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terça-feira, 27 de novembro de 2012

VOU, MATO E VOLTO (1967)


Na versão em italiano do clássico "Três Homens em Conflito" (1966), de Sergio Leone, há um diálogo em que Tuco (Eli Wallach) diz ao personagem de Clint Eastwood: "Vado, l'ammazzo e torno" (em bom português, "Vou, mato e volto"). A frase infelizmente se perdeu na dublagem em inglês (que virou "I get dressed, I kill him and be right back"), mas sua versão em italiano é tão boa que, diz a lenda, Leone pretendia fazer um filme justamente com este título, "Vado, L'ammazzo e Torno". Só que um jovem diretor chamado Enzo G. Castellari saiu na frente e, já no ano seguinte (1967), lançou seu próprio VOU, MATO E VOLTO!

Castellari não apropriou-se do título de Leone por acaso: seu western é uma homenagem declarada e também uma tiração de sarro com "Três Homens em Conflito": enquanto o clássico de Sergio Leone contava a história de três pistoleiros que se ajudavam e se enganavam mutuamente na caçada a um tesouro enterrado num cemitério, em VOU, MATO E VOLTO outros três pistoleiros igualmente se ajudam e se enganam o tempo inteiro na caçada a um tesouro escondido num velho convento, e com várias referências a Sergio Leone!


Confesso ao leitor que não gostei muito do filme quando vi pela primeira vez. Talvez porque, devido ao título sensacional, eu esperasse por algo mais sério e violento - afinal, é um filme de Enzo Castellari, o "Sam Peckinpah italiano"! Pode ser que eu esperasse a marca registrada do velho Enzo - a câmera lenta nas cenas de ação -, esquecendo que, àquela altura, o homem ainda estava começando e definindo um "estilo".

Poranto, o resultado ficou longe do que eu esperava: VOU, MATO E VOLTO segue uma linha mais cômica e absurda, sem se levar muito a sério, embora nada tão exagerado quanto nos filmes da dupla Terence Hill e Bud Spencer. Foi só recentemente que eu o revi como o que ele realmente é (uma sátira de "Três Homens em Conflito"), e passei a gostar da brincadeira.


O filme já começa com uma introdução antológica que dá o tom da inteligente tiração de sarro de Castellari, quando vemos três pistoleiros mal-encarados entrando numa cidadezinha. Até aí, nada de novo: quantos westerns spaghetti começam do mesmíssimo jeito? A diferença é que o trio de mal-encarados é formado por sósias do "Homem Sem Nome" interpretado por Clint Eastwood na Trilogia do Dólar (inclusive vestido com o mesmo poncho), do Coronel Mortimer interpretado por Lee Van Cleef em "Por uns Dólares a Mais" e do Django interpretado por Franco Nero!

Logo, o trio de ilustres valentões do western spaghetti cruza com uma carroça levando três caixões. Eles abordam seu condutor e perguntam quem são os mortos. Um homem que acompanha o cortejo fúnebre fala três nomes, e os pistoleiros se apavoram: "Mas somos nós!". Antes que possam se recuperar do susto, são impiedosamente abatidos por tiros certeiros do homem misterioso, que na verdade é um caçador de recompensas conhecido como The Stranger, (ou "Forasteiro", nas legendas brasileiras)!


Ou seja, VOU, MATO E VOLTO já começa mostrando que seu personagem principal é tão fodão que, numa tacada só, despacha "Clint Eastwood", "Lee Van Cleef" e "Franco Nero"! O Forasteiro é um dos primeiros grandes papeis de George Hilton, um uruguaio de Montevideo que foi para a Europa para ser astro de cinema. Antes, Hilton foi "007" numa comédia chamada "Dois Mafiosos contra Goldfinger" (!!!) e parceiro de Franco Nero no excelente "Tempo de Massacre", dirigido por Lucio Fulci. Depois, ele interpretaria Sartana (em imitações sem relação com a franquia oficial), Allelujah e Tressette (outros pistoleiros menos conhecidos que tiveram direito a duas aventuras cada),

O Forasteiro revela ao condutor da carruagem - e ao espectador - que sua próxima missão é sair atrás do bandidão mexicano Monetero (GIlbert Roland), cuja cabeça vale uma fortuna. Na versão original em italiano, o caçador de recompensas até usava a clássica sentença de "Três Homens em Conflito" que dá título ao filme, "Vado, l'ammazzo e torno", e que também foi arruinada aqui na dublagem em inglês, transformando-se numa outra frase de efeito qualquer ("Pode apostar seu último centavo que vou pegá-lo"). O que leva alguém a estragar pela segunda vez uma sentença tão clássica? Bem, talvez porque, nos Estados Unidos, VOU, MATO E VOLTO foi rebatizado com um título genérico, "Any Gun Can Play".


