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quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

10.000 DÓLARES PARA DJANGO (1967)


Depois de alguns títulos bem fuleiros, finalmente chega a hora de dar uma animada na nossa MARATONA VIVA DJANGO! com a análise de uma pequena obra-prima, provavelmente o melhor dos "Sotto-Djangos": 10.000 DÓLARES PARA DJANGO, de Romolo Guerrieri (exibido em nossos cinemas com o título "Django Mata por Dinheiro"). É até uma pena que este filmaço tenha ganhado uma relação bem superficial com a obra de Sergio Corbucci, pois muita gente deve ter deixado de ver pensando algo como "Mais uma porcaria com 'Django' no título", quando não poderia estar mais longe disso.

Os próprios realizadores perceberam que tinham algo muito melhor que um mero "Sub-Django" nas mãos, já que o projeto nasceu com um título enganoso que escancarava a relação (inexistente) com o personagem de Corbucci, "7 Dollari su Django" (em tradução literal, "7 Dólares em Django"), mas no momento do lançamento os distribuidores optaram por mudá-lo para "10.000 Dollari per un Massacro" (ou "10.000 Dólares para um Massacre"). Ou seja: seguiram o caminho inverso dos ambiciosos realizadores da época, que rebatizavam seus faroestes justamente para atrair a atenção dos fãs de "Django". Claro que, no Brasil e em outros países, o nome do personagem voltou para o título...


10.000 DÓLARES PARA DJANGO também marca a estreia do croata Gianni Garko como protagonista de westerns spaghetti. Ele já fazia cinema desde 1958, tendo aparecido em épicos e aventuras "peplum" do período. Também tinha roubado a cena como o excepcional vilão do faroeste "Johnny Texas" (1966), de Alberto Cardone, em que interpretava um psicopata chamado Sartana (!!!), irmão malvado do herói encarnado por Anthony Steffen.

A interpretação de Garko em "Johnny Texas" chamou a atenção dos produtores Mino Loy e Luciano Martino, que resolveram promovê-lo a astro em dois westerns que seriam filmados ao mesmo tempo e com o mesmo elenco: "Pistoleiros em Conflito" ("Per 100,000 Dollari ti Ammazzo"), de Giovanni Fago, e este 10.000 DÓLARES PARA DJANGO, que ficou pronto e foi lançado antes.


Escrito por Ernesto Gastaldi, Sauro Scavolini, Franco Fogagnolo e pelo produtor Martino, 10.000 DÓLARES PARA DJANGO já começa brilhante: ao invés de apresentar seu personagem principal galopando pelo deserto, ou arrastando um caixão por uma estrada lamacenta, a bela cena inicial mostra o caçador de recompensas Django (Garko) deitado à beira da praia (!!!). Agora, de memória, não consigo lembrar de outro western spaghetti que comece mostrando o mar ao invés da tradicional cidadezinha caindo aos pedaços com ruas de areia...

Por alguns breves minutos, enquanto admira o vaivém das ondas, Djando comenta com o amigo deitado ao seu lado sobre as maravilhas da natureza. É quando a câmera se afasta e descobrimos que o "amigo" na verdade é um cadáver, pertencente ao último fugitivo que o caçador de recompensas matou! "Mas acho que agora seu único interesse é o Paraíso, não é?", pergunta Django ao finado, antes de colocá-lo na sela do cavalo e galopar de volta para a cidade para trocá-lo pelo dinheiro da recompensa, enquanto aparecem os créditos iniciais do filme!


Logo descobrimos que o Django de Garko é um "bounty hunter" com um estrito código de conduta: só pega serviços que valham no mínimo 10.000 dólares. Ele vive num quartinho nos fundos do estúdio do amigo fotógrafo Fidelio (Fidel Gonzáles), e nutre uma paixão platônica por Mijanou, a dona do saloon, interpretada por ninguém menos que Loredana Nusciak (que já havia "pegado" outro Django, o original).

Apresentado o herói, vamos conhecer o vilão: ele é Manuel Vasquez (Claudio Camaso, irmão mais novo e menos famoso de Gian Maria Volonté!), um bandido mexicano fugido da cadeia e que está com a cabeça a prêmio, mas custa "apenas" 2.000 dólares, então não interessa ao ambicioso Django.


