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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

HALLOWEEN III - A NOITE DAS BRUXAS (1982)


HALLOWEEN III - A NOITE DAS BRUXAS é um filme que boa parte da humanidade aprendeu a odiar somente pelo título, que remete à série iniciada por John Carpenter em 1978, mas não tem absolutamente nenhuma relação com este ou com a sua primeira sequência, "Halloween 2" (1981). Porém, por causa do número 3 no título, muitos fãs de horror foram aos cinemas esperando rever os personagens dos dois filmes anteriores, principalmente o icônico vilão Michael Myers, e saíram decepcionados ao deparar-se com uma história original.

Pois a mim essa mudança de rumo nunca incomodou. Até porque eu dei a sorte de assistir HALLOWEEN III antes dos dois episódios anteriores da franquia, e assim não me decepcionei com a ausência de Jamie Lee Curtis ou do mascarado Myers. E por isso, neste Halloween, o FILMES PARA DOIDOS propõe um novo olhar sobre este filmaço injustiçado.


A gênese de HALLOWEEN III vem, claro, da maneira como o anterior "Halloween 2" terminava. Era aquele tipo de conclusão definitiva que não permitia mais continuar, já que mostrava o vilão Michael Myers morrendo após uma explosão provocada pelo seu psiquiatra e arquiinimigo Dr. Loomis (Donald Pleasence), que se sacrificava no processo. Antes, o psicopata mascarado tomou tiros nos olhos que o deixaram permanentemente cego, e um último take mostrava seu corpo e máscara queimando, para não deixar dúvidas de que estava mortinho da silva.

Ressuscitar Myers literalmente das cinzas nunca esteve nos planos de Carpenter, que àquela altura era produtor da série junto com Debra Hill. "Não havia mais história para contar, e só o que podíamos fazer era imitar 'Sexta-feira 13' e apenas repetir as cenas de ação e fazê-las mais sangrentas", disse ele, em entrevista ao livro "John Carpenter: Prince of Darkness".


Só que Carpenter e Debra tiveram uma ideia ambiciosa para que a franquia não acabasse ali: por que não continuar fazendo novos "Halloween", só que contando histórias independentes que envolvessem o Dia das Bruxas, ao invés de voltar àquela mesma trama do assassino mascarado perseguindo jovens na data fatídica? Dessa maneira, eles teriam um "Halloween" diferente todo ano, com bilheteria garantida graças ao peso do já consagrado título.

Irwin Yablans e Moustapha Akkad, que produziram os dois episódios anteriores, gostaram da ideia e investiram 2,5 milhões de dólares para o orçamento da Parte 3. E dois nomes de peso se juntaram ao projeto: Joe Dante, recém-saído do set de "Grito de Horror", seria o diretor, enquanto o inglês Nigel Kneale (criador do seriado de TV "Quatermass") foi convidado pelo seu fã declarado Carpenter para escrever um roteiro original cuja ideia foi sugerida pela produtora Debra: feitiçaria nos tempos da informática. Não tinha como dar errado.


Mas não demoraram para aparecer os problemas. Primeiro foi Dante que pulou fora do projeto. Para ocupar seu lugar, Carpenter convidou um amigo de longa data, Tommy Lee Wallace, que iria fazer sua estreia na função, mas já era "prata da casa" (foi ele que editou "Halloween" e "A Bruma Assassina"). Ironicamente, Wallace tinha sido convidado para dirigir "Halloween 2" no ano anterior, mas recusou e preferiu escrever o roteiro de "Amityville 2 - A Posessão", de Damiano Damiani.

Depois, Kneale não gostou das alterações que Carpenter e Wallace fizeram em seu roteiro e também deixou o projeto. Embora Wallace sustente que 60% do que se vê em HALLOWEEN III tenha sido escrito pelo inglês, sabe-se que ele abandonou a produção por não concordar com a inclusão de mais cenas de morte e de nojeira explícita criadas pela dupla, e inclusive exigiu a retirada do seu nome dos créditos (o único roteirista creditado na versão final foi Tommy Lee Wallace).


HALLOWEEN III começa com um homem correndo desesperado numa noite escura. Estará fugindo de Michael Myers? Não, mané; a história aqui é outra, esqueceu? Na verdade, o homem está tentando fugir de misteriosos e silenciosos adversários que se vestem como executivos, com terninho, gravata e cabelo engomado, mas que por baixo dessa aparência civilizada se comportam como verdadeiros Michael Myers - ou seja, são assassinos impiedosos, mudos e inexpressivos!

O homem consegue escapar, depois de esmagar um dos seus perseguidores entre dois carros, e pede ajuda num posto de gasolina. Dai, é levado ao pronto-socorro com olhar enlouquecido, segurando uma máscara de Dia das Bruxas numa das mãos e repetindo frases como "Eles vão matar todos nós!". 


Só que a polícia não tem muito tempo para interrogá-lo e saber quem vai matar todos nós, pois na mesma noite o sujeito é brutalmente assassinado em seu quarto (número 13, claro), por outro daqueles homens misteriosos de terno e gravata. O assassino depois comete suicídio no próprio estacionamento do hospital, ao incendiar e explodir o seu carro.

Preocupado com as duas mortes violentas ocorridas em seu hospital na mesma noite, o médico Dan Challis (Tom Atkins), resolve bancar o detetive. Ele se alia a Ellie Grimbridge (a gracinha Stacey Nelkin), filha do homem assassinado, para investigarem os últimos dias da vítima, e logo descobrem que alguma coisa aconteceu durante uma viagem que ele fez à pequena cidade de Santa Mira.