A nova empreitada do caçador de recompensas não será tão simples quanto o trio de valentões da introdução: Monetero e sua quadrilha estão se preparando para roubar um trem escoltado por soldados fortemente armados, e que transporta a fortuna de 300 mil dólares em moedas de ouro. Além dos soldados, segue com o comboio o próprio Forasteiro e um banqueiro chamado Clayton, preocupadíssimo com a possibilidade de a grana ser roubada durante a viagem.

O almofadinha é interpretado pelo norte-americano Edd Byrnes, que foi um grande astro da TV norte-americana entre 1958 e 1964 graças à sua atuação como coadjuvante "77 Sunset Strip", chegando a receber 15 mil cartas de fãs por semana! Mas a série acabou, Byrnes caiu no ostracismo e foi para a Europa estrelar westerns, como este.


O aguardado assalto finalmente acontece: os homens de Monetero atacam o trem, matam vários soldados e fogem com o vagão contendo a fortuna. Mas um dos capangas do vilão, Pajondo (Ignazio Spalla, de "O Dólar Furado"), foge com a fortuna. Ele a esconde em local ignorado e tenta cruzar a fronteira do México, mas é morto pelo exército durante a fuga. Monetero consegue recuperar um medalhão usado pelo traidor, a única pista para a localização do tesouro, mas acaba sendo preso.

Na cadeia, o banqueiro Clayton pressiona o comandante para que faça Monetero abrir o bico, sem saber que o bandidão também desconhece o local onde a fortuna foi desconhecida, tendo o medalhão de Pajondo como "mapa" que não consegue decifrar. Logo, Monetero recebe em sua cela a visita do Forasteiro, vestido como padre. O caçador de recompensas concorda em ajudar o bandido a escapar para ajudá-lo na caça ao tesouro. Ganha metade do medalhão como garantia e põe em prática um ousado plano de fuga.


Mas é a partir da fuga de Monetero da cadeia que as coisas começam a se complicar. O bandido trai o Forasteiro, rouba de volta a segunda metade do medalhão e parte sozinho em busca do tesouro. Já o almofadinha Clayton revela ter papel fundamental na trama e também sai na caça à fortuna. Lá pelas tantas, também aparece um novo interessado no tesouro, um agente de seguros que está tentando rastrear a bolada para não ter que pagar a indenização ao banco de onde os 300 mil foram roubados!

Sabe aqueles filmes onde nada é o que parece ser? Pois VOU, MATO E VOLTO segue nessa linha: exagerando ainda mais o que já acontecia em "Três Homens em Conflito", a relação entre os três personagens principais nunca é totalmente explicada ao espectador e só fica clara no final, depois que um já traiu o outro pelo menos dez vezes. E é tanta traição e mudança de lado que no final, ao ser abandonado pela amante (que também se revela uma traidora), um dos protagonistas diz, com a maior calma do mundo: "Que diferença faz? Ninguém mais está sendo sincero mesmo!".


O roteiro do filme foi assinado por três pessoas: Castellari, seu colaborador habitual Tito Carpi e Giovanni Simonelli, baseados numa história original de Romolo Guerrieri e Sauro Scavolini. Talvez tanta gente envolvida tenha contribuído para a bagunça que é o roteiro, com o trio de personagens centrais mudando de lado o tempo todo motivados pela cobiça, lembrando vagamente outro clássico: "O Tesouro de Sierra Madre", de John Huston.

Em um momento, o Forasteiro ajuda Monetero ao invés de matá-lo e embolsar a recompensa, mas acaba sendo traído por ele; depois, Clayton ajuda o Forasteiro, mas apenas para depois revelar estar do lado do bandidão Monetero desde o começo; finalmente, os arquiinimigos Monetero e Forasteiro se unem contra Clayton, mas a escalada de traições está longe de terminar. É tanto "muda para um lado / muda para outro" que lá pelas tentas o espectador até desiste de tentar entender as motivações dos personagens.


Mas isso me incomodou muito mais na primeira vez que vi VOU, MATO E VOLTO do que na revisão. Conhecendo a proposta e a dinâmica do filme, fica muito mais fácil encará-lo como o divertido passatempo que é do que numa primeira assistida, quando o excesso de voltas e reviravoltas chega a irritar o espectador.

O filme começa violento, com dezenas de mortes no ataque ao trem; mas o segundo ato é mais leve e puxado para a comédia-pastelão, com piadinhas inocentes (tipo a cena em que Forasteiro usa apenas sua roupa de baixo vermelha, lembrando o uniforme do Super Pateta nos quadrinhos!) e pancadarias exageradas ao estilo Terence Hill e Bud Spencer, com heróis e vilões destruindo cenários inteiros durante a troca de pancadas (a briga numa casa de banho é especialmente inspirada nesse quesito, já que os protagonistas destróem o lugar enquanto brigam).