Porém as coisas tendem a mudar: Manuel passou alguns anos na cadeia por culpa de um rico fazendeiro da região, Don Mendoza (Herman Reynoso). Para vingar-se, ele invade o rancho e mata todo mundo MENOS o próprio Mendoza, a quem reserva um outro tipo castigo: o bandido foge levando consigo a filha do fazendeiro, a jovem e pura Dolores (Adriana Ambesi). O pai desesperado resolve procurar pelo melhor pistoleiro da região (Django, é claro), e, após acirrada negociação, concorda em lhe oferecer a recompensa de 10.000 dólares pela cabeça de Manuel e resgate da filha.

Como Django acabou de explodir com dinamite o seu último alvo, e por isso não recebeu o dinheiro da recompensa, ele decide aceitar o trabalho para equilibrar as finanças. Deixando para trás a enfurecida Mijanou, para quem tinha prometido aposentar-se, o herói sai na pista do mexicano. Mas quando o encontra, ao invés de matá-lo, é convencido a associar-se a ele num golpe rápido e mais lucrativo: roubar uma carruagem que transporta uma fortuna em ouro. Só que as coisas acabam mal, os bandidos traem Django e, no assalto à carruagem, matam a amada do herói. Começa a tradicional busca de vingança.


10.000 DÓLARES PARA DJANGO difere-se de outros "Sotto-Djangos" bem burocráticos ou ruins (como "Django Atira Primeiro" e "Django Não Espera... Mata") principalmente pela preocupação em criar uma história melhor construída e com personagens que tenham motivações, cheios de camadas, contrastando com aquelas figuras de cartolinas que aparecem em outras imitações do clássico de Corbucci.

Aqui, cada personagem tem características bem definidas, que os tornam mais complexos que os clichês ambulantes das aventuras do gênero: Django usa sempre uma echarpe branca no pescoço, Manuel leva o coldre no ombro e saca o revólver por cima, enquanto o velho Vasquez usa na camisa as estrelas de prata pertencentes aos vários xerifes que matou ao longo de sua carreira criminosa.


Heróis e vilões também têm personalidades bem complexas. Por exemplo, o Django de Garko mais uma vez anda no fio da navalha entre o herói e o anti-herói, como Franco Nero lá em 1966. Por não caçar procurados que valham menos de 10.000 dólares de recompensa, o protagonista não apenas deixa Manuel livre na primeira vez em que lhe pedem para pegá-lo (porque vale muito pouco), como ainda comemora que, com os novos crimes praticados pelo mexicano, a recompensa pela sua cabeça começa a subir ("Acho que você tem potencial", comenta sarcasticamente o "herói" ao corrigir o valor ofertado pelo fugitivo num cartaz de "Procura-se").

Também é genial o fato do Django de Garko dormir num quarto rodeado dos cartazes com as fotos dos Procurados que constituem seu ganha-pão (e que são impressos pelo seu amigo Fidelio), como se esta fosse a única coisa que importasse na sua vida. Sinceramente, não consigo imaginar lar melhor para um caçador de recompensas!


Já o vilão Manuel é um criminoso diferente da média clichezenta dos westerns spaghetti, e especialmente dos "Sotto-Djangos". Embora a princípio sequestre a filha de Mendoza por vingança, só para sacanear o fazendeiro, mais adiante fica claro que o bandido acaba se apaixonando pela garota, e vice-versa, tornando um pouco mais complicada aquela clássica trama do "resgate da mocinha indefesa em perigo".

Os personagens secundários também agregam uma riqueza singular à história: além de Fidelio, o atrapalhado amigo fotógrafo de Django (que é um alívio cômico menos escancarado que outros do gênero), e da apaixonada Mijanou, tem um velhinho engraçadíssimo na quadrilha de Manuel, interpretado por Pinuccio Ardia. O coroa é um grande agourento, pois vive fazendo apostas CONTRA o seu "empregador" Manuel - tipo "Aposto sete dólares que Django vai aparecer e pegar todos nós", justificando assim o título inicial do filme lá na Itália, "7 Dólares em Django".


Outro personagem riquíssimo é o pai de Manuel, Vasquez, um velho bandidão aposentado interpretado (claro) por Fernando Sancho, figurinha carimbada nos faroestes italianos e justamente neste papel (mas que apareceu como um raro personagem bonzinho em "Django Não Espera... Mata"). Vasquez vive com alguns ex-colegas de crime numa cidade-fantasma no meio do deserto, constantemente assolada por ventanias e tempestades de areia, que dão um ar surreal ao cenário.

