
Ontem eu finalmente vi "Um Beijo a Mais" (The Last Kiss, 2006), remake norte-americano praticamente cena a cena do fantástico filme italiano "O Último Beijo" (L'Ultimo Bacio, 2001). O original é de Gabriele Muccino; a refilmagem foi dirigida por Tony Goldwyn, que muitos devem lembrar como o vilão do filme "Ghost - Do Outro Lado da Vida" (aquele que morre espetado por um pedaço enorme de vidro).
Quando chegou o final do filme, novamente me peguei pensando na gigantesca injustiça cometida pelo personagem principal para que se consumasse o "final feliz" esperado pela maior parte da platéia, mesma atitude questionável que eu já havia presenciado no original italiano.
Para quem não viu nenhum dos filmes: Michael (Carlo no original) é um "adultescente" de 29 anos que, às vésperas de chegar nos 30, começa a sentir aquele tradicional medo de que sua vida se transforme num gigantesco tédio. Ele tem um bom emprego, uma namorada fantástica e divertida, e o casal espera seu primeiro filho. Por outro lado, todos os outros casais ao redor do rapaz (seus amigos, seus sogros...) parecem estar em crise ou se separando. Será isso um sinal?
Finalmente, na festa de casamento de um dos amigos, Michael conhece Kim (Francesca no original), uma irresistível ninfetinha que começa a dar mole para ele. A garota percebe que ele está com o namoro em crise e passa a seduzi-lo; já Michael, assustado com a possibilidade de passar o resto da vida com a mesma mulher, cede aos encantos da "invasora", com quem tem um breve caso de amor.

Pois tanto em "L'Ultimo Bacio" quanto em "The Last Kiss", nosso herói repentinamente "abre os olhos" e percebe que aquela ninfeta não passa de uma aventura, e que a mulher da sua vida é mesmo a namorada traída, aquela que vai ter um filho seu. Claro, essa "descoberta" só acontece depois que ele come a pobre garotinha que estava dando mole para ele!
E assim "Um Beijo a Mais" repete a cena em que nosso "herói" dá o fora na menina para voltar para o seu "grande amor". E é incrível como continuo ficando sensibilizado com esse momento, para mim uma das cenas mais tristes da história do cinema.
E isso que o remake norte-americano ainda dá uma maneirada, pois no filme italiano a coisa é ainda pior: a pobre Francesca aproxima-se de Carlo, toda apaixonada, presenteando-o com um livro, cobrando atenção e afeto (já que o rapaz não faz contato desde que transou com ela); e Carlo simplesmente arranca para longe com seu carro, fugindo daquela menina que dias antes seduziu sem culpa, deixando atirado ao chão o presente que Francesca comprou com todo amor e carinho (veja abaixo).
Talvez ajudasse se os roteiros de "O Último Beijo" e "Um Beijo a Mais" transformassem as personagens de Francesca e Kim em simples predadoras sexuais, em Lolitas insensíveis atrás de homens comprometidos, com o único objetivo de destruir um casal por pura diversão.
Mas não: Francesca e Kim são garotas realmente apaixonadas pelo protagonista, seja Carlo ou seja Michael, que não estão seduzindo o rapaz apenas por diversão, mas por amor. Além disso, ambas são garotas lindas, sensíveis e divertidas, daquele tipo por quem é muito fácil se apaixonar, o que justifica o fato de Carlo e Michael ficarem caidinhos por elas. O único "pecado" das personagens foi se apaixonar por um rapaz comprometido e tentar salvá-lo de um relacionamento em crise.

E é justamente por isso que a atitude de nossos supostos "heróis" soa tão horrível. Tanto Francesca quanto Kim só servem para uma trepadinha rápida; não são elas que estão brincando com os sentimentos do "herói", mas sim o contrário. E, após conseguirem o que querem (a pulada de cerca), tanto Carlo quanto Michael não demoram para fugir correndo da menina, quando qualquer homem na mesma situação pensaria pelo menos um milhão de vezes antes de voltar para um relacionamento já caindo na rotina. (As fotos aqui publicadas são de Carlo e Francesca no filme de Mucino; repare na felicidade do casal antes do "herói" voltar acovardado para os braços da namorada.)
Eu sempre tive essa fraqueza de pensar no destino dos personagens secundários dos filmes, especialmente comédias românticas. Os roteiros tentam nos fazer torcer pelo protagonista, por mais estúpido que ele seja, mas eu normalmente fico com pena daquele sujeito que perde a namorada para o "herói", ou da pobre mocinha abandonada quando o "herói" redescobre o amor da sua vida (como Francesca e Kim no caso em questão).
