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sexta-feira, 31 de outubro de 2008

SUPERMAN REDEEMED (2006)


Eu nunca curti muito o Superman como personagem de quadrinhos (ele é certinho, bonzinho e perfeito demais), mas confesso que gosto das adaptações do personagem para o cinema feitas entre as décadas de 70-80. Menos, claro, aquela pavorosa produção feita a toque de caixa pela Cannon, "Superman 4 - Em Busca da Paz" (1987), que matou o personagem no cinema (estrago que nem Bryan Singer conseguiu corrigir naquele pavoroso "Superman Returns"). "Superman 3" (1983) também não é lá essas coisas, mas pra mim é cult movie, acho que pelo clima trash que domina o filme do começo ao fim.

Foi, portanto, com muita curiosidade que li sobre um projeto de 2006 chamado SUPERMAN REDEEMED (em bom português, "Superman Redimido"; ou, se preferir, "Superman - A Redenção"). Algum fã dos mesmos filmes do Superman dos anos 70-80 resolveu que iria tentar amenizar a ruindade de "Superman 3" e "Superman 4", utilizando as maravilhas da tecnologia moderna para ripar os DVDs das duas seqüências e editar as (poucas) cenas boas, mandando direto pra lixeira as (muitas) bobagens destes dois filmes.

Para resolver alguns problemas aqui e ali, o paciente e criativo sujeito pegou também umas partes de "Superman 2" (1980), inclusive uma das cenas excluídas deste filme filmadas por Richard Donner, que mostrava uma criativa fuga de Luthor da cadeia. E assim, resumindo dois filmes que duravam 3h30min para míseros 90 minutos, criou este fan film chamado SUPERMAN REDEEMED. Alguém bem que podia fazer um fan film de no máximo duas horas editando os três novos (e intragáveis) "Star Wars" dirigidos por George Lucas, né?

E não é que funciona? O tal fã (que assina a "reedição" com o pseudônimo "A Digital Man", talvez para escapar de problemas com direitos autorais) apagou sem dó nem piedade tudo o que não funcionava nos dois filmes e deixou somente as cenas boas ou razoáveis, milagrosamente fazendo com que as duas tramas completamente diferentes (Superman enfrenta supercomputador em "Superman 3" e o Homem Nuclear em "Superman 4") conseguissem ficar razoavelmente interessantes quando resumidas em 1h30min.

Claro que ainda está longe da perfeição, e ainda tem algumas coisas sobrando, mas SUPERMAN REDEEMED com certeza é bem melhor que os dois filmes supracitados vistos separadamente. O sujeito fez até uma capinha para a sua versão, onde colocou "Você vai acreditar que uma lenda possa ser salva", ironizando a clássica frase "Você vai acreditar que um homem possa voar", que estava no cartaz da primeira aventura do herói.

Primeiro, vamos aos cortes: A Digital Man excluiu (bendito seja!!!) TODAS as cenas com Richard Pryor interpretando Gus Gorman em "Superman 3" e sumiu com qualquer vestígio do "novo vilão" Ross Webster (Robert Vaughn), aquele almofadinha sem graça que substituía Lex Luthor de forma desastrosa no terceiro filme. Nem sinal de supercomputador no fan film também: as únicas cenas que o "re-editor" aproveitou desta seqüência foram a da subtrama mostrando o retorno de Superman/Clark Kent para Smallville e seu reencontro com o amor da juventude, Lana Lang (Annette O'Toole), personagem que sumiu misteriosamente em "Superman 4".

Superman vs. Clark Kent



Também foi aproveitada a clássica cena em que o Superman Malvado (efeito colateral de uma nova forma de kriptonita criada pelo supercomputador) lutava contra seu alter ego, Clark Kent, num ferro-velho - provavelmente a melhor parte do terceiro filme. E outros pequenos pedacinhos aqui e ali.

De "Superman 4", SUPERMAN REDEEMED aproveita parte da trama do garotinho que escreve para o Superman pedindo o desarmamento e todo o lance da criação do Homem Nuclear (Mark Pillow, em seu único filme) por Lex Luthor.

Em compensação, o fan film deleta toda aquela bobajada de o jornal Planeta Diário ter sido adquirido por novos proprietários (entre eles Lacy Warfield, interpretada por Mariel Hemingway, que foi totalmente apagada na nova edição) e reduz ao mínimo a participação do intragável sobrinho de Luthor, Lenny Luthor (Jon Cryer), que na edição original era uma espécie de Jar Jar Binks ainda mais insuportável, sempre fazendo piadinhas sem graça com o seu tio - outra invenção de roteiristas idiotas que não sabem o que fazer com personagens de quadrinhos.

Na ordem da nova edição, a história fica mais ou menos assim: após aqueles créditos tradicionais com os nomes dos atores voando no espaço, ao som da inesquecível trilha de John Williams, e do aviso de que este é um fan film feito a partir de "dois filmes imperfeitos", SUPERMAN REDEEMED mostra Clark Kent convencendo Perry White (Jackie Cooper), seu chefe no Planeta Diário, a liberá-lo para fazer uma reportagem sobre o encontro de ex-alunos do colégio de Smallville.

Ele segue para sua cidade-natal acompanhado do fotógrafo Jimmy Olsen (Marc McClure), salva a cidade de um incêndio num laboratório químico no caminho e finalmente chega ao tal baile, onde reencontra a ex-amada Lana. Todas estas cenas são de "Superman 3".

Paralelamente, reencontramos Ottis (Ned Beatty), que originalmente não apareceu nas partes 3 e 4, mas retorna numa das cenas excluídas de "Superman 2" dirigidas por Richard Donner. Esta parte mostra Luthor fugindo da cadeia, auxiliado pela srta. Teschmacher (Valerie Perrine), e deixando o pobre gordinho para trás.

Em seguida, aliado ao sobrinho Lenny (a srta. Teschmacher infelizmente desaparece da edição, já que não havia cenas dela em "Superman 4"...), Luthor rouba um fio de cabelo do Superman do museu de Metrópolis, e usa o material genético do cabelo para criar um clone do Superman (todas estas cenas são do quarto filme).

Superman vs. Homem Nuclear



Quando volta de Smalville, Clark descobre que há uma ameaça terrorista na Torre Eiffel, e que sua amada Lois Lane (Margot Kidder) foi escalada para cobrir o evento, e está em apuros. Ele resolve o problema arrancando o elevador da torre em que está a bomba e lançando o dito cujo no espaço, em cenas de "Superman 2".

O atentado inicia um debate sobre o perigo das armas nucleares, quando voltam as cenas de "Superman 4", mostrando o garoto Jeremy (Damian McLawhorn) escrevendo para o Superman e pedindo sua ajuda para deter a ameaça de uma guerra atômica. O herói começa, então, uma cruzada contra a corrida armamentista, "roubando" ogivas nucleares dos Estados Unidos e da (extinta) União Soviética para explodi-las no núcleo do Sol.

Só que um destes mísseis tem o material genético do Superman, alterado por Luthor. Ao ser arremessado contra o Sol, ele dá origem ao terrível Homem Nuclear (com uma roupinha digna de Parada Gay), um "super-capanga" que Luthor usa contra o herói. Até então, continuam as cenas mais razoáveis de "Superman 4" (pelo menos a maior parte do CGI bagaceiro e dos efeitos toscos da Cannon foram apagados desta versão), até que o Homem Nuclear fere Superman no pescoço.

Então, aparentemente em virtude do ferimento, o herói fica malvado (quando voltam as cenas de "Superman 3"), fazendo coisas "horríveis" como desentortar a Torre de Pisa e apagar a tocha olímpica. O conflito interior do herói acaba na clássica luta de Superman versus Superman no ferro velho, e então voltam as cenas de "Superman 4" para mostrar o duelo final com o Homem Nuclear.

