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domingo, 21 de agosto de 2011

A ROTA DO BRILHO (1990)


Em 1990, exatos 17 anos antes do Capitão Nascimento e seus caveiras combaterem traficantes cariocas em "Tropa de Elite", dois policiais da Narcóticos paulista receberam missão parecida: desbaratar uma perigosa quadrilha que agia em São Paulo, trazendo cocaína pela rota ferroviária diretamente de Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia.

Falando assim parece até filme sério, mas na verdade este é o argumento de A ROTA DO BRILHO, um policial de quinta categoria que, hoje, só funciona como diversão trash. E das boas.

Afinal, quem em sã consciência engoliria uma dupla de policiais brasileiros durões chamados Tom e Nil (!!!), e interpretados, respectivamente, por Alexandre Frota (então na fase galã de novela e marido de Cláudia Raia) e Marcos Manzano (loiro platinado estilo He-Man, que na época era apresentador do famigerado Clube das Mulheres)?


A ROTA DO BRILHO foi dirigido por Deni Cavalcanti, o sujeito responsável por "clássicos" (ironia mode on) da cinematografia brasileira, como "Aluga-se Moças" (1982), filme erótico notório por tirar a roupa de várias chacretes, como Gretchen, Rita Cadillac e Índia Amazonense.

Com péssima distribuição, tanto nos cinemas como em vídeo, A ROTA DO BRILHO provavelmente ficaria esquecido no limbo das tralhas produzidas a toque de caixa na Boca do Lixo da época se não fosse por um detalhe curioso: quatro anos depois do seu lançamento, em 1994, uma modelo que faz participação minúscula no filme protagonizou um escândalo ao aparecer em fotografias carnavalescas ao lado do presidente da República vestindo apenas uma camiseta e mais nada, com a perereca à mostra para o mundo inteiro ver!


Claro que estou falando do famoso caso Lilian Ramos e presidente Itamar Franco. Ela, auto-proclamada sósia de Fafá de Belém por causa do tamanho dos seios, ganhou seus 15 minutos de fama com esse episódio do Carnaval. Para a sua sorte, pois jamais seria lembrada pela curta e ridícula carreira de "atriz" (além desse aqui, ela apareceu também em "Ritual of Death", horror dirigido por Fauzi Mansur para o mercado externo e nunca lançado no Brasil).

Foi graças ao episódio Lilian-Itamar que A ROTA DO BRILHO foi redescoberto. A fita do filme, originalmente lançada por uma tal "Sétima Arte Vídeo" (!!!), e com Alexandre Frota e Gretchen em destaque na capinha, já mofava nas locadoras à época. Semanas após o escândalo do Carnaval, a Sato Vídeo resolveu relançar a obra em vídeo com duas novas capinhas (reproduções abaixo), ambas com fotos enormes da moça (apenas uma tirada do próprio filme, aquela do rala-e-rola) e a chamada enganosa "A polêmica Lilian Ramos em...". Só não avisaram o espectador que a participação de Lilian Ramos em A ROTA DO BRILHO não chega a somar cinco minutos!


O filme começa mostrando Tom e Nil chegando ao motel em que uma prostituta morreu de overdose; ali, há um montão de cocaína da boa ("brilho" era a gíria da época para cocaína, por isso o título hoje sem sentido). Segundo um colega da Homicídios, é o terceiro caso em poucas semanas.

De volta à delegacia, eles levam um esporro do seu chefe (o saudoso Felipe Levy, dos filmes dos Trapalhões), que pede urgência máxima na investigação da quadrilha de traficantes responsável por abastecer São Paulo de pó. Eventualmente, os dois casos vão se cruzar, já que o homem que vem matando prostitutas de overdose é um dos integrantes da tal organização.


A ROTA DO BRILHO é uma bagunça danada. Além da trama principal, com os policiais caçando os traficantes, e da trama secundária da investigação da morte das prostitutas (esquecida durante a maior parte do tempo, diga-se de passagem), há outras situações jogadas sem muito critério ao longo da narrativa, como a filha de um senador (Patrícia Salgado) que se diverte levando vida dupla e fazendo programas para uma cafetina.