Normalmente, os roteiristas corrigem essa falha de caráter de seus protagonistas transformando os personagens secundários em malas cheios de defeitos, que justificam a torcida por parte do espectador. Mas isso não acontece em "O Último Beijo"/"Um Beijo a Mais". No fim, eu realmente acho que Carlo/Michael devia ter ficado com Francesca/Kim, com quem certamente teria uma vida mais divertida e apaixonada do que com a namorada que, afinal, traiu.
Outra comédia romântica recente que me deixou com a pulga atrás da orelha (comecem a namorar e vocês também serão obrigados a ver váriaaaas comédias românticas) foi "O Melhor Amigo da Noiva", onde Patrick Dempsey rouba Michelle Monaghan de um nobre escocês em pleno dia do casamento da moça.
Por mais "romântico" e "bonitinho" que possa parecer o final desse filme, tem que ser muito insensível para não ficar pensando no coitado do noivo abandonado. Pois o pobre rapaz era um partidão (bonitão, ricaço, cavalheiro, apaixonado...), a mocinha passou o filme todo perdidamente apaixonada por ele, mas é claro que o roteiro exigia que ela ficasse com o mocinho trapalhão e mulherengo na cena final.

E por isso, sem pensar duas vezes, é só o filme se aproximar da conclusão para que a moça saia da igreja, no dia do seu casamento, subitamente tomada de paixão fulminante pelo herói banana. Isso, claro, para o alívio da maioria dos espectadores - e para a fúria de quem, como eu, sempre espera um pouco de lógica do roteiro dos filmes.
Aí, enquanto o casalzinho central curte seu final feliz, o maluco aqui se põe a pensar: e quanto àquele pobre ricaço escocês, cujo único defeito e única culpa era ser o personagem secundário do filme?
Talvez o errado seja eu, pois confesso que já torci até pelo Belloq, o rival de Indiana Jones em "Os Caçadores da Arca Perdida" (puxa, ele nem era de todo mal, e ainda ajudava a Marion quando ela era prisioneira dos nazistas!!!).
Mas toda vez que esse tipo de injustiça acontece, eu me lembro do filme "Austin Powers" e da impagável piada que mostra o drama dos familiares e amigos dos ajudantes do Dr. Evil mortos pelo herói. "Ninguém pensa nas famílias dos capangas dos vilões", reclamam eles, entre lágrimas. Pelo jeito, ninguém pensa nos sentimentos dos personagens secundários, também...
PS: Descobri agora que o diretor Gabriele Mucino está trabalhando em uma seqüência de seu "L'Ultimo Bacio", que vai se chamar "Baciami Ancora" e será lançada em 2010, mostrando seus personagens 10 anos depois dos acontecimentos do original. Pensei que era a chance da redenção de Carlo, e que ele finalmente voltaria aos braços da apaixonada Francesca. Mas caí do cavalo ao olhar os créditos do filme no IMDB: a linda Martina Stella, que interpretou a ninfeta no original, não estará na seqüência. E, pelo jeito, Carlo não vai se redimir daquele fora terrível que deu na garota - uma das cenas mais tristes da história do cinema.

24 comentários:
Felipe, falando francamente, tive este mesmíssimo sentimento pela Niandra em Canibais & Solidão! Foi de propósito?
Claro! Porque se fosse uma comédia romântica hollywoodiana, o herói do Canibais & Solidão teria desistido da sua musa para ficar com a melhor amiga apaixonada (tipo o Jim do "American Pie", que eu nunca perdoei por ter trocado a Nadia pela flautista sem sal na Parte 2). Mas, como eu tinha visto "O Último Beijo", achei melhor fazer o final desse jeito menos convencional e mais triste.
Mas aí que tá, acho que a moral da história é que, por mais bonita, interessante e apaixonada que fosse a outra (infelizmente só vi a versão americana) o protagonista gostava mesmo era da mulher. Eles tinham toda uma história, todo um passado que ele não estava disposto a deixar de lado. Ele traiu não porque não gostava da esposa, mas era pra provar, se me perdoa o palavreado, uma bocetinha diferente pela última vez. Era medo de ser pai, de ser marido.
Acho até que passou pela cabeça dele que a menina ter chamado tanto a atenção dele é porque ele achou, por um instante, que "era pra ser". Lembra do diálogo dele com o sogro? O sogro diz algo como: "ainda está para aparecer a última morena na minha vida", tipo, ser fiel é uma escolha, não uma vocação, uma simples afirmação de que não existem outras moças que poderiam mexer com a cabeça de um cara.