SUPERMAN REDEEMED faz um favor ao espectador ao poupá-lo de rever personagens insuportáveis como Gus Gorman e Lenny Luthor e ao eliminar a maioria das cenas de ação chinfrins de "Superman 3" e "Superman 4" (tipo o herói contra os mísseis no terceiro filme e salvando a menina de um tornado no quarto).

Cenas pavorosas como a do supercomputador transformando uma perua em robô sem mais nem menos, em "Superman 3", ou o Homem Nuclear levando Lacy para um passeio sem proteção no espaço em "Superman 4" (sem que a moça percebesse qualquer sinal de falta no vácuo) também foram direto para a lixeira.

Tiveram o bom senso de apagar ISSO!



O novo editor também demonstra um sensível e elogiável respeito à série, coisa de fã mesmo, ao resgatar personagens que os produtores destas duas seqüências excluíram sem qualquer explicação (Luthor do terceiro filme, Ottis e srta. Teschmacher de ambos); teve espaço até para um "off" de Marlon Brando, como o pai do Superman, em uma das cenas.

Enfim, o tal do "Digital Man" passou a borracha no que não prestava e deixou o que dava para engolir, criando uma trama razoavelmente coerente e, quem diria, divertida. Ficou algum furinho aqui e ali, e em diversos momentos parece mais uma colcha de retalhos de "melhores momentos" do que um filme propriamente dito, mas ainda assim é melhor que "Superman 3" e "Superman 4". Não que isso queira dizer alguma coisa...

Muitas vezes eu vi filmes que me deixaram pensando em como eu faria diferente, ou como mudaria alguma coisinha que não funcionava bem. Esta é a graça destes fan films: ver que existem, no mundo, sujeitos que pensam como você, mas são desocupados e dominam as ferramentas de edição de vídeos para criar uma nova edição apagando o que consideram errado na primeira.

E é por isso que eu gostaria muito de ver alguém "corrigindo" os novos "Star Wars", apagando o personagem chato de Samuel L. Jackson em "Duro de Matar - A Vingança", mesclando cenas boas de vários filmes razoáveis do James Bond numa aventura única ou ainda transformando metade das seqüências de "Sexta-feira 13" num filme só.

ão apenas alguns exemplos do que o universo dos fan filmes permitem, e aí está SUPERMAN REDEEMED para comprovar que esse tipo de brincadeira pode resultar num passatempo divertido - e, ironicamente, muito melhor que o "produto oficial".

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Superman Redeemed (1983/1987/2006, EUA)
Direção: Richard Lester e Sidney J. Furie
Reedição: A Digital Man
Elenco: Christopher Reeve, Gene Hackman,
Margot Kidder, Annette O'Toole, Jon Cryer,
Jackie Cooper e Marc McClure.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

POLIZIOTTI VIOLENTI (1976)


Os filmes policiais italianos da década de 70 deram origem a um subgênero específico, conhecido como "Poliziotteschi" (ou "Poliziottesco") e também como "Eurocrime". De modo geral, todos são marcados por uma postura séria de crítica social ou "filme-denúncia", e seus personagens principais são quase sempre anti-heróis, policiais durões e implacáveis (imortalizados com os rostos de Luc Merenda, Franco Nero e Fabio Testi, entre outros), daquele tipo que prefere encher os bandidos de tiros do que levá-los a julgamento. Cineastas como Fernando Di Leo, Enzo G. Castellari, Umberto Lenzi e Stelvio Massi deram preciosas contribuições a este ciclo, que inclui alguns filmes tão violentos e amorais que fariam o norte-americano Dirty Harry parecer um coroinha.

E o que Michele Massimo Tarantini tem a ver com a história? Michele (pronuncia-se "Miquele", que na Itália é nome masculino) é um débil mental (ou "foi", já que boatos não-confirmados dão conta de que teria morrido há alguns anos) que, desde o começo da sua carreira, sempre atirou para todos os lados: fez filmes policiais, comédias eróticas, cópias de "Conan - O Bárbaro" ("A Espada de Fogo", de 1982) e até uma série de co-produções Itália-Brasil rodadas aqui em nosso país, incluindo os divertidíssimos e absurdamente toscos "Perdidos no Vale dos Dinossauros", "Fêmeas em Fuga" e "Atração Selvagem" (thriller erótico que conseguiu a façanha de reunir o pseudo-galã tupiniquim Raul Gazolla e o astro pornô Rocco Sifredi!)


Na década de 70, Tarantini investiu no "poliziotteschi" e, entre os filmes que dirigiu, está POLIZIOTTI VIOLENTI ("Policiais Violentos", inédito no Brasil), uma aventura exagerada, politicamente incorreta, violenta, tosca até a medula e, por isso mesmo, muito divertida, na mesma linha dos "clássicos" do diretor como "Perdidos no Vale dos Dinossauros". Nesta pérola, Tarantini ainda conseguiu a façanha de colocar, como "heróis", dois atores cujas carrancas ficaram marcadas no papel de vilões: o norte-americano Henry Silva e o italiano Antonio Sabato. Por aí o espectador já sabe o que esperar.

Longe do estilo narrativo videoclipeiro atual, POLIZIOTTI VIOLENTI se desenrola como se fosse um filme sério, sem cortes rápidos ou grandes efeitos. Mas, quando a coisa ferve, é tiro pra todo lado e carros e motos acelerando pelas ruas de Roma. E sempre com uma alta contagem de cadáveres para os dois lados (bandidos e civis). Como muito bem ilustrou meu amigo Osvaldo Neto, do blog Vá e Veja, "o bom senso é zero".


O filme enfoca a relação de amizade e ódio entre dois heróis distintos: o major Paolo Altieri (Silva), um experiente e veterano oficial do exército italiano, e o inspetor Tosi (Sabato), policial durão que trabalha disfarçado, tentando se infiltrar numa poderosa quadrilha de traficantes de armas pesadas.

Altieri foi "promovido" a um trabalho burocrático no Ministério depois de xeretar em um delicado assunto militar que poderia provocar polêmica (a morte de soldados devido a defeitos nos seus pára-quedas). Mas ele não desiste de continuar investigando o caso por contra própria, ao mesmo tempo em que se envolve com uma jovem professora chamada Anna (a gracinha Silvia Dionisio).

O problema é que o major parece atrair violência. E, após frustrar o seqüestro de uma criança numa arriscada perseguição automobilística (onde ele faz o carro dos seqüestradores capotar e pegar fogo, aparentemente pouco ligando para a saúde do próprio refém!!!), Altieri se transforma no alvo número 1 da mesma perigosa quadrilha que Tosi está perseguindo.


Pego numa emboscada, o militar é violentamente espancado por um grupo de homens liderados por um marginal de bigodinho e viciado em chocolate (Thomas Rudy, de "Django, O Bastardo"). Apavorado, Altieri percebe que os homens portam novíssimas metralhadoras MK-118, uma poderosa arma experimental e secreta que seu pelotão estava testando, e que de maneira alguma poderia estar nas ruas.

Quando ele começa a seguir a trilha das metralhadoras, sua investigação solitária cruza-se com a do inspetor Tosi, que está de olho na mesma quadrilha. E embora não se biquem, Altieri e Tosi unem seus esforços para desbaratar (leia-se balear pelas costas, explodir em pedacinhos e metralhar) a quadrilha de traficantes de armas.


O que mais me chamou a atenção em POLIZIOTTI VIOLENTI é a total amoralidade do roteiro escrito a oito mãos por Tarantini, Adriano Belli, Franco Ferrini e Saulo Scavolini: os vilões são tão cruéis que em cada uma de suas ações sempre sobra para inocentes transeuntes ou velhinhas que estão atravessando a rua; os pobres coitados, que não têm nada a ver com a história, são impiedosamente metralhados pelas costas, atropelados por bandidos em fuga, explodidos em atentados contra a vida dos heróis, e por aí vai.