Numa daquelas coincidências que não convencem nem em novela das sete da Globo, o tal senador (Edgard Franco) é o cabeça da quadrilha de traficantes, e um dos seus capangas, Roque (Raymundo de Souza), acaba se envolvendo com a patricinha-prostituta! Nem sei porque estou relatando isso, considerando que não faz diferença alguma na trama e quase todos os personagens citados são sumariamente esquecidos!


A "polêmica" Lilian Ramos interpreta Suzana, a conexão entre um cartel de drogas da Bolívia e os traficantes paulistas. Só que ela se dá mal logo no início: ao envolver-se com o namorado de Branca (Elizabeth Winkler), outra das integrantes da organização, é assassinada e sai de cena depois de meia dúzia de diálogos horríveis e uma cena de sexo rápida e rasteira.

Mas e afinal, onde entram nossos "heróis" Tom e Nil nessa história? A bem da verdade, os tiras só aparecem no filme porque são os protagonistas, já que não fazem absolutamente nada digno de nota. Ao invés de investigar o caso, os caras saem pela cidade sem muito critério, abordando informantes como Tigrão (Bim Bim, figura habitual dos filmes de Sady Baby) e Carlão.


Esse último é interpretado pelo excelente Anselmo Vasconcellos ("O Torturador", "Eu Matei Lúcio Flávio"), cuja voz aqui é ridiculamente dublada. Ele está a cara do John Turturro, e até hoje me pergunto o que o coitado faz nesse filme, já que sua expressão de descontentamento chega a ficar evidente em algumas cenas.

Como eu dizia, Tom e Nil não investigam porra nenhuma e descobrem tudo que precisam saber por pura sorte. Ou, no caso, torturando um dos informantes. A cena é hilária porque tenta fazer com que o espectador acredite que aquele é um procedimento policial perfeitamente normal, e que não há nada de errado no que acontece: Nil persegue o bandido e, no momento seguinte, vemos o sujeito amarrado pelado num pau-de-arara, tomando choques elétricos pelo corpo!


Ah, quase me esqueci: há uma participação especial hilária de ninguém menos que Gretchen (!!!), interpretando uma artista plástica (!!!) chamada Natália, que é namorada do personagem de Frota. Ambos protagonizam mais uma cena de sexo, cheia de caras e bocas exageradas, e é irônico lembrar que os dois acabaram fazendo pornô duas décadas depois.

A ROTA DO BRILHO apresenta mais algumas caras conhecidas: o guarda-costas de Mojica, Satã, interpreta um capanga dos traficantes (e o que mais Satã poderia "interpretar"?); o diretor José Miziara (de "Embalos Alucinantes" e "Rabo I") aparece na pele de um traficante boliviano que fala em hilário portunhol; e a envelhecida musa das pornochanchadas Neide Ribeiro faz uma cafetina de luxo.


Ninguém foi creditado pelo roteiro do filme, mas se bobear o responsável pela bagaça é o próprio Deni Cavalcanti. Caso o texto seja dele mesmo, o cara está de parabéns: sempre se inticando com frases como "Você está com cara de bundão!" e "Esse é meu parceiro, uma mala!", Tom e Nil são heróis fanfarrões impossíveis de levar a sério, ao estilo do cinema norte-americano.

A dupla tem um diálogo hilário com o chefe de polícia, que transcrevo aqui porque essa genialidade merece ser compartilhada:

Chefe (sério): Já te comeram o rabo, Tom?
Tom (surpreso): Eu? Que é isso, chefe?
Chefe: E você, Nilzinho?
Nil (rindo): Eu, chefe? Nem troca-troca eu fiz! Sou virgem ainda.
Chefe: Pois eu não sou mais. Acabaram de me enrabar! E sabe quem me enrabou? (bate na mesa) O secretário de Segurança Pública!
Tom: Bom, pelo menos foi alguém importante, chefe...



