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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

LA VENGANZA DE LOS PUNKS (1991)


Punks não são uma raça fácil de lidar. Que o digam Mad Max e todos os personagens que levaram escarrada do Bob Cuspe na extinta revista Chiclete com Banana. Ou, ainda, policiais de filmes mexicanos. Esses útimos costumam comer o pão que o diabo amassou nas mãos dos punks (ou "pónks", como pronunciam com seu sotaque carregado), em aventuras rasteiras e absurdas ao estilo de "Intrepidos Punks", de Francisco Guerrero.

Eu resenhei "Intrepidos Punks" aqui no FILMES PARA DOIDOS em maio de 2010. Na época, fiquei surpreso ao descobrir a existência de uma sequência de 1991. Então eis aqui os punks mexicanos de volta ao blog!


LA VENGANZA DE LOS PUNKS só trocou o diretor. No lugar de Guerrero, quem comanda o show é o débil mental Damián Acosta Esparza, o mesmo doido varrido que dirigiu "El Violador Infernal".

De resto, volta praticamente a mesma turma de "Intrepidos Punks", do herói (Juan Valentín) ao grande vilão, interpretado pelo lutador mascarado de luta livre El Fantasma! Até mesmo personagens bem secundários estão de volta, revelando que os "pónks" cinematográficos mexicanos são mesmo uma grande família unida!


Só não aparecem nesta segunda aventura o ator que interpretava Javier, parceiro do herói no original (não sei o nome do ator, mas ao que parece ele não quis pagar mico dobrado), e a gostosíssima Princesa Lea, que fazia Fiera, a amante do vilão no filme de 1988 (mas ela nem podia retornar, visto que levou um tiro na cabeça na conclusão daquele filme).

LA VENGANZA DE LOS PUNKS começa sem perder tempo: temos um plano geral do prédio de uma cadeia e, cinco segundos depois, uma das paredes vai pelos ares e todos os "intrépidos pónks", que haviam sido presos no final do primeiro filme, fogem para a liberdade após anos mofando atrás das grandes.


A responsável pela explosão é a gordinha, peituda e bunduda Olga Rios. Ela tinha aparecido no original como uma personagem secundária sem nome, mas agora foi promovida a "Pantera", nova amante do chefão do bando, Tarzan (El Fantasma), depois que a namorada anterior tomou um tiro na cabeça no filme anterior.

(Só para constar: embora apareça pelada o tempo todo e tenha uma buzanfa gigantesca, Olga Rios não serve nem para lamber o salto do sapato da musa do FILMES PARA DOIDOS Princesa Lea. E isso que tenta imitá-la no cabelão armado, no figurino e até no apetite sexual!)


Novamente sem perder tempo, os "pónks" vão concretizar a vingança descrita no título. Eles invadem a festa de 15 anos da filha de Marco (Juan Valentín), o policial que os prendeu, e transformam a comemoração num inferno: estupram a menina e a esposa diante dos olhos do sujeito, estupram as outras mulheres da festa e depois metralham todo mundo. Só Marco escapa com vida, porque Tarzan estupidamente quer que ele viva com a dor da morte de toda a sua família.

É uma pena que o pobre Tarzan nunca tenha visto nenhum filme da série "Desejo de Matar", pois aí ficaria óbvio que era melhor ter matado o pobre Marco também. Afinal, depois de testemunhar estupro e matança da filha, da esposa e de seus familiares e amigos, o sujeito fica meio maluco, pede demissão da polícia e dedica-se ao extermínio sistemático e cruel de todos os "pónks", lentamente e um por um.


Bem, se você gostou daquela divertida tosqueira chamada "Intrepidos Punks", talvez fique feliz de saber que essa sequência é muito, mas muito MELHOR que o original. Dessa vez, tudo vem numa escala maior: há mais violência, mais sacanagem e muito mais bobagens e cenas hilárias para apreciadores desse tipo de tranqueira cinematográfica!

