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quinta-feira, 30 de abril de 2009

Outros filmes que você infelizmente NÃO vai ver num cinema perto de você


AVENTURAS DE UM CAÇADOR (2003, Recife - PE)

Dirigido pelo auxiliar de enfermagem recifense José Manoel, "Aventuras de um Caçador" dá uma idéia de como seriam os filmes de Simião Martiniano ou Seu Manoelzinho se eles tivessem uma produção melhorzinha e, principalmente, edição feita no computador: embora visualmente a obra seja caprichada, a falta de história para contar, as idas-e-vindas sem necessidade e as interpretações exageradas dos atores amadores lembram que estamos diante de um legítimo exemplar do "Cinema de Bordas".

A história acompanha as aventuras de um jovem chamado André, que se embrenha na mata para procurar o pai que ele nunca conheceu, mas sabe que é caçador. No seu encalço estão dois presidiários que ganharão a liberdade caso consigam capturar o rapaz. Todos estes personagens acabam cruzando com o caçador do título. E o "quase longa-metragem" de 55 minutos fica nisso, apenas registrando as inúmeras andanças dos personagens pela mata, registrando sotaques e hábitos bem característicos da região em que foi produzido.

"Aventuras de um Caçador" tem algumas cenas involuntariamente hilárias, como o reencontro entre pai e filho no meio do bosque. Quando o garoto diz que procura pelo pai caçador que se chama Fulano e tem uma mãe chamada Beltrana, o outro responde: "Me chamo Fulano e minha esposa é a Beltrana... Mas tem muitos Fulanos e Beltranas no mundo". Meros dois segundos depois, o caçador finalmente recebe alguma iluminação divina e então se rende: "Mas agora eu reconheço você como meu filho!".

Em dois momentos, ainda, personagens diferentes vêem-se em dificuldades por picadas de aranha-caranguejeira e de cobra venenosa. O primeiro fica caído no chão gritando incontáveis "Ai meu Deus" (pelo menos uns 30), e o segundo acaba cego (???) após a picada e, encostado a uma árvore, murmura sem um pingo de emoção: "Socorro, tou cego... Fui mordido de cobra! Socorro!". hahahaha.

Momentos como estes tornam o filme até divertido, mas é inútil tentar acompanhar a história, já que não acontece muita coisa (apesar das várias ameaças de que haverá algum conflito violento entre os personagens, conflito esse que nunca vem), e a conclusão apenas confirma o nada.



O RICO POBRE (2002, Mantenópolis - ES)


Tentar analisar um filme do folclórico Manoel Loreno, o "Seu Manoelzinho", como se fosse um filme comum é pura perda de tempo. Com lapsos temporais, edição tosca, personagens que aparecem e desaparecem e história e diálogos improvisados na hora, suas obras são quase surreais, além de bastante divertidas na sua ingenuidade e falta de recursos - Seu Manoelzinho não teria as menores condições técnicas e financeiras de fazer filmes, mas os faz, e só por isso eles já são obrigatórios.

Ele é fã de filmes de western (já fez os seus próprios, entre eles o cult "O Homem Sem Lei"), mas este "O Rico Pobre" é a sua tentativa de fazer uma comédia dramática no estilo Chaplin ou Mazzaropi, ancorada somente no seu carisma como protagonista. Manoelzinho interpreta um pobretão que vive num barraco com a esposa (muito mais jovem que ele) e com dois filhos pequenos. Certo dia, quando vai à cidade para comprar comida, resolve gastar o único dinheiro que possui num bilhete de loteria, e ganha a "fortuna" de R$ 300 mil. Feliz com a reviravolta, ele resolve queimar o barraco e todos os seus antigos pertences para comprar uma fazenda. Mas, acidentalmente, acaba queimando o bilhete premiado entre as tralhas!

É perceptível a improvisação de praticamente todas as situações, já que Manoelzinho se desloca pelo cenário falando o que bem quer, saindo de cena, voltando para a cena e deixando todos os outros "atores" completamente perdidos com o que parece inventar na hora. Lá pelas tantas, o que era comédia se transforma em filme de bangue-bangue, com o protagonista sacando seu revólver para enfrentar a polícia. Estes estão entre os momentos mais bizarros do cinema do mítico Loreno: mesmo tomando tiros à queima-roupa dos policiais, seu personagem não morre em momento algum!

Como é inútil tentar analisar o filme de uma forma convencional, o negócio é relaxar, munir-se de um pouco de paciência (pois as situações repetitivas tornam os 56 minutos mais longos do que realmente são) e dar muita gargalhada com a edição que faz sumir/aparecer pessoas em cena, com os "figurantes" que passam o tempo inteiro olhando para a câmera e com os cenários toscos que lembram uma espécie de "Dogville" nada intencional (o barraco do protagonista são quatro varas com um pedaço de lona em cima!).

Quem conhece o trabalho do Seu Manoelzinho diz que o filme foi um sucesso e já tem até remake assinado pelo próprio...

Veja uma entrevista com Seu Manoelzinho




O FAROL (2007, Pedralva - MG)

Eu estava ansioso para ver "o retorno de Manjuba", já que este curta-metragem é escrito, dirigido e estrelado pelo mesmo Francisco Caldas de Abreu Jr. que fez o engraçadíssimo "A Dama do Lago" (onde interpretava o impagável Manjuba). Pena que este outro curta é bem sem graça. Em compensação, as interpretações forçadas, a edição (ou inexistência dela) e a falta de intimidade com a câmera estão ainda mais evidentes do que no outro filme.

A trama parte de uma "lenda urbana" da cidade do cineasta: um farol misterioso que aparece na estrada à noite assustando motoristas e pedestres. Após intermináveis "cenas de arquivo", mostrando um baile de Carnaval e uma procissão de Corpus Christi na cidade (estas últimas trazem até a legenda com a data e a hora da filmagem, que o diretor esqueceu de tirar na hora de gravar!!!), três personagens, entre eles um interpretado por Francisco (vamos continuar chamando-o de Manjuba), começam a confabular sobre o tal farol e resolvem investigar o mistério.

O resto do curta acontece praticamente apenas na estrada, com Manjuba e seu amigo dirigindo um Fusquinha de uma cidade a outra para "entrevistar" pessoas e conhecer mais sobre a lenda do farol (com direito a cenas em preto-e-branco num flashback!). Tudo em clima de comédia involuntária, é claro.

Por mais que estes filmes feitos nos cafundós do Brasil sejam toscos e mal-feitos, eles continuam exercendo um estranho fascínio em quem gosta de cinema, como eu. Talvez porque imortalizem a paixão pelo cinema de um grupo ou comunidade, que dribla a falta de recursos (no caso de "O Farol", esta falta de recursos é gritante) e lança seu filme de qualquer jeito. "O Farol" pode até ser pior que "A Dama do Lago", mas me deixou curioso para conhecer outras pérolas do Francisco Caldas de Abreu Jr.



O SOCO SILENCIOSO (2009, São Leopoldo - RS)


Após dois filmes de horror ("Massacre Cirúrgico" e "Onde as Coisas Cruéis Vivem"), meu conterrâneo gaúcho Lucas Moreira ataca no cinema experimental com o curta-metragem "O Soco Silencioso", uma fotomontagem (feita com dezenas de fotografias em preto-e-branco) de 15 minutos de duração. A principal inspiração foi o clássico curta francês "La Jetée", dirigido por Chris Marker em 1962, e que explorava uma trama de viagens no tempo também utilizando fotografias em preto-e-branco.

Tecnicamente, "O Soco Silencioso" é belíssimo. O curta narra uma troca de diálogos meio aleatórios entre dois homens num quarto escuro, e o tom cada vez mais agressivo da conversa logo evolui para o que se espera: um deles pede para que o outro decepe o seu braço com uma serra. E assim... a história termina!

Talvez este seja o grande defeito do trabalho de Lucas: conquista o espectador pelo visual acachapante, pela música hipnótica e pelo tom dos diálogos entre as duas únicas figuras em cena, mas termina sem explicar ao que veio, deixando margem para várias interpretações (a dupla matou alguém e sofre uma crise de consciência? um representa o alter-ego do outro? ou é apenas blablabla filosófico mesmo?), mas sem dar muitas pistas e elementos para que qualquer associação possa ser feita.

Trata-se de um trabalho bastante difícil e diferente, e só por isso já merece ser conhecido. Inclusive fico imaginando a trabalheira para fazer, compor e editar todas as fotografias no formato de um curta-metragem. Só fiquei boiando mesmo na narrativa; talvez uma historinha mais convencional e com menos simbolismos deixasse o curta mais acessível.



MANGUE NEGRO (2008, Guarapari - ES)


O clássico dos clássicos do cinema independente brasileiro recente. O filme que todo cineasta de bordas quer fazer quando crescer. Tanto que eu brinquei com o fato de o meu filme amador e toscão "Patricia Gennice" ter sido exibido antes de "Mangue Negro" na mostra do Itaú Cultural: é a mesma coisa que uma bande de garagem ser convidada para abrir um megashow dos Beatles ou dos Rolling Stones!

Escrito e dirigido pelo gente-fina Rodrigo Aragão, que também é técnico em efeitos especiais, "Mangue Negro" recria alguns dos melhores momentos de filmes como "Fome Animal", "Evil Dead" e as produções de mortos-vivos de George A. Romero, porém num cenário tipicamente brasileiro (um mangue no interior do Espírito Santo), e com personagens tipicamente brasileiros. Esta, acredito, é a grande qualidade e principal virtude do filme do Aragão: seus personagens são gente comum como uma velha benzedeira e um catador de caranguejos, personagens que não vemos nos filmes de terror "normais" nem nas imitações destes.

Como todo bom filme de mortos-vivos que se preze, "Mangue Negro" mostra uma contaminação zumbi que se espalha pelo mangue, transformando pescadores de uma comunidade pobre em monstros devoradores de carne humana. O filme se desenvolve através de várias linhas narrativas para acompanhar as situações envolvendo diferentes personagens (como se fossem episódios dentro de uma trama maior), até que eles se cruzam e passam a lutar juntos pela sobrevivência.

