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domingo, 3 de maio de 2009

LIGHTBLAST (1985)


Quando eu acabava de assistir LIGHTBLAST, fiquei imaginando o diretor Enzo G. Castellari e o roteirista Tito Carpi, alguns meses antes da produção do filme, compartilhando uma sessão de cinema de "Os Caçadores da Arca Perdida". Fascinado com a cena do derretimento do rosto dos vilões nazistas no filme de Spielberg, Castellari viraria para Carpi e iniciaria um diálogo mais ou menos assim:

- Caramba, Tito! Temos que fazer um filme assim!
- Mas Enzo, o Antonio Margheritti já está filmando uma série de cópias do Indiana Jones estreladas pelo David Warbeck, como "Os Caçadores da Serpente Dourada"...
- Você não entendeu: o que eu quero é fazer um filme onde as pessoas DERRETAM desse jeito!


E mais ou menos dessa forma pode ter surgido esta pequena e desconhecida produção misturando gêneros (policial, ação e ficção científica), em que o final de "Os Caçadores da Arca Perdida" é triplicado e temos pelo menos cinco derretimentos de pessoas muito legais em stop-motion.


Estas cenas, por sinal, são a principal atração de um filme um tanto rotineiro, que viraria produto descartável em outras mãos, mas acaba um tantinho acima da média por ter como diretor o hábil Castellari. Sem nunca deixar a peteca cair, o veterano Enzo recheou um roteiro raso como um pires (que pode ser reduzido a meia dúzia de linhas) com muitas cenas de ação, que tornam o resultado final bem melhor do que deveria ser.

LIGHTBLAST marca o início de uma época ruim para Castellari e para o cinema italiano em geral. Após o fracasso de seu ambicioso filme anterior, "Tuareg - O Guerreiro do Deserto" (1984), Enzo embarcou numa série de filmes padronizados para atingir o público norte-americano, sem muito destaque e anos-luz distante do que ele fazia antes, como "Striker" (1987, estrelado por Frank Zagarino), até acabar no comando do seriado de TV "Extralarge", com Bud Spencer.


O próprio LIGHTBLAST já tem aquela cara de produto de rotina para americano ver, com filmagens em San Francisco e a presença de um ator popular por lá, mas na época já meio decadente - Erik Estrada, astro do seriado "CHIPS" entre 1977 e 1983.

Erik interpreta um policial durão chamado Ronn Warren, que passa o filme inteiro perseguindo um cientista louco e psicótico, o dr. Yuri Sbovoda (Thomas Moore, aka Ennio Girolami, irmão de Enzo). O vilão desenvolveu um fantástico e mortífero raio laser, e ameaça a cidade com atos de terrorismo, pedindo dinheiro sob a ameaça de derreter pessoas com a arma.


A investigação do herói é relativamente descomplicada (ele encontra todas as pistas facilmente para identificar o cientista), e percebe-se logo que a investigação policial não será o grande destaque do filme. Na verdade, Castellari deu mais atenção para os tiroteios e perseguições de automóvel. Estas, para o leitor ter uma idéia, chegam a cansar, de tanto que se repetem: é praticamente uma perseguição de automóvel a cada 10 minutos.

Na conclusão, Warren persegue o veloz automóvel do vilão pilotando um igualmente veloz carro de stock-car (!!!), voando por aquelas ladeiras de San Francisco que já haviam sido imortalizadas na clássica perseguição do filme "Bullit", dirigido por Peter Yates em 1968. A cena serviria como lição para ensinar cabeças-de-bagre moderninhos a dirigir filmes de ação.


LIGHTBLAST é relativamente curtinho e, com 86 minutos repletos de ação, o espectador praticamente nem vê o tempo passar. Assim, acaba relevando os inúmeros furos de roteiro, e principalmente a inexistência de qualquer desenvolvimento dos personagens. O herói Warren, por exemplo, tem uma esposa, Jacqueline (Peggy Rowe), que só aparece em cena por alguns míseros minutos para ser baleada pelos vilões, e assim motivar uma vingança pessoal do policial contra a organização terrorista. Esta vingaça se dará através de incontáveis e mirabolantes tiroteios em câmera lenta, um dos artifícios preferidos do diretor Castellari.