Se o original tinha uma narrativa fragmentada, sem um fio condutor, basicamente apenas mostrando os crimes dos "pónks" até um rápido enfrentamento com a dupla de heróis no final (já que os heróis estavam ocupados resolvendo outros casos sem relação ao longo do resto do filme), em LA VENGANZA DE LOS PUNKS os bandidos multicoloridos passam a ser personagens secundários, já que a trama acompanha a sangrenta vingança de Marco, encarnando um anti-herói tão cruel que daria medo até no próprio Charles Bronson.


Desde as primeiras cenas, o diretor Acosta Esparza não poupa o espectador de doses cavalares de violência: LA VENGANZA DE LOS PUNKS é um filme sujo e sádico, que já começa com o estupro e extermínio da família do herói, e só vai ficando mais pesado à medida que Marco usa as formas mais cruéis para vingar-se dos criminosos.

A narrativa torna-se até meio repetitiva, já que, após os 10 ou 15 primeiros minutos, o filme se transforma numa longa sequência de torturas e assassinatos, com o anti-herói aprisionando algum inimigo e submetendo-o a uma violenta sessão de espancamento antes de finalmente matá-lo.

Menos mal que os diálogos estúpidos e cenas nonsense entre uma tortura e outra garantem a diversão. Até porque as pancadas são convincentes e o sofrimento dos atores também (a cena do cara sendo queimado vivo é perigosamente realista, e duvido que o sujeito não tenha sofrido pelo menos umas queimaduras leves).


Em relação às mortes, tem de tudo um pouco, mas só coisa da pesada: um sujeito é empalado, outro é queimado vivo, e uma garota (é, nem elas ganham colher-de-chá) é lentamente corroída com ácido (!!!). À la Zé do Caixão, cobras e aranhas REAIS também são usadas para matar os inimigos. Progressivamente, Marco vai se transformando num personagem tão sádico e odioso quanto os "pónks" que caça, e vai perdendo a razão.

Numa das muitas bobagens hilárias de LA VENGANZA DE LOS PUNKS, o herói sempre consegue entrar e sair facilmente do esconderijo dos "pónks", sempre levando consigo algum dos vilões para poder torturar e matar lentamente longe dali, e sempre sem que ninguém perceba nada.

E os vilões são tão estúpidos que, mesmo depois do décimo desaparecimento, continuam se separando toda hora e zanzando sozinhos pelo acampamento sem se preocupar com nada!


Outro besteirol é que os "pónks" agora não são apenas arruaceiros assassinos e estupradores viciados em drogas, como no filme original, mas também... satanistas!!! Isso mesmo: em seu novo esconderijo, eles têm até uma gigantesca estátua do Capeta cujos olhos vermelhos ficam piscando (!!!), provavelmente retirada de algum antigo carro alegórico do Carnaval carioca.

Lá pelas tantas, Tarzan realiza uma missa negra (!!!) para agradecer a Satã por terem escapado da cadeia, sacrificando uma ovelha e fazendo seus comandados beberem o sangue do animal! Bela e fidelíssima visão da cultura punk, não é mesmo?

(Vale destacar que a ovelha "sacrificada" provavelmente é de verdade, mas pelo menos já está morta quando é esquartejada pelo vilão sobre o "altar"...)


Ah, o traje utilizado por Tarzan para comandar a missa negra é literalmente de se mijar de rir, com direito a uma grande máscara colorida em formato de cone que lembra uma versão "Parada Gay" do capuz pontudo usado pelos integrantes da Ku Klux Klan!

Por sinal, Tarzan dessa vez não se contenta em usar uma única máscara. Lembre-se que, na vida real, El Fantasma é um "luchador", e portanto não pode mostrar o rosto em público. Pois, durante o filme, dependendo da ocasião, o vilão aparece com três ou quatro máscaras diferentes, inclusive uma muito parecida com a máscara de hóckey do Jason - citação, talvez, ao Humungus de "Mad Max 2", que usava máscara semelhante.


E o festival de bobagens segue adiante: o roteiro apresenta uma dupla de policiais, colegas de Marco na delegacia, apenas para descartá-los logo depois num tiroteio com assaltantes de uma videolocadora (que não têm nada a ver com os punks, são apenas bandidos aleatórios). Sabe-se lá qual o motivo para introduzir esses policiais no roteiro (além de esticar o tempo de duração do filme), mas eles somem de cena tão rápido quanto entraram!