Mas o fio condutor da narrativa é o amor platônico entre Luís (Walderrama dos Santos) e a lavadeira Raquel (Kika de Oliveira), que finalmente se vêem muito próximos quando ele começa a dizimar os zumbis com sua machadinha para proteger a amada.

Repleto de gosma e com banhos de sangue (literalmente) no protagonista, lembrando os bons tempos de "Evil Dead" e "Fome Animal", o filme conta ainda com maquiagens e efeitos especiais de primeira linha, que colocam a produção um passo acima de qualquer outro filme "de bordas" apresentado no Itaú Cultural. É coisa fina mesmo, profissional, digna dos melhores momentos do gênero, com cenas de carnificina brilhantemente sublinhadas pela belíssima trilha sonora original da Orquestra Sinfônica do Espírito Santo.

Se "Mangue Negro" tem um defeito, este é uma quebra no ritmo no ato final, quando uma cena na casa de Dona Benedita, a benzedeira, se arrasta muito mais do que deveria, retardando os ataques de zumbis. Mas é um problema que se esquece facilmente quando o sangue volta a jorrar, e o filme termina de forma fantástica, na hora certa, comprovando que Aragão, além de mestre dos efeitos especiais, também sabe direitinho como contar uma história!

Em uma única palavra: IMPERDÍVEL.

Veja o trailer de MANGUE NEGRO

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Filmes que você infelizmente NÃO vai ver num cinema perto de você


E foi um sucesso de público e crítica a mostra Cinema de Bordas, realizada durante a semana que passou no Itaú Cultural, em São Paulo, com curadoria dos professores e pesquisadores Bernardette Lyra e Gelson Santana. Entre a quarta-feira, 22, e o domingo, 26 de abril, foram exibidos 17 filmes vindos de todas as partes do Brasil, praticamente de um extremo a outro - da minha longínqua cidade de Carlos Barbosa, no Rio Grande do Sul, até Manaus, no Amazonas.

Um grande e interessado público participou das sessões realizadas em plena Avenida Paulista, valorizando um tipo de cinema extremamente popular que, infelizmente, você não vai ver num cinema perto de você.

Eu mesmo fui quase todos os dias para conferir os outros filmes, embora tenha perdido alguns. Antes de passar a um breve relato do que vi nesta semana de Cinema de Bordas, vou puxar a brasa para o meu assado: na tarde de domingo, o cinema do Itaú Cultural ficou lotado para a exibição de meu primeiro longa-metragem, a comédia romântica PATRICIA GENNICE, filmada em 1998 e reeditada em 2008. A "director's cut" foi exibida pela primeira vez em São Paulo!

Inicialmente, fiquei meio envergonhado por mostrar este filme a um público paulista, pois eu não sabia como iriam reagir diante de uma história bastante regional (que faz mais sentido para quem conhece ou mora na cidade de Carlos Barbosa, onde foi filmado). Além disso, a mostra tinha exibido algumas produções muito bem-feitas nos dias anteriores, e a minha era tão tosca que dava ate pena.

Mas, quem diria, o público aparentemente curtiu. Pelo menos riram do começo até o fim dos 57 minutos da projeção, e aplaudiram fortemente duas vezes ao final. Me senti na entrega do Oscar!

Além disso, num daqueles momentos inesperados, o pessoal do Itaú Cultural resolveu aproveitar que eu era um dos únicos "diretores" presentes na exibição de seu próprio filme, e me passaram um microfone para responder perguntas da platéia. Qual não foi minha surpresa quando umas 50 pessoas sentaram-se e ficaram fazendo perguntas e ouvindo as respostas, ao invés de se mandar do recinto... E isso que foram uns 20 minutos de bate-papo, onde pude esmiuçar o planejamento e realização do filme e fazer propaganda das minhas outras obras, além de vender meus DVDs.

E me deixou realmente emocionado a presença de algumas celebridades entre o público, como o diretor da Boca do Lixo Luiz Gonzaga dos Santos (que fez "Patty, A Mulher Proibida", com Helena Ramos, e elogiou publicamente o PATRICIA GENNICE), e o amigo Eduardo Aguilar, diretor de curtas profissionais e elogiados como "Lourdes - Um Conto Gótico de Terror" e "Dias Cinzentos", além de outros queridos amigos e amigas de São Paulo e dos meus pais.

Resumindo: um dia de glória para a pequena Necrófilos Produções Artísticas e seus filmes feitos em VHS com 200 reais!

Vamos agora aos colegas de mostra:


HORROR CAPIAU (2007, São Paulo - SP)


Alegadamente filmado num intervalo de 20 minutos de um outro trabalho que a equipe estava desenvolvendo, este curta-metragem explora o filão "redneck exploitation", bastante comum no cinema norte-americano ("O Massacre da Serra Elétrica", alguém?), mas praticamente uma novidade aqui no Brasil.

Dirigido por Dimitri Kozma, mostra um caipira aparentemente inocente (Raphael Borghi) saindo para uma incontrolável onda de assassinatos nas redondezas da sua fazenda, enquanto um cego masoquista (Rubens Mello) fica esfolando a própria pele com uma agulha. No final, os dois personagens se cruzam e é explicada a conexão entre eles.

Simples e direto, "Horror Capiau" só peca mesmo pela falta de gore, já que não aparece nem uma mísera gotinha de sangue falso (compreensível, quando se descobre que o curta inteiro foi gravado em apenas 20 minutos!!!). Mas é bem legal, com alguns inusitados ângulos e movimentos de câmera, e a presença de dois atores vistos em "Encarnação do Demônio", Rubens Mello e Lenny Dark (que atualmente é esposa do próprio).

O curta inteiro está disponível no YouTube, e a curiosidade é o fato de haverem duas versões: esta chamada "Horror Capiau" foi dirigida e editada pelo próprio Dimitri, mas o ator Mello fez sua própria montagem, chamada "Demência" e com várias diferenças, também disponível no Youtube.

Assista o curta HORROR CAPIAU




O ASSASSINATO DA MULHER MENTAL (2008, São Paulo - SP)

Um ótimo curta-metragem escrito e dirigido por Joel Caetano, que já havia feito o divertido "Minha Esposa é um Zumbi". Com uma equipe formada basicamente por familiares e pouquíssimos recursos, ele conseguiu uma façanha digna de respeito: contar uma história de super-heróis brasileiros que convence, com uma estrutura narrativa bem parecida à da graphic novel "Watchmen", mas 2h30min mais curta que o filme norte-americano dirigido pelo "visionário" Zack Snyder.

O curta mostra uma equipe de super-heróis brasileiros formada pelo Hiper-Homem (o próprio Joel), pela sua amada Mulher Mental (Mariana Zani, esposa do diretor) e pelo violento Bruma (Danilo Baia, o "Danny Trejo paulista", aqui numa versão nacional do Rorschach de "Watchmen").


A história, como nos quadrinhos escritos por Alan Moore, começa com o assassinato da Mulher Mental, anos após a aposentadoria forçada do grupo (através de "programas de TV" que vão interrompendo a narrativa, ficamos sabendo como os heróis se reuniram e porque se separaram). Bruma e o Hiper-Homem investigam o crime e descobrem uma trama mirabolante que envolve a Floresta Amazônica, clones e ótimos efeitos especiais, ainda mais considerando que esta é uma produção barata feita em casa.

O fato de o diretor e roteirista Joel ser apaixonado por quadrinhos fica evidente ao longo de todo o trabalho, que traz algumas divertidas montagens fotográficas, como a recriação da clássica capa da Action Comics com o Superman erguendo um automóvel nos braços (aqui é o Hiper-Homem erguendo uma velha Rural!!!). Vale a pena conhecer este impressionante trabalho, e no fim dá até vontade de ver novas aventuras dos super-heróis brasileiros...

Veja o trailer de O ASSASSINATO DA MULHER MENTAL




A DAMA DA LAGOA (1997, Pedralva - MG)

Ah, esses diretores-amadores maravilhosos e seus fantásticos filmes toscos... O diretor, roteirista e "astro" Francisco Caldas de Abreu Jr. foi o responsável por uma das grandes surpresas da mostra, um filme simplesmente divertidíssimo em seus defeitos e na sua ingenuidade.

Trata-se de uma história de crime e vingança sobrenatural, realizada de maneira inclassificável. Francisco aparece como um agricultor chamado "Manjuba", e simplesmente rouba o filme ao repetir, a cada cinco minutos, todos os acontecimentos que se desenrolaram até então (ele faz isso umas quatro vezes). E ele ainda tem ataques de gagueira que foram mantidos na edição, como quando Manjuba alega que um amigo teve uma "alu... aluci... aluci... alucinação".

"A Dama da Lagoa" é aquele tipo de filme feito mais no improviso do que com preocupações técnicas ou narrativas. Por exemplo, quando uma atriz coadjuvante entrega um diário à polícia, e esquece o único texto que deveria falar no filme inteiro, simplesmente dá uma risadinha sem jeito e espera muda até que o outro ator a ajude, improvisando o restante do diálogo. E é justamente por momentos como estes que o curta-metragem (de apenas 20 minutos) é tão divertido, valorizando sotaques e pessoas que jamais teriam chance no "cinemão" oficial.

Ao que parece, Francisco e sua equipe moram beeeeem no interior de Minas Gerais, onde o sujeito é incomunicável por e-mail (que não possui) e até por telefone. Em uma entrevista, a curadora Bernardette Lyra revelou a dificuldade para fazer contato com ele, quando, ao ligar para sua casa, atendeu uma mulher:

- Eu poderia falar com o cineasta Francisco Caldas de Abreu Jr.?

- Ih, ele tá na roça, só volta à tarde.

- Faz tempo que tento contato por esse telefone...

- É que aqui, quando chove, o telefone fica um tempo sem funcionar.




A CAPITAL DOS MORTOS (2008, Brasília - DF)


Quando se falava em "filmes nacionais independentes com zumbis", minha única lembrança era o média-metragem trash "Zombio", que o catarinense Petter Baiestorf dirigiu em 1999. Isso até agora, claro, pois nos últimos anos foram lançadas mais 4 (!!!) produções brasileiras com mortos-vivos.