A exemplo do que o diretor norte-americano Sam Peckinpah faria em vários dos seus filmes (incluindo o clássico "Meu Ódio Será Sua Herança"), o personagem de Sancho representa os "velhos tempos", um Oeste que não existe mais, em que havia "honra" e os papéis de mocinho e bandido eram bem definidos, mas que vê no próprio filho o retrato de uma nova geração rebelde que não respeita mais nada.


Numa cena bem diferente, o aposentado criminoso apresenta a Django sua companheira (Ermelinda De Felice), uma envelhecida dançarina, inchada pelo álcool, com quem ele vive há décadas. Quando Vasquez pede que a mulher dance, e ela atende de maneira desengonçada (o que poderá parecer engraçado para certos públicos), o bandidão faz um comovente discurso sobre a implacável ação do tempo: "Há 20 anos, esta garota virou a cabeça de todos os políticos e ricos fazendeiros. Rosita, 'A Boneca', era como lhe chamavam. Você deveria tê-la visto naquela época. E o jeito que ela dançava, amigo... Vamos! Mostre ao nosso amigo como você dançava!".

Enquanto a dançarina velha e gorducha faz o possível para parecer tão sensual como era na juventude, diante de um ainda maravilhado Sanchez, os outros homens no recinto apreciam o espetáculo com um olhar triste, sem jeito até. E quando Fidelio se atreve a rir da insólita apresentação, Django lhe lança um gélido olhar de reprovação. É uma cena melancólica, do tipo que você não espera ver numa aventura de faroeste.


E toques dramáticos são constantes em 10.000 DÓLARES PARA DJANGO. No momento mais triste do filme, o herói encontra o cadáver da sua amada na carruagem atacada por Manuel e seu bando. Em vários outros "Sotto-Djangos", e mesmo lá na aventura oficial de 1966, Django também teve a esposa morta por diferentes antagonistas. Porém em todos estes filmes, e mesmo no de Corbucci, a perda da amada não passa de um simples recurso narrativo para fazer andar a trama, uma justificativa para motivar a vingança do protagonista.

Não é o caso aqui, onde vemos um Django mais humano e mais sensível, que realmente fica emocionado com a morte da amada, chegando a sofrer e chorar - algo impensável em outras encarnações do herói, como Franco Nero em "Django" ou Anthony Steffen em "Um Homem Chamado Django", que também perdem suas esposas. Assim fica mais fácil entender a guinada no roteiro, em que aquele personagem que só pensava em dinheiro subitamente parte para o "tudo ou nada" em busca da velha e boa vingança.


Toda a cena em que Django encontra o cadáver de Mijanou é exageradamente dramática, mas belíssima em sua decupagem: a amada morta encara o herói com seus olhos inexpressivos, como que acusando-o pelo seu triste destino (ela só pegou a fatídica carruagem porque brigou com Django dias antes, quando este resolveu fazer um "último serviço" caçando Manuel).

A montagem alterna planos de detalhe dos olhos acusadores da falecida (como se estivesse dizendo "Eu estou morta por sua culpa!") e dos olhos com lágrimas do herói, num momento sem igual em toda a filmografia do personagem. Aí fica impossível não entender a dor e a angústia do Django de Garko, já que Mijanou não teria morrido caso ele tivesse prendido (ou matado) Manuel ao invés de "associar-se" a ele para o roubo do ouro. E embora o filme se resolva no tradicional duelo de quem saca mais rápido, não importa quem vai ficar vivo no final, pois a vitória é amarga e todos saem perdendo.


Mesmo que seja uma aventura independente, e não uma continuação, percebe-se certo cuidado dos realizadores para linkar 10.000 DÓLARES PARA DJANGO com o filme original de Corbucci, como, por exemplo, a presença da atriz Loredana Nusciak, ou a associação do herói com bandidos mexicanos para o roubo de uma fortuna em ouro, como acontecia também em "Django". Há quem veja também uma forte influência da "Trilogia do Dólar" de Sergio Leone: a busca de vingança pela morte de Mijanou por um bandido mexicano lembraria "Por uns Dólares a Mais" (1965), em que o personagem de Lee Van Cleef queria vingar-se do vilão de Gian Maria Volonté por ter matado sua irmã; a semelhança do bandido interpretado por Claudio Camaso com o vilão de seu irmão Volonté no western de Leone ajudam a justificar esta relação entre as duas obras.

