivos de fast food, inclusive as camas são gigantescos hambúrgueres!

O lugar ainda tem uma igreja com uma variação bem particular da pintura da Santa Ceia, onde o coro canta "Burgerluia" ao invés de "Aleluia", e o padre (o próprio dono da cadeia de lanchonetes) usa uma bíblia própria para dar sermões sobre a "sagrada fast food". Aí não tem erro: ou você bate a cabeça na parede, por vergonha de estar vendo uma coisa tão imbecil, ou abre mais uma cervejinha e rola de rir justamente com a imbecilidade do negócio.


Mas o mais engraçado de HAMBURGER - O FILME é justamente o excesso de mau gosto, com algumas piadas pesadas que podem até chocar espectadores mais sensíveis - se brincadeiras com sexo e escatologia não são a sua praia, FIQUE LONGE DESSE FILME!

Um dos momentos mais grosseiros e sem-noção (e nada engraçado, a não ser que você esteja REALMENTE alcoolizado) é quando um grupo de gordões invade a lanchonete onde os alunos estão estagiando. Eles fazem pedidos estrambólicos, como 50 hambúrgueres, e ainda roubam a comida dos outros clientes, tudo enquanto grunhem como porcos! Para liberar a lanchonete dos glutões, os alunos têm a fantástica ideia de misturar laxante industrial nos milk-shakes (!!!), fazendo os sujeitos saírem correndo da lanchonete em busca de um banheiro livre (tudo ao som daquela sonoplastia tenebrosa de "peidos molhados" e nojentos ruídos estomacais).


Algumas piadas sobre sexo também pegam pesado nesse mesmo (baixo) nível. Além de mulheres peladas desfilando com frequência pelo filme, há um momento espantoso em que Russell e Fred estão num "double data" às escondidas com Mia e Sra. Vunk, num restaurante de comida chinesa. Quando o Sargento Drootin aparece de repente, os rapazes precisam se esconder embaixo da mesa.

É quando Fred descobre que a Sra. Vunk não usa calcinha, e, sem a menor cerimônia, se atira no meio das pernas da moça para uma ruidosa sessão de sexo oral. Enquanto "acima" da mesa a mulher se contorce num ruidoso orgasmo, embaixo Fred comenta com Russell: "Ah, como eu adoro comer fora!". E tem gente que acha "American Pie" grosseiro e ofensivo...


O culpado por HAMBURGER - O FILME é o roteirista Donald Ross, também co-produtor. Este é o único crédito cinematográfico do sujeito, que, vejam só, especializou-se em escrever roteiros para inocentes seriados de TV como "Arnold", "Casal 20" e "Super Vicky"! Pelo jeito, Ross foi guardando dentro de si toda essa grosseria que liberou sem censura na sua única comédia sexista adolescente!

Já o diretor é Mike Marvin, também em sua estréia no cinema. Ele dirige o filme com mão pesada (há sérios problemas de ritmo), e às vezes as cenas são mais caóticas e bagunçadas do que propriamente engraçadas. Mas se o intuito era ser grosseirão, pode-se dizer que ele cumpriu o objetivo com louvor. Logo em seguida, Marvin dirigiu um clássico das videolocadoras brasileiras: "The Wraith - A Aparição", com Charlie Sheen.


É curioso constatar que um negócio obscuro como HAMBURGER - O FILME tem uma legião de fãs apaixonados, não só nos Estados Unidos (onde essa paixão faz mais sentido), mas também aqui no Brasil.

Particularmente, já vi o filme umas três vezes e o considero um "guilty pleasure": como já deixei bem claro, uma comédia pavorosamente ruim e mal-dirigida, que os próprios atores devem morrer de vergonha de ter feito, mas divertida justamente pelos seus excessos e por não ter medo de pegar pesado quando precisa. E as mulheres são todas lindas e frequentemente peladas (menos Debra Blee, que só mostrou os peitinhos em outros filmes, mas aqui está comportada).