Finalmente, no último ato, parece que as coisas voltarão a ser tão violentas quanto no começo. O desfecho da caçada ao tesouro envolve um momento, dentro de uma igreja abandonada, que remete à conclusão de "Três Homens em Conflito": um tiroteio triplo envolvendo o Forasteiro, Monetero e Clayton, mas com um desfecho bem diferente, comprovando que Castellari e cia. só queriam brincar com o clássico de Leone, e não recriá-lo.

No conjunto, VOU, MATO E VOLTO é diferente do que o diretor Castellari faria depois. Ainda não aparecem suas marcas registradas nos trabalhos posteriores - a câmera lenta e a violência explícita e exagerada -, mas o próprio Sam Peckinpah, que inspirou o estilo do diretor italiano, ainda estava refinando a sua técnica nessa época.


Mas já dá para perceber umas belas sacadas que comprovam o talento de Castellari ainda em seus primeiros filmes (ele tinha 29 anos quando fez VOU, MATO E VOLTO). Por exemplo, é interessante como o diretor usa, em diveras cenas, o recurso do revólver em primeiro plano apontando para outros personagens, como se a visão da câmera fosse a do próprio espectador (lembrando até aqueles jogos em primeira pessoa que se tornariam populares a partir da década de 1990, como "Doom" e "Quake").

Outro momento visualmente inspirado é aquele em que Clayton, durante o jantar, percebe a aproximação de inimigos armados e derrama a taça de vinho sobre a mesa, para poder enxergar o reflexo dos seus agressores na poça da bebida!


E o Forasteiro... que personagem bem bolado! Chega a ser um desperdício que não tenha sido aproveitado em outras aventuras. O caçador de recompensas implacável, mas também fanfarrão e piadista, que se disfarça de coveiro e de padre para enganar os rivais e leva sempre consigo uma verdadeira galeria de cartazes de recompensa com seus "alvos", é a melhor coisa de VOU, MATO E VOLTO.

A exemplo do personagem de Clint Eastwood na "Trilogia do Dólar", o Forasteiro de George Hilton não tem nada de heróico: é um amoral que só pensa no próprio nariz e no dinheiro que vai ganhar. Na cena do assalto ao trem, por exemplo, ele tem a chance de matar Monetero, mas desiste e prefere esperar que aumentem a recompensa pela cabeça do vilão graças ao assalto!

Em outro momento, o Forasteiro passa tranquilamente pelo cadáver de um bandido traído pelo seu comparsa, dá uma conferida no cartaz de recompensa pela cabeça do dito cujo e chega à conclusão de que o dinheiro recebido não vale o esforço de carregar o corpo do finado até o xerife!


Não dá para deixar de citar a música, composta pelo mestre Francesco De Masi (que só pisa na bola com o "tema humorístico" que criou para as cenas de pancadaria), e a presença da bela ruiva Stefania Careddu, aqui usando o nome artístico "Kareen O'Hara", e que é um raro colírio para os olhos numa trama predominantemente masculina.

Infelizmente, embora a moça tenha sido apresentada com destaque no trailer do filme, talvez com a intenção de transformá-la numa nova estrela do gênero, a italianinha nunca alçoou maiores voos, voltando no western seguinte de Castellari, "Deus Criou o Homem e o Homem Criou o Colt" (1968), e então mergulhando direto para o esquecimento.


Claro, VOU, MATO E VOLTO não deve ser levado muito a sério, e está mais para uma história em quadrinhos do que para uma trama realista. Além das múltiplas traições difíceis de engolir, também tem o inexplicável detalhe do tal medalhão que leva ao tesouro: por que diabos o bandido que escondeu o ouro carrega aquele medalhão consigo como pista para a sua localização, se foi ELE MESMO quem escondeu o dinheiro e sabe muito bem onde está? Será que ele tinha medo de esquecer onde escondeu uma fortuna? Por que se arriscar a revelar a localização levando o medalhão como mapa? Óbvio que se não existisse o medalhão não existiria mapa e nem caça ao tesouro, e o filme terminaria no momento em que o bandido que escondeu o ouro fosse morto; mas os roteiristas poderiam ter pensado numa explicação melhor para justificar o negócio!

(O medalhão ou mapa dividido em partes que pertencem a personagens diferentes, e que precisam ser reagrupados para indicar a localização da fortuna, é um dos grandes clichês do cinema de aventura e também de muitos filmes de faroeste, o que de certa maneira explica a sua reutilização aqui.)


Mas não se engane: ainda que o filme seja bem divertido e funcione, a melhor coisa ainda é o título VOU, MATO E VOLTO, que rivaliza com aquele que eu acho o melhor título de western spaghetti de todos os tempos, "Deus os Cria... Eu os Mato!". Em seus trabalhos seguintes no gênero, Castellari tentou recriar algo tão sonoro diversas vezes ("Vou, Vejo e Disparo", "Mate Todos Eles e Volte Só"), mas sem sucesso.