Outra subtrama dispensável, e que não chega a lugar nenhum, envolve uma tentativa de rebelião dentro da própria quadrilha dos "pónks", quando alguns integrantes insatisfeitos com os mandos e desmandos de Tarzan mostram-se louquinhos para matá-lo e tomar seu lugar. Como Marco logo surge para matar contentes e descontentes, essa história nunca rende!


Por fim, há uma patética (e portanto hilária) tentativa de fazer crítica social, quando o delegado que investiga os crimes cometidos pela turma de Tarzan ensaia uma expressão de fúria diante dos cadáveres do massacre na casa de Marco, e começa a berrar, direto para a câmera (e portanto para o espectador): "Escória humana! Quando nós os prendemos, chamaram a nós, os policiais, de criminosos. Meus chefes, os políticos, os doutores... Toda a sociedade! Eu queria que eles estivessem aqui para ver isso, para ver como reagiriam. Todos somos responsáveis! Todos somos culpados! Todos somos cúmplices... Todos nós!".

Como já acontecia em "Intrepidos Punks", tudo que envolve os "pónks" é tão exagerado que é impossível levar a sério. E quem conseguiria engolir esses vilões com cabelos coloridos, cara pintada estilo Pablo, do "Qual é a Música?", e roupas espalhafatosas, que parecem saídos de algum baile de carnaval da periferia, mas jamais legítimos representantes da cultura punk?


Aqui a coisa é até mais exagerada, de forma que até parece paródia. Se no primeiro filme tínhamos punks chamados Calígula e Pirata, além do risível chefão chamado Tarzan (hahaha), aqui há novos membros vestidos como gladiadores da Roma Antiga, um sujeito com apenas metade da barba em um dos lados do rosto (!!!) e até um cara trajado de viking, com capa, chapéu de corninhos pontiagudos e espada!

Claro, todos eles vivem no meio do deserto e não tomam banho, já que passam os dias cometendo crimes, usando drogas e trepando. Mas, milagrosamente, suas fantasias estão sempre impecáveis, e as garotas sempre maquiadas e penteadas!!!


Se funciona como diversão trash, LA VENGANZA DE LOS PUNKS também não nega fogo como aventura violenta. Confesso que fiquei surpreso com o confronto final entre Marco e Tarzan. Eu esperava uma longa pancadaria, já que El Fantasma é "luchador" - e já havia mostrado seus dotes em diversas cenas de "Intrepidos Punks". Mas a resolução do conflito é diferente, para o azar do vilão!

(Vale ressaltar que talvez El Fantasma não lute nessa continuação porque, três anos depois do primeiro filme, aparece bem gordo em relação ao original, e visivelmente fora de forma.)


Para completar a longa lista de bobagens, LA VENGANZA DE LOS PUNKS ainda se encerra de maneira inacreditável: sabe aqueles finais cíclicos que os italianos adoravam colocar em filmes de horror?. Isso só torna o programa todo ainda mais charmoso e engraçado, principalmente se você assistir acompanhado (e devidamente alcoolizado).

Nesses tempos em que o politicamente correto vigora até no cinema de ação, é sempre um alívio assistir aventuras inconsequentes e sádicas como essa LA VENGANZA DE LOS PUNKS, onde vilões cometem atos de extrema brutalidade e recebem o troco na mesma moeda.

Inclusive o sadismo e a sede de sangue do anti-herói Marco fazem com que ele se transforme numa espécie de versão cucaracha do Justiceiro da Marvel - e sua vingança é muito mais eficiente que as adaptações oficiais do personagem para o cinema.


Mesmo que sejam obras bem diferentes na proposta e na realização, "Intrepidos Punks" e LA VENGANZA DE LOS PUNKS podem proporcionar uma maravilhosa e inesquecível sessão trasheira dupla para os apaixonados por FILMES PARA DOIDOS.