E digo mais: tanto ele não amava aquela menina que ela ter ido atrás dele, singelamente com um presente, tornou aquilo, a traição, real demais. Se fosse só uma trepada ele talvez levasse aquilo melhor. Azar da garota, mas não era o coração dela que o interessava... Tipo, o cara não era mau, era apenas um perdido idiota, um "pato lógico", como todos nós.
P.S: como faço pra comprar teu filme? Ainda pretende fazer o tal faroeste que comentou numa entrevista sua?
Aí é que está: só acho que o filme é muito "maquiavélico" ao usar a pobrezinha da garota apenas como uma ferramenta descartável para fazer com que o rapaz perceba seu amor verdadeiro pela namorada.
Não teria o mesmo impacto se ele simplesmente fosse para a zona ou pegasse uma vagabunda qualquer num bar: a personagem da ninfeta, nos dois filmes, é apresentada como alguém muito legal, entende?
E é por isso que eu fico com pena, pois é só o cara fazer o serviço que a menina perde sua função na história e é dispensada de forma muito insensível.
É por isso também que eu acho o fora de Carlo em Francesca uma das cenas mais tristes que eu já vi - principalmente porque, no lugar dele, eu provavelmente ficaria com a ninfeta!
Você pode comprar o CANIBAIS & SOLIDÃO na lojinha virtual do site Boca do Inferno. Quanto ao faroeste, está temporariamente abandonado.
Pois é, essa tristeza dos personagens secundários ocorreu até mesmo em 007 PERMISSÃO PARA MATAR, onde no final James Bond tem que escolher entre uma das duas bond girls que sobreviveram.
Não lembro o nome do filme, mas tem um com a Sandra Bulock que também da raiva! O cara ta viajando pra cidade onde vai ocorrer o casamento dele e conhece a personagem da Sandra que está viajando pra rever o filho, eles ficam lá de namorico o filme todo pra no final ao invês dele dispensar a noiva ele simplesmente vai lá e se casa com a mocreia sem nem se despedir da Sandra.
Vontade de pegar um roteirista desses e encher na porrada!
Fiquei interessada pelos teus filmes a venda no post anterior...
...mas convertidos para dvd... rsrsrrs...
Mas essa é a graça do filme: seria fácil colocar o cara simplesmente com uma vadia, mas o puseram com uma garota que além de linda é um doce, do tipo que o cara tem que tratar a champanhe e caviar. Só que o filme é sobre o drama dele, nós temos o filme da perspectiva do babaca.
Maldade? Bom, sim, mas porque se fosse de verdade seria muito cruel, provavelmente se fizessem uma continuação focada nela mostrariam ela como uma dessas vagabundas ressentidas que acreditam que todos os homens são uns cretinos. É duro pra caralho, é injusto, mas o filme parece sinalizar que "é assim mesmo que acontece". A "boa e velha" verossimilhança que tratávamos no post do Blindman. E acho também que esse é o charme do filme, e é justamente o que fez o filme ficar em sua cabeça e, porque não, no seu coração: é uma bruta sacanagem, mas é uma solução até bem corajosa e diferente prum filme. Seria "fácil" o sujeito se encontrar de verdade nos braços da menina e abandonar a esposa, como em certos tantos filmes que vemos. Mas no fim das contas, pobre garota, ela o amou sozinho.
Esse da Sandra Bullock chama-se FORÇAS DO DESTINO, e é um caso que eu já achei diferente: a Sandra é a mocinha do filme, enquanto a noiva do sujeito é a personagem secundária sem grande desenvolvimento (a "vilã" nesse tipo de história). A "lógica hollywoodiana" mandaria que o personagen do Ben Affleck (o "herói") largasse a noiva (a "vilã") para ficar com a mocinha na conclusão, mas, quem diria, ele acaba mesmo é com a personagem secundária, algo totalmente inesperado - principalmente para quem já conhece de cor as armadilhas dessas comédias românticas!
Caro LUIZ ALEXANDRE, eu concordo com tudo o que você escreveu. Não estou reclamando da forma como as coisas acontecem no filme, inclusive acho "O Último Beijo" um grande filme principalmente pela coragem/realismo com que ele trata esses temas, mas sempre fico extremamente compadecido da pobre Francesca (e como eu gostaria de consolá-la após o fora desprezível que ela recebeu!!! hahahaha).
O filme italiano marca exatamente porque não poupa o espectador dessa dureza com os personagens secundários; nas comédias românticas de Hollywood, por exemplo, o roteiro nunca se preocupa com o pobre sujeito que foi trocado pelo Ben Affleck ou pelo George Clooney. Isso é o legal do filme do Mucino, mas ao mesmo tempo dá uma pena...