Com os sucessivos lançamento e relançamentos ao redor do mundo, a obra ganhou diferentes títulos, mas nenhum tão bom quanto o original. Na Alemanha, por exemplo, foi lançado como se fosse uma aventura da série "Django" - e o personagem de Hilton, ao invés de se chamar Forasteiro, acabou sendo rebatizado como Django! Outros títulos alternativos são "Blood River", "Glory, Glory Hallelujah" e "For a Few Bullets More".


No Brasil, o filme foi originalmente lançado como VOU, MATO E VOLTO em vídeo pela extinta Century (boa!), mas depois relançado em DVD por diversas distribuidoras, inclusive pela famigerada London/Works com um título genérico, "Terra Sem Lei".

Engraçado é que nenhum dos DVDs nacionais ou estrangeiros têm a versão completa do filme, com 105 minutos, trazendo apenas a versão internacional de 98 minutos. Parece que a versão completa passou apenas na TV alemã. Estes sete minutos a mais explicam melhor a história e o relacionamento entre os personagens.



Ah, os brasileiros também puderam conferir a obra de Castellari numa outra mídia: a fotonovela! Acontece que, nos anos 70, a Rio Gráfica Editora resolveu explorar o fascínio do público brasileiro pelo western spaghetti com a revista "Ringo", que publicava versões em fotonovela de filmes como "…E per Tetto un Cielo di Stelle" e "Um Trem para Durango".

A "fotonovelização" de VOU, MATO E VOLTO saiu no número 8 da revista, em 1971, rebatizando o Forasteiro como "Greenfield" e com um quadro de texto moralista no último quadrinho, explicando o que, segundo o cara que fez a adaptação, teria acontecido aos personagens: "Nenhum deles aproveitou o ouro, que o banco recuperou, algum tempo depois, quase inteiramente. Clayton e Monetero foram fuzilados pelos soldados, e Greenfield sucumbiu pouco depois, vítima de um acidente de trabalho, quando caçava um fora-da-lei"!!! Todos os exemplares da "Ringo" hoje são autênticas raridades.

PS: Uma das lendas não-confirmadas sobre o filme é que o papel tão bem interpretado por George Hilton teria sido inicialmente oferecido a um certo ator norte-americano chamado... Charles Bronson! Mas o lendário astro teria recusado a proposta, como já havia feito ao ser convidado por Sergio Leone para estrelar "Por Um Punhado de Dólares". No ano seguinte (1968), Bronson estrelaria a obra-prima "Era Uma Vez no Oeste".


Trailer de VOU, MATO E VOLTO



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Vado... L'ammazzo e Torno / Any Gun Can Play
(1967, Itália)

Direção: Enzo G. Castellari
Elenco: George Hilton, Edd Byrnes, Gilbert Roland,
Stefania Careddu, Gérard Herter, Ignazio Spalla,
Ivano Staccioli, Salvatore Borghese e Rocco Lerro.


* E a quem interessar possa, eis a lendária capinha do VHS brasileiro do filme, uma das mais bonitas que já vi, e que infelizmente foi substituída por artes mequetrefes e photoshopadas nas versões lançadas em DVD, tanto aqui como lá fora (clique para ampliar).

quarta-feira, 4 de julho de 2012

GUERREIROS DO FUTURO (1983)


Quem viver, verá: o mundo será destruído, nos próximos anos, por uma gigantesca explosão nuclear, e em 2019 os sobreviventes desta tragédia precisarão se adaptar à vida em um planeta árido e semi-destruído. Neste ano, os edifícios e as cidades se transformaram em escombros e a face da Terra virou um enorme deserto, mas, milagrosamente, todos os automóveis estão em perfeitas condições e, pelo jeito, os postos de gasolina continuam funcionando, já que ninguém nunca fica sem combustível. Neste mundo do futuro, o maior desafio não será a falta de água ou de comida, nem a radiação da atmosfera, mas sim um grupo de mercenários frutinhas, com fetiche por ombreiras enormes e um bizarro ritual de iniciação, que varrem o deserto aniquilando os sobreviventes do holocausto sem motivo.

Assim será o nosso futuro, pelo menos na visão do cineasta italiano Enzo G. Castellari e seu irresistível trash movie "I Nuovi Barbari", lançado duas vezes no Brasil: pela Jota Home Vídeo como GUERREIROS DO FUTURO (adotaremos este nome a partir de agora) e pela Sagres como "2019 - Os Bárbaros do Futuro".


