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quarta-feira, 6 de maio de 2009

MASSACRE EM SAN FRANCISCO (1974)


O Internet Movie DataBase, maior fonte de informações para fãs de cinema na internet, afirmava categoricamente que "O Vôo do Dragão", filme escrito e dirigido pelo astro Bruce Lee em 1972, era o único em que o ator Chuck Norris interpretava um vilão. E foi aí que eu percebi como MASSACRE EM SAN FRANCISCO era realmente uma produção das mais obscuras, pois neste esquecido filme de ação made in Hong-Kong o lendário Norris, ainda bem longe da fama, também interpreta um malvadão. (A informação incorreta foi recentemente corrigida pelo IMDB, que agora informa que Norris interpretou dois vilões em sua carreira.)

"Oficialmente", MASSACRE EM SÃO FRANCISCO é de 1974, tornando-se assim o terceiro papel creditado de Chuck Norris no cinema. Mas esta produção barata da Golden Harvest foi muito mal-lançada, e depois ficou mofando nas prateleiras da produtora. Como alguns anos depois Norris estouraria como astro, ganhando seu primeiro papel de protagonista em "Comboio de Carga Pesada" (1977), a Golden Harvest sacou o filme do depósito onde estava mofando, mudou o título original de "Karate Cop" para "Slaughter in San Francisco" (apesar de não haver nenhum massacre no filme, seja em San Francisco ou em qualquer outro lugar), e rodou novos créditos iniciais com o nome de Chuck Norris em destaque para relançá-lo nos cinemas ocidentais!


Picaretagem total, não é? E isso que nem falei do novo trailer, que tentava vender Chuck como protagonista, ou do cômico novo pôster de cinema, que anunciava "Chuck Norris explode na tela", e trazia um desenho do ator em posição de combate cercado por policiais (cena que não existe no filme!), mas sem nenhuma menção ao verdadeiro protagonista do filme - o coreano Don Wong!!!

A picaretagem estendeu-se ao Brasil: quando a FJ Lucas lançou essa porqueira em vídeo, teve bastante criatividade para criar uma capinha completamente enganosa que levava o espectador a acreditar que Chuck Norris era o verdadeiro protagonista do filme, como você pode ver abaixo (fonte: Museu do VHS, de Bruno Martino):


Não é por nada que, em diversas entrevistas depois de famoso, Norris declarou que o único filme que se arrependeu de fazer foi MASSACRE EM SÃO FRANCISCO. Mais um motivo para conhecê-lo, não é mesmo? Até porque, ao contrário da hipócrita da Xuxa, ele nunca tentou tirar o filme de circulação.

Don Wong, cujo verdadeiro nome é Wang Tao, interpreta um policial oriental que patrulha San Francisco (o filme realmente foi rodado nos States) ao lado do parceiro John Summer (Robert Jones), um policial negro com uma vasta cabeleira black power, só para lembrar que estamos vendo uma produção dos anos 70 - aposto que uma instituição conservadora, como a polícia de San Francisco, iria adorar ter policiais com cabelo black power na corporação...


O filme foi escrito e dirigido por Lo Wei, o responsável pelos dois primeiros (e CLÁSSICOS, em maiúsculas mesmo) filmes de Bruce Lee, "O Dragão Chinês" e "A Fúria do Dragão". Aqui, infelizmente, ele não estava tão inspirado, inclusive assina com o pseudônimo "William Lowe".

Seu roteiro é uma autêntica confusão. Primeiro, a dupla de policiais heróicos está dirigindo sua viatura pela rodovia quando, miraculosamente, escuta os gritos de socorro vindos de um bosque a mais de um quilômetro dali. É uma garota oriental (Sylvia Chang) que supostamente está sendo estuprada por dois valentões. Mas, depois que os policiais acabam com ambos a golpes de karatê, a moça aparece na delegacia dizendo que foi tudo um mal-entendido e pedindo para libertar os "amigos".

Depois, o policial John cai numa emboscada e é empurrado para dentro de um caminhão repleto de bandidos (nunca identificados). Levado até a praia, toma vários catiripapos até ser miraculosamente localizado pelo amigo faixa-preta Wong, que salta como um tigre sobre os agressores e, furioso, acaba matando um deles. O chefe de polícia não pensa duas vezes e expulsa o "Bruce Lee cover" da corporação, fazendo com que ele vá buscar emprego como garçom num restaurante chinês - e onde mais um oriental poderia trabalhar em San Francisco?