Recentemente, o filme foi de certa forma homenageado pelo decadente Kevin Smith em "O Balconista 2": os personagens principais trabalham numa lanchonete com figurino bem parecido (inclusive o bonézinho com chifres imitando boi), que também vira cenário de inúmeras piadas grosseiras e escatológicas. Mas "O Balconista 2" não é nem de longe tão divertido quanto HAMBURGER - O FILME: pelo contrário, é apenas ruim e de mau gosto mesmo.

Portanto, se você tem saudade daquelas comédias estúpidas e sem-noção dos anos 80, e, como eu, acha que hoje os caras desaprenderam a fazer filmes assim, corra atrás dessa pérola esquecida, que espantosamente só está disponível em VHS, tanto aqui no Brasil quanto lá fora (nunca foi relançado em DVD ou blu-ray, apesar dos fãs apaixonados que tem nos EUA).


E, como nota de rodapé, vale destacar que o diretor Mike Marvin também atuou, anos antes, numa outra comédia adolescente sexista e grosseira chamada... "Hot Dog - The Movie", dirigida por Peter Markle!!!

Ou seja: se ele não tivesse sumido do mapa, provavelmente já teria dirigido ou produzido todo o cardápio de uma lanchonete - talvez seus próximos projetos fossem "French Fries - The Motion Picture", "Onion Rings - The Movie" e uma continuação de HAMBURGER chamada "Cheeseburger - The Sequel"!

Trailer de HAMBURGER - O FILME



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Hamburger - The Motion Picture (1986, EUA)
Direção: Mike Marvin
Elenco: Leigh McCloskey, Debra Blee, Dick Butkus, Randi Brooks,
Charles Tyner, Sandy Hackett, Barbara Whinnery, Maria Richwine,
Karen Mayo-Chandler e Chuck McCann.

sábado, 21 de janeiro de 2012

REBELDES DA ACADEMIA (1980)


(Esta resenha é dedicada ao Raphael Fernandes, editor responsável - ou seria irresponsável? - por publicar a revista Mad no Brasil atualmente, pela Editora Mythos)

Fazer comédia parece fácil, mas só parece. Se você não prestar muita atenção a aspectos como roteiro e timing das piadas, vai acabar com um daqueles filmes em que apenas os realizadores parecem estar se divertindo pra caramba. Tipo a maioria das "comédias" do Will Ferrel e do Jack Black, ou 99% da produção do gênero no Brasil pós-Retomada - ou alguém realmente vê alguma graça nos longas do Casseta & Planeta e na série "Se Eu Fosse Você"?

Se um dia alguém quiser escrever uma cartilha sobre o que NÃO se deve fazer na hora de produzir uma comédia, eu sugiro usar REBELDES DA ACADEMIA como exemplo prático, talvez até colocando o DVD do filme como brinde na cartilha, já que esta é uma das "comédias" menos engraçadas já feitas.

E sabe o que é mais irônico? É que ela foi produzida por uma das mais brilhantes revistas humorísticas do mundo, a Mad!!!


Tudo começou com o estrondoso sucesso da comédia "Clube dos Cafajestes" (1978), dirigida por John Landis. Nos Estados Unidos, o filme se chama "National Lampoon's Animal House", e a National Lampoon era uma outra revista de humor concorrente da Mad, bastante popular nos anos 70.

Ao contrário do que se pensa, a revista não teve grande envolvimento na produção, e o fato de seu nome aparecer no título era apenas uma jogada de marketing, algo do tipo "National Lampoon apresenta...". Vários outros filmes trariam o nome da revista no título a partir de então, como a série "Férias Frustradas", que no original era "National Lampoon's Vacation"


"Clube dos Cafajestes" custou 3 milhões de dólares e rendeu 141 milhões só nas bilheterias norte-americanas. Logo, outros estúdios resolveram produzir comédias "apadrinhadas" por revistas humorísticas para ver se o raio caía duas vezes no mesmo lugar.