"A Capital dos Mortos", do brasiliense Tiago Belotti, é uma das melhores, aliando doses de humor e personagens simpáticos ao sangrento massacre realizado pelos mortos-vivos em pleno Distrito Federal. A bem da verdade, eu já havia visto o filme em DVD, mas é outra coisa você conferir numa sala de cinema, rodeado por pessoas com reações bem diferentes às cenas - e por isso é uma pena que este filme não vá passar num cinema perto de você...

O longa parte de uma suposta profecia escrita por Dom Bosco no final do século 19, sobre o apocalipse e seu início justamente em Brasília. A partir de então, o filme só vai surpreendendo mais e mais o espectador, seja por já começar com um casal de lésbicas se beijando, seja pela impressionante visão de mortos-vivos bem-feitinhos cambaleando diante de conhecidos pontos turísticos de Brasília - inclusive a Esplanada dos Ministérios!

A história é aquela tradicional dos filmes de George A. Romero (fartamente citados o tempo inteiro), mas com personagens carismáticos e engraçados, como o rapaz chato que fica provocando o amigo enquanto jogam uma partida de futebol no videogame (meu irmão faz exatamente a mesma coisa!). E quando o massacre começa é pra valer, com muitas cenas de banquetes de carne humana, tripas e órgãos arrancados, cabeças explodidas com tiros e até uma zumbi peladona (frente e verso).

Uma grata surpresa que merece ser conhecida, principalmente pelos fãs do gênero, principamente por duas participações geniais: uma de José Mojica Marins, e a outra uma ponta "além-túmulo" do falecido cineasta trash brasiliense Afonso Brazza (em cena retirada de um dos seus filmes).

Veja o trailer de A CAPITAL DOS MORTOS




RAMBÚ 4 - O CLONE (2008, Manaus - AM)

O "Rambo da Amazônia" Aldenir Coty já virou figura folclórica em todo o Brasil, tendo ganhado inclusive uma engraçada reportagem em rede nacional via Fantástico. Pode-se dizer que a persona do "Rambú", uma versão amazonense do famoso personagem de Sylvester Stallone, é muito mais divertida que o filme em si. Até porque esta comédia dirigida por Júnior Castro é bem bobinha, com um humor sem graça estilo "Zorra Total" - incluindo muitaaaaaas piadas com homossexuais.

A trama é uma bobagem sem pé nem cabeça, envolvendo um clone do Rambú (tão feio quanto o original, diga-se de passagem) e um travesti maléfico, que morreu no filme anterior, mas aqui é ressuscitado por um pai-de-santo. Eles seqüestram o pajé, líder espiritual de Rambú, na tentativa de conquistar a Amazônia, e o herói parte para destruir seus inimigos num festival de inacreditáveis cenas de pancadaria e tiroteios - acompanhados por uma trilha sonora inqualificável.


Folclórico e impagável, é um filme que vale a pena conhecer, até porque Coty leva a coisa muito a sério, ao contrário de todos os outros envolvidos. E é só o Rambú entrar em cena que as risadas estão garantidas, principalmente durante as inúmeras cenas de ação improvisadas, com sonoplastia exagerada remetendo aos filmes de pancadaria de Hong-Kong dos anos 70.

Também há inúmeros momentos impagáveis, como uma perseguição de lanchas que é surpreendente para um filme amador (e também muito trash porque Rambú, após derrubar seus rivais no rio, imediatamente joga um colete salva-vidas para que os atores não se afoguem!) e a cena em que o herói sai debaixo d'água em câmera lenta para disparar uma flechada num inimigo.

Veja o trailer de RAMBÚ 4 - O CLONE



(CONTINUA NUMA FUTURA ATUALIZAÇÃO!)

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Mostra Cinema de Bordas em SP


Começou oficialmente nesta quarta-feira a Mostra Cinema de Bordas, que o Itaú Cultural promove até o domingo, 26 de abril, reunindo produções independentes e/ou amadoras vindas de todas as partes do Brasil, e exibindo-as em pleno glamour da Avenida Paulista, em São Paulo.

A importância de uma mostra como essa é algo indescritível: para o público, é uma oportunidade única (e GRATUITA) para ver filmes vindos de diferentes partes do país e realizados à margem do cinemão comercial, de maneira improvisada e sem recursos, por cineastas auto-didatas que, na "vida real", são estudantes, jornalistas, donos de locadora e até camelôs e agricultores; para os próprios realizadores, também é uma oportunidade única de mostrar seus trabalhos num espaço nobre e com toda a divulgação, já que o grande problema de quem faz filme independente é justamente a distribuição.

Eu também estarei presente na Mostra com meu primeiro longa-metragem, uma comédia romântica de 1998 chamada PATRICIA GENNICE, que tem 57 minutos e conta a história improvável de um jovem que marca encontro com a garota mais cobiçada de uma pequena cidade, mas nunca consegue chegar à casa dela por ironias do destino - uma espécie de "Depois de Horas", do Scorsese, em versão adolescente.

Trailer de PATRICIA GENNICE


PATRICIA GENNICE será exibido no encerramento do Cinema de Bordas, às 17 horas do domingo, 26 de abril, antecedendo a exibição do elogiadíssimo filme de zumbis MANGUE NEGRO, de Rodrigo Aragão, vindo diretamente do Espírito Santo. Além deste, outros três filmes nacionais com mortos-vivos participam da Mostra: ERA DOS MORTOS, A CAPITAL DOS MORTOS e ZOMBIO.

Segue a programação completa, e reforço o convite para a galera de Sampa conferir essa mostra fantástica e dar o devido reconhecimento a quem consegue fazer muito com quase nada:

QUINTA-FEIRA, 23 de abril
17 horas:
- Insector Sun: O Guardião da Terra/A Hora da Verdade (dir: Chris Lee, SP, 2008, 40 min)
- Cocô Preto (dir: Marcos Bertoni, SP, 2008, 16 min)
- Era dos Mortos (dir: Rodrigo Brandão, MG, 2007, 42 min)
20 horas:
- O Assassinato da Mulher Mental (dir: Joel Caetano, SP, 2008, 20 min)
- A Capital dos Mortos (dir: Tiago Belotti, DF, 2008, 87 min)


SEXTA-FEIRA, 24 de abril
17 horas:
- O Soco Silencioso (dir: Lucas Moreira, RS, 2009, 15 min)
- Rambú IV: O Clone (dir: Júnior Castro, AM, 2008, 80 min)
20 horas:
- Aventuras de Um Caçador (dir: José Manoel, PE, 2003, 55 min)
- Um Rico Pobre (dir: Manoel Loreno aka Seu Manoelzinho, ES, 2002, 56 min)


SÁBADO, 25 de abril
17 horas:
- A Valise Foi Trocada (dir: Simião Martiniano, PE, 2007, 90 min)
20 horas:
- Desaparecidos (dir: Antonio Marcos Ferreira, PR, 2006, 75 min)
- Zombio (dir: Petter Baiestorf, SC, 1999, 45 min)


DOMINGO, 26 de abril
17 horas:
- O Farol (dir: Francisco Caldas de Abreu Jr., MG, 2007, 29 min)
- Patrícia Gennice (dir: Felipe M. Guerra, RS, 1998, 57 min)
20 horas:
- Mangue Negro (dir: Rodrigo Aragão, ES, 2008, 100 min)

Entrada franca - ingresso distribuído com meia hora de antecedência


SERVIÇO
Itaú Cultural - Sala Itaú Cultural
Avenida Paulista 149 - Paraíso - São Paulo SP
[próximo à estação Brigadeiro do metrô]
informações (11) 2168 1777

sábado, 18 de abril de 2009

48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE (1986)


Embora tenha ficado imortalizado com o seu personagem Zé do Caixão, nas produções de horror que realizou em meio século de carreira, o brasileiro José Mojica Marins foi obrigado a dirigir alguns filmes pornográficos durante uma época de vacas magras nos anos 80. Ironicamente, estes quatro filmes explícitos - "A Quinta Dimensão do Sexo" (1984), "24 Horas de Sexo Explícito" (1984-85), "Dr. Frank na Clínica das Taras" (1986) e 48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE (1986) - são de longe as obras mais assustadoras da sua carreira!

Muitos podem, hoje, condenar Mojica por ter dirigido estas produções paupérrimas, alegando que elas representam uma espécie de suicídio para a carreira de qualquer cineasta sério. O que estes moralistas-de-cuecas esquecem é que o mercado cinematográfico brasileiro dos anos 80 tinha se rendido à sacanagem, e qualquer diretor mais ou menos sério estava investindo na putaria, e até as produções mais classudas da época, se não traziam as cenas explícitas dos pornôs da Boca do Lixo, pelo menos tiravam a roupa de suas estrelas sem nenhum pudor. Bons tempos aqueles em que o sujeito ia ao cinema para ver Sônia Braga, Christiane Torloni, Vera Fisher e Cláudia Ohana peladas...


Além disso, a carreira de Mojica já parecia morta e enterrada. Ele realizava filmes por encomenda desde os anos 70 (inclusive algumas paupérrimas pornochanchadas que, envergonhado, assinou com o pseudônimo "J. Marreco"), e sua última produção realmente autoral foi "Perversão", de 1978. Sem grana para filmar o tão sonhado "Encarnação do Demônio" (que só foi sair em 2007!) e sem incentivos fiscais do governo, como outros cineastas bem mais medíocres do período, o pobre Mojica viu-se perdido no universo do sexo explícito graças ao amigo-da-onça e produtor Mário Lima.

48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE é a seqüência do trabalho pornográfico mais famoso da dupla Mojica/Lima: "24 Horas de Sexo Explícito", um dos grandes fenômenos de bilheteria de 1985 (ficou mais de 20 semanas em cartaz em pleno centrão de São Paulo!). E isso que Mojica tentou fazer o pornô mais sujo e tosco de todos os tempos, com um elenco de jaburus de dar dó e até a primeira cena explícita de zoofilia do cinema nacional, entre o pastor-alemão Jack e a veterana do pornô Vânia Bournier. Esta cena não tem nada a ver com a "trama" principal, e só está no filme porque o diretor sabia que, com aqueles bagulhos que tinha no elenco, só mesmo um cachorro transando para atrair público.