Pois é em Santa Mira que fica a gigantesca fábrica da Silver Shamrock (Trevo Prateado), responsável pelas máscaras de Halloween mais populares dos Estados Unidos, e que está prometendo "uma grande surpresa" para a noite do Dia das Bruxas. Claro que o Dr. Challis resolve esquecer quaisquer outros pacientes que precisem de seus cuidados para embarcar com Ellie numa viagem à cidadezinha em busca de novas pistas.

Não demora para eles descobrirem que há algo de muito errado por lá. A cidade e seus habitantes são controlados por câmeras e escutas telefônicas, e há até um toque de recolher à noite exigindo que todos saiam das ruas. O responsável pela vigilância é Conal Cochran (Dan O'Herlihy), o proprietário da Silver Shamrock. E o sujeito vive rodeado por aqueles homens de terno, que executam suas ordens fielmente - quaisquer que sejam as ordens.


É somente no último ato que o Dr. Challis descobrirá o terrível plano de Cochran para o Halloween: todas as máscaras da Silver Shamrock (que, como já se sabe, são as mais vendidas do país) estão programadas para matar seus usuários no momento em que eles assistirem ao comercial com a "grande surpresa" que será exibido em rede nacional na noite do Dia das Bruxas. O objetivo do maléfico fabricante de máscaras é resgatar o clima do Samhain, a festa pagã que deu origem ao moderno Halloween, e que supostamente envolvia feitiçaria e sacrifícios humanos.

Começa, então, uma tensa corrida contra o relógio, já que o médico-detetive precisa não apenas escapar de Cochran e seus asseclas de terno, mas também impedir a exibição do comercial da Silver Shamrock e o genocídio de milhões de crianças e de seus familiares por todo o país às nove em ponto!


Como se percebe, HALLOWEEN III dispensa o conforto do "mais do mesmo" e foge da armadilha de recontar pela terceira vez a história de Michael Myers perseguindo vítimas inocentes na noite do Dia das Bruxas, e o faz em prol de uma trama "de investigação", em que o mistério vai se resolvendo aos poucos. Afinal, ninguém teria saco para ver mais um round de matanças perpetradas pelo psicopata da máscara branca, certo?

Bem, acontece que a resposta dos espectadores foi justamente o CONTRÁRIO! O público se sentiu enganado ao pagar para ver um filme chamado HALLOWEEN III que não tinha nem Jamie Lee Curtis, nem o vilão Michael Myers, e essas críticas se espalharam na propaganda de boca em boca (na época não havia internet, mas notícia ruim se propagava com a mesma rapidez). Assim, a bilheteria ficou bem aquém do esperado, e é uma das mais baixas da série - "apenas" 15 milhões de dólares, sendo que "Sexta-feira 13 Parte 3", lançado no mesmo ano e justamente um "mais do mesmo" como o que os produtores da série "Halloween" queriam evitar, arrecadou mais que o dobro disso.


A bilheteria aquém do esperado decretou o fim dos planos de Carpenter e Debra Hill de lançar um "Halloween" original por ano com histórias independentes. Mais do que isso, o fracasso de HALLOWEEN III provocou o desligamento total dos dois produtores da série. "O público odiou e todo mundo ficou puto comigo porque achavam que eu tinha destruído a franquia", lembrou Carpenter no livro "John Carpenter: Prince of Darkness", completando: "Eles tiraram a série das minhas mãos e começaram a lançar novos 'Halloween' de tempos em tempos, mas apenas xerocando a mesma fórmula".

Porque como as histórias independentes de Dia das Bruxas aparentemente não funcionaram, Michael Myers foi absurdamente ressuscitado seis anos depois em "Halloween 4" (1988), dirigido por Dwight H. Little, e a partir de então não morreu mais, voltando, tal qual um Jason ou Freddy Krueger, em mais quatro filmes e dois remakes, todos oscilando entre o fraquinho e o muito ruim.


O diretor Wallace sempre achou que parte da culpa pelo fracasso do filme foi do Universal Studios, que distribuiu HALLOWEEN III, mas não soube fazer uma campanha de marketing que vendesse a obra como uma produção não-relacionada aos dois capítulos anteriores. Porque embora Michael Myers não apareça no trailer, na época você só assistia trailers de filmes caso fosse ao cinema (e não a qualquer momento no YouTube, como acontece hoje).

"Muitas coisas poderiam ter sido feitas para preparar o público, mas tudo que a Universal fez foi colocar uma pequena tarja no canto do pôster dizendo 'All New!' (Totalmente Novo!), como se fosse um anúncio de pasta de dente. 'All New', o que isso significa?", questionou Wallace, em recente entrevista a um site.


O injusto da coisa toda é que não há muito a se criticar em HALLOWEEN III além da tão comentada ausência de Michael Myers ou dos personagens de Jamie Lee Curtis e Donald Pleasence, pois o que temos aqui é um ótimo filme de horror à moda antiga, com trama mirabolante, mortes escabrosas e várias surpresas. Além do mais, eu sempre achei ótima a ideia de matar Myers definitivamente no final de "Halloween 2" e tentar partir para histórias independentes.