A ROTA DO BRILHO também tem um detalhe muito curioso: (SPOILER) com uma hora de filme, o personagem de Alexandre Frota é assassinado pelos bandidos, numa reviravolta surpreendente à la final de "Viver e Morrer em Los Angeles". Só que a cena é muito estranha: Frota é morto off-screen, apenas escutamos o grito dele. Será que o ator quebrou o pau com os realizadores e abandonou a filmagem, obrigando Cavalcanti a criar essa mirabolante saída de cena do herói? Ou foi mero amadorismo do diretor ao não mostrar justamente a morte de um dos protagonistas mais importantes?(FIM DO SPOILER)

Como a produção bagaceira nacional que é, A ROTA DO BRILHO tem um pouco de tudo: Frota e um galã do Clube das Mulheres como heróis, delegado desbocado, bandidos ridículos, Anselmo Vasconcelos pagando mico, uma carreirona de cocaína sendo feita nas costas de uma anônima nua, cena de tortura no pau-de-arara, um sujeito durão que aparece tomando leite (!!!) num bar, trilha sonora composta pelo Vangelis para "Blade Runner" sendo "reutilizada" em cenas de suspense...


Tem, também, aquela dose cavalar de nudez feminina que caracterizava o cinema brasileiro pré-Retomada: toda e qualquer mulher maior de idade que entra em cena acaba tirando a roupa mais cedo ou mais tarde. Inclusive Gretchen, a eterna "Rainha do Bumbum", que aqui mostra sua buzanfa ainda inteirona em close, o que ajudou a apagar da minha mente parte do trauma causado por aquele tenebroso filme pornô que ela protagonizaria quase duas décadas depois.

O que realmente faz falta no filme é aquilo que todo mundo espera: os socos e tiros que caracterizam o combate ao crime no cinema.


Pois, nesse quesito, Tom e Nil ficaram devendo. Praticamente não há cenas de luta, e a única troca de tiros ficou reservada para o final, quando um dos heróis despacha a maior parte da quadrilha que deveria prender com balas e até granadas (pois todos sabemos que granadas são ferramenta de trabalho comum da polícia de São Paulo). Com direito à tradicional cena do herói preparando as armas antes do confronto final com os marginais.

Vale destacar que, nesse confronto final, Satã protagoniza mais um momomento hilário da película, quando leva um tiro no peito e começa a contorcer-se como se fosse epilético, em momento que rivaliza com a péssima saída de cena de Christopher George em "Ninja - A Máquina Assassina" pelo título de "pior cena de morte da história do cinema". Fiz questão de colocar esse momento histórico no YouTube para que todos possam conferir:

"Morre logo, Satã, caralho!"



A verdade é que, ao contrário do "Tropa de Elite" citado no início da resenha (perdoe-me pela comparação, José Padilha!), A ROTA DO BRILHO é um filme policial de realismo zero.

Afinal, tudo que vemos na tela (personagens, situações e até diálogos) parece ter saído diretamente do cinema clássico hollywoodiano, e não das ruas das grandes capitais brasileiras. Temos desde a dupla de policiais estilo "Máquina Mortífera" até os bandidos que andam sempre de terninho e óculos escuros.


Os clichês se amontoam, ajudando na transformação do que deveria ser um filme policial sério em comédia. Até porque as interpretações com texto decoradinho, dignas de teatrinho de colégio, não ajudam em nada (Lilian Ramos e Elizabeth Winkler são os casos mais críticos).

O resultado é digno de figurar no panteão do FILMES PARA DOIDOS, e é realmente uma pena que não tenhamos novas aventuras trash (e quem sabe melhores) dos tiras paulistas Tom e Nil.

Confesso que seria muito divertido ver os dois outras vezes "investigando" novos casos e enfrentando a bandidagem com tiros e granadas enquanto ficam se chamando de mala e de bundão...

Cena inicial de A ROTA DO BRILHO



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A Rota do Brilho (1990, Brasil)
Direção: Deni Cavalcanti
Elenco: Marcos Manzano, Alexandre Frota,
Gretchen, Lilian Ramos, Raymundo de Souza,
José Miziara, Satã e Anselmo Vasconcelos.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO (1985-87)


Despeçam-se dos seus neurônios, caríssimos leitores e leitoras, porque hoje o FILMES PARA DOIDOS pega pesado na sua heróica missão de valorizar as obras mais bizarras do cinema mundial. Hoje falaremos de uma obra-prima que já foi chamada de "o filme mais débil-mental de todos os tempos". É claro que só pode ser AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO, e com um título desses você já imagina o que vem pela frente...