E é uma pena que a conclusão não tenha deixado nenhuma possibilidade para uma terceira aventura com os "pónks" mais engraçados do cinema - embora existam outras aventuras mexicanas igualmente hilárias que trazem punks sanguinários, como "Siete en la Mira 2 - La Furia de la Venganza", de Pedro Galindo III.

A inacreditável missa negra dos "pónks"



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La Venganza de los Punks (1991, México)
Direção: Damián Acosta Esparza
Elenco: Juan Valentín, El Fantasma, Olga Rios,
Arturo Mason, Bruno Rey, Fidel Abrego, Socorro
Albarrán, Anaís de Melo e Laura Tovar.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

EL CHARRO DE LAS CALAVERAS (1965)


Você sabe que está testemunhando um daqueles momentos mágicos da sétima arte quando topa com um filme como o obscuro western mexicano EL CHARRO DE LAS CALAVERAS, aka "The Rider of the Skulls" - em bom português, "O Cavaleiro das Caveiras". Não porque é um filme maravilhoso, nem porque é algum clássico perdido da cultura mundial, mas simplesmente porque ele resgata um tipo de mágica e de ingenuidade cinematográficas que parecem ter se perdido há décadas.

Topei com EL CHARRO DE LAS CALAVERAS por puro acaso. Estava procurando alguma outra coisa no Google e a busca indicou este filme. A descrição era fantástica: "Weirdest western ever!". Sempre pensei que o western mais esquisito de todos os tempos fosse o fantástico "Matalo", de Cesare Canevari, então resolvi dar uma conferida nesse outro. Fiquei hipnotizado.


Sabe o Dylan Dog, aquele personagem italiano de histórias em quadrinhos que investiga ameaças sobrenaturais? Pois o herói aqui, o tal "Charro de las Calaveras" do título, pode ser considerado uma espécie de avô cucaracha do Dylan Dog, igualmente combatendo monstros e fantasmas na zona rural mexicana - apesar da aparência de western, com pequenas vilas e pessoas a cavalo, o filme não se passa no século 19, mas sim numa cidadezinha dos anos 1960.

Interpretado por Dagoberto Rodríguez, El Charro é um cavaleiro misterioso, todo vestido de preto e com três crânios bordados na camisa. Esconde o rosto com uma máscara porque, segundo ele, "a justiça não tem face".


(Mais tarde descobrimos que seus pais foram mortos pelos bandidos e ele vingou-se de cada um deles, jurando sobre seus cadáveres que combateria todo o mal e injustiça do mundo. Enfim, um plágio disfarçado do Fantasma do Lee Falk, misturado com o visual do Zorro/Lone Ranger!)

O primeiro e único filme do personagem na verdade não é um filme, mas a união de três episódios de um daqueles velhos seriados exibidos nos cinemas de antigamente antes que começasse a atração principal. O cartaz anuncia até o título dos episódios: "El Lobo Humano", "El Vampiro Sinistro" e "El Jinete sin Cabeza". Assim, a cada 25 ou 30 minutos, nosso herói inicia uma nova aventura fechada e auto-conclusiva com outros personagens e monstros.


Não quer dizer, entretanto, que El Charro algum dia foi exibido como seriado. Inclusive nunca foram produzidas outras aventuras: só existem mesmo estes três episódios unidos em forma de longa. Eu li certa vez, em algum lugar, que esta prática era comum no México da época, pois havia muito mais incentivos para a produção de seriados do que para longas. Por isso, realizadores espertinhos filmavam dois ou três episódios de uma suposta futura série e depois juntavam todo o material para lançar como se fosse um único longa-metragem!

EL CHARRO DE LAS CALAVERAS começa com a viciante canção-tema do herói, cantada a plenos pulmões pelo "Trio Calaveras". Como os menestréis da Idade Média, eles celembram os feitos do personagem ("Amigo del justo / Y con los canallas / Fue por sus hazañas / Un gran paladín"), dando todo o clima do espetáculo que virá pela frente!

Cante com o Trio Calaveras



Começa então o primeiro episódio, "El Lobo Humano" (no filme, os segmentos não estão intitulados, nem há qualquer marcação entre o final de um e começo do outro, embora a transição seja perceptível). Essa primeira parte tem o objetivo de apresentar El Charro e sua origem, ao mesmo tempo em que o herói enfrenta o terrível lobisomem que está assombrando a fazenda da família Alvatierra.