Apesar dos protestos de Mojica (ele chegou a dizer que fez o filme tão tosco porque queria que o sujeito saísse do cinema e nunca mais quisesse fazer sexo na vida!), o sucesso comercial de "24 Horas de Sexo Explícito" encheu os bolsos de Mário Lima, e o produtor convenceu o amigo a rodar uma continuação. Assim surgiu 48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE, que é bem mais interessante do que o anterior por trazer um argumento metalingüístico (já explico), e também porque os bagulhos do filme anterior foram substituídos pela nata do pornô da Boca do Lixo (com dinheiro na mão é outra coisa, não é?).

Com argumento e roteiro do próprio Mário, o filme começa mostrando as filas nos cinemas paulistas que exibem "24 Horas de Sexo Explícito". Em seguida, vemos o próprio Mojica (vestido de terno e gravata, posando de grande magnata do cinema) e o próprio Mário Lima (com uma berrante jaqueta vermelha, e dublado com uma cômica voz de galã) sendo levados para um encontro com uma famosa psiquiatra num casarão chique. Detalhe é que ambos são conduzidos por um motorista numa velha perua caindo aos pedaços, já que não havia limusine à disposição da produção!


A psiquiatra é a dra. Margareth, interpretada pela veterana do pornô nacional Andréa Pucci (de "O Delicioso Sabor do Sexo" e "Hospital da Corrupção e dos Prazeres"). Ela explica à dupla que viu "24 Horas de Sexo Explícito" várias vezes (!!!), e acredita que ambos seriam as pessoas mais qualificadas (hahaha) para dirigir um novo filme pornográfico sob encomenda, desta vez com "fins científicos", já que a psiquiatra é uma pesquisadora do comportamento sexual humano (esqueça isso, porque não faz a menor diferença).

Em seguida, vemos Mojica e Mário em plena pré-produção do próprio 48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE, quando o roteiro tenta nos convencer de que ambos são tão organizados ao planejar os mínimos detalhes da película, mas, como sabe qualquer um que conhece um mínimo da carreira do diretor, ele não tinha nada de organizado! A dupla constrói um cenário luxuoso, contrata os grandes astros da Boca, submete todos a rigorosos exames médicos (hahahaha) e em seguida propõe uma grande maratona sexual para escolher o novo campeão do sexo.



Quem viu "24 Horas de Sexo Explícito" lembra que a história era mais ou menos a mesma, com a diferença de que lá a maratona era de apenas um dia, e não dois (dãããã...). E dois atores deste primeiro filme, Sílvio Júnior (de "Sexo Erótico na Ilha do Gavião") e Antônio Rody ("Sexo dos Anormais"), inclusive voltam para a maratona. Além deles, participam nomes famosos dos pornôs da Boca, como Walter e Eliane Gabarron, Oswaldo Cirillo e Priscila Muller, entre outros.

O vencedor, claro, será o homem que gozar mais vezes (as ejaculações são somadas num computador!!!), e a competição é controlada por garotas vestidas como bandeirinhas de futebol (uma delas na verdade é um traveco que, lá pelas tantas, participa da ação) e pelo mesmo juiz gay de "24 Horas de Sexo Explícito", aqui vestido de imperador romano e assessorado por um papagaio boca-suja que também apareceu no pornô anterior de Mojica - e que fica fazendo piadinhas sem graça entre todas as cenas de sexo!

Perto do final, a dra. Margareth finalmente revela a Mojica e Lima seu trauma: ela é frustrada sexualmente porque sua grande fantasia é fazer sexo com um touro (!!!). Para realizar o desejo da pesquisadora, Mojica manda construir uma vaca mecânica (!!!) e, no final antológico, coloca a garota nua no interior do bicho, tentando atrair algum touro safado para fazer o serviço. Felizmente, apesar de várias cenas de touros trepando com vacas e de cavalos com éguas enxertadas na edição, nenhum animal verdadeiro se assanha para cima da vaca falsa, e a solução é mandar um cara vestido de Bumba-meu-Boi para realizar a missão! A cena é simplesmente surreal, e parece saída do universo bizarro de David Lynch! (Clique na colagem abaixo para vê-la ampliada.)


Como todos os pornôs dirigidos por Mojica, 48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE é uma porquice: desafio qualquer pessoa normal a ficar excitada diante dos closes feios e toscos de pintos moles e pererecas peludas. As cenas de sexo explícito, quem diria, são o pior deste que é um FILME PORNOGRÁFICO! Confesso que me diverti bem mais com Mojica e Mário bancando os "bambambans" do cinema nacional e com as cenas que mostram os bastidores da filmagem de uma produção pornográfica do que com as trepadas, que afinal são a razão do filme existir.

Mojica, definitivamente, não nasceu para a pornografia. Como muito bem observou Ruy Gardnier no livro "José Mojica Marins - 50 Anos de Carreira", "as cenas de carnes batendo uma contra a outra não cumprem função nem de erotismo, nem de excitação sexual. Os filmes de sexo [de Mojica] não têm muita coisa de sexual". Assim, as trepadas são apenas uma seqüência de closes, que não permitem identificar quem está comendo e quem está dando - seguidas por takes im-pa-gá-veis dos sujeitos fazendo exageradas caras de prazer!!!


Realmente divertidas, portanto, são cenas absurdas como a do sujeito que, em meio à maratona, tem um princípio de infarto e cai estatelado no chão - e Mojica incentiva os outros atores a continuarem transando, dizendo que aquilo é "um acidente normal de trabalho", enquanto médicos retiram o pobre coitado de cena! Ou a "pausa para o lanche" da maratona, com o pessoal pelado comendo aperitivos que, muito provavelmente, acabaram cobertos de pentelhos (hahahaha).

Ou, ainda, uma cena nada a ver com sexo em que Mojica, Mário, a dra. Margareth e seu futuro noivo vão jantar numa churrascaria (!!!), e somos brindados com uma nada erótica "participação especial" do cantor Carlos Lombardi, cantando o tango "El Dia que Me Quieras", de Gardel, coisa que combina 100% com um filme pornô (e tenho certeza que o próprio Lombardi "adorou" ser incluído como participação especial numa produção X-Rated!).

E se as cenas de sexo são genéricas, sem-graça e bem nojentas, com uma trilha sonora de pomposas músicas românticas que só piora tudo, em alguns momentos a coisa é tão tosca que também se torna divertida. Como quando Sílvio Júnior, na véspera de encerrar as 48 horas da maratona, não consegue gozar mesmo sufocado de mulheres nuas, e então afasta todas e diz: "Vou ter que usar minha arma secreta!". Põe-se, então, a descascar a banana enquanto faz uma expressão concentradíssima de monge budista, um momento tão constrangedor quanto engraçado.



O roteiro escrito por Lima também reserva alguns diálogos simplesmente brilhantes, como "Pra ganhar esse campeonato eu meto em qualquer buraco" ou a poética frase "Eu vou é comer o cu desse filha da puta, ele vai é se foder!". E num momento em que Mojica e Mário discutem no filme, é impossível não lembrar de o quanto os dois brigavam na vida real: "Mas você foi se comprometer com esse tipo de coisa? Eu acho que você quer é arruinar a nossa vida! Você endoideceu, Mário!".

E graças a esta curiosa brincadeira de metalinguagem (a dupla produzindo uma continuação de seu sucesso; Mojica "dirigindo" as cenas de sexo), e à bizarra fantasia sexual envolvendo a vaca mecânica, 48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE é um daqueles raros filmes pornográficos que valem mais pela "história", se é que dá para chamar assim, do que propriamente pelo "sexo alucinante", que está mais para sexo BROXANTE do que para qualquer outra coisa.


Infelizmente, a seqüência não teve o mesmo impacto do original. Enquanto em "24 Horas de Sexo Explícito" a novidade era a cena de zoofilia, quando a continuação saiu, apenas um ano depois, já estava ultrapassada (!!!), pois todos os produtores da Boca do Lixo abriram as portas do zoológico para faturar em cima da nova febre - "Mulheres Taradas por Animais", que Ody Fraga dirigiu em 1985, trazia cenas com bode, anta, cavalo e até um leão, que felizmente só assistia.

Resultado: a bilheteria foi bem abaixo do esperado e não sobrou grana para Mojica filmar seu tão sonhado "Encarnação do Demônio" (Mário Lima tinha prometido investir o lucro que tivessem num novo filme do Zé do Caixão).

48 HORAS DE SEXO ALUCINANTE fica, então, como um impagável registro de uma era que não volta mais, reunindo algumas das caras (e genitais) mais conhecidas da Boca do Lixo, e alguns momentos entre o genial e o bizarro que só podiam ter saído da cabeça de José Mojica Marins, aqui visivelmente mais preocupado em contar uma história sobre as dificuldades de fazer cinema (mesmo pornô) no Brasil do que em mostrar penetrações e gozadas (estas aparecem como "brinde", e não como atração principal).


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48 Horas de Sexo Alucinante (1986, Brasil)
Direção: José Mojica Marins
Elenco: Mojica, Mário Lima, Andrea Pucci
Oswaldo Cirilo, Sílvio Júnior, Antônio Rody,
Walter Gabarron e Eliane Gabarron.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

OS CLONES DE BRUCE LEE (1977)


A carreira cinematográfica do astro chinês Bruce Lee foi relativamente curta, se começarmos a contar da sua primeira aparição com papel principal na tela grande (em "O Dragão Chinês", de 1971) até sua morte prematura em 1973. A bem da verdade, ele só participou de quatro filmes completos ("O Dragão Chinês", "A Fúria do Dragão", "O Vôo do Dragão" e "Operação Dragão"), e filmou uns 15 minutos de outro antes de bater as botas (este foi completado com a ajuda de dublês após sua morte, transformando-se em "O Jogo da Morte").

Mas Bruce Lee é um daqueles casos raros em que a lenda é maior que o homem. Só isso pode explicar a existência de pelo menos 48 filmes com "Bruce Lee" no título, sabendo-se que ele atuou oficialmente em apenas quatro - ou cinco, com muita boa vontade.