E se o Django de Garko e Guerrieri escapa da terrível punição de ter suas mãos esmagadas pelos bandidos mexicanos, inflingida ao Django de Franco Nero no original de Sergio Corbucci, por outro lado o herói enfrenta uma outra tortura bastante angustiante, quando é enterrado no deserto pelos mexicanos e fica apenas com a cabeça para fora, sofrendo com o sol forte e a sede!


Gianni Garko está perfeito como um herói mais humano e frágil (ele alegou que ainda não tinha visto o "Django" de Corbucci quando fez este filme), e é uma pena que só tenha interpretado o personagem uma vez. Se comparássemos as aventuras de Django com as de James Bond, 10.000 DÓLARES PARA DJANGO seria "007 A Serviço Secreto de Sua Majestade", e Garko o George Lazenby da série, já que o Bond de Lazenby era menos "super-herói" e coincidentemente também perdeu a mulher que amava.

Eu sempre fui um grande fã de Garko, principalmente por causa da série "Sartana". O ator tem um jeitão de quem não leva a coisa muito a sério, sempre com um olhar de fanfarrão e um sorriso cínico, mesmo quando mata 20 inimigos a tiros (só falta piscar para o espectador, lembrando que é tudo uma grande brincadeira). Ainda comparando com James Bond, Garko me lembra um pouco Roger Moore, que sempre teve uma pegada parecida em suas aventuras como 007. Em 10.000 DÓLARES PARA DJANGO, o astro consegue equilibrar muito bem sua habitual fanfarronice com a melancolia que o personagem exige. É, disparado, o terceiro melhor Django depois de Franco Nero, perdendo apenas para Terence Hill em "Viva Django!".


Na época de 10.000 DÓLARES PARA DJANGO, por ainda estar sendo "lançado" como protagonista, Garko foi obrigado pelos produtores a adotar um pseudônimo americanizado, como era comum nos westerns italianos daquele período. Assim, ele aparece nos créditos iniciais como "Gary Hudson", uma homenagem aos astros norte-americanos Gary Cooper e Rock Hudson. A partir da série "Sartana" (cujo primeiro filme é de 1968), o ator passou a assinar como "John Garko", e assim ficou internacionalmente conhecido.

Em sua longa carreira como herói no western spaghetti, Garko às vezes foi chamado para tentar dar mais personalidade a outros heróis, criados para rivalizar com os populares Django, Sartana e Trinity. Ele foi, por exemplo, Camposanto ("Cemitério", em italiano) no filme "Ainda me Chamam de Camposanto" (1971), que não vingou e não virou série, e Espírito Santo em "Espírito Santo, O Justiceiro" (1972), personagem que rendeu outras três aventuras, mas com Vassili Karis no lugar de Garko.


Já o diretor Guerrieri nunca foi tão popular quanto seu astro, apesar deste trabalho acima da média. 10.000 DÓLARES PARA DJANGO foi o quarto filme dirigido por Romolo, que é respectivamente irmão e tio dos também cineastas Marino Girolami ("Zombie Holocaust") e Enzo G. Castellari ("Vou, Mato e Volto"), e quem sabe por isso acabou ficando em segundo plano.

Ele dirigiu mais alguns poucos filmes, como o giallo "O Doce Corpo de Deborah" (1968) e a aventura pós-apocalíptica "O Executor Final" (1984), mas sempre com resultados bem distantes deste seu único "Sotto-Django". Atualmente, Guerrieri trabalha como roteirista da TV italiana.


Vale destacar que pelo menos quatro futuros diretores trabalharam nos bastidores de 10.000 DÓLARES PARA DJANGO. Um é Sergio Martino, irmão do produtor Luciano Martino, aqui creditado como diretor de produção. Ele estreou atrás das câmeras dois anos depois, em 1969, e tem uma filmografia bem eclética, com gialli ("Torso", "A Cauda do Escorpião"), aventuras baratas de ficção científica ("2019 - After the Fall of New York" e "Keruak - O Exterminador de Aço") e cultuados filmes de horror ("A Ilha dos Homens-Peixe" e "A Montanha dos Canibais").