Pior: a dupla de heróis parece nem se importar com a quantidade de baixas civis e continua caçando implacavelmente os bandidos, só demonstrando algum sinal de sentimentos quando as vítimas são pessoas próximas a eles, como a pobre Anna, que, claro, é estuprada pelos vilões - como manda a cartilha do cinema policial italiano da época.


POLIZIOTTI VIOLENTI também está repleto daquela tentativa de crítica social do período, já que por trás de todos os crimes está um poderoso político, o senador Vieri (Ettore Manni), que é intocável para os heróis - a não ser, claro, quando eles "jogam fora o distintivo" e partem para a guerrilha pessoal. Só a cena em que Altieri entrega dois marginais para serem linchados por uma multidão furiosa, e assiste ao espancamento com um cínico sorriso de satisfação, já vale o filme. "Direitos humanos" é o caralho!

Destaque ainda para a conclusão nada "feliz" e que leva às últimas conseqüências o choque entre o idealismo de Tosi e a postura de "foda-se todo mundo" de Altieri.


Lendo assim, pode até parecer um daqueles filmes policiais sérios na linha "Operação França". Mas não é: lembre-se que POLIZIOTTI VIOLENTI tem um débil mental na direção. E Tarantini não faz por menos: suas cenas de ação são tão absurdas que acabam engraçadas, como aquela em que Tosi e Altieri perseguem dois criminosos em motos por uns 5 minutos apenas para explodir ambos em pedacinhos no final da caçada.

A investigação do filme provavelmente seria muito mais rápida e fácil se os dois heróis tivessem um pouquinho mais de paciência e INTERROGASSEM os bandidos, mas eles preferem crivar os sujeitos de balas (várias, nunca apenas uma) ao invés de fazer perguntas! Assim, eles chegam aos cabeças da quadrilha praticamente por acaso, e alguns bandidões (como o tal viciado em chocolate que espanca Altieri) ainda escapam ilesos no final!


Mesclando a ação desenfreada e os tiroteios sangrentos com essas bobagens e o humor involuntário (graças à exagerada postura "macho man" dos dois heróis, sempre carrancudos e dispostos a dar tiros e socos), POLIZZIOTTI VIOLENTI é um belo filme para quem cansou das bobagens do cinema policial contemporâneo e procura algo com a cara "mais séria" dos anos 70.

Já quem não é do ramo vai estranhar - e muito - o pandemônio provocado pela dupla de heróis, que parece disputar com os bandidos quem mata mais, sempre ao som de uma esquisita trilha funk-jazz composta pelos irmãos Guido e Maurizio De Angelis.

PS: Tentei ver a versão original, dublada em italiano, mas não tem como entender direito. Por isso, deixo aqui um agradecimento público ao D.Evil e ao Zebu, da comunidade Boizeblog no orkut, que encararam o desafio de fazer uma legenda em português para esta preciosidade.

Trailer de POLIZIOTTI VIOLENTI



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Poliziotti Violenti/Crimebusters (1976, Itália)
Direção: Michele Massimo Tarantini
Elenco: Henry Silva, Antonio Sabato, Silvia Dionisio,
Ettore Manni, Rosario Borelli, Thomas Rudy, Claudio
Nicastro e Daniele Dublino.

sábado, 18 de outubro de 2008

BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE (1976)


Não, você não leu errado: o nome deste filme de 1976 é realmente "Bruce Lee Lutando de Volta do Túmulo", e fico só imaginando a reação dos familiares do verdadeiro Bruce Lee, falecido em julho de 1973, ao verem pipocar produções mórbidas como esta e "Os Clones de Bruce Lee" (aquele em que sangue retirado do cadáver do ator é usado para criar cópias programadas para combater o mal). Mas se "Os Clones..." pelo menos citava abertamente o ator, BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE simplesmente tem título e argumento completamente mentirosos, numa estratégia "pega-bobo" criada pela distribuidora norte-americana do filme para promovê-lo e aproveitar a onda chamada "Brucesploitation".

Este bizarro subgênero (que merecia no mínimo um livro caprichado) surgiu na metade dos anos 70, um pouco antes e logo depois da morte do verdadeiro Bruce Lee, quando outros atores orientais passaram a se auto-atribuir nomes semelhantes ao do astro para tentar enganar o público norte-americano, então ávido pelas aventuras baratas vindas de Hong-Kong. Embora o verdadeiro Lee só tenha feito quatro filmes completos (cinco, se contarmos "O Jogo da Morte", que só foi completado em 1978), seu legado de filmes de ação continuou através dos socos e chutes de outros atores, como Ho Tsung-tao (rebatizado "Bruce Li"), Huang Kin-lung (rebatizado "Bruce Le"), Leung Siu-lung (rebatizado "Bruce Liang") e Vyachaslev Yaksysnyi (rebatizado "Dragon Lee"), entre outros.

Em BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE, o clone da vez é Jun Chong, um campeão de taekwondo que, com a morte de Bruce Lee, passou a usar o nome artístico "Bruce K. L. Lea" (cruz-credo!). Só que a única semelhança entre Bruce K. L. Lea e Bruce Lee é o fato de ambos terem o cabelo preto - e, claro, dois olhos, um nariz, uma boca, duas orelhas... De resto, não há nada de "imitador de Bruce Lee" em Lea além da pretensão.

Bem, a história desta produção bizarra é igualmente bizarra: o filme é uma co-produção entre Hong-Kong e Coréia do Sul que, originalmente, não citava o nome de Bruce Lee, apesar de ser estrelada por um dos seus muitos imitadores. O título original era "America Bangmungaeg", e não vá me perguntar o que isso significa. Como nos EUA da época havia a febre dos cinemas grindhouse, que exibiam qualquer tosquice para uma platéia ávida por filmes de baixa ou nenhuma qualidade, a distribuidora norte-americana Aquarius resolveu faturar em cima da "Brucesploitation": comprou os direitos de exibição de "America Bangmungaeg" e mudou o nome para o enganoso e antológico BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE.

Mas foi além: criou um pôster com o desenho de Bruce Lee saindo do túmulo e a frase "You can't keep a good man down". Também mandou para os cinemas um trailer completamente apelativo narrando "o retorno de Bruce Lee do túmulo" após um pacto com o "Anjo Negro da Morte". Durante a colagem com as cenas de luta do filme, o narrador do trailer anunciava, com sua voz cavernosa: "Ele nunca morreu... Ele voltou do túmulo em busca de vingança"! Pode?

Só que aí os caras deram um tiro no próprio pé. Afinal, o tal filme que compraram não mostrava Bruce Lee voltando do túmulo, nem com muita boa vontade. A solução encontrada foi filmar um prólogo que não estava na montagem original, com apenas 20 segundos, num cemitério de Los Angeles. A câmera dá um close numa lápide onde lê-se "Bruce Lee 1940-1972" (perceba que erraram até a data da morte), e então, entre raios e trovões, um baixinho sem camisa sai pulando de dentro da sepultura e fica em posição de combate! Pronto: entra o título BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE , e o filme continua como havia sido anteriormente filmado. Aí o espectador precisa "imaginar" que o personagem de Bruce Lea na trama é o Bruce Lee ressuscitado. Dá pra acreditar?

Detalhe: quer dizer então que Bruce Lee foi sepultado sem caixão, sem camisa e vestindo apenas uma calça jeans?

Bruce Lee volta do túmulo



Resolvido o problema com a questão da propaganda enganosa (boatos dão conta de que este prólogo capenga de 22 segundos teria sido filmado pelo italiano Umberto Lenzi, informação nunca confirmada), o filme continua conforme foi feito pelo diretor coreano Doo-Yong Lee, sem zumbis de Bruce Lee e sem túmulos.

A trama acompanha Bruce Lea chegando em Los Angeles à procura de um amigo de infância, Go Ha Han. Após dar cabo de um taxista ladrão de passageiros (numa das muitas cenas ridículas desta obra-prima), Lea chega até o prédio onde o amigo morava e descobre que estão fazendo seu funeral. Aparentemente, o coitado suicidou-se ao se atirar do telhado do prédio.