Nos primórdios do FILMES PARA DOIDOS, eu resenhei uma pérola trash chamada "Bruce Lee Fights Back From the Grave", e lá expliquei sobre a brucesploitation, a exploração da fama do falecido Bruce Lee em uma série de filmes bagaceiros estrelados por sósias do astro, apropriadamente batizados como Bruce Le ou Bruce Li. Estes filmes normalmente eram vendidos como produções estreladas pelo verdadeiro Bruce Lee. Além de sem-vergonhice da grossa, a tática era inquestionavelmente mórbida: imagine família e amigos do falecido ator sendo obrigados a engolir filmes como "The Death of Bruce Lee", que inclusive trazia uma foto do verdadeiro cadáver do ator, feita no seu funeral, num canto do cartaz de cinema!!!


Porém o golpe mais apelativo da brucesploitation foi uma preciosidade inestimável chamada OS CLONES DE BRUCE LEE (que no Brasil ainda recebeu o subtítulo "As Réplicas Mortíferas" na época de seu lançamento em VHS). Entre todos os "elogios" que já escreveram sobre o filme, estão frases como "o Monte Rushmore da brucesploitation" ou "o 'Plan 9 From Outer Space' dos filmes de ação de Hong-Kong". Acredite: todos estes "elogios" são merecidos: o "filme" é tão ruim, tão mal-feito, tão tosco, tão apelativo, tão cretino em todos os níveis que acaba se tornando engraçado. Isso, claro, se você for um apreciador de FILMES PARA DOIDOS. Caso contrário, assisti-lo será tão divertido quanto fazer uma colonoscopia com arame farpado. Nem o Uwe Boll se esforçando muito conseguiria fazer algo tão ruim.

OS CLONES DE BRUCE LEE foi cometido pelo diretor Joseph Velasco (com o pseudônimo "Joseph Kong") e pelo produtor norte-americano Dick Randall em 1977, com a intenção de faturar uns cobres no auge da brucesploitation, até porque o mercado de filmes de pancadaria made in Hong-Kong estava dando bastante dinheiro no Ocidente. Velasco já havia dirigido ele mesmo alguns filmes para aproveitar o filão, como "Bruce's Deadly Fingers", de 1976, e "Ninja Versus Bruce Lee/Return of Bruce", de 1977, ambos estrelados por Bruce Le, um dos muitos imitadores de Bruce Lee.

Este aqui, como o título já denuncia, é uma pérola da apelação, pois Bruce Lee e sua morte são citados abertamente o tempo inteiro. Além disso, o filme parte de uma idéia que não deixa de ser genial: juntar numa única produção quatro imitadores do falecido astro - Dragon Lee (aka Vyachaslev Yaksysnyi), Bruce Le (aka Kin Lung Huang), Bruce Lai (aka Chang Yi Tao) e Bruce Thai (aka ???????).


Os primeiros cinco minutos de OS CLONES DE BRUCE LEE são, ao mesmo tempo, uma aula de cinema exploitation e trash: um sósia de Bruce Lee é levado à UTI de um hospital chinês, já à beira da morte - e no caminho todas as enfermeiras suspiram coisas do tipo: "Ai meu Deus, é o Bruce Lee", para não deixar dúvidas no espectador. Em poucos minutos, provavelmente graças à inexperiência dos médicos, o pobre Bruce acaba morrendo. Era esperado, dadas as condições da UTI em que foi operado: vamos dizer apenas que a sala de cirurgia tem janelas (!!!), e com os vidros abertos ainda por cima, e não há nem mesmo um monitor de freqüência cardíaca, pois o médico escuta os batimentos do coração de Bruce Lee com um simples estetoscópio!!!! Será que o pobre coitado foi atendido pelo SUS?

Eis que surge em cena o agente Collins, do SBI (Special Branch of Investigation, olha a inteligência do roteiro!), que convoca um cientista, o Prof. Lucas, para encontrá-lo no hospital onde "Bruce Lee" acabou de morrer. Pois sem qualquer autorização da equipe médica ou da família do falecido astro, o cientista retira uma amostra de sangue e células do cadáver para, vejam só, construir clones de Bruce Lee, já que o SBI pretende utilizar estas cópias do mestre das artes marciais como agentes secretos em missões perigosas ao redor do mundo.


Calma lá, calma lá: que sentido faz clonar um conhecido e popularíssimo astro de cinema como Bruce Lee para usar como AGENTE SECRETO? Bom, claro que isso acaba não fazendo muita diferença no filme, até porque os "clones" não saem assim tão parecidos com o verdadeiro Lee (o único que tem certa semelhança física é Dragon Lee). Onde já se viu clone sair diferente do original? Ah, deixa pra lá...

Além disso, em nenhum momento do filme qualquer um dos vilões desconfia estar diante de uma cópia de Bruce Lee, mesmo quando um dos clones é mandado para se infiltrar secretamente... num estúdio de cinema que está produzindo um filme de artes marciais!!!



Prontos os clones, que atendem pelos criativos nomes de Bruce Lee One (Dragon Lee), Bruce Lee Two (Bruce Le) e Bruce Lee Three (Bruce Lai, o menos parecido do trio), o cientista faz com que eles passem por uma bateria de treinamentos de artes marciais, para poderem lutar como o Bruce Lee original. E isso inclui aulas com Bolo Yeung, que foi aluno do verdadeiro Lee e chegou a lutar contra ele no filme "Operação Dragão".

Após o treinamento, os clones são enviados para missões que soam como episódios curtos dentro do filme. Bruce Lee One é o tal enviado como agente secreto para um estúdio de Hong-Kong, onde deve investigar um produtor chamado Chai Lo, que nas horas vagas é traficante de ouro. Lo acaba suspeitando do novato e pede que seus capangas dêem um fim nele. O diretor do filme dentro do filme sugere matá-lo diante das câmeras para depois faturar horrores de bilheteria - morbidamente, o filho do verdadeiro Bruce, Brandon Lee, morreu em frente às câmeras durante as filmagens de "O Corvo", nos anos 90! Mas é claro que Bruce Lee One está preparado e, após detonar todos os assassinos, acaba pessoalmente com Chai Lo, justo quando ele estava fugindo com seu ouro (um monte de tijolos comuns porcamente pintados com tinta dourada).

Corta para a segunda missão, agora com Bruce Lees Two e Three lutando juntos contra um cientista malvado chamado Dr. Nye (Dr. No, alguém?), que não apenas tem um harém particular de mulheres nuas, como ainda pretende dominar o mundo (começando pela Tailândia!!!) usando sua fórmula que transforma homens comuns em lutadores indestrutíveis feitos de bronze (no caso, um monte de figurantes de sunguinha e o corpo coberto com a tinta dourada que sobrou da pintura dos tijolos do segmento anterior).


Para ajudar os dois clones, entra em cena um outro agente do SBI chamado Chuck, que é interpretado também por um imitador de Bruce Lee, Bruce Thai. E, embora ele não apareça oficialmente como clone no filme, ironicamente o cara é o MAIS PARECIDO com o verdadeiro Bruce Lee dos quatro! Dá pra acreditar?

Este segmento é de longe o mais trash do filme inteiro. Os homens-bronze indestrutíveis têm como único ponto fraco a ingestão de uma erva venenosa, que os heróis precisam enfiar na goela deles, rendendo cenas constrangedoras como estas aí embaixo:



Como os tais homens de bronze são apenas uns manés pintados com tinta dourada, os Bruces também acabam com as mãos e braços dourados a cada golpe que dão neles! E há uma cena sem qualquer fundamento em que Bruce Lai e Bruce Thai vão à praia de sunguinha apenas para encontrar um grupo de garotas completamente peladas, que não faz nada além de passar bronzeador no corpo em close! O termo "nudez gratuita" nunca caiu tão bem...

E eis que OS CLONES DE BRUCE LEE termina com o Prof. Lucas ficando maluco e sonhando ele próprio com a dominação mundial, no que é o terceiro e último segmento do filme. Para concretizar seu plano, e vá entender o porquê disso, o cientista resolve escolher o mais forte dos três clones para ser seu capanga, ao invés de usar o trio completo, e acaba mandando os Bruces lutarem entre si até a morte. É o ponto alto do filme: a oportunidade de conferir três imitadores de Bruce Lee, cada um com suas próprias características de luta, trocando porradas! Definitivamente, algo que não se vê todo dia...


Infelizmente, como filme de artes marciais, OS CLONES DE BRUCE LEE é bem fraquinho. As lutas se resumem ao tradicional "bate-bloqueia-bate", e após as duas ou três primeiras pancadarias o repeteco perde toda a graça. E olha que é um festival de surras e porradas: há uma luta a praticamente cada cinco minutos! Claro que a história poderia ter ficado interessante se enfocasse detalhes como a forma de pensar e o sentimentos dos clones. Exemplo: Como eles se sentem sendo cópias de um astro morto? Quanto das memórias de Bruce Lee eles tinham, se foram obrigados a reaprender a lutar? Mas é óbvio que não era esta a proposta do filme.

Assim, o melhor de tudo é o clima trash dessa aventura pobre e tosca. Começa com os supostos clones, que tentam imitar Lee nos mínimos detalhes, dos gritinhos afeminados durante as lutas ao cacoete que Bruce tinha de ficar coçando o nariz enquanto provocava os rivais. Também tem uma cena impagável em que três imitadores do astro (Bruce Le, Bruce Lai e Bruce Thai) aparecem em cena juntos usando óculos escuros de modelo igual ao do verdadeiro Bruce, o que só serve para confundir mais o espectador, que não sabe quem é quem. Isso sem contar os erros à la Bruno Mattei. Lá pelas tantas, por exemplo, uma mulher completamente nua puxa uma faca do nada para atacar um dos clones. Agora eu me pergunto: de onde ela tirou essa faca? (E a provável resposta chega a me dar arrepios...)



Já a pobreza franciscana da produção e da direção, com cenários horríveis e objetos de cena idem (o "laboratório" onde são criados os clones consegue ser pior que qualquer cenário já elaborado por Ed Wood), é uma atração à parte. Tanto que o filme termina abruptamente, sem qualquer desfecho para a trama e sem sequer ter créditos finais (vai ver faltou grana na finaleira da produção).

Assim, ficamos sem saber o que foi feito dos clones de Bruce Lee: será que continuaram trabalhando como agentes secretos para o SBI ou abandonaram a vida de 007 para seguir carreira como astros de cinema, na ausência do verdadeiro Bruce?

A julgar pela quantidade de filmes brucesploitation que todos eles ainda estrelariam, imagino qual é a resposta para esta pergunta...