Fica bem claro desde o começo que o homem-lobo é o próprio patriarca da família, Don Luis (David Silva, de "Alucarda" e "El Topo"). Afinal, ele veste uma camisa xadrez, e o lobisomem veste uma camisa xadrez também. Seria muita coincidência que ambos tivessem o mesmo alfaiate...


Ajudado/atrapalhado pelo empregado da fazenda, Cleofas (Pascual García Peña), e pelo caçula da família, Perico, o herói não consegue evitar que o licantropo Don Luis mate a própria esposa (Alicia Caro). Também não consegue dar um fim no monstro, que morre por puro acidente ao despencar de um precipício enquanto persegue o garotinho! Logo, digamos que este não é exatamente um início promissor para as aventuras de El Charro...

Por outro lado, esse episódio inicial tem um charme todo especial. Primeiro, por causa da hilária transformação de Don Luis em lobisomem (repetida umas quatro ou cinco vezes em 20 minutos): ao invés de virar lobo direto, o processo tem uma fase intermediária em que ele se transforma num esqueleto (?) e sua roupa desaparece (???), para só então virar homem-lobo, e novamente vestido!


Outro momento mágico e maravilhoso de "El Lobo Humano" é a intervenção de uma bruxa que vive num cemitério, e que lembra, inclusive visualmente, a feiticeira interpretada por Eucaris Moraes no filme de estréia do Zé do Caixão, "À Meia-noite Levarei Sua Alma" (1964).

Pois eis que a bruxa ressuscita um dos defuntos do cemitério (!), cujo caixão está enterrado numa sepultura com uns meros 5 cm de terra por cima (!!!), para contar a El Charro a identidade do lobisomem!!! Pode?


"El Vampiro Sinistro" começa logo em seguida. Com a morte de toda a família Alvatierra no episódio anterior, Cleofas passou a acompanhar El Charro como fiel escudeiro, um Sancho Pança mexicano. Após um diálogo para justificar a ausência do menino Perico ("Ele está na escola", ou algo do gênero), somos apresentados a um novo parceiro-mirim chamado Juanito, que saiu sabe-se lá de onde.

Existe uma explicação lógica para essa mudança no elenco: deve ter passado um grande período de tempo entre a filmagem do primeiro episódio e dos dois posteriores, já que a roupa de El Charro está diferente (a máscara agora cobre a cabeça toda, não apenas o rosto, e há caveiras bordadas também no peitoral da camisa). Provavelmente o garoto que participou da história anterior pulou fora do projeto e teve que ser substituído por um outro menino e um novo personagem.


Seja como for, o trio de heróis chega a uma cidadezinha que está sendo aterrorizada por um terrível vampiro daquele estilo monstruoso, à la Nosferatu (e que usa um cinto com um morcego desenhado na fivela, que parece roubado do Batman!). Eles se hospedam na casa de Maria (Laura Martínez) para protegê-la da ameaça sanguessuga, mas não adianta nada, pois o vampiro ataca uma noite e leva a garota para ser sua noiva. El Charro precisa ir até o esconderijo do vilão (um cemitério abandonado) para uma luta até a morte.

O charme deste segundo episódio é o vampirão, permanentemente imitando a pose de Bela Lugosi em "Plan 9 From Outer Space", segurando as pontas da capa como se fosse um morcego gigante. Aliás, são incontáveis as transformações do vampiro num enorme morcego de borracha, e vice-versa, através de corte seco (desliga a câmera, tira o ator, coloca o morcego, liga a câmera).


E é hilário o momento em que o morcegão de borracha, suspenso por fios de nylon, tenta entrar por uma janela: a falta de habilidade do sujeito que está manipulando o morcego é tamanha que o bicho precisar dar "marcha-a-ré" duas vezes até conseguir passar pela janela!

Enfim, sem querer spoilear a conclusão de "El Vampiro Sinistro", nosso trio de heróis está vivinho e saudável na terceira e última história, "El Jinete sin Cabeza", a melhor do filme.