Mas é claro que Lea logo suspeita que tem sujeira da grossa no esquema. E, sempre carregando amarrada ao pescoço uma caixa de madeira com os restos mortais do falecido cremado (!!!), ele circula pela cidade em busca dos possíveis responsáveis pela morte do amigo.

Após salvar uma conhecida de Han, Susan (a gatinha e futura scream queen Deborah Chaplin), de ser estuprada por um gigante sem camisa num estacionamento (!!!), o casal une forças para investigar o misterioso "suicídio". Logo descobrem uma complicada trama envolvendo tráfico de drogas e os chefões do crime de Chinatown.

Escrevendo assim, até parece que há uma história para acompanhar. Acredite: NÃO HÁ! O roteiro de Chee Do Hong (este é, compreensivelmente, seu único crédito) é uma verdadeira zona, que apenas vai pulando de uma cena de luta para outra sem explicação.

Logo no começo, por exemplo, Lea é atacado por um negro enorme vestido com capa (parece o Batman!) e segurando um machado numa das mãos. Sem se justificar, o negão sai dando porrada no herói, que se defende dando uns gritinhos ridículos (imitando o verdadeiro Lee, mas de maneira muito exagerada e cômica). Resultado: o bandido de capa é morto a socos e chutes.

Bruce Lea versus Batman!



Corta então para Lea preso e ouvindo a maior mijada dos policiais. "Você vai fritar, cara!", ameaça um deles. Subitamente, alguém telefona para o delegado avisando que a fiança de Lea está paga, e o herói simplesmente sai da delegacia como se nada tivesse acontecido! Nada mal para quem estava quase condenado à pena de morte, não? Antes, porém, ele ainda dispara uma pílula de sabedoria oriental: "Ah... Uma súbita mudança de sorte no esquema dos fatos!". hahahahaha

Mais adiante, Lea e Susan estão andando de carro por Chinatown e o herói pede para a garota estacionar. Ele então se aproxima do primeiro cara que vê parado na calçada, lhe dá uma bofetada no rosto e ordena: "Me leve para o seu chefe!". E o sujeito obedece, levando Lea até o esconderijo de um poderoso chefão do crime. O herói sai na porrada com o sujeito e, quando este vai abrir o bico para falar a verdade sobre o que aconteceu a Han, é atingido mortalmente por uma estrelinha ninja. Agora, cá entre nós: que técnicas investigativas Lea utilizou para descobrir que o cara estava metido no esquema? E mais: por que o assassino silencioso não matou também o herói, para impedir que ele continuasse investigando?

O filme ainda inclui dezenas de cenas sem nexo, como aquela em que Lea e Susan vão comprar um carro (!!!), ou a aparição de um sujeito inexplicavelmente vestido de cowboy (!!!), acompanhado por um lutador de luta livre (!!!). No fim, descobre-se que Go Ha Han é o grande vilão. Ele simulou a própria morte para poder escapar com um milhão de dólares em heroína que pertenciam à quadrilha para quem trabalhava. A muamba, como você já deve ter desconfiado, está escondida naquela caixa de madeira com os supostos "restos cremados" do falecido, e que Lea ficou levando para lá e para cá o filme inteiro. Assim, tudo termina na tradicional luta final entre vilão e mocinho.

Sou só eu, ou mais alguém viu o roteiro como uma versão tosca do clássico "O Terceiro Homem", de Carol Reed?

BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE é um daqueles filmes magneticamente ruins, onde a coisa é tão tosca e absurda que você não consegue desgrudar os olhos da telinha da TV. Como filme de ação, pelo menos, é nota zero: sonolento, mal-feito e desnecessariamente confuso. Mas, como comédia involuntária, é tão engraçado quanto as produções de Al Adamson e David A. Prior. Ah, também tem uma pequena participação de Shô Kosugi (dos clássicos "Ninja - A Máquina Assassina" e "Ninja 3 - A Dominação") antes da fama.

O diretor Lee não tem qualquer noção de narrativa. Tudo acontece ao acaso no filme, os bandidos surgem do nada ou são encontrados acidentalmente pelo herói, a "investigação" é bisonha e até o grande vilão precisa se desmascarar, porque o herói não é capaz de descobrir nada do mistério por conta própria. E há ainda ridículos erros de continuidade, do tipo personagens que estavam num jóquei-clube aparecendo misteriosamente dentro de uma casa, ou o herói e um vilão se encontrando num estacionamento e subitamente trocando porradas num ringue de boxe (!!!).

Lá pelas tantas, numa das muitas cenas completamente cretinas, Lea tem o carro roubado e precisa ir a pé até um encontro com Susan. No caminho, topa com um desfile de carros alegóricos e fica assistindo em meio ao multidão. Acredite se quiser, mas a cena dura uns 5 minutos: a equipe realmente filmou um VERDADEIRO desfile de carros alegóricos, e intercalou cenas do evento com closes de Bruce Lea olhando aquilo com cara de maravilhado. Detalhe: sempre que a câmera filma a multidão, aparece alguém fazendo tchauzinho! De rolar de rir!

Bruce Lea versus taxista!



Não bastasse os atores orientais serem porcamente dublados em inglês - principalmente Lea; toda vez que ele abre a boca, é um festival de gargalhadas -, o tal "imitador de Bruce Lee" não funciona nem fisicamente, nem lutando. Isso porque o sujeito simplesmente não consegue lutar, e, para piorar, ele próprio é o coreógrafo das cenas de pancadaria.

Pelo menos duas delas foram filmadas com os atores fazendo os movimentos lentamente, e depois as cenas foram aceleradas na edição (percebe-se claramente, e aí a coisa fica ainda mais trash). E em todas as demais trocas de sopapos, as mãos e pés de Bruce Lea passam tão longe do rosto dos adversários que eles só podem estar caindo estatelados de susto, ou pelo atrito do deslocamento de ar entre punhos e face.

Ah, sim: TODA luta termina com um "replay" em câmera lenta do último e melhor golpe, aquele que nocauteia o vilão (e resta saber porque Lea não dá este golpe por primeiro... hehehe), como se fosse um jogo de fliperama!!! Pena que, em câmera lenta, fica ainda mais evidente o fato dos golpes passarem dois metros longe do "alvo".

BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE foi lançado no Brasil num DVD tão tosco quanto o filme, pelo selo Kives (uma "subsidiária" dos pirateiros da Works Editora). A matriz parece ter sido uma velha e gasta fita cassete dublada em inglês, o que só dá mais ar de grindhouse para o programa. O título em português é tão enganador quanto o norte-americano ("Bruce Lee - A Marca do Dragão"), e o resumo no verso da capinha é aquela mesma mentira anunciada no trailer, falando sobre a ressurreição de Bruce Lee para enfrentar o Grande Anjo Negro da Morte. A não ser que alguém me convença de que o negão vestido como Batman que aparece no início é o tal "Grande Anjo Negro da Morte", não existe nada disso no filme.

Então, sem túmulos, Bruce Lee-zumbi ou retorno da morte, BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE é apenas uma tosquice, uma enganação, que só recomendo aos fãs de cinema ruim e apelativo. Visto com este espírito, é de morrer de rir. O único que não deve ter achado graça é o verdadeiro Bruce Lee. Mas como ele nunca lutou de volta do túmulo, azar o dele!

Trailer de BRUCE LEE FIGHTS BACK FROM THE GRAVE



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America Bangmungaeg (1976, Hong-Kong/Coréia do Sul)
Direção: Doo-yong Lee e Umberto Lenzi (?)
Elenco: Bruce K. L. Lea (Jun Chong), Sarah
Chaplin, Debby Tebora, Su-cheon Bae, Anthony
Bronson e Mun-ju Kim

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

PIRANHA 2 - ASSASSINAS VOADORAS (1981)


Um peixe que voa? E respira fora da água? E ataca direto na jugular das suas pobres vítimas, que são devoradas num estalar de dedos? Acredite se quiser, mas a resposta para estas três perguntas é "sim" no inacreditável PIRANHA 2 - ASSASSINAS VOADORAS, uma produção ítalo-americana lançada em 1981, e que não funciona nem como suposta continuação do ótimo filme B "Piranha" (1978), de Joe Dante, nem como filme independente.