Trailer de OS CLONES DE BRUCE LEE


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The Clones of Bruce Lee (1977, Hong-Kong)
Direção: Joseph Kong (Joseph Velasco)
Elenco: Bruce Le, Dragon Lee, Bruce Lai,
Bruce Thai, Jon T. Benn, Tao Chiang,
Siu-Lung Leung e Bolo Yeung.



A pedidos, a morte de Bolo Yeung

segunda-feira, 13 de abril de 2009

1968: TUNNEL RATS (2008)


Já virou clichê escrever que o alemão Uwe Boll é um dos mais medíocres cineastas atualmente em atividade (se é que dá pra considerar cinema as porcarias que ele "escreve" e "dirige"). Mas esta generalização às vezes se transforma numa injustiça; afinal, o pobre sujeito virou sinônimo de ruindade mesmo para quem nunca realmente viu um filme dele! E não dá para negar que alguns dos seus trabalhos são pelo menos divertidos (o primeiro "Bloodrayne", por exemplo, que ainda tem o mérito de mostrar a linda Kristanna Loken pelada, ou a comédia "Postal", que atrai justamente pelo seu extremo mau gosto).

E então chegamos a 1968: TUNNEL RATS, um dos novos filmes do hiperativo Boll, que só neste ano de 2009 deve lançar mais três obras ("Far Cry", "Stoic" e "Rampage") e já está filmando outras duas ("The Storm" e "Darfur"), isso tudo mesmo com a quantidade absurda de críticas que seu trabalho recebe, e apesar de seus filmes jamais terem dado qualquer retorno financeiro em bilheteria - queria saber como o sujeito ainda consegue encontrar financiadores para as suas maluquices...


TUNNEL RATS é diferente dos filmes que Boll vinha fazendo até então, já que parte de uma história original de Dan Clarke transformada em roteiro do próprio diretor, mas sem inspiração em nenhum videogame, como a maior parte de suas obras anteriores. Aqui ironicamente fizeram o caminho inverso: foi o filme que depois se transformou em jogo de videogame!

Também é um dos primeiros trabalhos do diretor sem grandes astros ou nomes conhecidos no elenco, depois que nosso amigo desperdiçou gente como Ben Kingsley, Jason Statham e Burt Reynolds em suas produções anteriores. Aqui, para dar uma idéia, o nome mais conhecido é o ex-astro dos anos 80 Michael Paré, o que obviamente não quer dizer grande coisa. O orçamento foi de míseros 8 milhões de dólares e, reza a lenda, a estréia foi num único cinema de Los Angeles (!!!).


A surpresa é que, dependendo do seu estado de espírito, e com alguma boa vontade, este drama de guerra é bem divertido, e até, acredite se quiser, interessante. Talvez seja preciso um idiota como o Boll para conseguir fazer um filme cínico sobre a idiotice da guerra, neste caso a Guerra do Vietnã. Claro que não é nada que chegue aos pés de um "Apocalypse Now" ou "O Franco-Atirador", mas é louvável a maneira como o filme foge do tradicional estereótipo de "heróis americanos" vitimados pelos "malvados vietcongues". Para Boll, não há heróis nem vilões, vencedores ou perdedores - apenas vítimas.

O clima é tão pessimista que lembrei de alguns ótimos filmes italianos sobre o tema (como "Apocalypse 2/The Last Hunter", do Antonio Margheritti), que uniam extrema violência com uma mensagem anti-belicista, o contrário do que se via nas produções norte-americanas sobre o conflito - especialmente os "clássicos" produzidos e dirigidos por David A. Prior, como "Batalha no Campo do Inferno" e "Zona de Ataque", onde um ou dois heróicos soldados norte-americanos chacinavam pelotões inteiros de vietcongues (vai saber como é que os Estados Unidos não ganharam a guerra...).


E você realmente percebe que o homem está aprendendo a fazer filmes já nos créditos de abertura, em que helicópteros carregados de sacos-de-cadáver sobrevoam a imensidão da selva (as filmagens foram na África do Sul) ao som da música "In the Year 2525", de Zager & Evans.

TUNNEL RATS enfoca um grupo de soldados que têm como missão se infiltrar nos apertados túneis subterrâneos onde os inimigos vietcongues vivem, se escondem e preparam armadilhas e emboscadas para os rivais. Assim, são "ratos de túnel", como o título já diz, sob o comando do fanático tenente Vic Hollowborn (Paré), um personagem que parece saído de "Apocalypse Now", e que tem como atividades rotineiras enforcar prisioneiros de guerra ou desafiar soldados que discutem suas ordens para lutas de boxe (e vai entender como é que o sujeito tem luvas de boxe em plena selva!!!).


Os primeiros 20 minutos, que tentam apresentar um pouco mais da vida pregressa, dos dramas e dos medos dos jovens recrutas, é de longe a pior parte. É Boll tentando criar seu próprio "Platoon" ou "Nascido Para Matar", obviamente sem conseguir. Até que, lá pelas tantas, um dos personagens faz um discurso que parece ler o pensamento do próprio espectador: "Nada dessas merdas interessa, onde você esteve, de onde você é... Agora você está no Vietnã, e só interessa o que você faz no campo de batalha!".

É então que o filme começa a mostrar ao que veio, a partir do momento em que o pelotão entra em um túnel recém-descoberto nas cercanias do seu acampamento. É quando o clima tosco de "Platoon" vai para o espaço e a história se transforma numa versão bélica de "Abismo do Medo", com os pobres soldadinhos se arrastando por túneis escuros e cada vez mais apertados, e sendo despachados violentamente pelo inimigo escondido na escuridão.


Claro que, para curtir o filme, é preciso ignorar o fato de o roteiro de Boll ser HORRÍVEL. O desenvolvimento dos personagens é mínimo, e, quando existe, é constrangedor (tipo o negro que sonha em abrir uma lanchonete fast food quando voltar para os EUA, e passa as noites mandando beijos para a Lua para a sua namorada!!!!); o fio narrativo é inexistente, com as cenas e as mortes se sucedendo meio sem razão; personagens desaparecem sem explicação da história até que seja conveniente trazê-los de volta, e tudo acaba meio sem propósito, como se nunca tivesse existido, de fato, uma trama a seguir, deixando o espectador com aquela sensação de "Tá, e daí?".

Mesmo assim, algumas coisas realmente me agradaram em TUNNEL RATS para fazer com que eu esquecesse que estava vendo um filme sem roteiro. Uma delas é que o diretor-roteirista brinca com as expectativas do espectador, surpreendendo-nos inúmeras vezes ao longo da trama. Para começar, não há protagonistas principais: todos os recrutas ganham mais ou menos o mesmo destaque, e você acaba nem lembrando os nomes da maioria deles. Também não há espaço para heroísmos individuais à la "Rambo", frases de efeito ou acrobacias pirotécnicas.


Melhor: Boll faz com que um dos seus personagens passe o filme inteiro sobrevivendo a todo tipo de dificuldade no interior dos túneis, apenas para chegar à superfície e ser estupidamente abatido por fogo amigo! Também engana o público ao fazer o soldado metido a machão, que parece o grande herói da trama, morrer por primeiro (e de forma imbecil também), e ao mesmo tempo mantém vivo até a conclusão o recruta banana e covarde, que todos passam o filme inteiro dizendo que não vai durar muito tempo.

Para quem tem saudade daquelas produções bagaceiras e hiperviolentas feitas pelos italianos, TUNNEL RATS também é um deleite, primando pelo exagero: de soldados eviscerados por baionetas a espinha arrancada em enforcamento, o filme traz todo um catálogo de barbaridades. Uma das grandes influências de Boll parece ter sido "O Resgate do Soldado Ryan", já que há desde cenas com vietcongues esfaqueando impiedosamente inimigos desarmados até um soldado que é fanático religioso.


Pode-se até criticar o ritmo lento da narrativa, já que as cenas dos soldados engatinhando nos túneis escuros são repetidas à exaustão até deixar o próprio espectador sem fôlego. Mas elas funcionam para criar um clima de claustrofobia (é terrível imaginar-se naquela situação, com pouco espaço para se mexer e ainda sendo atacado pelos inimigos vindos de todos os lados), e ainda ajudam a criar uma história sobre a Guerra do Vietnã narrada de maneira original, até porque você fica se questionando sobre a idiotice daquilo - por que os caras não tacam umas 30 granadas e explodem os túneis ao invés de obedecer as ordens de seus superiores para rastejar lá embaixo? Há um momento altamente bizarro em que um soldado fica bloqueado no túnel após matar um vietcongue, e precisa esquartejar o cadáver pedaço por pedaço para liberar a passagem!

No final, quando um soldado norte-americano morre lado a lado com um "inimigo" vietcongue, o espectador até releva diversas bobagens que viu durante o filme para admirar a coragem do diretor. Longe de ser aquela historinha de ação e guerra que eu esperava, TUNNEL RATS traz até uma mensagem altamente crítica sobre a estupidez do conflito e sobre a futilidade da guerra. É isso mesmo, amiguinhos: Boll está tentando passar uma mensagem!

E, quem diria, consegue fazer isso de maneira muito mais contundente do que muito suposto clássico sobre o Vietnã que existe por aí...