O segundo é Tonino Ricci, que trabalhou como assistente do diretor e pelo jeito não aprendeu muita coisa, a julgar pela quantidade de divertidíssimas tralhas que o sujeito passaria a dirigir por conta própria, também a partir de 1969. Sua obra mais popular, inclusive para os brasileiros, é o terror trash "Pânico" (1976), mas Ricci dirigiu ainda uma hilária cópia de "Conan" ("Thor, o Conquistador") e paupérrimos fimes de horror sobre o Triângulo das Bermudas (o inacreditável "Bermude: La Fossa Maledetta" e "Encuentro en el Abismo").

Os outros dois são o assistente de câmera Pasquale Fanetti - que, com o pseudônimo "Frank DeNiro", virou diretor de filmes pornográficos nas décadas de 80 e 90 -, e o secretário de produção Michele Massimo Tarantini, aqui em um dos seus primeiros trabalhos com cinema, antes de dirigir "clássicos" como "Poliziotti Violenti" e "Perdidos no Vale dos Dinossauros"! Em resumo, é muito talento para um filme só, o que talvez explique o resultado muito acima da média!


10.000 DÓLARES PARA DJANGO foi uma das mais nobres e interessantes variações produzidas em cima da obra de Sergio Corbucci, e percebe-se o trabalho de todos os envolvidos para fazer algo além de uma aventura de rotina só para faturar com o nome do personagem. O mérito é principalmente do ótimo roteiro, que foge do lugar comum do gênero, e onde se percebe a valiosa contribuição de Ernesto Gastaldi, um dos grandes roteiristas italianos de todos os tempos.

É até uma pena que o filme tenha ficado associado às demais cópias de "Django", porque muitas delas são tão ruins que esta bela obra deve ter sido mal-interpretada como picaretagem de má qualidade, quando na verdade é um dos raros "Sotto-Djangos" a buscar uma abordagem original, ao invés de só tentar lucrar com um título enganoso.


Por isso, talvez seja melhor referir-se a ele pelo título italiano, "10.000 Dollari per un Massacro". Porque perto de outras bobagens produzidas com o nome "Django" no título, incluindo a única continuação oficial do clássico de Corbucci (o péssimo "Django, A Volta do Vingador"), o filme de Guerrieri é praticamente um "Cidadão Kane" - e uma pérola a ser (re)descoberta.

PS: Para fechar o conjunto com chave de ouro, a trilha sonora da cantora, compositora e pianista italiana Nora Orlandi é fantástica, e não deixa a menor saudade de Ennio Morricone, Bruno Nicolai, Riz Ortolani e outros mestres que musicavam os westerns spaghetti do período. Infelizmente, a trilha completa não está disponível no YouTube para ser apreciada, mas dê uma conferida na linda música-tema "Basta Così", cantada por Pier Giorgio Farina, clicando neste link (logo logo o Tarantino usa esta canção num próximo filme dele!).


Trailer de 10.000 DÓLARES PARA DJANGO



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10.000 Dollari Per Un Massacro (1967, Itália)
Direção: Romolo Guerrieri
Elenco: Gianni Garko, Claudio Camaso, Loredana Nusciak,
Fernando Sancho, Fidel Gonzáles, Adriana Ambesi, Franco
Lantieri, Pinuccio Ardia e Franco Bettella.

sábado, 13 de março de 2010

O EXECUTOR FINAL (1984)


Você já parou para pensar como o mundo seria triste caso o australiano George Miller não tivesse dirigido o clássico "Mad Max 2" em 1981? Primeiro, porque não teríamos esse FILMAÇO (um dos tantos na minha lista de melhores filmes de todos os tempos). Segundo, porque não teríamos todas aquelas maravilhosas e engraçadíssimas cópias trash de "Mad Max 2" feitas na Itália, como "Guerreiros do Futuro", de Enzo G. Castellari, e "O Guerreiro do Mundo Perdido", de David Worth (dois filmes que merecem seu espaço em breve aqui no FILMES PARA DOIDOS).

Nenhuma delas chega aos pés do original, é claro. Mas convenhamos que parecia relativamente fácil fazer clones de "Mad Max 2", pois não só os italianos, como também muitos norte-americanos e até outros australianos, investiram nas suas "versões genéricas". O visual pós-apocalíptico garantia até certa economia aos realizadores, já que poderiam usar cenários semi-desmontados e figurinos esfarrapados, além de veículos em cacarecos.