Sergio Mallandro hoje é uma personalidade "cult-trash". Mas na década de 80 e começo dos anos 90, Mallandro (nome de batismo: Sérgio Neiva Cavalcanti) era uma verdadeira celebridade. Reza a lenda que quando foi contratado pelo SBT, nos anos 80, Silvio Santos dispensou uma certa loirinha que em pouco tempo seria mundialmente conhecida pela alcunha de Xuxa.

Durante a cultuada década de 80, Serginho invadiu os televisores do país inteiro como jurado do Show de Calouros (programa obrigatório nos lares da família brasileira no domingo à noite, rivalizando diretamente com o Fantástico). Costumava azucrinar Silvio Santos, os calouros e até os outros jurados com seu jeito malucão. Era tão popular que chegou a ganhar vários Troféus Imprensa na emissora do ex-patrão.


E foi mais ou menos nessa época que Mallandro estrelou o filme com seu nome, AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO. Antes, já havia aparecido como figurante em outras produções, inclusive uma comédia ao lado de Renato Aragão, "O Trapalhão na Arca de Noé" (da época em que Didi brigou com os outros três Trapalhões, Dedé, Mussum e Zacarias).

No fim dos anos 80, Mallandro virou apresentador infantil, comandando o clássico "Oradukapeta" (que concorria diretamente com o "Xou da Xuxa" nas manhãs de segunda a sexta-feira). Era a vitrine perfeita para esta figuraça, que criou, entre outras brincadeiras, a famigerada "Porta dos Desesperados". Para quem não lembra, as pobres criancinhas precisavam escolher uma entre três portas coloridas para ganhar um brinquedo. Uma era premiada, mas nas duas outras havia figurantes vestidos como monstros. Mallandro, que nunca parava quieto, perguntava 200 vezes para os infantes: "Você está desesperado? Está desesperado? Então grita!!! Ahhhhhh!!! Grita mais alto, mais desesperado... AAAAAHHHHHH!!!!". Muitos destes pobres fedelhos devem ter crescido para se tornar adultos traumatizados...


No começo dos anos 90, Mallandro era um astro. Ganhou até revista em quadrinhos com seu nome (e histórias simplesmente ridículas, ainda mais quando relidas nos dias atuais). Alguns números do gibi acompanhavam a famigerada "Sacola do Mallandro", um monte de quinquilharias de papel vagabundo para a criança montar com tesoura e cola (dado, carrinho, óculos...), e que se desfaziam poucas horas depois.

Foi aí que o pobre Serginho fez uma troca que não lhe foi proveitosa, saindo do SBT para assumir um programa infantil matinal na Globo. Mas não repetiu o mesmo sucesso, e logo a sua atração global foi cancelada. Neste período, fez alguns filmes com o "padrão Globo de qualidade", todos eles muito ruins, e que nem de longe fazem justiça ao escalafobético e "independente" AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO.


Mas agora chega de flashback que isso aqui não é o "Almanaque dos Anos 80"!

Voltemos ao filme, ou ao "filme mais débil-mental de todos os tempos". Ele não é apenas ruim; se fosse, logo acabaria esquecido entre outras tralhas nacionais dirigidas ao público infanto-juvenil, como os filmes da Xuxa.

Na verdade, AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO é tão ruim, tosco, debilóide, louco, absurdo e bizarro que se torna algo, digamos, especial. E hipnótico.

Por exemplo: aos 15 minutos de tempo corrido, eu me contorcia desconfortável no sofá; aos 30, ria sozinho e descontroladamente a cada bobagem; ao final dos 85 minutos, eu clamava desesperado por uma camisa-de-força.


AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO é, sem discussão, o filme mais sem pé nem cabeça de todos os tempos, possivelmente o maior trash do cinema brasileiro! (Menos generosa, a crítica da época taxou-o de "o pior filme de todos os tempos", fazendo Mallandro rivalizar com Ed Wood pelo título!)

Há divergências quanto ao ano de produção. O IMDB informa que é de 1985, mas o site da Cinemateca Brasileira diz que o ano de lançamento foi 1987. É possível que tenha sido filmado em 1985 e engavetado pelos próximos dois anos por problemas diversos. Até porque várias partes da trama são narradas com a ajuda de desenhos, talvez porque as "cenas de ligação" nunca foram filmadas.