A verdade é que o filme valeria apenas pelas cenas de derretimento de pessoas em stop-motion, que são muito bem feitas para uma produção barata como esta. Começa com um casal de adolescentes que está transando dentro de um vagão de trem e é acidentalmente destruído quando o dr. Sbovoda está testando o seu raio da morte. Depois vai para uma dupla de locutores de uma corrida de automóveis, derretida pelo vilão como "alerta" para o prefeito de San Francisco. Finalmente, termina com a típica justiça poética: o próprio cientista acaba morto pela sua arma!

Estes "derretimentos" são bastante violentos (clique na montagem abaixo para vê-la em tamanho ampliado), mas o filme ainda traz muitos e ensangüentados buracos de tiro à la Sam Peckinpah, não só no peito, como é tradicional, mas também na cabeça e no pescoço.


E há também tentativas de humor. No início do filme, Warren é enviado disfarçado de garçom para levar comida a uma dupla de seqüestradores que não pensa em se render(isso não tem nada a ver com a trama principal). Para não correr riscos, os meliantes exigem que o "garçom" compareça completamente nu, para não poder levar armas escondidas. E assim somos brindados com uma divertida cena em que Erik Estrada, metido numa ridícula cueca preta, dá cabo dos dois seqüestradores usando uma pistola com silenciador escondida dentro de um frango assado!!!

Talvez o grande problema de LIGHTBLAST - problema este que faz o filme ser tão facilmente "esquecível" - é a falta de um protagonista forte ou mais simpático. Afinal, quem engole Erik Estrada como mocinho fora da série "CHIPS"? Fosse um Franco Nero ou Fabio Testi no papel principal, o resultado seria completamente diferente. Do jeito que está, resta um herói pouco simpático, sem muita motivação, totalmente inexpressivo e apagado, que você esquece horas depois de ver o filme, lembrando apenas das ótimas cenas com efeitos especiais. Não tivesse a violência característica do cinema de Castellari, poderia até ser uma produção feita para a TV, tal a rotina das situações apresentadas.


LIGHTBLAST acabou se tornando uma peça rara na filmografia do italiano. Circula em raras cópias VHS e em alguns DVDs estilo Works Filmes, com cópia retirada da velha fita de vídeo mesmo, mas sem nenhuma remasterização. No Brasil, ele foi lançado em VHS pela Look Vídeo como "A Máquina do Extermínio", em outra fitinha que logo acabou se tornando raridade.

Via Emule ou torrents, infelizmente, a única maneira de localizar o filme é numa versão dublada em italiano, por sinal gravada direto da TV italiana. Mas, para quem quiser ter uma idéia, há algumas cenas da versão em inglês no YouTube, inclusive um dos derretimentos de pessoas.

E se o filme está longe de ser uma das grandes obras de Enzo G. Castellari, ainda assim diverte e traz algumas cenas bem acima da média. Afinal, até os filmes mais fraquinhos do diretor são melhores que muita bobagem que se faz hoje com um orçamento infinitamente maior - e por gente infinitamente MENOS talentosa!

Veja o derretimento de pessoas em LIGHTBLAST


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Colpe di Luce/ Lightblast (1985, Itália)
Direção: Enzo G. Castellari
Elenco: Erik Estrada, Thomas Moore (Enio
Girolami), Michael Pritchard, Peggy Rowe
e Massimo Vanni.

12 comentários:

Anônimo disse...

De onde tu tira esse tipo de filme??? puts, stop-motion, sempre foi um tipo de efeito especial que admiro muito, principalmente qdo se trata em cenas de pessoas derretendo, entrando em decomposição ou se transformando em algum ser dos infernos...

=)

Ronald Perrone disse...

Do Castellari eu vi essa semana o BIG RACKET....putz, que filmaço!

Artur disse...

Castellari é mestre mesmo, exelente diretor, é uma pena estar sendo desperdiçado na Tv italians, espero que o cinema europeu volte como antigamente, ia ser legal ver filmes de ação carcamano voltando a ativa, esse filme não mostra muito uma visão pessimista do futuro, mas parece ser um filme legal, e mais: "Afinal, até os filmes mais fraquinhos do diretor são melhores que muita bobagem que se faz hoje com um orçamento infinitamente maior - e por gente infinitamente MENOS talentosa!"