Talvez o erro tenha sido manter o título "Halloween", o que muitos espectadores consideraram propaganda enganosa. Por outro lado, ninguém nunca reclamou quando outras séries de horror, tipo "Natal Sangrento" e "Prom Night", partiram para histórias independentes (principalmente esta última, em que cada um dos quatro filmes traz uma trama completamente nova e sem relação com as outras!).


No meu caso, não sei se foi por ter assistido HALLOWEEN III antes dos "originais", ou por ter gostado bastante da história, mas nunca me importei com o fato de ele tentar seguir por outro caminho. Inclusive prefiro essa solução a fazer continuações ruins com a mesma trama e os mesmos personagens do original, tipo os terríveis "O Massacre da Serra Elétrica 2" (1986) ou "O Exorcista 2".

Em todo caso, a franquia concorrente "Sexta-feira 13" também quebrou a cara ao tentar seguir novos rumos: como o vilão Jason Voorhees havia morrido "pra valer" no final de "Sexta-feira 13 Parte 4" (1984), os produtores da série transformaram o quinto filme num "whodunit?", em que o assassino não era Jason, mas sim um imitador usando sua máscara, e cuja identidade era revelada na última hora. Só que também não colou, e por isso os produtores tiveram que ressuscitar Jason na Parte 6 - e isso que "Sexta-feira 13 Parte 5" não muda a história tão radicalmente quanto HALLOWEEN III, sendo, basicamente, um "mais do mesmo" com outro matador no lugar de Jason.


O que eu gosto mais em HALLOWEEN III é sua coragem de  fugir dos clichês dos slasher movies que "Halloween" ajudou a popularizar, mas que já estavam batidos lá em 1982 exatamente por causa das muitas imitações do filme de Carpenter. Não há nenhum adolescente ou babysitter na trama, e a personagem principal mais jovem é a de Stacey Nelkin, mesmo assim já na faixa dos vinte-e-poucos anos. Já o "herói" é um adulto, distanciando este terceiro filme do tom dos dois anteriores e de franquias tipo "Sexta-feira 13". Ainda bem, diga-se de passagem: eu sinceramente não consigo imaginar o mesmo roteiro com adolescentes no lugar dos adultos...

Ao mesmo tempo em que busca fugir das armadilhas típicas dos slasher movies, Wallace aproxima o filme do clássico "Vampiros de Almas" (1956), de Don Siegel, primeira das quatro adaptações do livro "Invasores de Corpos". Veja só: ambas as tramas se passam na fictícia cidade de Santa Mira, em ambos há seres humanos "replicados" e sem emoções (alienígenas em "Vampiros de Almas", robôs que se passam por humanos aqui), e ambos terminam com um close desesperado no rosto do protagonista tentando inutilmente alertar o resto da humanidade sobre a tragédia prestes a se desenrolar!


A tragédia em questão representa o ponto alto de HALLOWEEN III, quando Cochran dá uma de vilão de filme do James Bond e explica todo o seu plano para o aprisionado Dr. Challis, inclusive realizando uma pequena demonstração da "brincadeira de Dia das Bruxas" que preparou. Ocorre que o vilão conseguiu mesclar a feitiçaria do passado com a tecnologia da informática ao adicionar fragmentos de uma das pedras de Stonehenge (sim, aquele antiquíssimo círculo de pedras na Inglaterra) num microchip escondido sob a etiqueta da sua empresa e colado nas máscaras.

Na demonstração, uma pobre família inocente é morta quando o filho pequeno assiste à transmissão da Silver Shamrock usando uma das máscaras, sua cabeça inteira derrete e de dentro dela saem insetos, aranhas e serpentes venenosas, que atacam os pais! Você não leu errado: não apenas uma criancinha foi morta (verdadeiro tabu em filmes de horror), como ainda foi morta da forma mais cruel e tenebrosa possível! Quem viu essa cena quando moleque deve tê-la gravada na retina até hoje.


E só de imaginar isso acontecendo em escala global, a cena final de HALLOWEEN III é verdadeiramente desesperadora, (SPOILERS) com o Dr. Challis tentando impedir a exibição dos comerciais mortíferos da Silver Shamrock em cima da hora. Seu grito desesperado ao telefone ("Stop it!") encerra o filme e deixa a conclusão em aberto: será que a ameaça foi detida a tempo? Opto pelo final trágico, e só de imaginar a quantidade de crianças mortas pelo macabro plano de Cochran, já fico surpreso com a coragem dos realizadores de fugir de uma conclusão mais "agradável". (FIM DOS SPOILERS)

O curioso é que eu assisti HALLOWEEN III pouco antes de "Halloween 4" ser lançado no Brasil, e fiquei animadíssimo imaginando que o quarto filme começaria mostrando o que, afinal, aconteceu após a cena final do terceiro. Desnecessário dizer que HALLOWEEN III foi completamente ignorado no quarto episódio, o que não deixou de ser frustrante para o moleque aqui em busca de respostas...


Não bastasse a tenebrosa cena da cabeça do moleque derretendo, o filme ainda entrega outros impressionantes momentos de violência explícita, estes protagonizados pelos robóticos assassinos de terno comandados por Cochran. A morte do homem no hospital me dá um arrepio até hoje, já que o assassino enfia seus dedos nos olhos da vítima e quebra seu crânio com um movimento brusco!