Baseado no conto "A Lenda de Sleepy Hollow", de Washington Irving, mostra um terrível cavaleiro sem cabeça atacando em outra vila do interior do México, onde coincidentemente vão parar El Charro, Cleofas e Juanito.


Enquanto isso, numa cidade perto dali, a milionária Gloria Mendez (Rosario Montes) descobre, entre as quinquilharias deixadas pelo seu falecido avô, uma caixa de madeira contendo uma cabeça mumificada (!!!). A moça começa a ser aterrorizada pelo sinistro souvenir, pois a cabeça fala e exige que seja devolvida ao seu corpo. Adivinhe qual é o corpo? Bem, não é coincidência o fato de existir um cavaleiro sem cabeça aterrorizando uma vila nas cercanias...

Descobrimos que o cavaleiro na verdade é um bandidão chamado El Chacal, cuja cabeça foi decepada pelo avô de Gloria para estudos científicos. A profanação, entretanto, transformou o criminoso comum num vilão sobrenatural, auxiliado por dois mortos-vivos cujo visual lembra muito os "mortos sem olhos" daqueles filmes feitos anos depois pelo espanhol Amando de Ossorio.


"El Jinete sin Cabeza" é o melhor momento de EL CHARRO DE LAS CALAVERAS por causa das criativas trucagens utilizadas para "dar vida" ao cavaleiro decapitado e sua cabeça decepada falante. E também porque é o único dos episódios em que o herói El Charro realmente mostra serviço, travando uma feroz luta de espadas (na verdade, machetes!) com o demoníaco adversário!

(Aliás, vale destacar que quando o cavaleiro sem cabeça recupera a dita cuja, ele fica a cara do Michael Jackson versão branquela, como você pode ver na foto abaixo!)


Bem, se você aguentou até aqui, deve ter percebido que EL CHARRO DE LAS CALAVERAS é um daqueles filmes bizarros e imperdíveis que servem para matar a saudade de um tipo de cinema popularesco e amalucado que já não se faz mais - motivo pelo qual apaixonei-me pelo filme à primeira vista.

Enquanto o assistia, voltei aos meus tempos de moleque assistindo obras tão fascinantes quanto absurdamente amalucadas, tipo "Os Aventureiros do Bairro Proibido", de John Carpenter, que misturava lutadores de artes marciais com fantasmas, monstros e ninjas voadores.

Hoje, infelizmente, não há mais espaço para filmes assim. Se você pegar uma bomba como "Van Helsing", do Stephen Sommers, por exemplo, a proposta é exatamente a mesma de EL CHARRO DE LAS CALAVERAS (um herói lutando contra diversos monstros famosos), mas a execução é pífia, com um excesso de efeitos por computação gráfica que chega a incomodar o espectador.


Prefiro muito mais o clima de ingenuidade e de "fundo de quintal" do filme mexicano, em que vampiros e lobisomens andam em plena luz do dia, enquanto os personagens dizem frases como "Em algumas horas vai amanhecer" (aparentemente, os realizadores não tinham iluminação suficiente para filmar REALMENTE à noite).

Também prefiro muito mais o morcego de borracha e as máscaras de carnaval inexpressivas usadas pelo lobisomem e pelo vampiro (só os olhos se mexem) do que esses efeitos toscos e exagerados de CGI.

E no fim você não se importa com essa pobreza mambembe dos efeitos porque É A PROPOSTA do negócio: uma aventura barata, rápida, rasteira, sem muita enrolação, feita para consumo popular, sem grandes pretensões nem muitos recursos. O tipo de cinema que passava nas cidades pequenas e era ovacionado por uma platéia ávida por esse tipo de produção, décadas antes dessa Era de Multiplex e da "magia" criada por computação gráfica.


Há um irresistível charme trash em EL CHARRO DE LAS CALAVERAS. O herói, apesar da pose de fodão e do ar misterioso, é um completo desastre: nunca consegue salvar ninguém e sempre é subjugado pelos monstros, mas salvo na última hora por algum dos companheiros (geralmente o garotinho, o que torna tudo ainda mais engraçado, pois o moleque é muito melhor e mais esperto que o PROTAGONISTA DO FILME!).