Trailer de 1968: TUNNEL RATS


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1968: Tunnel Rats (2008, Canadá/Alemanha)
Direção: Uwe Boll
Elenco: Michael Paré, Nate Parker, Wilson
Bethel, Brandon Fobbs, Jane Le, Rocky
Marquette e Erik Eidem.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Mais críticas rápidas para pessoas nervosas


GRAN TORINO (Gran Torino, 2008, EUA. Dir: Clint Eastwood)
Clint Eastwood velho e fantástico num filme que, do começo ao fim, me pareceu o tipo de produção que o saudoso Charles Bronson estaria fazendo hoje caso continuasse vivo (talvez o final fosse diferente, uma coisa mais "Desejo de Matar 3", mas vá lá...). Ora, se o Stallone revisitou Rocky e Rambo aos 60 anos de idade, se o Bronson encarnou pistoleiros comedores de garotinhas na casa dos 80, por que é que o eterno durão Clint não poderia entregar algo bem próximo de uma versão envelhecida e ainda mais ranzinza do seu Dirty Harry? Seu personagem em "Gran Torino", Walt Kowalski, aparece sempre carrancudo, ao ponto de rosnar em algumas cenas, e xinga tudo e todos (inclusive os filhos mercenários) como uma metralhadora. Mesmo assim, Walt acaba virando herói do bairro sem querer quando intercede a favor de um vizinho oriental (ironicamente, ele ODEIA os orientais, que combateu na Guerra da Coréia!). Resolve "adotar" o rapaz e cuidar para que ele tenha um futuro decente, mesmo com todas as dificuldades e a presença de uma gangue pelo caminho. Tudo desemboca na tradicional conclusão com redenção, mas o filme não é, de maneira alguma, aquela historinha para boi dormir que parece ser pelo resumo. É, isso sim, um filmaço, e não me lembro qual foi a última vez que ri tanto, e sozinho, numa sala de cinema, por conta dos comentários mal-humorados e xingamentos do estressado personagem de Eastwood. Só as conversas dele com o jovem padre da paróquia (nas palavras do protagonista, "um virgem de 28 anos que acabou de sair do seminário"), incluindo uma impagável confissão, já valem o filme. Sem contar que o astro, também diretor, opta pelo tom dramático, sem exagerar os "heroísmos" do seu personagem (ao contrário do que o Charles Bronson aparecia fazendo em seus filmes já do fim da vida). Paro por aqui: direto para a lista dos melhores do ano!




DIA DOS NAMORADOS MACABRO 3D (My Bloody Valentine 3D, 2009, EUA. Dir: Patrick Lussier)
Analisando friamente, este filme é horrível: apesar de tentar seguir os passos do original canadense de 1981, que era um slasher bem decente (principalmente em sua versão uncut), essa refilmagem erra o tom ao partir para o exagero e para o vale-tudo. Não há suspense ou tensão, o minerador Harry Warden aqui não é capaz de dar um mísero susto ou sequer parecer uma ameaça decente, e o final não tem aquela perseguição legal nos escuros túneis das minas - sem contar que a revelação da identidade do assassino não acrescenta nada. Mesmo assim, achei um passatempo bastante divertido, talvez porque foi a primeira sessão que peguei com esta nova tecnologia em 3D (e convenhamos que é muito legal ver picaretadas saindo da tela do cinema e mandíbulas arrancadas voando na direção da platéia!). Ou talvez porque consegui achar graça justamente no lado mais trash da coisa, principalmente nos absurdos erros factuais (como o "assassino" sabia onde estava enterrado o corpo de Harry Warden?) e nas burrices não-intencionais (tipo uma enfermeira ir checar o soro de um paciente e só depois disso perceber que ele não está mais na cama!!!). Além do mais, você até releva uma meia dúzia de bobagens só por causa daquela cena da loira totalmente pelada (a gostosa Betsy Rue) sendo perseguida pelo assassino - cena esta que inclui até o assassinato de uma anã, vejam se tem cabimento! E as mortes são todas exageradas e bastante sangrentas, ao contrário do novo "Sexta-feira 13", que falhou justamente neste quesito. Inclusive acredito que Harry Warden e sua picareta fariam picadinho do novo Jason. Bobo, tosco, feio e burro, mas divertido e engraçado - em 3D, bem entendido. Sem 3D, deve perder 80% da graça.




A LIGA EXTRAORDINÁRIA (The League of Extraordinary Gentlemen, 2003, EUA. Dir: Stephen Norrington)
Este passou seis anos na minha lista de "filmes que jamais vou ver", ao lado de "Van Helsing", da trilogia "Jurassic Park" e de muitos outros. Devia ter ficado outros seis anos, mas a curiosidade foi mais forte e eu quis ver o quanto tinham estragado a fantástica minissérie em quadrinhos escrita por Alan Moore e Kevin O'Neill. Bem, digamos que o resultado conseguiu ficar abaixo das minhas mais baixas expectativas. Como é que alguém consegue transformar um material tão inteligente num filme tão tosco e idiota? Neste caso, a culpa é tanta do diretor Stephen Norrington ("Blade"), que parece mais interessado em explodir cenários do que em contar uma história, quanto do roteirista de primeira viagem (e que continue assim!) James Robinson. A Liga, para quem não sabe, é um "supertime" formado por personagens famosos da literatura do século 19, como Mina Harker (do livro "Drácula"), Dr. Jekyll ("O Médico e o Monstro") e Allan Quatermain ("As Minas do Rei Salomão"). Mas a adaptação para o cinema aproveita apenas umas duas ou três falas dos quadrinhos, o resto é tudo novo - e ruim. A vampira Mina perde o cargo de líder da Liga para Quatermain; afinal, aqui ele é interpretado por Sean Connery. O personagem também é mostrado como um aventureiro em plena forma física mesmo na velhice, enquanto nos quadrinhos era um trapo viciado em ópio! Para piorar, o roteirista Robinson meteu no balaio outros dois personagens que não estavam na minissérie de Moore e O'Neill, o imortal Dorian Gray e o aventureiro norte-americano Tom Sawyer. O resultado é abaixo da crítica: fiquei tão revoltado com os excessos do filme (na verdade um videogame fuleiro) que comecei a usar a tecla FF a partir da cena em que Sawyer dirige um carro conversível (resquícios de Batmóvel?) em alta velocidade pelas ruas da Veneza do século 19, enquanto edifícios feitos por computação gráfica desmoronam pelo caminho (!!!). E não espere ver o Homem Invisível ou Mr. Hyde (a "parte má" do dr. Jekyll) matando seus inimigos violentamente, como acontecia nos quadrinhos. Aqui o show é todo de Quatermain e Sawyer, e os outros personagens são apenas figurantes. Não por acaso, Connery e o diretor Norrington brigaram durante toda a filmagem, num trabalho tão estressante que ambos abandonaram o mundo do cinema desde então. Enfim, uma aula de como destruir um texto inteligente, mastigando-o para a geração MTV.




RESSACA DE AMOR (Forgetting Sarah Marshall, 2008, EUA. Dir: Nicholas Stoller)
O título nacional babaca para "Esquecendo Sarah Marshall" quase me fez desistir de ver esta surpreendentemente divertida comédia romântica, mais uma do time do produtor Judd Apatow - e, como as outras, repleta de humor grosseiro para adultos. Jason Segel (também roteirista) leva um fora da namorada, uma atriz famosa chamada Sarah Marshall (Kristel Bell). Sem conseguir se recuperar do baque, mesmo após transar com inúmeras garotas, ele resolve tirar umas férias no Havaí para esquecer a ex. Mas a tarefa será bastante difícil, já que Sarah e seu novo namorado, um roqueiro inglês lesado (Russell Brand), estão hospedados no mesmo hotel. Seguem-se as confusões e piadas eróticas de praxe, aqui com direito a farta exibição de genitais masculinos (!!!). O filme se estende demais, por quase duas horas (um defeito comum nas comédias produzidas por Apatow), mas consegue fugir do lugar-comum das comédias românticas contemporâneas. Um dos pontos altos é a discussão sobre a ruindade de um filme de horror estrelado por Sarah, sobre celulares assassinos (provavelmente uma citação ao remake "Uma Chamada Perdida"). Mas vale destacar também as cenas da série policial de TV que Sarah protagoniza ao lado de William Baldwin (!!!), com direito até aos bordões infames dos seriados policiais televisivos reais! Enfim, ideal para quem procura uma comédia romântica para assistir com a namorada, mas sem se privar do direito de rir de piadas infames e sexistas.




PARANÓIA (Disturbia, 2007, EUA. Dir: D.J. Caruso)
Bem legal este suspensezinho inofensivo voltado ao público jovem que eu acabei vendo numa madrugada insone via TV a cabo (e acredito que este seja o melhor jeito de ver um programinha simplório como este). Basicamente, é "Janela Indiscreta" para a Geração YouTube: o novo galã Shia LaBeouf (ô nomezinho...) é um garoto rebelde obrigado a cumprir prisão domiciliar após agredir um professor. Como ele está nos Estados Unidos, e não no Brasil, a coisa funciona: ele recebe uma tornozeleira digital que emite um alarme à polícia no caso de ele mal colocar o pé fora da área da sua casa. Sem poder escapar da condenação, ele se dedica a espionar os vizinhos, principalmente a gracinha interpretada por Sarah Roemer, que acabou de se mudar para a casa ao lado. O problema é quando ele começa a desconfiar que o vizinho da frente, um esquisitão interpretado pelo ótimo David Morse, é um serial killer. O elenco tem ainda a "Trinity" Carrie-Anne Moss em participação que não fede nem cheira, como a mãe do rapaz. Me lembrou inclusive uma variação do "A Hora do Espanto" (rapaz espiona vizinho, desconfia dele, o vizinho percebe que está sendo espionado e começa a invadir a vida do rapaz, e por aí vai). Mas, e isso realmente me surpreendeu, o filme é bem feitinho e consegue prender a atenção até o final. Pena que não tem coragem de ir além: na conclusão, alguns personagens que pareciam mortos reaparecem para o "final feliz" obrigatório nestas produções comercialóides.




PAGANDO BEM, QUE MAL TEM? (Zack and Miri Make a Porno, 2008, EUA. Dir: Kevin Smith)
Vendo os últimos filmes do eterno nerd Kevin Smith, quem diria que ele já foi considerado a salvação do cinema independente lá atrás, nos anos 90, ao fazer filmes simples e inteligentes como "O Balconista" e "Procura-se Amy"? Eu já tinha desistido do sujeito há algum tempo, especialmente desde os muito ruins "O Balconista 2" e "Menina dos Olhos", mas resolvi esquecer o título nacional horroroso e arriscar, já que o tema deste seu novo trabalho me pareceu interessante (casal de amigos fica sem grana para pagar o aluguel e resolve fazer um filme pornô amador), e a dupla de protagonistas valia a pena (com o engraçado Seth Rogen e a delícia Elizabeth Banks). O resultado acertou na trave: continua anos-luz distante das coisas boas que Smith já fez, continua tão besta quanto suas produções mais recentes (difícil entender que tipo de público ele anda mirando, se são os "adultescentes" de antigamente ou a garotada desmiolada de hoje), mas tem lá seus momentos. O melhor é a primeira parte, principalmente a sátira pornô de "Star Wars" (Star Whores), e também porque Smith não cai na burrada de fazer um filme sobre a indústria pornográfica sem mostrar nudez ou sexo (erro cometido por comédias patetas e inocentes como "Quase Ilegal" e "Um Show de Vizinha"). Entretanto, e isso é uma pena, o que começa como uma comédia sacana e safada bem legal desmorona a partir da metade, quando se transforma em comédia romântica, e o filme pornô é simplesmente esquecido. E a Elizabeth Banks NÃO aparece pelada, o que é extremamente deprimente! Para piorar, a tradução das legendas é ridícula, deixando de fora 80% dos palavrões e termos de baixo nível tão necessários numa história como essa. Resumindo: até vale uma espiada, mas não é nada memorável. Atenção para as pequenas participações da ex-musa pornô Traci Lords (agora uma baranga de dar medo), e do novo Superman, Brandon Routh, aqui em papel de homossexual!