Outras cenas bonitas incluem uma mulher atingida por um "disparo acidental" das máscaras, e de cujo rosto explodido saem aranhas, e a cabeça de um mendigo sendo torcida e arrancada sem o menor esforço pelos assassinos robóticos. Ou seja, Michael Myers e sua faca de açougueiro não fazem a menor falta aqui.


Mesmo os maiores críticos de HALLOWEEN III irão concordar que "herói" e vilão do filme entregam grandes e antológicas performances. O Dr. Challis é interpretado por Tom Atkins, à época um habitué dos filmes de John Carpenter (estrelou "A Bruma Assassina" e fez uma ponta em "Fuga de Nova York"), e um daqueles raros atores que são "cool" sem fazer o menor esforço, tipo Bruce Campbell ou Christopher Lambert.

Aqui, num lance involuntariamente cômico, Atkins interpreta O PIOR MÉDICO DA HISTÓRIA DO CINEMA, já que aparece o tempo inteiro fumando ou bebendo álcool, e a cada cinco minutos dispara um "Preciso de um drink". Ao embarcar com Ellie na viagem a Santa Mira, Challis não leva nenhuma mala com roupas, e sim um six-pack de cerveja! Relaxado que só, ele veste a mesma roupa durante três dias seguidos, e sequer usa cueca! Por fim, o doutor transa com Ellie, que tem mais da metade da sua idade, sem se preocupar com possíveis acusações de pedofilia.


Já o Cochran de Dan O'Herlihy (1919-2005) é aquele típico velhinho aparentemente simpático que esconde suas más intenções atrás de sorrisos sinistros. Sua origem e verdadeira identidade nunca ficam bem claras (rumores indicam que, no roteiro original de Nigel Kneale, ele seria um demônio com 3.000 anos de idade), mas torna-se óbvio que Cochran não é "deste mundo", até porque fala dos rituais de Samhain e dos antigos celtas como se tivesse vivido entre eles.

O curioso é que O'Herlihy não se envolve diretamente em nenhuma cena de violência ou morte, preferindo deixar o serviço sujo para seus capangas autômatos, e mesmo assim consegue compor um vilão legitimamente assustador. Numa entrevista à revista Starlog nos anos 1980, o ator disse que se divertiu muito com o personagem, pois também tem ascendência irlandesa, mas confessou que não gostou do filme.


Obviamente, HALLOWEEN III está longe de ser uma obra-prima. Aquele tipo de público que gosta de um mínimo de lógica mesmo em filmes de horror vai ficar puto com a maior parte da trama. Mas é curioso perceber que a trama já enfoca a morte vinda pela tela da televisão um ano antes de "Videodrome - A Síndrome do Vídeo" (1983) e 16 anos antes de "Ringu" (1998).

Há um momento particularmente divertido em que Cochran comenta, sobre a pedra roubada de Stonehenge e levada para a sua fábrica em Santa Mira: "Deu o maior trabalhão trazê-la para cá. Você não acreditaria em como fizemos". De fato, o público dificilmente iria acreditar que uma pedra de cinco toneladas pudesse ser levada da Europa para o interior dos EUA sem ninguém perceber, e por isso o roteiro preferiu nem tentar inventar uma explicação para isso, o que ficou muito engraçado!


Alguns críticos também reclamam que o plano de Cochran dificilmente iria funcionar pelo fato de os Estados Unidos terem diferentes faixas de horário, e portanto em alguns Estados o relógio só marcaria nove da noite uma hora depois que nos demais. Em defesa do filme, afirmo que em nenhum momento é anunciado que o comercial da Silver Shamrock será exibido às nove da noite EM TODOS OS ESTADOS UNIDOS (é possível que tenha sido marcado para outros horários em alguns dos Estados, a fim de manter o ataque simultâneo).

O único furo de roteiro que REALMENTE me incomoda é o fato de (SPOILERS) a Ellie transformada em robô não tentar impedir o Dr. Challis quando ele destrói a fábrica de máscaras no final, rebelando-se contra o herói apenas quando já estão longe de Santa Mira. Por sinal, a revelação de que a moça foi transformada em autômato é uma bela surpresa, e de certa maneira também uma ironia, já que a atriz Stacey Nelkin quase interpretou uma das Replicantes de "Blade Runner" no mesmo ano, mas sua personagem foi cortada da versão final do roteiro. (FIM DOS SPOILERS)


Mesmo saindo da "zona de conforto" das Partes 1 e 2, HALLOWEEN III traz várias referências cruzadas com os episódios anteriores, como se todos fizessem parte de um universo único.

Há citações escancaradas, como o comercial de TV anunciando a exibição de "Halloween 1" na noite de Dia das Bruxas, e também a participação especial de atores dos filmes anteriores, como Jamie Lee Curtis (que aqui empresta sua voz para a telefonista de Santa Mira), Nancy Keyes (esposa do diretor Tommy Lee Wallace e intérprete de Annie em "Halloween" 1 e 2, que aqui aparece como ex-esposa do Dr. Challis) e o dublê Dick Warlock (Michael Myers em "Halloween 2" e um dos homens de terno aqui).


O fato de os sinistros "homens de terno" serem robôs criados por Cochran e programados para matar também aproxima esses personagens de Michael Myers e a forma como ele se comporta em "Halloween"; ou seja, um verdadeiro autômato sem expressão, que caminha lentamente atrás de suas vítimas, mas sempre destruindo tudo o que vem pela frente e sem parar até alcançar seu objetivo. Curiosamente, os robôs de HALLOWEEN III lembram o pistoleiro robótico interpretado por Yul Brynner no clássico "Westworld - Onde Ninguém Tem Alma", e John Carpenter já declarou que este mesmo personagem foi a fonte de inspiração para o próprio Michael Myers!