Era questão de tempo para que a Mad entrasse na jogada. Fundada em 1952 e publicada ininterruptamente desde então nos Estados Unidos, a Mad era a mais bem-sucedida das revistas do gênero no país - fez bastante sucesso também no Brasil, onde chegou na década de 70, ao contrário da National Lampoon, que nunca deu as caras por aqui.


A Warner entrou em contato com Bill Gaines, editor norte-americano da revista, pedindo que "emprestasse" seu título para uma comédia nonsense, para tentar faturar em cima do sucesso de "Clube dos Cafajestes". Tinha tudo para dar certo. Mas não deu.

Escrito por dois sujeitos vindos da TV, Tom Patchett (criador do seriado "ALF, o Eteimoso") e Jay Tarses, REBELDES DA ACADEMIA conta a história de quatro garotos-problema enviados por suas famílias para a Academia Militar Sheldon R. Weinberg.


Eles são Chooch (Ralph Macchio, molecão e em sua estréia no cinema), o filho de um mafioso; Hash (Tommy Citera), um garoto árabe e cleptomaníaco; Ike (Wendell Brown), jovem negro filho de um tele-evangelista, e que está se relacionando com a madrasta, e Oliver (Hutch Parker), filho de um importante político que concorre à reeleição, e que resolve mandar o garoto para o quartel na expectativa de que ele pare de criar problemas que ameacem sua candidatura.

Na academia, o quarteto vai comer o pão que o diabo amassou nas mãos do Major Vaughn Liceman (Ron Leibman, de "Matadouro Cinco"), aquele típico comandante sádico, embora atrapalhado, que gosta de transformar a vida dos recrutas num inferno - espécie de embrião para o Comandante Harris da série "Loucademia de Polícia".


Antes de mais nada, esqueça que REBELDES DA ACADEMIA se passa numa academia militar. Diferente da já citada franquia "Loucademia de Polícia", em que a ambientação justificava as piadas com o modo de vida militar e o duro treinamento dos cadetes, aqui tanto faz o fato de a trama se passar num quartel, considerando que raríssimas vezes o roteiro se aproveita do cenário - a mesma trama poderia se passar numa faculdade de engenharia ou num campo de treinamento de terroristas do Al-Qaeda sem grandes modificações.

Acompanhe: ao invés de criar piadas sobre o rigor da rotina militar, a exemplo do que filmes como "Recrutas da Pesada" e "Loucademia de Combate" fariam alguns anos depois, REBELDES DA ACADEMIA prefere enfocar o conflito de um dos jovens (Oliver) com o Major Liceman, que inexplicavelmente se apaixona pela namorada do garoto, Candy (a gracinha Stacey Nelkin, de "Halloween 3"). Claro, numa daquelas forçadas de barra tremendas de roteiro ruim, Candy também foi enviada para uma escola militar feminina, e que fica a apenas alguns metros daquela que o namoradinho frequenta!


Só para dar uma ideia do nível geral das piadas, a academia também tem um professor gay de dança (Tom Poston) e uma professora gostosa (a Sra. Ringo Starr Barbara Bach, de "A Ilha dos Homens-Peixe") que leciona sobre armamentos usando expressões de duplo sentido que envergonhariam até a equipe de roteiristas do programa Zorra Total. Peraí: professor gay de dança e professora gostosa de armamentos numa academia militar??? Pois é...

Ah, quase esqueci de comentar que o diretor do local é o Comandante Causeway (Ian Wolfe, de "THX 1138"), um velhote que sempre solta um sonoro e fedorento peido toda vez que aparece em cena. Deu para sacar o nível das "piadas"? Nem colocando uma claque estilo Chaves alguém riria dessas coisas!


Além da dupla de roteiristas, um dos grandes culpados por esta catástrofe é o diretor Robert Downey, pai de um certo Robert Downey Jr. (o próprio Homem de Ferro). Downey Pai nunca foi um cineasta brilhante, mas em REBELDES DA ACADEMIA ele se superou: com sua mão pesada e falta de ritmo, o sujeito consegue estragar até as poucas piadas que PODERIAM ter ficado engraçadas!