Querer falar sobre o roteiro num filme chamado AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO é uma tarefa tão inglória quanto desnecessária, mas vamos tentar: um anão alienígena chamado Superpoderoso ("interpretado" pelo palhaço Rolinha, e por favor não maliciem com o nome do pobre anão!) vem à Terra para entregar a algum ser humano o poder de "fazer o bem".

Quando o ET vê Sergio Mallandro no "Show de Calouros" (e é claro que Serginho interpreta ele mesmo, o que você esperava?), decide por algum motivo inexplicável que aquele é o melhor candidato para virar super-herói alienígena. Antes, porém, Sergio precisará cumprir uma missão: recuperar o chimpanzé de estimação de Tininha (Carla Prestes), que foi roubado.

Mas a tarefa não será das mais fáceis. Primeiro porque nosso herói não investiga porcaria nenhuma o filme inteiro, preferindo fazer palhaçadas e trapalhadas com seu inseparável amigo Zé Cocada (Cosme dos Santos). E segundo porque um outro alienígena, Dom Pedro (Pedro de Lara!!!!), também cobiça o tal poder, e para isso tenta atrapalhar Mallandro de todas as formas para que ele não consiga concluir sua missão.


Ainda aqui? Ótimo.

Os créditos iniciais de AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO informam que o filme foi escrito por Carlos Aquino e dirigido por Erasto Filho (em seu segundo e último filme, o que é plenamente justificável). Esqueça, porém, que Carlos Aquino e Erasto Filho existem: seus nomes só estão nos créditos por pura formalidade. É óbvio que este é um filme DE Sergio Mallandro, e ponto final.

Mallandro é "indirigível". Você até pode dirigir Marlon Brando e Robert DeNiro, mas não Serginho Mallandro. Lembra da animação "Os Sem-Floresta", que trazia um esquilo hiperativo que estava sempre a mil por hora? Pois Sergio Mallandro é este mesmo esquilo depois de 12 latas de Red Bull, um quilo de cocaína e um choque de 100 mil volts, tudo isso durante um ataque epilético.

Mallandro não é um ser humano normal, é uma força da natureza. O que ele faz em AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO é inacreditável: pula, grita, corre, sobe em cima e/ou pisoteia os outros atores, estraga maquiagens e figurinos do resto do elenco (como ao arrancar o bigode falso de um figurante) e faz micagens O TEMPO INTEIRO.


Enfim, é uma performance tão intensa que o espectador chega a cansar, quase suar, só de ver o Mallandro em ação - o sujeito não pára nunca!!!

A mesma coisa vale para o roteiro: esqueça que um sujeito tentou escrever um roteiro e talvez até os diálogos de Mallandro, porque é óbvio que o incansável Serginho improvisou 200% do que se vê na tela.

Na cena final, por exemplo, nosso herói pede Tininha em noivado e, feliz da vida, cumprimenta seus sogros. No papel, isso deve ter sido explicado em duas ou três frases. No filme, entretanto, Mallandro deita e rola: sobe na mesa, abraça os atores, pisoteia a atriz que interpreta sua sogra, tira a peruca do ator que interpreta o pai da sua noiva e coloca na própria cabeça, enquanto se joga por cima dos outros atores e grita descontrolado: "Meu sogro é careca! Meu sogro é careca!". É impossível não dar risada...


E são estes "improvisos" que valorizam o filme. Todas as piadinhas "feitas", que você nota que foram escritas e ensaiadas, são totalmente sem graça. Entre elas, Mallandro chamando o Superpoderoso de "Super Bota-ovo" em toda oportunidade que o encontra, ou confundindo o sobrenome da mãe de Tininha, que é Carneiro, com Cabrito, Cavalo, Camelo, etc etc... Risadas amarelas ecoam pela sala de cinema ou da casa.

Mas no momento em que o hiperativo Serginho começa o seu "one-man show", é sai da frente que atrás vem gente. Numa cena, ele chega a dar uma bolacha na cara do Pedro de Lara para depois derrubá-lo abruptamente no chão - e não duvide que isso foi puro improviso, pela cara de surpresa do coitado do Pedro!


Tentar analisar AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO como filme é uma tarefa inglória, já que o "roteiro" se apresenta como uma série de pequenas confusões porcamente relacionadas por um fio condutor (a busca pelo macaco).