Ainda no campo das semelhanças, a cena em que o Dr. Challis persegue o assassino que caminha lentamente pelos corredores desertos do hospital lembra a ambientação de "Halloween 2", os assassinos robóticos às vezes surgem da escuridão por trás dos personagens como Michael Myers nos outros filmes da série, e há até uma cena em que uma máscara jogada na lente de uma câmera de segurança cria um efeito muito parecido com a "visão em primeira pessoa" do jovem Michael na antológica sequência inicial de "Halloween"! 


Por último, mas não menos importante, vale destacar a fantástica trilha sonora composta pelo próprio John Carpenter em parceria com Alan Howarth. A música não deve em nada para o clássico tema composto para o "Halloween" original, dessa vez substituindo o piano do tema clássico de 1978 por sintetizadores. Inclusive é uma daquelas trilhas tão boas e climáticas que a gente até lamenta que só tenha sido usada uma vez...

Outros momentos sinistros envolvem o efeito sonoro tipicamente Carpenteriano (aquele "éééééééóóóóóónnnnn") sempre que um dos robôs de Cochran aparece de repente. Isso era garantia de diversos pulos de susto na minha infância, e certamente devem funcionar até hoje com quem for encarar HALLOWEEN III pela primeira vez.


Claro que não se pode falar sobre a música de HALLOWEEN III sem citar o inesquecível jingle da Silver Shamrock, repetido tantas vezes ao longo do filme que provoca uma verdadeira lavagem cerebral pela vida inteira. Composto em cima do ritmo de uma velha canção infantil chamada "London Bridge is Falling Down" (se não conhece, clique aqui), o jingle faz uma contagem regressiva para o Halloween, tipo "Two more days to Halloween / Halloween, Halloween / Two more days to Halloween / Silver Shamrock".

Publicitários do mundo inteiro deveriam estudar esse comercial fictício para aprender uma coisa ou outra, já que a música gruda na cabeça da vítim... ou melhor, espectador... durante décadas. (O diretor Wallace emprestou sua voz ao locutor do comercial, na parte em que ele anuncia: "It's almost time, kids").

"Eight more days to Halloween..."



E o que dizer das belas máscaras da Silver Shamrock? Aposto que todo mundo que viu o filme ainda criança sonhou em ter uma delas. São três modelos (uma bruxa, um esqueleto e a tradicional abóbora de Halloween, conhecida como "Jack O'Lantern" na gringa), todos eles produzidos pelo artista Don Post. A do crânio e a da bruxa já existiam e foram apenas adaptadas para o filme; somente a máscara da abóbora foi produzida especialmente para HALLOWEEN III. Nos EUA, essas máscaras chegaram a ser fabricadas em larga escala e vendidas na época de lançamento do filme, e inclusive vinham com o logotipo da Silver Shamrock! Acima, o leitor pode conferir um anúncio das máscaras numa velha edição da revista Fangoria de 1982. Hoje, alguns exemplares dessas máscaras ainda podem ser encontrados no E-Bay, ao preço médio de 50 dólares.

Concluindo, eu sempre achei HALLOWEEN III um filmaço injustiçado. Alguns críticos argumentam que ele seria melhor recebido se fosse lançado apenas com seu subtítulo "Season of the Witch" (no Brasil, "A Noite das Bruxas"), mas jura que você vai condenar uma produção inteira apenas pelo número no título? Dá um tempo, pô!

De minha parte, pelo menos, sempre defendi o filme, e lembro de ter comprado várias brigas por causa disso nos tempos das comunidades de cinema de horror no (quase finado) Orkut. Inclusive criei nessa rede social, só de birra, uma comunidade chamada "Eu Gosto de Halloween III", lá no longínquo ano de 2004. Nesta semana, quando fui checar, ainda havia 135 participantes no grupo!


A péssima recepção lá em 1982 representou um baque irrecuperável na carreira ascendente de Wallace. Tanto que ele ficou anos sem dirigir novamente, perdeu-se em produções para a TV e depois passou a assinar continuações fracas tipo "A Hora do Espanto 2" e "Vampiros 2 - Os Mortos" (sendo que esse último também é sequência de um filme de John Carpenter). Seu trabalho mais memorável, além deste terceiro "Halloween", é a minissérie de TV "It – Uma Obra-Prima do Medo" (1990), baseada no livro "A Coisa", de Stephen King.

Recentemente, HALLOWEEN III tem sido resgatado e reavaliado com outros olhos por uma nova geração, que, graças à internet, não compra mais gato por lebre e sabe que vai ver uma história independente sem Michael Myers. Tanto que há alguns anos, em 2010, o filme teve uma sessão especial em Los Angeles com a presença de Wallace, que ficou surpreendido com a quantidade de fãs da sua obra.


Até mesmo pesquisadores sérios têm se debruçado sobre a outrora maldita sequência e enxergado coisas que ninguém nunca viu antes. O historiador Nicholas Rogers, por exemplo, escreveu um livro chamado "Halloween: From Pagan Ritual to Party Night", onde defende HALLOWEEN III como um libelo anti-capitalista, já que a trama enfoca um homem de negócios bem-sucedido como vilão.