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Kurt Breichen disse...

Com certeza o homem sabia como é que se dirigia uma cena de ação. Estou baixando o "La Polizia incrimina la legge assolve" para tirar o gosto ruim que ficou depois de testemunhar a direção "magistral" de Quantum of Solace. O que mata aquele filme são aquelas cenas de ação merda de videoclipeiro - porra, o cara acha é só meter corte e tremer a câmera que cria tensão. A direção dos poliziotteschi de Castellari é mil vezes melhor e provavelmente os filmes eram feitos com um por cento do orçamento. Luc Besson devia encontrar o homem e convencê-lo a dirigir "Transporter 4". Mesmo com 90 anos, aposto que ele ainda dá um banho na maioria dos diretores de "cinema de ação" que andam por aí hoje em dia. Cacete, só a cena de stock car nesse clipe já dá uma surra na "perseguição" da abertura de QoS. E os caras derretendo são muito massa.

Felipe M. Guerra disse...

O Castellari vai fazer 71 anos em julho e não duvide que ele dá um banho em qualquer "Velozes e Furiosos" da vida.

2009 poderá ser o ano da virada na carreira do nosso querido Enzo: ele vai aparecer numa ponta como ator em "Inglorious Basterds", do Tarantino, que é uma homenagem a "Assalto ao Trem Blindado", e também lançará seu primeiro filme produzido para o cinema desde 1993.

Kurt Breichen disse...

De fato, me embananei com as datas. Sempre fui retardado com números.

E eu tinha esquecido da ligação de Castellari com "Inglourious Basterds". Caramba, tomara que isso dê um boost na carreira do velho maestro. Se deu certo pro mané do John Travolta...

Agora, Guerra, imagine o Castellari dirigindo um filme de ação com um orçamento de 100 milhões...

Rubens Angelo disse...

Nossa! Estou impressionadíssimo com a qualidade do seu Blog. Mas a pergunta é: onde eu consigo ver o LIGHTBLAST?? Parece bom demais!!!! Vc tem o DVD? Estou começando um Blog de filmes antigos, mas não chega nem perto desse... Parabéns!

Felipe M. Guerra disse...

RUBENS, obrigado pelos comentários. O Lightblast você consegue por uma destas três vias: encontrando o raríssimo VHS nacional em algum sebo, comprando o DVD bagaceiro lançado nos EUA ou baixando via torrent/Emule. Eu optei pela terceira via, e baixei a tal cópia ripada da TV italiana, dublada em italiano e com o logo da emissora no canto inferior direito (como você pode ver pelas fotos). Se um dia sair um DVD decente, talvez eu compre.

Artur disse...

tomara mesmo Guerra, essa é uma exelente noticia que vou publicar no meu blog, pois estou fazendo um especial sobre o filme e as inspirações do Tarantino, vamos torçer pro velho Enzo voltar aos cinemas, e que filme é esse que ele produziu em 1993? que coincidência, 93 foi o ano que eu nasci, hehehehe

Felipe M. Guerra disse...

JONATHAN E OS URSOS foi o último filme escrito e dirigido pelo Castellari para o cinema, em 1993. Não funcionou porque era um western tardio com o Franco Nero, acredito que uma tentativa de aproveitar o reinteresse pelo gênero após o sucesso (e os Oscars) de Os Imperdoáveis, do Clint Eastwood. Eu mesmo tenho o VHS há quase uma década, mas nunca assisti o filme para saber se é bom ou não!!!

Artur disse...

JONATHAN E OS URSOS é um filme que estou curioso pra assistir, até porque é sobre um cara criado por ursos, se lancar no cinema, não vou perder essa chance de ver Castellari na telona, hehehehe.

sitedecinema disse...

Vale citar que o Estrada fez no filmou, lá pelo fim de 1987, ua participação no primeiro longa norteamericano dirigido pelo carioca Bruno Barreto, ASSASSINATO SOB DUAS BANDEIRAS, um thriller político passado em Puerto Rico, com Amy Irving, Bob Duvall, Andy Garcia (esses dois em pequenos papéis), Kevin Spacey (num dos primeiros papéis de vilão dele nas telonas norteamericanas), e, canastreando de forma MUITO divertida, Lou Diamond Phillips, como um dos vilões mais bregões que vcs já viram