O RETORNO DOS MALDITOS (The Hills Have Eyes 2, 2007, EUA. Dir: Martin Weisz)
Falaram tão mal desta continuação do remake de Alexandre Aja para o clássico de Wes Craven que nunca me animei a ver, até agora. Puro exagero: trata-se de uma típica continuação caça-níquel para o mercado de DVD, tão comum quanto outras tantas, mas longe de ser esta ruindade que comentaram - a continuação "original", dirigida por Wes Craven em 1985, é que é um lixão indefensável. O roteiro desta seqüência foi assinado por Craven com seu filho Jonathan, e mostra um pelotão da Guarda Civil em uma missão de resgate naquela mesma área do deserto do Novo México onde a família Carter foi atacada no primeiro filme. Claro que ainda há muito mutantes canibais por lá (embora misteriosamente nenhum deles tenha dado as caras no primeiro filme...), e os monstrengos tratarão de aniquilar os soldadinhos de chumbo um a um. Há bastante sangue e mortes (com direito a cabeça esmagada com pedra EM CLOSE, saco esmagado a marretadas e lâmina de baioneta enfiada na boca), mas sem um pingo da tensão e do suspense do original de Craven ou mesmo do remake do Aja. Culpa do diretor alemão Weisz, mais interessado no visual do que na história. Mas vale para uma Sessão da Tarde gore para doidos. Sem contar que é divertido ver soldados tão burros quanto a média das jovens vítimas de slasher movies. Dá até para traçar um paralelo com a ocupação norte-americano no Iraque: como lá, aqui também temos jovens soldados bem equipados, mas mal-preparados, tentando tomar posse de um território que não é deles e sofrendo a sangrenta retaliação dos habitantes locais. Quem disse que só o George Romero pode fazer crítica social? Divertidinho, e nada mais.




UMA VIAGEM MUITO LOUCA (Harold & Kumar Escape from Guantanamo Bay, 2008, EUA. Dir: Jon Hurwitz e Hayden Schlossberg)
Este filme é seqüência de uma comédia boba que tinha lá seus momentos ("Harold e Kumar Go To White Castle", lançada no Brasil como "Madrugada Muito Louca", por isso o igualmente tenebroso título nacional desta continuação). Infelizmente, os roteiristas cometeram a burrada de pegar estes poucos bons momentos do original e repetir aqui, pensando que teria a mesma graça. Não tem. Isso sem contar que a trama é bisonha: a dupla de maconheiros Harold e Kumar pega um vôo para Amsterdã, mas um mal-entendido a bordo, envolvendo um bong, faz com que eles sejam acusados de terrorismo e enviados a Guantanamo Bay (!!!). Está no título original, mas a cadeia se resume a uma ceninha de cinco minutos: logo a dupla foge e atravessa os EUA, com o Serviço Secreto no seu encalço. Acontece de tudo um pouco: eles invadem uma reunião da Ku-Klux-Klan, quase transam várias vezes, fumam maconha com o presidente George Bush (!!!), mas nada disso tem a menor graça. O único momento divertido, como já acontecia no filme original, é a participação do ator Neil Patrick Harris interpretando ele mesmo, e fazendo uma curiosa auto-crítica (é representado como um astro de Hollywood viciado em drogas e sexo com prostitutas). O desfecho de sua aparição, de tão absurdo, é o ponto alto do filme. O resto é bobagem e não provoca nem sorrisos amarelos. E nem mesmo o festival de gostosas peladas ajuda. Está na hora de os roteiristas de comédias debilóides aprenderem que peidos e pessoas cagando, por si só, não têm graça nenhuma, pelo menos para as pessoas normais. Pior: segundo o IMDB, um terceiro filme com Harold e Kumar vem aí...




O CURIOSO CASO DE BENJAMIN BUTTON (The Curious Case of Benjamin Button, 2008, EUA. Dir: David Fincher)
Como é que um conto bem humorado e com meia dúzia de páginas escrito por F. Scott Fitzgerald se transforma num porre melodramático interminável com quase três horas de duração? Boa pergunta... Eu nem vou discutir aqui os aspectos técnicos do filme, a maquiagem perfeita e o talento de David Fincher como diretor, já demonstrado diversas vezes ao longo de uma carreira repleta de filmaços. Mas este "Benjamin Button" é muito chato, e falha principalmente por não conseguir tornar interessante o drama absurdo do personagem principal. Tudo bem, o Brad Pitt nasce velho e vai rejuvenescendo com o passar dos anos ao invés de envelhecer. Legal, interessante, mas a criatividade da situação se esgota depois dos primeiros 20 minutos, e ainda tem 140 pela frente! O maior problema é o roteiro de Eric Roth, que mais parece uma regurgitação do seu premiado trabalho anterior, "Forrest Gump" (são tantas semelhanças entre os dois filmes que nem vou perder meu tempo enumerando). E, estranhamente, os melhores momentos são justamente aqueles que não têm relação com a trama principal, como o velhinho que vive se lembrando de quantas vezes foi atingido por raios (eu ria alto a cada vez que os flashbacks mostravam o sujeito sendo atingido!), ou a história do relojoeiro que constrói um relógio cujos ponteiros andam para trás, na esperança de que o tempo volte e seu filho retorne vivo da Primeira Guerra Mundial. Já no caso da história sem graça do Benjamin Button - que, como Forrest Gump, participa sem querer de diversos fatos históricos -, a única parte realmente empolgante é a sua participação involuntária na Segunda Guerra Mundial. Mas quando a guerra acaba, e o ótimo personagem do Capitão Mike (interpretado por Jared Harris) some de cena, o filme se transforma numa xaropice interminável. Grande decepção que ainda estou tentando entender como ganhou tantas críticas positivas.




THE GIRLS REBEL FORCE OF COMPETITIVE SWIMMERS (Joshikyôei hanrangun, 2007, Japão. Dir: Kôji Kawano)
Mais um da série "O que será que tem na água que esses japas malucos bebem?". Rodada em vídeo digital, esta tosqueira bizarra bota no mesmo balaio extrema violência, tabus reprimidos, sacanagens das mais diversas, fetiches (japinhas vestidas como colegiais, japinhas tomando banho, japinhas de biquíni, lesbianismo entre japinhas), zumbis, vilões à la James Bond, raio laser saindo da perereca (!!!) e até uma super-assassina estilo Nikita. Como o filme tem apenas 78 minutos de duração, ou 1h18min, pouco ou nada deste tempo de projeção será utilizado para o desenvolvimento dos personagens. O que se sabe é que a bonitinha e tímida Aki (Sasa Handa) e a extrovertida Sayaka (Yuria Hidaka) se encontram num colégio, para onde a primeira foi transferida, bem no meio de uma invasão de zumbis. Sorte que elas são integrantes do time de natação do título, e o cloro da piscina garante imunidade ao vírus da zumbificação (!!!). Na verdade, é tudo uma grande bobagem, daquele tipo que não pode e nem deve ser levado a sério. Tudo, das interpretações (espere para ver as caretas dos atores que interpretam os zumbis...) aos efeitos especiais, é de segunda linha, o que às vezes até provoca alguma risadinha aqui e acolá pela produção miserável. Mas logo a piada perde a graça, pois lembra um filme amador, com imagem um pouco melhorzinha, gravado no quintal da casa de alguém. O que parece é que o diretor Kawano se perdeu por querer atirar para todos os lados, e acaba sem acertar em nenhum alvo: há gore, humor, bobagem e sacanagem em doses esparsas, mas não equilibradas, de maneira que o filme fica apenas vazio e muito chato, mesmo sendo curto.




NOSSO QUERIDO BOB (What About Bob?, 1991, EUA. Dir: Frank Oz)
Dos populares comediantes dos anos 80, Bill Murray talvez seja o único que mantenha uma carreira elogiável até hoje - já que Steve Martin, Eddie Murphy, James Belushi e Chevy Chase perderam a graça, John Belushi e Richard Pryor morreram e Dan Aykroyd hoje sobrevive de pontas em comédias sem graça, inclusive servindo de escada para o Adam Sandler! Portanto, sempre é bom redescobrir os filmes antigos do Murray, como esta pérola de humor negro chamada "Nosso Querido Bob", e que inacreditavelmente eu nunca havia visto. Ele interpreta um sujeito tão chato, mas tão chato, que faz aquele seu amigo mais xarope ou cunhado mais inconveniente parecerem anjinhos. É tudo que Jim Carrey tentou ser em "O Pentelho" e não conseguiu. O chatão chama-se Bob Wiley e é um paranóico e hipocondríaco cheio de manias, que transforma num inferno a vida de seu novo psiquiatra, o dr. Leo Marvin (Richard Dreyfuss, excelente). Desesperado por atenção médica, ele segue o doutor até o lago onde o psiquiatra está passando férias com a família. E, claro, transforma a vida do pobre homem num inferno - principalmente porque toda a família vê Bob como um sujeito simpático, menos, é claro, o psiquiatra, e o espectador! É aquele tipo de comédia em que as coisas só vão piorando, mesmo quando você pensa que o pior já aconteceu (excelente a maneira como Bob destrói a entrevista ao vivo que o psiquiatra está concedendo em rede nacional!!!). Humor negro de primeira, e realmente dá a maior pena do personagem de Dreyfuss.