Nessa mesma pegada, o pesquisador Martin Harris apontou várias outras críticas ao sistema empresarial em seu artigo "You Can’t Kill the Boogeyman: Halloween III and the Modern Horror Franchise", como o fato de a Silver Shamrock ser uma megacorporação estrangeira (suas raízes são irlandesas) que se estabelece numa pequena cidade norte-americana, mas não emprega mão-de-obra local, e sim seus robôs importados com forma humana (que seriam uma metáfora à automatização do operário de fábrica, à la Charles Chaplin em "Tempos Modernos"). É mole?


Particularmente, eu acho uma pena que HALLOWEEN III tenha sido tão mal recebido lá atrás, na época do seu lançamento. Pois se esse aqui envolvia o genocídio de crianças através de máscaras de Dia das Bruxas, vocês já pararam para imaginar o que mais poderia sair das mentes de John Carpenter e Debra Hill nos próximos "Halloween" com histórias independentes que eles planejavam?

Não dá nem para imaginar, mas acredito que seriam histórias muito melhores do que o "mais do mesmo" que tomou conta da franquia. E certamente seríamos poupados de coisas como Michael Myers emo-chorão ("Halloween 5"), conspiração druida ("Halloween 6"), "Halloween" para a Geração "Pânico" ("H20") e Big Brother de Halloween ("Halloween, A Ressurreição").

PS: "A Colheita Maldita 3" (1995) plagiou vergonhosamente o plano de extermínio global da Silver Shamrock, apenas substituindo as máscaras de Dia das Bruxas por uma nova variedade de milho - mas com os mesmos "efeitos colaterais". Talvez o velho Cochran devesse mandar um dos seus advogados-robôs para conversar com esse pessoal aí...


Trailer de HALLOWEEN III



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Halloween III: Season of the Witch
(1982, EUA)

Direção: Tommy Lee Wallace
Elenco: Tom Atkins, Stacey Nelkin, Dan O'Herlihy,
Michael Currie, Ralph Strait, Jadeen Barbor, Nancy
Kyes, Jonathan Terry e Dick Warlock.

sábado, 21 de janeiro de 2012

REBELDES DA ACADEMIA (1980)


(Esta resenha é dedicada ao Raphael Fernandes, editor responsável - ou seria irresponsável? - por publicar a revista Mad no Brasil atualmente, pela Editora Mythos)

Fazer comédia parece fácil, mas só parece. Se você não prestar muita atenção a aspectos como roteiro e timing das piadas, vai acabar com um daqueles filmes em que apenas os realizadores parecem estar se divertindo pra caramba. Tipo a maioria das "comédias" do Will Ferrel e do Jack Black, ou 99% da produção do gênero no Brasil pós-Retomada - ou alguém realmente vê alguma graça nos longas do Casseta & Planeta e na série "Se Eu Fosse Você"?

Se um dia alguém quiser escrever uma cartilha sobre o que NÃO se deve fazer na hora de produzir uma comédia, eu sugiro usar REBELDES DA ACADEMIA como exemplo prático, talvez até colocando o DVD do filme como brinde na cartilha, já que esta é uma das "comédias" menos engraçadas já feitas.

E sabe o que é mais irônico? É que ela foi produzida por uma das mais brilhantes revistas humorísticas do mundo, a Mad!!!


Tudo começou com o estrondoso sucesso da comédia "Clube dos Cafajestes" (1978), dirigida por John Landis. Nos Estados Unidos, o filme se chama "National Lampoon's Animal House", e a National Lampoon era uma outra revista de humor concorrente da Mad, bastante popular nos anos 70.

Ao contrário do que se pensa, a revista não teve grande envolvimento na produção, e o fato de seu nome aparecer no título era apenas uma jogada de marketing, algo do tipo "National Lampoon apresenta...". Vários outros filmes trariam o nome da revista no título a partir de então, como a série "Férias Frustradas", que no original era "National Lampoon's Vacation"


"Clube dos Cafajestes" custou 3 milhões de dólares e rendeu 141 milhões só nas bilheterias norte-americanas. Logo, outros estúdios resolveram produzir comédias "apadrinhadas" por revistas humorísticas para ver se o raio caía duas vezes no mesmo lugar.

Era questão de tempo para que a Mad entrasse na jogada. Fundada em 1952 e publicada ininterruptamente desde então nos Estados Unidos, a Mad era a mais bem-sucedida das revistas do gênero no país - fez bastante sucesso também no Brasil, onde chegou na década de 70, ao contrário da National Lampoon, que nunca deu as caras por aqui.


A Warner entrou em contato com Bill Gaines, editor norte-americano da revista, pedindo que "emprestasse" seu título para uma comédia nonsense, para tentar faturar em cima do sucesso de "Clube dos Cafajestes". Tinha tudo para dar certo. Mas não deu.

Escrito por dois sujeitos vindos da TV, Tom Patchett (criador do seriado "ALF, o Eteimoso") e Jay Tarses, REBELDES DA ACADEMIA conta a história de quatro garotos-problema enviados por suas famílias para a Academia Militar Sheldon R. Weinberg.