O maior atrativo desta tralha é constatar que quem assina como diretor é ninguém menos que o hoje "todo poderoso" James Cameron. Sim, aquele mesmo da série "O Exterminador do Futuro" e do blockbuster "Titanic", que atualmente se diverte torrando centenas de milhões de dólares para levar seus projetos aos cinemas. Belo jeito de começar a carreira, não???

PIRANHA 2 é o primeiro filme de Cameron. Antes, ele trabalhou na equipe de miniaturas e efeitos visuais de Roger Corman, tendo participado do time de filmes como "Mercenários das Galáxias" (1980) e "Galáxia do Terror" (1981). Ainda em 81, atuou na equipe técnica do clássico "Fuga de Nova York" (1981), e foi contratado pelo produtor italiano Ovidio G. Assonitis para comandar PIRANHA 2, finalmente ocupando a cadeira de diretor.

Natural do Egito, Assonitis já tinha dirigido, ele próprio, alguns filmes. É o caso de "Tentáculos" ("Tentaculi"), sobre um polvo assassino, lançado em 1977 e com nomes como John Huston, Shelley Winters e Henry Fonda no elenco. Ele também dirigiu uma cópia bagaço de "O Exorcista" chamada "Espírito Maligno" ("Beyond the Door"), em 1974, e que até hoje é o filme mais lucrativo de todos os tempos na relação custo-benefício.

Então surgiu este roteirista chamado H. A. Milton (este é seu único crédito cinematográfico, o que é até compreensível; mas não estranhe se o nome for pseudônimo de alguém), trazendo debaixo do braço um roteiro inacreditável sobre piranhas voadoras!!! Vê se tem cabimento! Porém, sem pensar duas vezes, o produtor Assonitis contratou este pobre jovem norte-americano chamado James Cameron e mandou-o até a Jamaica para torrar uma fortuna (hahahaha, até parece!) em PIRANHA 2...

Prato do dia: galinha ensopada



O filme já começa extraordinário (no mau sentido). Um casal de mergulhadores visita os destroços de um navio do Exército americano afundado perto de um grande hotel de turistas, quando, sem mais nem menos, a garota tira o biquíni e salta em cima do homem, cortando seu calção com uma faca (vê se pode). A dupla então começa a transar debaixo d'água, inclusive tirando as máscaras e o tubo de oxigênio que permitia que respirassem, para não "atrapalhar" o lance!!! Quem sabe, era um casal de suicidas que queria morrer dando uma última transadinha.

Porém, neste caso, nem precisaram esperar a morte por afogamento: mais rápido que você possa dizer "assassinas voadoras", um cardume de piranhas, que só aparece de relance, surge do nada e ataca o casal fornicador, devorando-o impiedosamente. hahahahaha

Entram os créditos sobre um fundo azul com manchas vermelhas. E o que surpreende, além da trilha sonora até bem feita (de Stelvio Cipriani, usando o pseudônimo "Steve Powder"), é a quantidade de nomes talentosos envolvidos numa barca furada dessas, como Lance Henriksen (que a partir de então passaria a trabalhar em praticamente todos os filmes de James Cameron, menos os mais recentes) e o maquiador italiano Giannetto de Rossi, parceria do cineasta Lucio Fulci. Ele é um dos culpados pelas horríveis piranhas com asas que veremos no momento mais hilariante do filme!!!

A história se passa no Caribe (hahahaha), na praia de Saint Anns, onde o hotel Clube Elysium está repleto de turistas louquinhos para participar da tradicional "Noite do Peixe Frito". Trata-se de um fenômeno que acontece uma vez por ano, na desova dos peixes-rei: eles nadam até a margem do mar para desovar e podem ser rapidamente agarrados pelos hóspedes, que então fritam os peixes na madrugada para comer. É por causa disso que o subtítulo original do filme, que aparece nos créditos iniciais, é THE SPAWNING ("A Desova"). Porém, misteriosamente, nos créditos finais o subtítulo é outro: FLYING KILLERS ("Assassinas Voadoras"), mostrando que a equipe era tão incompetente que não conseguiu chegar nem a uma conclusão sobre o nome do filme!!!

Mas voltemos à trama. O hotel está repleto de gente louca para transar, inclusive umas velhas assanhadas que tentam agarrar os salva-vidas garotões. Neste momento, somos brindados com diálogos brilhantes, como: "Sabe do que meu marido morreu? De tesão!", e outras maravilhas que nos fazem compreender o porquê do roteirista Milton nunca mais ter conseguido emprego.

Em meio aos hóspedes com hormônios em ebulição, também existe uma professora americana de mergulho que é um tanto casta e pura, Anne Kimbrough (Tricia O'Neil, que Cameron depois colocou numa ponta em "Titanic"). Ela vive com seu filho adolescente, Chris (Ricky Paul Goldin, que acabou no remake de "A Bolha Assassina" e em... oh meu Deus, "Lambada - O Filme"!!!), é divorciada e seu ex-marido é o policial que controla a região, Steve (Lance Henriksen, pagando mico, ainda de cabelo comprido).

Assassinas voadoras



Entre coroas que procuram médicos para flertar, gatinhas que passeiam de barco completamente nuas e um negro que usa dinamite para pescar (hahahaha), o hotel também tem a ilustre presença do misterioso Tyler Sherman (Steve Marachuk, que sumiu do mapa cinematográfico em 1985). Ele tenta seduzir a professora de mergulho.

Durante um passeio no fundo do mar, coincidentemente nas proximidades do tal navio afundado onde o casal foi devorado no início, um dos alunos de Anne também é atacado pelas piranhas, sendo encontrado pela professora parcialmente devorado. O corpo é então levado ao necrotério. E, numa daquelas coisas que só acontecem em filmes, Anne e Tyler invadem o necrotério à noite para examinar o cadáver, tentando descobrir que tipo de animal fez aquilo. Na mesma noite, uma funcionária do local é atacada por uma piranha voadora que sai da barriga do corpo carcomido (é ver pra crer)!!!

Desconfiando que algo de estranho está acontecendo, ainda mais ao descobrir que um documento de Anne foi esquecido no necrotério, o policial Steve coloca a ex-esposa contra a parede. Mas, a estas alturas, ela já está fazendo "contatos imediatos de terceiro grau" com Tyler - que, logo descobrimos, é um bioquímico responsável pelo projeto secreto do Exército que criou as piranhas voadoras. Tyler explica a Anne que ovos da piranha voadora afundaram junto com o navio e se desenvolveram no mar da região. Só não explica quem é que teve a idéia de jerico de usar piranhas com asas como arma de guerra.

Sabendo do segredo das piranhas voadoras, Anne tenta convencer o gerente do hotel, Raul (Ted Richert), a suspender a famosa "Noite do Peixe Frito". Mas como todo homem de negócios ambicioso de filmes do gênero (ora, todos já vimos "Piranha" e "Tubarão", certo???), Raul se recusa a cancelar o evento e ainda demite Anne.

A professorinha terá outras preocupações em breve: seu filho está em alto-mar com uma gatinha que conheceu na noite anterior (Leslie Graves, que morreu de Aids em 1989), e pode vir a se tornar a nova vítima das "piranhas-passarinho".

O clímax desta tralha é na tal "Noite do Peixe Frito", quando, num momento irônico do roteiro, a cadeia alimentar se inverte e os turistas tarados, ávidos por comer peixe, se transformam eles próprios na refeição, sendo devorados pelas horríveis piranhas com asas, que fazem o espectador se mijar de rir toda vez que aparecem em cena - ainda mais pelo barulho que emitem, lembrando mais morcegos que piranhas voadoras!