Uma coisa que nem Downey Pai e nem os roteiristas Patchett e Tarses entenderam é que o humor da revista Mad era essencialmente visual e nonsense, e não tanto verbal. Infelizmente, não é o que se vê no filme, que abusa dos trocadilhos intraduzíveis (o nome "Hash", por exemplo, é uma gíria em inglês para maconha) e expressões de duplo sentido no nível do Pânico na TV.


Produções posteriores roteirizadas e dirigidas pelo trio Jim Abrahams e David e Jerry Zucker, como "Apertem os Cintos, O Piloto Sumiu", "Top Secret" e "Corra que a Polícia Vem Aí!", fazem este tipo de humor nonsense estilo revista Mad de maneira muito mais eficiente, tanto que seria mais fácil aceitar um "Mad Magazine Presents Top Secret" do que esta patuscada aqui...

Algumas raras piadas visuais em REBELDES DA ACADEMIA, só para dar uma ideia: a banda que canta num baile na academia (não pergunte...) é tão desafinada que quebra todos os vidros no recinto e até o próprio quadro do filme; as aparições do vilanesco Major Liceman são sempre precedidas de uma sonora ventania e pelos acordes de "Gimme Danger", de Iggy Pop & The Stooges; e o cachorro de Liceman também usa farda militar, num plágio descarado do cão do Sargento Tainha nos quadrinhos do Recruta Zero! Risadas amarelas ecoam pela sala de cinema ou da casa.


O Major Liceman também tem o irritante hábito de fazer os recrutas repetirem dezenas de vezes a mesma resposta gritando "Say it again! Say it again!", e isso deveria ser engraçado. Pelo menos na cabeça dos realizadores.

Talvez alguém possa considerar um ponto positivo o fato de o filme não ter medo de ser "politicamente incorreto". Há piadas bem fortes (para os padrões atuais) sobre negros, árabes e homossexuais, uma tirada envolvendo um aborto forçado e ainda a sugestão de um romance entre a professora gostosa e um dos garotos, Ike. Mas o mau gosto não salva o conjunto.


No roteiro, inclusive, a relação entre Ike e a professora era ainda mais erotizada, com direito a cenas de nudez (quando o garoto espiava a mulher tomando banho) e sexo. Mas essa subtrama foi cortada quando os produtores acharam que era pegar pesado demais!

Assim, REBELDES DA ACADEMIA é um daqueles exemplos constrangedores de comédia em que você ri mais da vergonha alheia, da falta de graça e do filme em si do que das piadas - até porque raríssimas piadas são realmente novas, chegando-se ao cúmulo de mostrar um homem travestido com roupas íntimas femininas como se fosse a coisa mais engraçada do mundo.


Enfim, o resultado é tão ruim, mas TÃO ruim, que um dos atores principais, Ron Leibman, exigiu que seu nome fosse retirado dos créditos, prevendo o fiasco que seria quando a bomba chegasse aos cinemas. Curiosamente, ele não fez a mesma coisa com o igualmente constrangedor "Rhinestone - Um Brilho na Noite", de Bob Clark!

Os próprios editores da Mad ficaram tão desencantados quando o filme estreou que publicaram um editorial na revista desculpando-se com seus leitores pelo fiasco da obra - e, diz a lenda, o editor Bill Gaines respondeu pessoalmente a cada carta enviada que reclamasse da qualidade do filme.


Além disso, Gaines pagou caro (30 mil dólares, à época) para eliminar toda e qualquer referência à revista no filme e no seu material de divulgação quando ele fosse lançado em VHS ou exibido na televisão.

Porque, originalmente, REBELDES DA ACADEMIA se chamava "Mad Magazine Presents Up the Academy", na linha de "National Lampoon's Animal House", mas acabou só "Up the Academy" no vídeo. As aparições do mascote da revista, Alfred E. Neuman (aquele garotinho sardento e banguela, que ganha vida com efeitos de maquiagem do mestre Rick Baker!), também foram retiradas da edição.