E se no começo eu comparei El Charro com Dylan Dog, vale ressaltar que eles compartilham até de um alívio cômico: nos quadrinhos é Grouxo, um sósia de Grouxo Marx; aqui é Cleofas, o típico gordinho fanfarrão e medroso que só faz cagada.


EL CHARRO DE LAS CALAVERAS é o primeiro filme dirigido pelo célebre roteirista Alfredo Salazar, que faz uma ponta como a primeira vítima do vampiro. Nascido em 1922, durante quatro décadas ele foi responsável por escrever roteiros que mais pareciam histórias em quadrinhos ou "pulp fictions" (aqueles livrinhos de rodoviária), mais ou menos como o Rubens Francisco Luchetti fez aqui no Brasil (escrevendo primeiro os roteiros do Mojica, depois do Ivan Cardoso).

Salazar costumava escrever aventuras absurdas juntando criaturas fantásticas de maneira surreal, em títulos como "La Momia Azteca Contra el Robot Humano", de Rafael Portillo, "Las Luchadoras Contra la Momia", de René Cardona, e até uma versão feminina do Batman, "La Mujer Murciélago", também dirigido por Cardona.


Também foi Salazar quem mais colocou o lutador mascarado El Santo para combater ameaças sobrenaturais, escrevendo as aventuras "Santo y Blue Demon vs Drácula y el Hombre Lobo", "Santo en La Venganza de la Momia", "Santo en El Tesoro de Drácula", e muitas outras. Ou seja, o negócio do sujeito era fazer crossover entre todos esses monstros e heróis mascarados, mas sem muito compromisso com a lógica nem muita explicação (usando a velha estratégia "se colar, colou")!

Tanto que ninguém perde tempo explicando a origem do lobisomem e do vampiro em EL CHARRO DE LAS CALAVERAS, e a história por trás do cavaleiro sem cabeça é narrada em três minutinhos. Salazar joga no lixo até as convenções clássicas dos personagens, pois o lobisomem é morto sem a necessidade de balas de prata!


Roteiro e direção do filme também lembram muito uma história em quadrinhos, em seu desenvolvimento, narrativa e até composição das imagens (há uma cena em que ele mostra tiros em primeira pessoa décadas antes de isso ficar popularizado nos videogames). Salazar não enrola e dá ao público exatamente o que ele quer, inclusive repetindo numerosas vezes as cenas fantásticas (transformação de homem em lobisomem e de morcego em vampiro), mesmo que os efeitos não sejam lá grande coisa.

Salazar não é erudito, é econômico: seu vampiro não fica lamentando a vida imortal, e seu lobisomem não fica choramingando a maldição de virar fera na Lua Cheia, como é moda no cinema fantástico atual. O mais perto disso que o filme chega é no último episódio, quando o cavaleiro sem cabeça discute com Deus (!!!), reclamando que não vai descansar em paz. Ainda assim, é uma cena curta e que não está ali só para encher linguiça.


É uma pena, portanto, que esse seja o primeiro e único filme de El Charro de las Calaveras, pois, além de ser muito divertido, o personagem teria grande potencial para continuar varrendo o México de ameaças sobrenaturais. Se bem que depois de vampiros, lobisomens e mortos-vivos, não sobraram muitas criaturas poderosas para o herói detonar numa futura aventura...

Bem que alguém podia criar um "Cavaleiro das Caveiras" brasileiro, para livrar o interior do país de criaturas igualmente ameaçadoras como a Mula Sem Cabeça, o Chupa-cabras, o ET de Varginha (ou, agora, ET Bilú) e o zumbi Oscar Niemeyer!

"Aquí está el Charro / Aquí está el charro / El Charro de las Calaveras"...

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El Charro de las Calaveras (1965, México)
Direção: Alfredo Salazar
Elenco: Dagoberto Rodríguez, David Silva, Alicia Caro,
Pascual García Peña, Laura Martínez, Rosario Montes,
Carlos del Muro e Jose Luis Cabrera.