A Noite do Peixe Frito acaba mal!



PIRANHA 2 - ASSASSINAS VOADORAS foi lançado em vídeo no final dos anos 90, com a distribuidora assumindo a ruindade da obra, sem vergonha na cara. A capinha dizia, em letras garrafais: "TRASH MOVIE: UM DOS PIORES FILMES JÁ FEITOS". Ironicamente, quando esta produção era exibida na TV (pela Globo e depois pelo SBT), os comerciais anunciavam como filme sério!!! E recentemente ele foi relançado em DVD novamente como se fosse uma produção séria. Até foi realizada com este intuito lá atrás em 1981, mas é simplesmente impossível de levar a sério - na linha "tão ruim que fica bom". O pior é que o "Piranha" original era um excelente filme de suspense (cuja história é citada de leve nesta seqüência).

São 84 minutos de extrema pobreza e falta de criatividade cinematográfica. Vendo "isso", ninguém jamais imaginaria que James Cameron depois se sairia com filmes extremamente criativos como "O Exterminador do Futuro" e "Aliens, O Resgate". Porém, ele nem é o maior culpado pelo desastre.

O próprio Cameron disse várias vezes que foi afastado das filmagens pelo produtor Assonitis depois de duas semanas de filmagens. Isso porque o produtor não estaria gostando da forma como Cameron estava realizando o trabalho - talvez com um "toque pessoal". Resultado: Assonitis assumiu ele mesmo as filmagens, certamente sendo o responsável por bobagens como as gostosas de topless e a impagável cena do "sexo aquático". Cameron até teria tentado fazer sua própria edição do filme, mas foi impedido pelos produtores. Que, porém, mantiveram seu nome nos créditos - talvez cientes da bomba que tinham nas mãos.

Com tantos erros e problemas, além da infeliz idéia de colocar piranhas voadoras na trama, PIRANHA 2 bem que poderia ser um engraçadíssimo trash movie. Infelizmente, em apenas 84 minutos de duração, são muitos os tempos mortos, com longas cenas onde nada acontece além de diálogos ridículos e gente feia desfilando de biquíni.

E a história ainda termina da forma mais moralista possível, com as piranhas devorando Tyler (afinal, foi ele quem as criou, e teria que levar o merecido castigo, não é mesmo?), resolvendo assim o impasse conjugal entre Anne e Steve, que voltam a ficar juntos como dois pombinhos apaixonados. Ou seja: piranhas resolvendo problemas de casal, devorando uma das pontas do triângulo amoroso. Que tal? Não parece um filme que PRECISA ser visto???

Se você gosta de ver tralhas do gênero fechando um olho para a ruindade, PIRANHA 2 é, definitivamente, o seu filme. Mas prepare-se para acionar a tecla fast-foward para poupar seu cérebro de uma boa dose de abobrinhas. Ou então procure, no YouTube, a montagem que uns desocupados fizeram com apenas 10 minutos de "melhores momentos" da película.

E na próxima vez que assistir um blockbuster multimilionário de James Cameron, tente visualizar a imagem do diretor filmando PIRANHA 2 com uma equipe italiana, usando uma merreca de orçamento. Aliás: será que foi esta porcaria que despertou em Cameron a paixão de filmar no mar, como ele fez depois em "O Segredo do Abismo" e "Titanic", já com orçamentos beeeeeem maiores??? Desta vez, porém, sem piranhas voadoras. E, por isso mesmo, bem menos divertidos.

Trailer de PIRANHA 2



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Piranha 2 - The Spawning/Flying Killers (1981, EUA)
Direção: James Cameron e Ovidio G. Assonitis
Elenco: Tricia O'Neil, Steve Marachuk, Lance
Henriksen, Ricky Paull Goldin, Ted Richert,
Leslie Graves, Carole Davis e Arnie Ross.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

ASSALTO AO TREM BLINDADO (1978)


Foram os "bastardos sem glória" de um dos títulos alternativos ("The Inglorious Bastards") deste filme italiano que inspiraram o cineasta Quentin Tarantino a escrever seu fantástico épico de guerra "Bastardos Inglórios" (2009) - usando apenas o título, mas pouco ou nada da trama desta pequena gema dirigida pelo mestre Enzo G. Castellari em 1978. Enquanto Tarantino usou a Segunda Guerra como pano de fundo para uma história rocambolesca de traições, vinganças e conspirações, aqui temos um roteiro episódico escrito a 10 mãos (!!!), em que os personagens pulam de uma "missão" a outra como se estivessem num jogo de videogame.

Tanto no argumento quanto no título em inglês e na frase do cartaz norte-americano ("Whatever the Dirty Dozen did they do it dirtier!"), ASSALTO AO TREM BLINDADO faz referência ao clássico de guerra "Os Doze Condenados" ("The Dirty Dozen"), dirigido por Robert Aldrich em 1967. Naquele filme, um grupo de prisioneiros de guerra era escalado para uma perigosa missão durante a Segunda Guerra. Aqui, a idéia é semelhante: os "bastardos sem glória" são soldados e um oficial norte-americano condenados pelos mais diversos crimes (assassinato, roubo...).


Se os "Doze Condenados" eram gente do naipe de Lee Marvin, Ernest Borgnine, Charles Bronson, Jim Brown, John Cassavetes, George Kennedy, Telly Savalas e Donald Sutherland, para Castellari e seu orçamento muitas vezes reduzido só restou escalar um elenco de caras conhecidas do cinema classe B da época, liderado pelos norte-americanos Bo Svenson e Fred Williamson. O único "grande astro" do elenco é o falecido escocês Ian Bannen, que em 1965 ganhou o Oscar de Ator Coadjuvante por "O Vôo da Fênix", e que em 1978 já andava meio mal das pernas e estrelava estas produções baratas rodadas na Itália.

Das vinhetas animadas nos créditos de abertura à música épica de Francesco De Masi, passando ainda pela estrutura "man on a mission" do roteiro, ASSALTO A TREM BLINDADO é um perfeito retrato de uma época áurea do cinema italiano que infelizmente morreu na década de 90: a época dos exagerados e barulhentos filmes de ação feitos na esteira de sucessos norte-americanos, onde o orçamento reduzido era contornado com malandragem e soluções muitas vezes toscas, mas nem por isso o resultado era menos divertido.


A história se passa em 1944, último ano da Segunda Guerra Mundial, na França, onde um grupo de prisioneiros é escoltado por um comboio para uma outra base, onde serão julgados pela Corte Marcial pelos seus respectivos crimes. Entre eles estão os soldados norte-americanos Tony (Peter Hooten), que é viciado em apostas; Fred Canfield (Williamson), acusado do assassinato de um racista; Berle (Jackie Basehart), que tem ataques de pânico e ansiedade diante de tiroteios e explosões, e o italiano Nick (Michael Pergolani), que vive de roubar e vender posses dos soldados mortos no conflito. De última hora, chega o preso mais ilustre do comboio: o tenente Robert Yeager (Svenson), acusado de deserção (para visitar a namorada nos Estados Unidos!).

No caminho para o julgamento, o comboio militar é atacado por um avião nazista, que enche os veículos de chumbo. Quase todos os prisioneiros são mortos no interior do caminhão em que eram transportados, e os que tentam fugir são fuzilados pelos guardas de escolta. No fim do confronto, sobrevivem apenas o tenente Yeager e os quatro soldados anteriormente citados, que resolvem se unir para chegar à fronteira da Suíça – que, na época, era território neutro, e onde eles poderiam escapar da guerra.


Este é o toque mais genial do roteiro escrito por Sandro Continenza, Sergio Grieco, Franco Marotta, Romano Migliorini e Laura Toscano: os "bastardos sem glória" não recebem arrego de nenhum dos lados do conflito, sendo caçados pelos nazistas (afinal, ainda são inimigos) e também pelos seus próprios companheiros aliados (por serem prisioneiros de guerra fugitivos).