E eis que finalmente a história começa a entrar nos eixos: surge o malvadão Norris, chamado simplesmente "The Boss", e que vem a ser o rei do crime da cidade. Sua primeira cena no filme é queimando a mão do herói com um charuto aceso, só para dar uma amostra da sua maldade. "The Boss" acaba gostando do ex-policial, aparentemente apenas pela sua capacidade de resistir à dor da queimadura do charuto, e teima em trazê-lo para sua organização. Mas Wong é honesto e não quer saber de virar a casaca.

Então, dias depois, John tenta frustrar um assalto e é morto pelos bandidos, obviamente chefiados por "The Boss". Mesmo afastado da polícia, o herói decide investigar o caso por conta própria e vingar-se dos responsáveis. E o faz da maneira mais cômica e absurda possível: simplesmente passa os próximos 20 minutos do filme invadindo a casa de elementos suspeitos da cidade (!!!) e batendo pra caramba neles (!!!) até encontrar, por mero acaso (!!!), um dos envolvidos no crime, que entrega todos os responsáveis, inclusive um homem misterioso que vem a ser o próprio chefe de polícia de San Francisco (argh!!!).

Isso tudo apenas para levar à luta final entre Wong e Norris, que em nada lembra aquele duelo com Bruce Lee no Coliseu em "O Vôo do Dragão", mas ainda assim é muito divertido - e, claro, tem aquele velho clichê da camisa do herói rasgando para ele lutar de peito nu!!!



O filme tem também uma absurda trama paralela em que um velho comerciante chinês é preso (sem qualquer prova) pelo assassinato do policial John, e a polícia ainda tenta arrancar uma confissão do velhinho na base da porrada.

Apesar do cartaz de cinema, de alguns títulos alternativos enganosos (como "Chuck Norris Versus Karate Cop") e do fato do nome do ator norte-americano aparecer por primeiro nos créditos iniciais do filme, MASSACRE EM SAN FRANCISCO não é, de maneira nenhuma, um filme de Chuck Norris.

As cenas com o futuro astro não chegam a somar dez minutos, e ele praticamente entra mudo e sai calado, interpretando aquele tipo de vilão que passa a trama inteira dando ordens para seus subalternos, sujando as mãos apenas no final. Tirando a luta da conclusão, só existe uma ceninha mixuruca com "The Boss" treinando karatê, para quem realmente quiser ver Norris em ação.

E se como filme de pancadaria MASSACRE EM SAN FRANCISCO não é lá grandes coisas (embora algumas lutas, especialmente a final, sejam muito boas), a produção torna-se mais do que recomendada pelo inevitável fator trash. Afinal:

* Este é o segundo dos dois únicos filmes em que você poderá ver "o mito" Chuck Norris realmente apanhando. E perdendo uma luta!

* A dublagem dos personagens segue o padrão "filme de Hong-Kong" de qualidade: até Norris é dublado exageradamente e ganha sotaque inglês! Mas o cúmulo é quando um cão policial também aparece dublado: o bicho está lá quietinho, com a língua de fora, e mesmo assim algum energúmeno adicionou uma trilha de ferozes "au-aus"!!!

* O som das pancadas e do deslocamento de ar durante os golpes é tão exagerado que mesmo quando o herói e seu amigo John trocam uns tapinhas por puro fingimento (sem se acertar com força), a gente escuta algo do tipo POW! SOC! TUM!, como se ambos estivessem realmente se moendo na pancada!


* Todo mundo na polícia de San Francisco sabe lutar karatê - do policial oriental ao negro black power, passando até pelo chefe de polícia!!! -, e todos eles preferem dar bolachas nos bandidos a usar revólveres.

* Em que outro filme você vai encontrar um herói que, sem pistas para seguir, simplesmente sai dando porrada em todo mundo até que alguém confesse o que ele queria saber?

* Mesmo quando o protagonista está cercado por 15 sujeitos armados, os bandidos continuam atacando um por vez, para que cada um possa apanhar na ordem.

* O chefe de polícia parece ser um oficial da Gestapo: não só acusa um pobre velho oriental pela morte de um policial (APENAS porque o cadáver foi deixado no quintal da casa do coitado), como ainda espanca o SUSPEITO o tempo inteiro e manda prendê-lo, sem direito a fiança, mesmo que não existam provas contra ele!


* "The Boss" passa o filme inteiro tentando convencer o herói a fazer parte da sua organização, ao invés de matá-lo de uma vez. No final, Wong consegue infiltrar-se facilmente no QG do vilão e descobrir todos os seus negócios sujos APENAS dizendo algo do tipo: "Tudo bem, eu finalmente resolvi me juntar à organização". E o vilão acredita! Belo rei do crime...