Assim, são todos os momentos absurdos e inexplicáveis da película que valem o espetáculo. No mais hilário deles, Mallandro está atravessando a rua, fugindo dos vilões, quando é atropelado e cai estatelado na calçada. Ouve-se a marcha fúnebre, e o narrador anuncia: "Será este o fim da aventura?". Close na cara imóvel de Serginho "morto", que, de repente, abre os olhos, vira diretamente para a câmera, e para o público, e começa a gargalhar. Uma autêntica (e inexplicável) "Pegadinha do Mallandro"!

(Para ver esse momento mágico da sétima arte no Brasil, espere carregar o vídeo abaixo e então tente sobreviver até os 6min20s, quando rola o hilário e injustificável atropelamento seguido da ressurreição do Mallandro!)

Rááááá! Pegadinha do Mallandro


Em outro momento que é quase inenarrável (existe esta palavra?), Mallandro veste-se de mulher para escapar de Dom Pedro e seus comparsas. Topa, então, com Alexandre Frota "interpretando" ele mesmo - na época em alta graças às novelas "Roque Santeiro" e "Sassaricando".

Frota se apaixona pela "Mallandra" e tenta agarrá-la, mas nosso herói foge pela praia e se esconde atrás de uma prancha de surfe. Subitamente, coloca a mãozinha para fora do esconderijo para fazer seu tradicional "glu-glu"! Genial...


Muitos comparam o "humor" de Sergio Mallandro com o de Renato Aragão. Mas na verdade não tem nada a ver: Mallandro faz um humor físico e careteiro, com uma persona insana que destoa radicalmente do calmo e controlado Didi Mocó. Eu compararia Mallandro neste filme com Jim Carrey em seus primeiros trabalhos, principalmente "Ace Ventura": os dois atores estão absurdamente exagerados e caricaturais, e simplesmente não conseguem ficar parados em cena!

Sergio Mallandro nunca mais conseguiria repetir o mesmo clima de insanidade em seus trabalhos posteriores. Talvez porque eles foram produzidos pela Globo, e fica evidente que tentaram "controlar" o incontrolável Mallandro. Isso explica porque obras como "Lua de Cristal", "Sonho de Verão" e especialmente "Inspetor Faustão e o Mallandro" (argh!) são tão ruins: Serginho parece engessado e desconfortável em cena, obviamente travado por diretores e roteiros que não aproveitaram todo o potencial da sua maluquice.


Pelo contrário, neste seu primeiro trabalho solo, é nítido que nosso herói está "ligadão" o tempo inteiro. Ironicamente, uma das músicas que o Mallandro cantava na época, "Farofa", começava assim: "Comprei um quilo de farinha...". Isso explica muita coisa! (Farinha era uma das gírias mais populares da cocaína na época.)

E se tudo isso que você leu não é motivo suficiente para ver ou rever AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO, vale destacar a pequena participação de "ícones trash" dos anos 80 em momentos completamente dispensáveis. Entre os "convidados" estão Sylvinho e a Banda Absyntho (tocando, claro, o seu único hit, aquele do "ursinho Blau-Blau") e a desaparecida Mara Maravilha (que era mesmo uma gatinha!).


Na trilha sonora, também toca um dos grandes clássicos de Mallandro, "Vem Fazer Glu-glu", aquela impagável composição cujo refrão diz: "Vem, meu amor, vem fazer glu-glu/Mon amour/Vem, meu amor, vem, meu chuchu/Vem bem pertinho fazer glu-glu".

A verdade é que eu até tentei, mas AS AVENTURAS DE SERGIO MALLANDRO é simplesmente um filme indescritível, sem pé nem cabeça, uma bizarra coletânea de maluquices que só vendo para entender o porquê do (merecido) título de "filme mais débil-mental de todos os tempos".

Eu até sugeriria uma impagável Sessão Dupla dele com "Cinderela Baiana", da Carla Perez, mas aí não há neurônio que agüente o impacto...


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As Aventuras de Sergio Mallandro
(1985-87, Brasil)

Direção: Erasto Filho
Elenco: Sergio Mallandro, Pedro de Lara,
Alexandre Frota, Cosme dos Santos, Carla
Prestes, Mara Maravilha e Rolinha.