Como fã de podreiras e filmes bagaceiros, toda noite, antes de dormir, eu rezo uma Ave-Maria para o cineasta George Miller, aquele australiano que dirigiu a trilogia "Mad Max". Afinal, Miller não só deu ao mundo do cinema dois filmaços (o terceiro é fraco), mas também originou toda uma série de clones e imitações baratas feitas no mundo inteiro, do Brasil às Filipinas!

E foi na Itália que a estética "pós-nuclear" fez mais sucesso, talvez por serem produções razoavelmente baratas: não era necessário construir cenários, pois bastava usar sets semi-destruídos de outras produções; nem era necessário gastar em figurinos, pois bastava usar roupas rasgadas e sobras de outros filmes.


De uma vez só, entre 1982 e 84, pipocaram diversos filmes de ação apocalípticos na Terra da Bota, como "O Exterminador do Século 3000", "O Guerreiro do Mundo Perdido", "O Executor Final" e este GUERREIROS DO FUTURO, que é, disparado, um dos melhores (ou pelo menos mais engraçados) da safra.

O responsável pela brincadeira, Castellari, acabava de sair de uma pendenga judicial que tirou dos cinemas americanos sua produção anterior, "O Último Tubarão" (1981), acusado de ser "muito parecido" com o "Tubarão" de Spielberg. Aparentemente com um orçamento precário, que transparece o tempo inteiro na tela, o diretor fez de GUERREIROS DO FUTURO uma aventura esquisita, barata e involuntariamente cômica.


Eu nunca consegui entender até que ponto o roteiro (assinado por Castellari, Tito Carpi e Antonio Visone) é sério ou sátira ao subgênero, mas uma coisa é certa: este é um dos filmes mais gays da história. Esqueça "Top Gun", esqueça "A Hora do Pesadelo 2", esqueça Rocky e Apollo correndo e se jogando água na praia em "Rocky 3", pois aqui o nível de baitolagem é da pesada!

GUERREIROS DO FUTURO já começa a mil: nos créditos iniciais, a explosão de uma maquete super-tosca em cartolina representa o suposto fim do mundo. Na minha opinião, porém, o verdadeiro fim do mundo é o tenebroso tema de sintetizador que toca na abertura, composto pelo mestre Claudio Simonetti (sim, o ex-Goblin, em dia de dor de barriga)!


Imediatamente após os créditos, vemos alguns escombros, esqueletos (um deles veste uma bizarra roupa feminina com um espaço transparente para colocar os peitos!!!) e um letreiro informativo: "2019 A.D. - O holocausto nuclear terminou".

Dali, a câmera de Castellari corta imediatamente para uma colônia de sobreviventes do fim do mundo - na verdade, um mero acampamento com carros velhos e tendas -, onde um operador de rádio tenta encontrar sinais em ondas curtas. Os tais sobreviventes, pelas roupas e bigodões, parecem figurantes saídos de algum filme barato sobre a Segunda Guerra Mundial - tem até um velho vestido como coronel nazista!!!


Quando o operador de rádio finalmente detecta um sinal distante, prova irrefutável de que há gente transmitindo de algum lugar ali perto, o tema de sintetizador recomeça e surgem os vilões do filme, os tenebrosos Templários!

Os Templários são malvados, vestem-se de branco dos pés à cabeça, com umas ombreiras enormes tipo jogador de futebol americano, e suas roupas estão sempre limpinhas (apesar de viverem num mundo pós-apocalíptico sem máquina de lavar nem Omo). São revoltadinhos provavelmente por causa de suas roupas abichonadas, de seus cortes de cabelo grotescos e de seus carros fuleiros, porque todo mundo no filme possui carrões envenenados, mas eles dirigem umas latas-velhas que parecem aqueles velhos buggies de praia - e, ao invés de barulho de motor, emitem um som xarope tipo "bzzzzzzzzz".


Dentro da sua "missão sagrada" de exterminar todos os sobreviventes do holocausto, os malvados atacam o acampamento com suas armas que disparam laser e seus carrinhos fuleiros, mas cheios de acessórios à la James Bond. Um deles tem até uma hélice circular, tipo ventilador, que surge na lateral para decepar cabeças de imbecis que tentam fugir correndo - arma que seria completamente inútil se alguma das vítimas tivesse a inteligência de DEITAR no chão para escapar por baixo da maldita hélice!

Você sabe que está vendo um filme de Enzo G. Castellari quando, por piores que sejam os efeitos e figurinos, as cenas de ação - extremamente violentas - acontecem todas em câmera lenta, mostrando em detalhes pessoas caindo fulminadas por tirambaços ou explodidas em pedacinhos sangrentos, além de dublês virando cambalhotas, atirados ao ar por explosões!


O líder dos Templários é um gigante chamado One, interpretado por ninguém menos que George Eastman (nome de batismo: Luigi Montefiori), o assassino canibal de "Antropophagous" e vilão em incontáveis produções italianas do período. One passa o filme todo dando discursos sem pé nem cabeça que, teoricamente, justificam a matança injustificada perpetrada pelo seu grupo. Ao rasgar no meio uma Bíblia encontrada no acampamento dos ex-sobreviventes, por exemplo, ele declara, filosófico: "Livros... Foi isso que começou o Apocalipse"!