* Num momento da luta final, Wong e "The Boss" caem dentro de uma fonte e ficam completamente molhados. Mas no take seguinte, ambos já estão sequinhos. Vai ver a alta temperatura da luta fez toda a água evaporar instantaneamente!

Filho do também ator George Wang (que era habitué em produções baratas de western e espionagem feitas na Itália nos anos 60 e 70), Don Wong até luta bem e convence. E não dá para relevar o fato de que ele ganha uma luta contra o Chuck Norris, caramba!


Mas a verdade é que Wong nunca fez mais do que isso, e ironicamente quem transformou-se em astro aqui foi o inexpressivo vilão do filme! Seu azar foi ter estrelado uma produção tão sem sal, em que a pobreza de recursos e de orçamento está mais do que evidente, inclusive pelo fato de o herói passar o filme inteiro com a mesma roupa (comprovando que higiene pessoal não é o seu forte).

O marketing da época tentou vendê-lo como "o tigre" (um dos muitos títulos alternativos é "Yellow Faced Tiger"), já que Bruce Lee era o dragão, mas não funcionou. Pelo menos em Hong-Kong ele continuou uma prolífica carreira que somou 40 filmes (nenhum deles fez grande sucesso), e encerrou em 1989.

Quem gosta dessas curiosidades do cinema de ação de Hong-Kong, ou simplesmente procura um filme bem ruim para dar risada, terá em MASSACRE EM SAN FRANCISCO um prato cheio. Pena que a fita VHS da FJ Lucas seja uma daquelas raridades disputadas a tapa por colecionadores, e a obra nunca tenha sido relançada numa versão decente em DVD.

Será que Norris toparia fazer uma faixa de comentário discutindo a "profundidade psicológica" do seu personagem na cena em que o vilão come uma maçã enquanto seus capangas apanham do herói?

Trailer de MASSACRE EM SAN FRANCISCO


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Slaughter in San Francisco/ Karate Cop/
Huang Mian Lao Hu (1974, Hong-Kong, EUA)

Direção: William Lowe (Lo Wei)
Elenco: Don Wong, Chuck Norris, Robert
Jones, Chuck Boyd, Sylvia Chang, Dan
Ivan e Ching-Ying Lam.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

NO CORAÇÃO DO PERIGO (1986)


Depois de duas resenhas de filmes mais amenos, chegou a hora de voltar ao que interessa, amiguinhos. Ou seja: filmes de ação casca-grossa, daqueles com tanto tiro e explosão que, depois de ver, dá vontade de pegar uma metralhadora e sair pelas ruas declarando guerra contra o mundo inteiro. Um belo exemplar desse estilo é o visceral NO CORAÇÃO DO PERIGO (1986), mistura explosiva de ação e guerra feita por John Woo antes de ir para Hollywood e virar florzinha.

Originalmente chamado "Ying Xiong Wu Lei", e nos EUA "Heroes Shed No Tears" (Os Heróis Não Derramam Lágrimas), NO CORAÇÃO DO PERIGO representou uma mudança radical no "estilo Woo" de cinema. Até então, ele era conhecido como diretor "pau-pra-toda-obra" da Golden Harvest, contratado para dirigir filmes de artes marciais (dois bons saíram no Brasil como "A Jugular Blindada" e "A Lâmina Fatal") e até comédias de horror ("A Farra do Demônio", de 1981).

Finalmente, entre 84 e 85, o cineasta foi para a Tailândia rodar este que é seu primeiro grande filme de ação, com sangrentos e exagerados tiroteios, cenas estilizadas de ação em câmera lenta e muito sangue jorrando, lançando uma forma toda pessoal e barulhenta de fazer filmes que atingiria a perfeição nos clássicos "Fervura Máxima" e "The Killer", ambos dos anos 90.


Mas, como todo diretor à frente do seu tempo, Woo teve que enfrentar a cabeça fechada dos seus patrões da Golden Harvest, que não gostaram do festival de tiros e explosões sem propósito de NO CORAÇÃO DO PERIGO e deixaram o filme mofando na gaveta, sem lançamento comercial. Ele só chegou aos cinemas em 1986, quando o diretor alcançou fama internacional justamente através de um filme com tiroteios violentos e estilizados, o ótimo "Alvo Duplo" (A Better Tomorrow/Ying Hung Boon Sik), com Chow Yun-Fat, que saiu naquele ano. Com Woo transformado em "nome quente" dos filmes de ação, finalmente seu épico de guerra viu a luz do dia.