O EXECUTOR FINAL é uma destas inúmeras cópias trash italianas do clássico de George Miller. A diferença para as outras é que a trama, escrita por Roberto Leoni (de "A Cruz dos Executores"), não tem cara de clone de Mad Max e traz pouquíssimos elementos das aventuras pós-apocalípticas. A bem da verdade, o roteiro parece ter sido adaptado apenas para faturar em cima da onda, e as poucas cenas "pós-apocalípticas" destoam do resto do filme, como se tivessem sido incluídas de última hora no roteiro apenas para transformá-lo em mais uma aventura do gênero.

E é justamente isso que torna o filme hilário. O EXECUTOR FINAL já começa com a tradicional narração explicando como nosso mundo foi destruído por bombas nucleares - narração esta que se desenrola sobre o maior número de cenas de arquivo que os produtores conseguiram encontrar, de explosões atômicas a fotos de cidades devastadas na Segunda Guerra Mundial, e até a erupção de um vulcão! A coisa é tão bizarra que vale até postar aqui o vídeo do YouTube, para que vocês possam (re)ver e se emocionar:

O Apocalipse com cenas de arquivo


O narrador explica que a terra pós-apocalíptica acabou dividida em duas castas: uma com mais grana (claro!) vivendo nos subterrâneos, e outra lazarenta obrigada a viver na superfície, e contaminada pela radiação. Como uma forma de acabar com o problema dos humanos contaminados, explica o narrador, os ricaços lá do subterrâneo resolveram criar temporadas de caça. Você não leu errado: exóticos caçadores especializaram-se em subir à superfície para divertir-se caçando os humanos radioativos e acabando com a raça deles, para que não possam se reproduzir e continuar espalhando seus genes podres pela terra devastada.

Quando finalmente a história começa, encontramos o herói Alan Tanner, um cientista, sendo transportado do mundo subterrâneo à superfície. Alan é interpretado pelo austríaco William Mang, o mais próximo de um clone do Kurt Russell (em alta na época por causa dos filmes de John Carpenter) que os italianos conseguiram encontrar.

Descobriremos mais tarde que o herói é um cientista condenado injustamente a virar presa dos caçadores da superfície, assim como sua namorada (Cinzia Bonfantini). Ele descobriu que a contaminação terminou e que as pessoas da superfície não precisam mais ser exterminadas. Mas é claro que os fãs das caçadas humanas não querem que este "pequeno detalhe" chegue aos ouvidos do povo... Melhor mandar o cientista sabichão para a superfície como alvo!


Quando a trama sai do metrô para a superfície, o universo de "Mad Max 2" se mescla com o do clássico "The Most Dangerous Game", de 1932 (que influenciou, entre outros filmes, "O Alvo", de John Woo). Afinal, o herói e alguns outros humanos desafortunados servirão como caça para um grupo de exóticos caçadores vestindo o típico figurino pós-apocalíptico trash desse tipo de filme (muito couro preto, fitas na cabeça, adornos com pontas de metal...), ou mesmo as roupas que sobraram das obras anteriores da produtora (uma das moças usa um vestido que parece saído de algum épico sobre o Império Romano, por exemplo)

Os líderes dos caçadores são Edra (Marina Costa, no primeiro dos seus dois filmes) e Erasmus (Harrison Muller Jr.). Depois que os vilões cercam e exterminam um grupo de humanos, Alan e sua garota acabam capturados. Um dos caçadores estupra a moça, que depois é morta.


Já Alan foge e é atingido com um tiro, mas sobrevive e recupera-se nas mãos de um ex-policial chamado Sam (Woody Strode!). Pelos próximos 20 minutos, Sam dá uma de mestre Miyagi e treina Alan para a sua vingança. As cenas de treinamento, usando fogo e arame farpado, estão entre as melhores do filme.

Clássico da era de ouro do VHS no Brasil (saiu pela distribuidora Hipervídeo com uma capinha ridícula reaproveitada do pôster de "Assalto à 13ª DP", de Carpenter), O EXECUTOR FINAL é trash, absurdo, mal-dirigido e por isso mesmo engraçadíssimo. Embora não tenha a violência necessária, em comparação com outros clones italianos de "Mad Max 2", não faltam nudez e baixaria, com cenas de sexo, estupro e a nudez constante das estrelinhas Margit Evelyn Newton (que todos lembrarão de "Predadores da Noite", de Bruno Mattei) e Maria Romano (figurinha carimbada dos filmes italianos de mulheres na prisão).