O que importa é que pelo menos os próprios Templários seguem fielmente o seu mestre, e parecem entender seus discursos desconexos, já que vibram e gritam "One! One!" em uníssono após cada abobrinha dita pelo seu líder.


One tem um braço direito, um frescão chamado Shadow, que fica uma gracinha com seu cabelo comprido amarrado em cima da cabeça num coque, tipo uma bailarina anabolizada - e é interpretado por Thomas Moore, ou Enio Girolami, irmão do diretor Castellari, pagando mico provavelmente em consideração aos laços familiares.

Ah sim: One também tem um "queridinho" entre seus soldados, Mako (Massimo Vanni), com corte de cabelo moicano e tudo mais. "Você mima ele demais!", queixa-se um ciumento Shadow, mas o líder quer Mako como seu sucessor - ou namorado, tire suas próprias conclusões. E a baitolagem está só começando...


Mas os Templários não perdem por esperar: eis que naquele mundo devastado também existe um valente guerreiro pós-apocalíptico chamado Mad Max... ou melhor, Scorpion! E interpretado por Timothy Brent (nome de batismo: Giancarlo Prete), um dos grandes nomes do cinema de ação oitentista carcamano, que apareceu também em "Tornado" e "Fuga do Bronx".

Scorpion, na verdade, é um projeto de herói: odeia os Templários, mas nunca fica claro se já foi um deles ou se era ex-namorado de One; veste uma justíssima calça de couro marrom com uma proteção ultra-gay sobre o saco, amarrada com o que parece ser um fio-dental que passa pela bunda; usa também um casaco de pele com duas ombreiras extra-large (será uma herança dos seus tempos como Templário?), e dirige um velho Dodge Charger com um crânio prateado na lataria e uma enorme abóboda de vidro (plástico?) no teto, lembrando tanto um disco voador quanto um carro alegórico de alguma escola de samba de quinta categoria!


Ah, vale destacar que o carrão de Scorpion é ainda mais incrementado que os carrinhos dos Templários. Aliás, dá um banho no Batmóvel, no Aston Martini do James Bond e no carro do Stallone Cobra JUNTOS.

Acompanhe: além da abóboda de vidro no teto, do crânio na lataria e de canos prateados que saem misteriosamente das laterais e não têm nenhuma finalidade específica, o carrão tem um painel repleto de botões coloridos, que Scorpion usa para fazer praticamente TUDO. Um botão abre o capô, outro abre as portas, outro faz a porta do lado do motorista voar para longe do carro quando um vilão gruda uma bomba na dita cuja, outro dispara mísseis, e por aí vai.


E como todo carrão tem que ter sonzeira, Scorpion também tem um rádio - que não toca nem fitas nem CDs, mas uns moderníssimos cubinhos de plástico que são a mídia digital do futuro. Isso mesmo, amiguinhos: Castellari previu o pen drive!

Em sua primeira aparição no filme, Scorpion detona meia dúzia de saqueadores que estavam roubando o que sobrou daquele acampamento destruído pelos Templários. Encontra um sobrevivente em estado lamentável (interpretado pelo diretor Castellari, em participação especial), e dá um tiro no homem para poupar-lhe do sofrimento, transformando-o também em ex-sobrevivente.


Depois, o herói dá uma passada em sua "oficina mecânica pós-apocalíptica", um trailer administrado pelo garotinho Giovani Frezza ("A Casa do Cemitério"). Além de mecânico dos bons, eis que o anônimo garoto também é um terror no estilingue, e aparentemente só sobreviveu até então porque mata seus desafetos disparando certeiras estilingadas (o filme nunca se preocupa em mostrar o quê, exatamente, ele dispara, mas os inimigos colocam a mão no pescoço, dão gritos de dor e caem mortos instantaneamente!!!).

Em seguida, quando um pelotão de Templários está perseguindo um comboio de sobreviventes (resumido a um único furgão prateado por limitações orçamentárias), Scorpion tem sua primeira chance de mostrar porque, afinal, é o herói do filme. Ele aparece do nada e salva uma garota que está vestida como assistente de mágico, com biquíni e capa púrpura - o IMDB diz que seu nome é Alma, mas ninguém nunca chama a pobre moça pelo nome durante o filme inteiro!


Ela é interpretada pela bela Anna Kanakis, Miss Itália de 1977 que depois acabou se perdendo nessas presepadas. A moça protagoniza até uma cena de sexo com o galã italiano à meia-luz, dentro de uma esquisita tenda de plástico!