O mais interessante de NO CORAÇÃO DO PERIGO é que ele já traz todos os elementos que o diretor aperfeiçoaria nos filmes seguintes (a relação amizade-honra, onde vale a pena se sacrificar por amigos ou pela "coisa certa"; os vilões obcecados e movidos pela fúria cega; os amigos que tombam pelo caminho em cenas dramáticas em câmera lenta; atiradores usando uma arma em cada mão; um herói enfrentando um exército, etc etc etc...).

Mas tudo isso, aqui, ainda é feito de maneira crua, caótica, barulhenta, sem aquelas acrobacias e coreografias perfeitas que apareceriam nos filmes seguintes. Justamente por isso, talvez este seja o trabalho mais furioso do diretor, antes de virar moda e começar a enfeitar as obras posteriores - e sem astros de Hollywood, como Tom Cruise e Ben Affleck, ou a MPAA para encher o saco.

Eu vi o filme pela primeira vez nos anos 90. Woo estava em alta e era "moderninho" conhecer seu cinema, já que a nossa imprensa, sempre atrasada (considerando que o cara já fazia filmes há duas décadas), começou uma babação de ovo descarada à "coreografia da matança" do cinema do diretor - com muitos pseudo-críticos e pseudo-jornalistas esquecendo que Sam Peckinpah e Enzo G. Castellari já faziam mais ou menos a mesma coisa bem antes de John Woo. Mas enfim, o homem era febre, só se falava nele e era praticamente obrigatório conhecer seus filmes para não ficar por fora.


Existem duas versões circulando. A original tem 93 minutos, mas o corte internacional mal chega a 80 minutos. Foi esta versão, dublada em inglês ainda por cima, que chegou às videolocadoras brasileiras pela Penta Vídeo. E eu só conhecia esta versão reduzida, mas ficava pensando o que haveria nos 13 minutos cortados, considerando que o filme, do jeito que está, já é um massacre. Felizmente, agora fui descobrir que os cortes são apenas de cenas "expositivas", que aprofundam a relação entre os personagens - e estas cenas cortadas não fazem qualquer diferença.

Do jeito que está, NO CORAÇÃO DO PERIGO é nitroglicerina pura: começa com um prólogo vapt-vupt explicando sobre o "Triângulo Dourado" que controla o tráfico de drogas entre Mianmar, Laos e Tailândia, e que seria responsável por 75% da distribuição de entorpecentes no mundo todo. Em seguida, ficamos sabendo que o governo tailandês contratou um grupo de destemidos mercenários para explodir o quartel-general dos traficantes e levar à justiça o principal cabeça da organização, o general Sampton. No momento seguinte, sem qualquer outra cena expositiva ou apresentação dos personagens, o filme corta diretamente para a ação, com o tal grupo de mercenários invadindo a base de Sampton e detonando uns 100 soldados inimigos - tudo isso só nos primeiros dez minutos!!!

O chefão do tráfico é levado pelos soldados, liderados pelo típico herói durão Chan Chung (Eddy Ko, visto recentemente em "Mad Detective", de Johnny To). Ele aceitou liderar a missão para poder mudar-se com o filho Sang para os Estados Unidos. O problema é que se a prisão de Sampton foi fácil, levá-lo até a fronteira do país para entregá-lo às autoridades não será tão simples: perseguidos pelos intermináveis homens do traficante, eles cruzam o país enfrentando inúmeros perigos e batalhas violentas.

A coisa piora quando, na fronteira com o Vietnã, eles compram uma briga que nem era deles ao resgatar uma jornalista francesa (Cécile Le Bailly) do estupro coletivo pelos homens liderados por um sádico e anônimo comandante (Ching-Ying Lam, ótimo). Durante o resgate, Chung acaba cegando o vilão, que então empreende uma caçada obsessiva aos mercenários, usando todo o exército do país e mais os reforços de uma tribo local, "convencida" à força a participar da perseguição. Some-se a eles os homens do traficante e dá para ter uma idéia da quantidade de problemas (e de inimigos) que os nossos heróis terão que enfrentar ao longo do resto do filme - principalmente porque o filho de Chung e sua cunhada passam a fazer parte da caravana fugitiva!