Pelo menos ela não levou um tirambaço na cara tipo a Scarlett Johansson no Match Point.. :P
Falando sério, eu acho até melhor que seja assim, acho mais irritante aqueles filmes em que o "herói" vai impedir o casamento da amada e o "noivo secundário" se revela um safado, traidor, vilãozão mesmo. Como se a mulher nunca tivesse percebido que o cara era safado durante todo o namoro e noivado. Se bem que tem mulher assim mesmo! :D
de vez em quando eu penso, mas também não seria mais fácil o cara ter explicado que a coisa foi só atração fisica pra moça do que deixar ela sofrendo? e outra se ela foi capaz de seduzir um cara comprometido, ela pode escolher a dedo seus pretedentes,acho que um dos grandes defeitos desses filmes é fazer achar que só existe só o mocinho de homem no mundo como se não existisse mais niguém além do carinha legal do filme, isso é rídiculo, então se a personagem gostosa pode escolher outro cara porque ela fica sofrendo pelo mocinho? é por isso que nunca gostei de filmes românticos.
oi, Felipe! eu não vi nenhum desses filmes mencionados, mas acho que todos eles refletem a visão conservadora (forte nos EUA e na Itália) de defesa da estrutura familiar do casamento, especialmente se este é resultado de um longo processo de ligação entre as famílias e tal. nessa visão, a moça que tenta interferir no processo é sempre a vilã, mesmo que esteja bem intencionada. e repare que (pelo menos numa rápida lembrança, posso estar enganada) só os personagens homens, em geral, têm o direito de atrapalhar casamentos em cima da hora nos filmes americanos. naquele "O Casamento do Meu Melhor Amigo", nem a Julia Roberts consegue!!
eu entrando aqui pra ler uma critica de algum filme italiano podreira dos anos 80 me deparo com uma critica de romance
sick
Calma JOHN, foi apenas um momento de fraqueza. Em breve voltaremos com nossa programação normal!
"Calma JOHN, foi apenas um momento de fraqueza. Em breve voltaremos com nossa programação normal"
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
essa foi deamais !!1
Isso me lembrou a música "Arma de Vingança' do grande mestre do brega Carlos Alexandre.
Essa cancão mostra o ponto de vista do Ricardão, que fica arrasado quando a mulher volta para os braços do corno.
A grande sacanagem é que ela alem de linda, é sensivel, e divertida, o cara a usou pura e simplesmente, e acho que essa é a logica do filme ele tava atrás de uma aventura, e ela ao contrario dele foi quem se apaixonou, no final acho que essa que é o diferencial do filme, foi real, o cara descobriu que amava a esposa e largou o presente da lindinha por pura culpa, fodeu os sentimentos dela claro, mais como eu disse na vida real isso é comum as vezes a escolha errada pra um é a certa pra outro, vide American Pie 2.
Me dá um aperto no coração quando me lembro do fora que John Cusack levou da mulher que amava no final de QUERO SER JOHN MALVOKICH, e como ela foi embora com a Diaz sem nem ao menos olhar para ele, deixando o cara desolado no meio da estrada e com chuva caindo em cima dele. E o pior é que ele deixou o corpo de Malkovich por causa dela! Quanta ingratidão...
Você já assistiu "Noites Brancas" de Visconti? Por causa desse filme, hoje em dia penso muito nos que são abandonados em finais de filme.
Deus me livre de me comprometer com uma pessoa que pensa assim como você, rapaz! quer dizer que é só um relacionamento começar a "cair na rotina" (embora vc tenha dito que a namorada do cara era "legal e divertida, ou seja, culpa dela não foi)que se deve cair nos braços da primeira "ninfetinha" que aparecer? E o amor nessa história, como que fica e vc escreveu isso quando ainda tava com o coração inteiro, pqp!)
Sabe qual seria o final perfeito? O CARA FICAR SEM NENHUMA DAS DUAS! Por que um sujeito que se deixa influenciar pelo que está acontecendo com os amigos e não valoriza o que tem de bom, merece é isso mesmo!
OU então ficasse com a ninfetinha e levasse um belo par de chifres, que é o que provavelmente aconteceria na vida real.
E é o que acontece em MUITOS filmes realmente bons!
Aprecio sua observação sobre os personagens secundários, mas realmente sua análise foi bem do tipo "adultescente" na faixa dos 30!
Graças a deus que a vida real é beeeem distante dessas comediazinhas bestas, e todos sofrem as consequencias de seus atos após o "final feliz".
Eu já fui personagem secundária, mas não levei fora. Foi um pouco diferente. Quando a gente se encontrar eu te conto essa história. Foi triste e gerou consequências idem.
Ah, eu também acho que o moleque de American Pie deveria ficar com a Nádia. Não por ela ser gostosa(e ela é!), mas porque ela era bacana e também gostava muito dele.
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