Eles são Chooch (Ralph Macchio, molecão e em sua estréia no cinema), o filho de um mafioso; Hash (Tommy Citera), um garoto árabe e cleptomaníaco; Ike (Wendell Brown), jovem negro filho de um tele-evangelista, e que está se relacionando com a madrasta, e Oliver (Hutch Parker), filho de um importante político que concorre à reeleição, e que resolve mandar o garoto para o quartel na expectativa de que ele pare de criar problemas que ameacem sua candidatura.

Na academia, o quarteto vai comer o pão que o diabo amassou nas mãos do Major Vaughn Liceman (Ron Leibman, de "Matadouro Cinco"), aquele típico comandante sádico, embora atrapalhado, que gosta de transformar a vida dos recrutas num inferno - espécie de embrião para o Comandante Harris da série "Loucademia de Polícia".


Antes de mais nada, esqueça que REBELDES DA ACADEMIA se passa numa academia militar. Diferente da já citada franquia "Loucademia de Polícia", em que a ambientação justificava as piadas com o modo de vida militar e o duro treinamento dos cadetes, aqui tanto faz o fato de a trama se passar num quartel, considerando que raríssimas vezes o roteiro se aproveita do cenário - a mesma trama poderia se passar numa faculdade de engenharia ou num campo de treinamento de terroristas do Al-Qaeda sem grandes modificações.

Acompanhe: ao invés de criar piadas sobre o rigor da rotina militar, a exemplo do que filmes como "Recrutas da Pesada" e "Loucademia de Combate" fariam alguns anos depois, REBELDES DA ACADEMIA prefere enfocar o conflito de um dos jovens (Oliver) com o Major Liceman, que inexplicavelmente se apaixona pela namorada do garoto, Candy (a gracinha Stacey Nelkin, de "Halloween 3"). Claro, numa daquelas forçadas de barra tremendas de roteiro ruim, Candy também foi enviada para uma escola militar feminina, e que fica a apenas alguns metros daquela que o namoradinho frequenta!


Só para dar uma ideia do nível geral das piadas, a academia também tem um professor gay de dança (Tom Poston) e uma professora gostosa (a Sra. Ringo Starr Barbara Bach, de "A Ilha dos Homens-Peixe") que leciona sobre armamentos usando expressões de duplo sentido que envergonhariam até a equipe de roteiristas do programa Zorra Total. Peraí: professor gay de dança e professora gostosa de armamentos numa academia militar??? Pois é...

Ah, quase esqueci de comentar que o diretor do local é o Comandante Causeway (Ian Wolfe, de "THX 1138"), um velhote que sempre solta um sonoro e fedorento peido toda vez que aparece em cena. Deu para sacar o nível das "piadas"? Nem colocando uma claque estilo Chaves alguém riria dessas coisas!


Além da dupla de roteiristas, um dos grandes culpados por esta catástrofe é o diretor Robert Downey, pai de um certo Robert Downey Jr. (o próprio Homem de Ferro). Downey Pai nunca foi um cineasta brilhante, mas em REBELDES DA ACADEMIA ele se superou: com sua mão pesada e falta de ritmo, o sujeito consegue estragar até as poucas piadas que PODERIAM ter ficado engraçadas!

Uma coisa que nem Downey Pai e nem os roteiristas Patchett e Tarses entenderam é que o humor da revista Mad era essencialmente visual e nonsense, e não tanto verbal. Infelizmente, não é o que se vê no filme, que abusa dos trocadilhos intraduzíveis (o nome "Hash", por exemplo, é uma gíria em inglês para maconha) e expressões de duplo sentido no nível do Pânico na TV.


Produções posteriores roteirizadas e dirigidas pelo trio Jim Abrahams e David e Jerry Zucker, como "Apertem os Cintos, O Piloto Sumiu", "Top Secret" e "Corra que a Polícia Vem Aí!", fazem este tipo de humor nonsense estilo revista Mad de maneira muito mais eficiente, tanto que seria mais fácil aceitar um "Mad Magazine Presents Top Secret" do que esta patuscada aqui...

Algumas raras piadas visuais em REBELDES DA ACADEMIA, só para dar uma ideia: a banda que canta num baile na academia (não pergunte...) é tão desafinada que quebra todos os vidros no recinto e até o próprio quadro do filme; as aparições do vilanesco Major Liceman são sempre precedidas de uma sonora ventania e pelos acordes de "Gimme Danger", de Iggy Pop & The Stooges; e o cachorro de Liceman também usa farda militar, num plágio descarado do cão do Sargento Tainha nos quadrinhos do Recruta Zero! Risadas amarelas ecoam pela sala de cinema ou da casa.


O Major Liceman também tem o irritante hábito de fazer os recrutas repetirem dezenas de vezes a mesma resposta gritando "Say it again! Say it again!", e isso deveria ser engraçado. Pelo menos na cabeça dos realizadores.

Talvez alguém possa considerar um ponto positivo o fato de o filme não ter medo de ser "politicamente incorreto". Há piadas bem fortes (para os padrões atuais) sobre negros, árabes e homossexuais, uma tirada envolvendo um aborto forçado e ainda a sugestão de um romance entre a professora gostosa e um dos garotos, Ike. Mas o mau gosto não salva o conjunto.


No roteiro, inclusive, a relação entre Ike e a professora era ainda mais erotizada, com direito a cenas de nudez (quando o garoto espiava a mulher tomando banho) e sexo. Mas essa subtrama foi cortada quando os produtores acharam que era pegar pesado demais!