Em entrevista publicada em 1983, Bill Gaines tentou justificar a ruindade do filme. Segundo ele, a Warner enviou para a redação da revista um roteiro ruim para um filme que teria o nome "Mad apresenta" no título.


Gaines e sua equipe recusaram e o próprio time de redatores da revista escreveu um roteiro para o filme, mas dessa vez foram os produtores que não gostaram. No final, a Warner fez um remendão com ideias de um e de outro roteiro, mas sem acatar as várias sugestões feitas posteriormente pela equipe da Mad.

"Paguei 30 mil para a Warner tirar o nome da Mad das versões para o mercado doméstico, e foram 30 mil bem investidos!", declarou Gaines nesta entrevista. Demonstrando humildade, a Mad também publicou uma das suas populares sátiras de filmes com o próprio REBELDES DA ACADEMIA (veja abaixo), fazendo graça da ruindade da obra, e em apenas duas páginas (a sátira termina com uma troca de bilhetes entre os desenhistas e o editor, reclamando que o filme era péssimo demais até para ser satirizado!).


Como sempre acontece com produções tão ruins e problemáticas, REBELDES DA ACADEMIA ganhou um ar de "filme de culto", com débeis mentais promovendo sessões justamente para espinafrar a falta de graça do negócio.

Nos anos 1990, depois da morte do editor Gaines, a Warner colocou de volta todas as referências à Mad para exibições do filme na TV a cabo e no seu relançamento em DVD. O pobre Gaines deve estar se revirando no túmulo...


Agora, se há algo de bom em REBELDES DA ACADEMIA é a sua trilha sonora. Inclusive a trilha é tão boa que chega a ser ofensivo que tenha sido utilizada num filme tão ruim. Começa já com a ótima música dos créditos iniciais, "Kicking Up A Fuss", do Blow-Up (clique para ouvir), repetida até cansar ao longo do filme; tem o já citado The Stooges, mais "Night Theme" (Iggy Pop), "X Offender" e "One Way Or Another" (Blondie), "Yes Sir, No Sir" (The Kinks), "Street Hassle" (Lou Reed), "Bad Reputation" (Sammy Hagar), entre outras. Ou seja, a bagaça vale mais pela música do que por qualquer outra coisa!

Se a National Lampoon continua "apresentando" filmes até hoje (alguns tão ruins quanto REBELDES DA ACADEMIA, ou piores!), o pessoal da Mad aprendeu a lição e nunca mais emprestou seu nome para nenhuma outra presepada do gênero, embora tenham produzido o seriado televisivo "MADtv" (uma espécie de TV Pirata lá dos EUA) entre 1995 e 2009.


Para dar uma ideia de como o episódio maculou a imagem da revista, imagine um equivalente aqui no Brasil: "Chiclete com Banana Apresenta Muita Calma Nessa Hora", ou "Geraldão Apresenta Os Normais 2". Não é de cortar os pulsos?

Por tudo isso, torna-se irônica uma das imagens mais populares do mascote da Mad, Alfred Neuman, que é aquela em que ele se questiona: "Eu, me preocupar?". Bem, caro Neuman, no caso da ruindade de REBELDES DA ACADEMIA e do estrago que isso provocou na imagem da sua revista, eu me preocuparia sim. E muito!

"Say it again!"

"Say it again!"

"Say it again!!!"


PS: Um Robert Downey Jr. ainda moleque faz uma ponta como um dos garotos que joga futebol com a turma da academia lá pela metade do filme.

Trailer de REBELDES DA ACADEMIA



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Mad Magazine Presents Up the Academy (1980, EUA)
Direção: Robert Downey
Elenco: Ralph Macchio, Wendell Brown, Tommy Citera,
Hutch Parker, Ron Leibman, Barbara Bach, Ian Wolfe,
Tom Poston, Stacey Nelkin e Antonio Fargas.