NO CORAÇÃO DO PERIGO praticamente não tem história, ainda mais nesta versão reduzida. É ação, ação e ação: um tiroteio leva ao outro, centenas de figurantes perdem a vida (imagine 15 tiroteios finais de "Comando Para Matar", e você terá uma idéia do massacre absurdo perpetrado neste filme...), e os comandados de Chung aos poucos vão perecendo pelo caminho, sempre da forma mais horrível e violenta, normalmente crivados por inúmeras rajadas de metralhadoras, embora uma das cenas mais violentas envolva um soldado atravessado por diversas lanças inimigas - o que me lembrou morte semelhante no espetacular "Conquista Sangrenta", de Paul Verhoeven.

Lá pela metade, há algumas tentativas de fazer humor que arrastam um pouco a narrativa (e soam deslocadas), principalmente uma envolvendo um mercenário viciado em jogos de azar. Claro que fica meio forçado imaginar que, com meio país atrás deles, o cara iria perder tanto tempo jogando dados! Mais adiante, o grupo chega à casa de um amigo de Chung dos tempos do Vietnã, um soldado norte-americano desertor (interpretado por Philippe Loffredo) que vive chapado (!!!), ransando com duas garotas (!!!) e permanentemente com um cinturão de explosivos amarrado ao tórax (!!!), para poder explodir seus inimigos a qualquer momento!!!

E é aí que se inicia uma das maiores matanças da história do cinema de ação... É tanto tiro e tanta morte que o espectador até começa a aceitar com naturalidade o fato de meia dúzia de caras conseguir exterminar centenas de inimigos sem muita dificuldade. Praticamente não há trilha sonora: rajadas de metralhadora e explosões são a única música ao longo dos 80 minutos de genocídio!

Numa história movida pela ação, escrita pelo próprio John Woo, os personagens quase nem têm nomes. É o caso do anônimo vilão que Chung cega com um tiro disparado através da mira telescópica da arma do sujeito (cena que seria "reaproveitada" por Spielberg em "O Resgate do Soldado Ryan"). Sem um olho e cego (literalmente) de fúria, o oficial passa o restante da história querendo o couro do herói, movido à morfina para amenizar as dores do ferimento.


E no meio deste inferno de balas e mortes, Woo ainda consegue espaço para mostrar a dramática relação entre o herói e seu filho pequeno, num toque que lembra o mangá "Lobo Solitário".

NO CORAÇÃO DO PERIGO é ação barulhenta, absurda e exagerada. Um filme de guerra feio, sujo e malvado que, se fosse filmado hoje, seria "Rambo 4". Um filme de macho onde as mulheres não têm vez nem voz, e só aparecem para serem estupradas ou servirem de alvo. Um filme onde morrem 100, 200, 300 inimigos, e aí você pára de contar porque ainda tem muito tempo pela frente. Um filme em que tiros de escopeta e de metralhadora de grosso calibre lançam os dublês vários metros longe, em que sangrentos buracos de bala explodem na roupa das vítimas, em que você quase sente a dor dos tiros, tal o realismo da coreografia da matança.

Um filme que encerra com uma luta brutal e de mãos limpas entre Chung e o comandante caolho, então já reduzidos a verdadeiras feras selvagens. Os dois trocam porradas entre escombros em chamas, de maneira tão convincente que os atores (e seus dublês) devem ter terminado a filmagem da cena repletos de hematomas da cabeça aos pés. Enfim, um filme que você jamais vai poder assistir com a sua namorada!


E se o próprio cineasta posteriormente filmaria uma história de guerra superior ("Bala na Cabeça", de 1990), é até bom ver esta para comparar com as produçõezinhas fru-frus que o homem dirige hoje nos Estados Unidos!

A verdade é que Woo nasceu para fazer estes filmes exagerados, repletos de tiros e explosões, com 300 mortes on-screen, e não coisas tipo "Missão Impossível 2" e "O Pagamento". Quando foi importado para os EUA, ele não soube se reciclar, e seus filmes da "fase Hollywoodiana", além de não trazerem nada de novo (sempre descambam para os tradicionais duelos em câmera lenta com duas pistolas nas mãos e pombas voando, o que acabou até se tornando uma piada), têm muito enfeite e pouquíssimo conteúdo.

Por isso, façam coro comigo: "Volta pra Hong-Kong, Woo!!!".

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Heroes Shed No Tears/Ying Xiong Wu Lei
(1986, Hong-Kong)

Direção: John Woo
Elenco: Eddy Ko, Ching-Ying Lam, Cécile Le
Bailly, Philippe Loffredo, Kuo Sheng, Chau
Sang Lau, Ho Kon Kim.