A única esperança de salvação é chegar à fronteira, mas, no processo, o grupo se envolve em uma série de batalhas sem relação com a trama principal, encarando de pequenos destacamentos alemães até um insólito encontro com mulheres nuas tomando banho de rio - e que logo pegam metralhadoras para expulsar os tarados dali!


O "maledetto treno blindato" do título original italiano e do título nacional só entra na trama depois de uma hora de filme, quando os fugitivos exterminam, acidentalmente, um grupo de soldados norte-americanos que estava vestido com fardas alemãs. Eles eram especialistas treinados para uma missão secreta e suicida: interceptar um trem blindado nazista para roubar o giroscópio de um novíssimo míssil V-2 para a Resistência Francesa.

Tendo matado a tropa acidentalmente, Yeager e seus homens resolvem tomar o lugar dos falecidos, combinando com o responsável pela missão, o coronel Charles Thomas Buckner (Bannen), o perdão pelos seus crimes caso consigam cumprir o objetivo.


ASSALTO AO TREM BLINDADO não tem um roteiro coeso que possa ser resumido em meia dúzia de linhas. Se você lê, por exemplo, o resumo do velho Guia de Filmes da Nova Cultural, que só fala da missão do trem blindado, fica sem ter uma idéia abrangente do que na verdade é o filme.

Como o tal trem só aparece no final, os dois primeiros atos são preenchidos com seqüências de ação cada vez mais exageradas, onde os fugitivos se metem em encrenca com os dois lados do confronto, e sempre se saem bem, claro, mas isso envolve matar dezenas, às vezes centenas de inimigos. Os perigos vão ficando cada vez mais complicados, na medida que os próprios "heróis" se colocam em risco quando se disfarçam de nazistas, por exemplo.


Castellari é um brilhante diretor de ação, e isso pode ser visto nas cenas de guerra, recheadas de tiroteios e explosões. Mas o estilo habitual do diretor (com a câmera lenta ao estilo do que o norte-americano Sam Peckinpah fazia na época) demora a aparecer, surgindo somente na conclusão, já na missão do trem blindado. Mas vale a pena esperar, pois as cenas estão entre as melhores que o velho Enzo já filmou, incluindo sangrentos tiros que explodem o peito das vítimas e fazem voar pedaços de "carne" e roupa contra a câmera.

O interessante é que o diretor não levou a coisa muito a sério, e, na maior parte do tempo, entrega apenas um divertido filme de ação e guerra, com tiroteios e explosões a rodo, sem aquela pretensa "seriedade" que as produções sobre a Segunda Guerra Mundial tinham na mesma época.


O único momento mais sério e dramático, em que Castellari parece tentar mostrar ao espectador a imbecilidade da guerra, é brilhante: durante uma violenta batalha, o volume da trilha sonora sobe e abafa o som de gritos, tiros e explosões da carnificina filmada em câmera lenta, com direito a soldados de ambos os lados do conflito lançados pelos ares por explosões ou se contorcendo com os tiros disparados pelas metralhadoras inimigas! Um momento que parece ter saído de "A Cruz de Ferro", de Peckinpah, que por sinal é do ano anterior (1977).

O filme também ganha pontos pelos toques de humor (especialmente de Williamson, interpretando um canalha que vive com um charuto no canto da boca, e de Pergolani, como o soldado malandro que tem todas as traquitanas necessárias "escondidas" no seu uniforme), pelo uso criativo de miniaturas para baratear custos (nas cenas mais complicadas de explosões de casas e de veículos), pelo fato de os próprios atores principais encararem algumas das cenas perigosas (Williamson aparece pulando de uma ponte sobre o trem em movimento, por exemplo) e pela conclusão completamente fora do convencional, especialmente no inesperado destino de alguns dos personagens.


Recentemente, aproveitando o "Inglorious Bastards" do Tarantino, foi lançada uma edição superespecial de ASSALTO AO TREM BLINDADO nos States, com três discos (!!!) repletos de extras (um deles é a trilha sonora composta por De Masi). O tipo de coisa que nunca vai chegar por aqui, e que traz também uma longa conversa entre o próprio Tarantino e Castellari.

Num momento do bate-papo, Castellari elogia Tarantino, chamando-o de gênio, e este responde de maneira humilde, dizendo que é Castellari o "maestro" ("mestre", em italiano). E, durante a conversa, percebe-se que Tarantino realmente respeita o trabalho de Castellari, um ótimo diretor que infelizmente não filma há anos.

Para finalizar: falam tanto de "Comando para Matar", "Rambo 4" e outros filmes com altos números de morte, mas ASSALTO AO TREM BLINDADO com certeza é um recordista neste quesito. Precisa, claro, ter paciência para contar os cadáveres, e segurar o riso quando os mesmos figurantes aparecem morrendo múltiplas mortes diferentes...

Trailer de ASSALTO AO TREM BLINDADO



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Quel Maledetto Treno Blindato/The Inglorious
Bastards (1978, Itália)

Direção: Enzo G. Castellari
Elenco: Bo Svenson, Peter Hooten, Fred Williamson,
Michael Pergolani, Jackie Basehart, Michel Constantin,
Debra Berger, Raimund Harmstorf e Ian Bannen.

domingo, 12 de outubro de 2008

INVASÃO USA (1985)

Ah, o cinema de ação dos anos 80... Violência e exagero eram as palavras de ordem. Os heróis eram sempre valentões sem sentimentos que passavam as horas livres treinando tiro ao alvo ou limpando suas armas, e para eles não bastava apenas prender os vilões e julgá-los dentro do que dizia a Justiça; era necessário matá-los, torturá-los, agredí-los, enfim, fazê-los sofrer da pior forma possível, descarregando sobre eles tudo que cometeram contra a "sociedade" e ainda mais um pouco.

Nesta década mágica, explosões, tiros e altas contagens de cadáveres faziam parte de produções como "Stallone Cobra", "Desejo de Matar 3" ou "Comando para Matar", onde os mocinhos acabavam matando o dobro ou o triplo de pessoas que os vilões!

Desta mesma década é o clássico INVASÃO USA, uma parábola sobre a paranóia militarista da época, incentivada pelo então presidente norte-americano Ronald Reagan no auge da Guerra Fria. INVASÃO USA é uma espécie de clássico da TV aberta, onde foi exibido incontáveis vezes, e foi um sucesso estrondoso de locações na época das fitas piratas no Brasil, no final da década de 80. Também é um dos filmes mais famosos do ator Chuck Norris, que aqui interpreta seu herói mais arrogante, maldoso e cruel - que em determinadas cenas mais parece um bandido do que um herói.

A direção é de Joseph Zito, que já havia dirigido Norris num dos grandes sucessos da carreira do ator, "Braddock - O Super Comando". Mikhail Rostov (o eterno vilão Richard Lynch) é um terrorista russo que resolve, literalmente, invadir os Estados Unidos. Ele junta uma quadrilha de mercenários e terroristas de todo o mundo, liderados por ele e por seu braço direito, Nikko (Alexander Zale), e entram facilmente no território americano, iniciando uma série de atentados e assassinatos que seria o início da auto-proclamada "Invasão dos Estados Unidos".

O plano de Rostov é jogar os próprios americanos uns contra os outros. No início, por exemplo, ele e seus homens abordam um barco de refugiados cubanos, usando trajes da guarda corteira americana, e metralham todo mundo, inclusive velhos e crianças; mais tarde, vestidos como policiais, os terroristas vão ao bairro latino de Los Angeles e provocam uma chacina, colocando os civis contra os verdadeiros policiais quando estes aparecem e acabam apedrejados.