O veterano Strode, nome conhecido dos western spaghetti (fez até "Era Uma Vez no Oeste"!), aparece em cena durante uns 15 minutos, e mesmo assim é a melhor coisa do filme.


Quando Strode não está, resta ao espectador rir das cenas de ação frouxas e da pobreza geral da produção. Por falar nisso, percebi grandes semelhanças entre os cenários, figurinos e instrumentos usados no filme (inclusive as armas de quatro ou cinco canos usadas pelos vilões) com aqueles que aparecem no clássico trash "Ratos", do Mattei, filmado no mesmo ano de 1984. Será que foram rodados simultaneamente, reaproveitando os mesmos elementos de cena? Eu apostaria 10 centavos que sim.

Vale destacar que todas as cenas com Woody Strode foram reutilizadas, cinco anos depois, em outra bagaceirice da Terra da Bota, "Bronx Executioner", dirigido por Vanio Amici em 1989. Cerca de 50% desse filme é formado pelas cenas de O EXECUTOR FINAL. Inclusive Strode nem precisou pisar no set nesta filmagem de cinco anos depois, e foi apenas redublado! O tipo de picaretagem que os italianos adoravam fazer...


Mais divertido no início do que quando descamba para a batida trama de vingança, O EXECUTOR FINAL tem alguns elementos que só confirmam a fama trash que recebeu desde o seu lançamento, como o péssimo e afetado vilão interpretado por Muller Jr.

Os realizadores até tentaram lhe dar alguma sofisticação: ele está sempre vestido de negro da cabeça aos pés, tem uma motocicleta estilosa, uma espada samurai e até aparece jogando xadrez consigo mesmo em certa cena. Mas não adianta: a suspeitíssima echarpe branca que o sujeito usa, e seus discursos medonhos (chamando os humanos contaminados de "animais"), afundam qualquer tentativa de criar um vilão sério.


Isso, mais a quantidade absurda de imbecilidades e bobagens ao longo da trama (incluindo uma cena de "condicionamento mental" à la "Laranja Mecânica"), transformam o que era para ser um filme pós-apocalíptico numa bizarra comédia involuntária. Principalmente por causa da noite em que o quartel-general dos vilões é invadido por Alan, que mata um deles. Ao encontrar o cadáver, o nosso amigo da echarpe branca ordena aos companheiros: "Alguém invadiu a casa. Vamos dormir e amanhã procuramos por ele!". Isso sim que é avaliar as prioridades...

Não dá para não perceber, ainda, o excesso de câmera lenta nas cenas de ação, à la Enzo Castellari. A menção do nome do mestre não é gratuita: acontece que o diretor de O EXECUTOR FINAL, Romolo Guerrieri, é tio de Enzo.

Pena que, ao contrário do sobrinho, Romolo utilize o recurso sem qualquer critério ou noção de estilo, colocando em câmera lenta até mesmo o que não precisa. Isso sem contar as exageradas piruetas feitas pelos dublês em meio às explosões - coisa de circo, como você pode ver na imagem abaixo!


Ruim em vários sentidos, divertido em outros tantos, e até bem-feitinho em alguns momentos, O EXECUTOR FINAL é aquele legítimo FILME PARA DOIDOS que sempre acaba encontrando o seu público, mesmo que esteja muito abaixo do padrão dos clones italianos de "Mad Max 2". Como eu escrevi lá no começo, parece uma historinha qualquer adaptada de última hora para o universo do filme de George Miller, e isso se percebe claramente.

O negócio é relaxar e rir muito com a quantidade de bobagens, deleitar-se com as belíssimas italianas de peitos de fora (principalmente Margit, uma musa esquecida) e surpreender-se com a precariedade da vingança do herói incompreendido Alan, já que quase todos os vilões de quem ele quer se vingar são mortos por outras pessoas que não ele!!! Bela vingança, hein?

Melhor sorte em "O Executor Final 2"!

Treinamento ninja em O EXECUTOR FINAL


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The Final Executioner/L'Ultimo
Guerriero (1984, Itália)

Direção: Romolo Guerrieri
Elenco: Woody Strode, William Mang,
Marina Costa, Harrison Muller Jr., Margit
Evelyn Newton e Maria Romano.