Ao perceber que o herói não vai deixar que matem a garota, Shadow (aquele vilão-bailarina com cabelo em coque, lembra?) prefere discutir com Scorpion ao invés de matá-lo de uma vez: "Você também rouba e mata, não é diferente de nós!", acusa Shadow. Calmamente, o herói responde: "Eu quero viver, enquanto vocês querem exterminar todos os seres humanos para que nada mais viva na Terra".


O que me leva a uma velha dúvida: a missão de "exterminar todos os sobreviventes do fim do mundo" não desembocará neles mesmos, que também são sobreviventes, tipo a serpente que come o próprio rabo? Será que, quando acabarem seu "trabalho", os Templários vão matar um ao outro, ou simplesmente passar o resto da vida escutando os discursos de One e fazendo troca-troca?

E já que estamos falando em One, é claro que o bofe não está nem um pouco contente ao saber que Scorpion salvou a moça do extermínio. Shadow sugere matá-lo, mas One aparentemente ainda mantém uma pontinha de amor platônico e berra: "Não! Seu sangue não é suficiente... Ele tem que me dar seu orgulho, e sua alma!". Orgulho e alma??? Hmmm... Tá bom, mudou de nome...


A partir de então, GUERREIROS DO FUTURO transforma-se num festival de encontros e desencontros do herói com os Templários, que evoluem para o progressivo extermínio desses últimos e de praticamente todos os sobreviventes do apocalipse que são pegos no meio do fogo cruzado.

Lá pelas tantas, também surge o norte-americano Fred Williamson, astro de nove entre cada dez tralhas da época que precisavam de um negro mal-encarado e bom de briga. Ele, que já tinha sido dirigido por Castellari em "1990 - Os Guerreiros do Bronx", interpreta Nadir, um arqueiro que usa uma ridícula luva dourada repleta de pontas de flecha explosivas (coloridas, mais parecem luzinhas de Natal!). Detalhe: as tais pontas de flecha nunca acabam, nem se tenta explicar onde Nadir consegue repor seu arsenal...


O que interessa é que, durante os combates, Nadir perde um tempão escolhendo a ponta, atarrachando na flecha e só então disparando - e, nesse meio-tempo, nenhum vilão é esperto o suficiente para meter um tiro na fuça do sujeito! Como são explosivas, elas fazem os Templários em pedacinhos - espere só para ver o bandido que toma uma flechada no pescoço e tem a cabeça explodida em câmera lenta, mas continua pilotando sua motocicleta por algum tempo sem cabeça!

GUERREIROS DO FUTURO é um clássico instantâneo para os escolados em bagaceirices italianas, fãs de tralha diversas e adoradores de trash movies. Se você assisti-lo em turma, fica difícil segurar o riso por mais de cinco segundos: ou você gargalha com os diálogos bisonhos (e a dublagem medonha), ou com os nomes ridículos dos personagens, ou com as situações "suspeitas", ou com a roupa ultra-fashion da galera, ou com os carros sucateados do futuro, ou com a sonoplastia bagaceira... Enfim: não faltam motivos para rir do filme!


Tudo é inconsistente: num mundo devastado por uma explosão nuclear, os sobreviventes se preocupam mais em turbinar seus carros e enchê-los com traquitanas do que em tentar reconstruir cidades (o tempo todo vemos os sobreviventes vivendo como nômades ou em acampamentos fuleiros, mas o filme nunca mostra de onde eles tiram água, comida e gasolina, por exemplo).

Outra coisa engraçada é que, no mundo devastado, não existem cidades, hospitais, postos de gasolina ou supermercados (enfim, não existe prédio algum!), mas mesmo assim todos os sobreviventes têm um suprimento ilimitado de gasolina, maquiagem (para as mulheres, sempre com o rosto absurdamente pintado) e ombreiras (para heróis e vilões). Tanto heróis quanto vilões passam o dia todo zanzando com seus carros, os primeiros procurando os sobreviventes e os segundos caçando sinais de rádio, mas nenhum deles fica sem gasolina em momento algum. Vai ver que os automóveis do futuro são movidos a ar...


Ah, e não se preocupe com essa história dos sinais de rádio: apesar de ser um dos detalhes mais interessantes do roteiro (haverá ainda um resquício de civilização no mundo pós-apocalíptico?), GUERREIROS DO FUTURO termina num massacre onde quase todos morrem, e não resta praticamente ninguém para continuar seguindo os sinais de rádio!

E aí o roteiro nem se preocupa em explicar se realmente ainda existia algum resto de civilização transmitindo para reagrupar os sobreviventes, ou se os sinais eram simplesmente uma armadilha dos Templários para atrair suas vítimas.


E é impossível não citar a cena mais sem-noção do filme, aquela pela qual GUERREIROS DO FUTURO é infamemente reconhecido: lá pelas tantas, Scorpion é aprisionado pelos Templários e obrigado a passar pelo ritual de "iniciação" das bonecas antes de morrer.