Assim, REBELDES DA ACADEMIA é um daqueles exemplos constrangedores de comédia em que você ri mais da vergonha alheia, da falta de graça e do filme em si do que das piadas - até porque raríssimas piadas são realmente novas, chegando-se ao cúmulo de mostrar um homem travestido com roupas íntimas femininas como se fosse a coisa mais engraçada do mundo.


Enfim, o resultado é tão ruim, mas TÃO ruim, que um dos atores principais, Ron Leibman, exigiu que seu nome fosse retirado dos créditos, prevendo o fiasco que seria quando a bomba chegasse aos cinemas. Curiosamente, ele não fez a mesma coisa com o igualmente constrangedor "Rhinestone - Um Brilho na Noite", de Bob Clark!

Os próprios editores da Mad ficaram tão desencantados quando o filme estreou que publicaram um editorial na revista desculpando-se com seus leitores pelo fiasco da obra - e, diz a lenda, o editor Bill Gaines respondeu pessoalmente a cada carta enviada que reclamasse da qualidade do filme.


Além disso, Gaines pagou caro (30 mil dólares, à época) para eliminar toda e qualquer referência à revista no filme e no seu material de divulgação quando ele fosse lançado em VHS ou exibido na televisão.

Porque, originalmente, REBELDES DA ACADEMIA se chamava "Mad Magazine Presents Up the Academy", na linha de "National Lampoon's Animal House", mas acabou só "Up the Academy" no vídeo. As aparições do mascote da revista, Alfred E. Neuman (aquele garotinho sardento e banguela, que ganha vida com efeitos de maquiagem do mestre Rick Baker!), também foram retiradas da edição.

Em entrevista publicada em 1983, Bill Gaines tentou justificar a ruindade do filme. Segundo ele, a Warner enviou para a redação da revista um roteiro ruim para um filme que teria o nome "Mad apresenta" no título.


Gaines e sua equipe recusaram e o próprio time de redatores da revista escreveu um roteiro para o filme, mas dessa vez foram os produtores que não gostaram. No final, a Warner fez um remendão com ideias de um e de outro roteiro, mas sem acatar as várias sugestões feitas posteriormente pela equipe da Mad.

"Paguei 30 mil para a Warner tirar o nome da Mad das versões para o mercado doméstico, e foram 30 mil bem investidos!", declarou Gaines nesta entrevista. Demonstrando humildade, a Mad também publicou uma das suas populares sátiras de filmes com o próprio REBELDES DA ACADEMIA (veja abaixo), fazendo graça da ruindade da obra, e em apenas duas páginas (a sátira termina com uma troca de bilhetes entre os desenhistas e o editor, reclamando que o filme era péssimo demais até para ser satirizado!).


Como sempre acontece com produções tão ruins e problemáticas, REBELDES DA ACADEMIA ganhou um ar de "filme de culto", com débeis mentais promovendo sessões justamente para espinafrar a falta de graça do negócio.

Nos anos 1990, depois da morte do editor Gaines, a Warner colocou de volta todas as referências à Mad para exibições do filme na TV a cabo e no seu relançamento em DVD. O pobre Gaines deve estar se revirando no túmulo...


Agora, se há algo de bom em REBELDES DA ACADEMIA é a sua trilha sonora. Inclusive a trilha é tão boa que chega a ser ofensivo que tenha sido utilizada num filme tão ruim. Começa já com a ótima música dos créditos iniciais, "Kicking Up A Fuss", do Blow-Up (clique para ouvir), repetida até cansar ao longo do filme; tem o já citado The Stooges, mais "Night Theme" (Iggy Pop), "X Offender" e "One Way Or Another" (Blondie), "Yes Sir, No Sir" (The Kinks), "Street Hassle" (Lou Reed), "Bad Reputation" (Sammy Hagar), entre outras. Ou seja, a bagaça vale mais pela música do que por qualquer outra coisa!

Se a National Lampoon continua "apresentando" filmes até hoje (alguns tão ruins quanto REBELDES DA ACADEMIA, ou piores!), o pessoal da Mad aprendeu a lição e nunca mais emprestou seu nome para nenhuma outra presepada do gênero, embora tenham produzido o seriado televisivo "MADtv" (uma espécie de TV Pirata lá dos EUA) entre 1995 e 2009.


Para dar uma ideia de como o episódio maculou a imagem da revista, imagine um equivalente aqui no Brasil: "Chiclete com Banana Apresenta Muita Calma Nessa Hora", ou "Geraldão Apresenta Os Normais 2". Não é de cortar os pulsos?

Por tudo isso, torna-se irônica uma das imagens mais populares do mascote da Mad, Alfred Neuman, que é aquela em que ele se questiona: "Eu, me preocupar?". Bem, caro Neuman, no caso da ruindade de REBELDES DA ACADEMIA e do estrago que isso provocou na imagem da sua revista, eu me preocuparia sim. E muito!

"Say it again!"

"Say it again!"

"Say it again!!!"


PS: Um Robert Downey Jr. ainda moleque faz uma ponta como um dos garotos que joga futebol com a turma da academia lá pela metade do filme.

Trailer de REBELDES DA ACADEMIA



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Mad Magazine Presents Up the Academy (1980, EUA)
Direção: Robert Downey
Elenco: Ralph Macchio, Wendell Brown, Tommy Citera,
Hutch Parker, Ron Leibman, Barbara Bach, Ian Wolfe,
Tom Poston, Stacey Nelkin e Antonio Fargas.