O tal ritual é a maior prova de que os os vilões gostam de queimar a rosca: enquanto Shadow força Scorpion a ficar de quatro, One "faz o serviço" no fiofó do nosso herói, numa cena que parece ter sido tirada de "Amargo Pesadelo" - e não consigo lembrar de nenhuma outra aventura em que o herói é sodomizado pelo vilão ao invés de ser simplesmente torturado ou surrado! Assista à "iniciação" no vídeo abaixo, se tiver coragem:

Veja ANTES de decidir juntar-se aos Templários!



Além dos seus habituais tiroteios e explosões em câmera lenta, Castellari ainda aproveita para homenagear os velhos tempos como diretor de western spaghetti. O filme todo tem um climão de faroeste futurista. Os ataques dos vilões, por exemplo, lembram os ataques de índios a caravanas nos filmes de Velho Oeste, com os carros dos bonzinhos adotando uma formação em círculos para se defender.

Porém o momento de maior referência ao western acontece quando Scorpion surge para o duelo final de "quem saca primeiro?" com One, vestindo um poncho marrom (à la Clint Eastwood na Trilogia do Dólar, de Sergio Leone). Neste momento, até a música de sintetizador de Simonetti assume um tom de western. One tenta matar Scorpion a tiros, mas, por baixo do poncho, o herói veste uma afrescalhada armadura indestrutível, citação direta a uma cena idêntica em que Eastwood vestia uma placa de ferro por baixo do poncho para escapar dos tiros do vilão, no clássico "Por um Punhado de Dólares". Só esta brincadeira já vale o filme inteiro.


Cineasta experiente, o velho Enzo também utiliza uma série de divertidos subterfúgios para fazer seu pequeno filme parecer maior do que realmente é: o fato dos vilões utilizarem roupas brancas padronizadas e capacetes de motoqueiro (como uma versão trash dos Storm Troopers de "Star Wars") facilita a reutilização dos mesmos figurantes pelo menos umas dez vezes, já que os anônimos Templários mortos em uma cena podem voltar em outras sem que se saiba a identidade.

E muita atenção para perceber um inteligente truque de montagem: numa das cenas do cerco dos Templários ao acampamento de sobreviventes, a câmera passa por dezenas de vilões em seus carros e motos, depois passa por algo que bloqueia a visão da câmera e, neste momento, Castellari aproveita para fazer um corte imperceptível e rearranjar todos os figurantes e veículos DO OUTRO LADO, fazendo parecer que há muito mais gente na cena do que existe na verdade!.


GUERREIROS DO FUTURO também está coalhado de momentos antológicos pela sua extrema imbecilidade, mas vou destacar apenas dois deles para não me alongar demais:

Quando Scorpion é perseguido por Mako em seu carrinho com hélice mortífera, Nadir aparece para salvar o herói com suas fechas explosivas. Não, ele não explode o carro do vilão, o que seria muito fácil: ele explode um buraco no chão onde Scorpion se atira para escapar da hélice!

A outra: quando Scorpion é aprisionado e torturado pelos Templários (aliás, o nosso herói parece precisar de ajuda em tempo integral!), os bandidos amarram-no a uma corda e começam a arrastá-lo com seus carros. Nadir aparece novamente para salvar o dia, mas, ao invés de soltar Scorpion de uma vez, ele fica uns cinco minutos disparando suas flechas NOS OUTROS VILÕES, e não naquele que arrasta o herói - que, assim, continua sendo dolorosamente arrastado!!!


Seja como for, amiguinhos, 2019 está logo aí. Portanto, preparem seus estoques de ombreiras e de gasolina, encham seus carros de equipamentos desnecessários que possam ser acionados com um botãozinho colorido e decidam-se por um dos lados do conflito: desmunhecar e entrar para os Templários (o ritual de iniciação não é dos mais agradáveis), ou virar crente e correr atrás de sinais de rádios inexistentes? Você decide!

Mas, pelo menos na visão de Enzo Castellari, o nosso futuro já está bem definido: baitolas ou crentes, seremos todos uns imbecis dirigindo veículos caindo aos pedaços, mas repletos de acessórios (tipo os Chevettes tunados dos dias atuais), e nos mataremos até restar dois ou três. Logo, nada muito diferente dos dias de hoje - só faltam mesmo as ombreiras...

Trailer de GUERREIROS DO FUTURO



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I Nuovi Barbari / Warriors of the Wasteland
(1983, Itália)

Direção: Enzo G. Castellari
Elenco: Giancarlo Prete (aka Timothy Brent), Fred Williamson,
George Eastman, Giovanni Frezza, Anna Kanakis, Ennio
Girolami, Massimo Vanni, Iris Peynado e Zora Kerova.