Ao perceber que Rostov está por trás destes recentes atos de violência e vandalismo, a CIA vai até os pântanos da Lousiana, onde o aposentado Matt Hunter vive, caçando crocodilos no seu tempo livre. Se em filmes anteriores de Norris havia uma tentativa de compor um personagem principal que pelo menos tivesse algum vínculo afetivo ou o menor dos sentimentos (uma família, uma namorada, um melhor amigo), o Matt Hunter de INVASÃO USA é o verdadeiro "homem-de-pedra", um agente indestrutível que parece ter saído de uma história em quadrinhos. Ele passa pelo filme sempre armado, com luvas de couro pretas e cara de poucos amigos, caçando os vilões, e nem ao menos tem um interesse romântico para mostrar que, afinal, também é gente. Talvez Hunter seja um cyborg. Neste caso, um "terminator".

Hunter passa a patrulhar a cidade em sua picape, dizimando os vilões aos poucos. A conclusão é uma autêntica "Terceira Guerra Mundial", com o exército americano enfrentando o exército terrorista com metralhadoras, granadas e até tanques de guerra (!!!!). Enquanto isso, Hunter, sozinho, com duas metralhadoras Uzi e uma bazuca, desafio o exército para ver quem mata mais, dizimando ele mesmo uns 50 terroristas e enfrentando cara a cara o próprio Rostov. E dentro da proposta exagerada do filme, o duelo final entre os dois não é com pistolas, mas com bazucas!

INVASÃO USA tem algumas cenas antológicas. Uma delas inclui Rostov e um traficante interpretado por outro eterno malvado do cinema classe B, Billy Drago. Outra é aquela em que os terroristas tentam explodir uma igreja lotada, mas o explosivo não funciona. Hunter então aparece por trás dos bandidos, atira a bomba sobre eles e diz: "Não funcionou antes, é? Mas agora vai funcionar...", e então explode os malvados em pedacinhos.

Claro que, para o espectador esclarecido, o filme deve ser encarado como uma divertida comédia involuntária. O filme é tão ridículo e imbecil que o negócio é desligar o cérebro e levar na brincadeira os absurdos, a postura "macho man" do personagem de Norris, suas frases de efeito e a forma como ele parece onipresente para encontrar os vilões e despachá-los, justificando a excelente a frase do cartaz do filme: "Os Estados Unidos não estavam preparados para uma guerra... mas ELE estava!".

Demorou alguns anos para que o cinema de ação feito nos States pegasse mais leve, retratando heróis mais humanos, tipo o John McLane de Bruce Willis na série "Duro de Matar", que aparecia sangrando e com medo de enfrentar os bandidos.

Como curiosidade, a maquiagem é do especialista em terror Tom Savini, com quem o diretor Joseph Zito havia trabalhado anteriormente em "Sexta-feira 13 - Parte 4", de 1984. Mas não há grandes maquiagens, apenas tiroteios e explosões. A grande contribuição de Savini para o filme parece ter sido cortada: a explosão de um vilão com um tiro de bazuca. A cena é muito rápida e mostra bem pouco, evidenciando que pode ter sofrido algum tipo de censura.


Trailer de INVASÃO USA

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Invasion USA (1985, EUA)
Direção: Joseph Zito Elenco: Chuck Norris, Richard Lynch,
Melissa Prophet, Alexander Zale, Alex Colon, Eddie Jones,
Jon DeVries, James O'Sullivan e Billy Drago.

sábado, 11 de outubro de 2008

KILLER CROCODILE (1989)


Filmes com animais assassinos eram um gênero bastante popular e divertido entre os anos 70 e 80, quando praticamente todo tipo de animal se transformou em assassino, de famintos crocodilos e gigantescos tubarões a minúsculas abelhas e inofensivas formigas. Nos últimos anos, este tipo de produção voltou à moda. Mas, tirando meia dúzia de saudáveis exceções, filmes de animais assassinos agora são um sinônimo de bomba, principalmente quando trazem o logotipo do estúdio Nu Image.

Com uso indiscriminado de efeitos (sempre fraquíssimos) de computação gráfica e quase nenhum suspense e/ou sangue e violência, bombas como "Crocodilo", de Tobe Hooper, e "Tubarões" (que usa cenas de documentários da National Geographic) só provocam bocejos. Volta-e-meia aparece algo mais exagerado, intencionalmente trash e divertido, como o primeiro "Python" e "Frankenfish". São raras as exceções num oceano de mediocridade.


Com esta breve introdução, chegamos a KILLER CROCODILE, filme na linha "bom de tão ruim", que nunca foi lançado no Brasil. Trata-se de uma produção baratíssima feita por produtores italianos em 1989, quando a indústria de filmes baratos made in Italy já estava em plena decadência. KILLER CROCODILE é um curioso (e atrasado) aproveitamento dos filmes "Tubarão", de Steven Spielberg, e "Alligator", de Lewis Teague, ambos feitos 10 anos antes. E nem é necessariamente uma novidade, pois já existia uma produção barata feita na Itália e envolvendo um crocodilo assassino, chamada "Il Fiume del Grande Caimano" (ou "Big Alligator River", no mercado americano), dirigida por Sergio Martino em 1979, com Claudio Cassinelli e Barbara Bach.

É claro que nada disso importou para o produtor italiano Fabrizio De Angelis, responsável por algumas das obras-primas do cinema de horror europeu da época (sua produtora, a Fulvia Films, financiou "Zombie" e "The Beyond", de Lucio Fulci, só para citar dois exemplos mais famosos). De Angelis achou que ainda era hora para fazer filmes com gigantescos crocodilos assassinos, e saiu-se com essa pérola trash que só pode ser recomendada para quem adora as tralhas italianas no período - embora seja muito, mas muito superior a ruindades tipo o "Crocodilo" de Tobe Hooper. Animado com o projeto, De Angelis ajudou o famoso roteirista italiano Dardano Sacchetti na criação da história e até resolveu assumir ele mesmo a cadeira de diretor, escondido atrás de seu pseudônimo americano, "Larry Ludman".


KILLER CROCODILE conta a história de um grupo de ecologistas que está em busca de provas de que uma poderosa empresa anda poluindo os pântanos de uma vila de pescadores, em algum lugar da América Latina que nunca é identificado - só se sabe que é pobre e povoado por negros que falam espanhol; provavelmente é Santo Domingo.

O grupo é formado por típicos estereótipos do cinema americano, apesar de ser um filme italiano: o líder da expedição, Kevin (Anthony Crenna, que não tem muitos outros créditos), é o típico herói de bom coração, sempre pronto a arriscar o próprio pescoço para salvar os amigos; o topetudo Mark (Julian Hampton) é o fotógrafo impulsivo que não hesita em botar a vida dos companheiros em risco para tirar uma foto; Pamela e Jennifer (Sherie Ross e Ann Douglas) são as mocinhas em perigo; Bob (John Harper) é o responsável por comandar o barco e o elemento dispensável que logo vai ser morto, e por aí vai.


Eles chegam até um ponto do rio onde descobrem um depósito clandestino de lixo nuclear - que se resume a meia dúzia de tambores de óleo diesel com a inscrição "Radioactive" na frente. Após colher amostras da água contaminada, eles partem de volta para a vila. Mas, no caminho, uma das coadjuvantes da expedição, Conchita, sai para uma caminhada noturna atrás do seu cachorrinho (sim, ela levou um cachorrinho numa expedição no meio do pântano!!!!) e é prontamente abocanhada por um gigantesco crocodilo, que sai de surpresa do rio.

Os companheiros acham que Conchita desapareceu, e no dia seguinte voltam à vila para alertar as autoridades. Porém, o lugar não tem polícia, apenas um juiz corrupto interpretado por Van Johnson (que foi galã do cinema americano nos anos 50 e 60, mas, depois que envelheceu, acabou em podreiras italianas como esta). O problema é que o tal juiz é pago por Folley (Wohrman Williams), o dono da tal empresa poluidora, para deixar o assunto por baixo dos panos, e por isso ele não dá qualquer ajuda aos ecologistas.


É então que o gigantesco crocodilo aparece na margem da vila, espalhando o pânico e devorando rapidamente dois dos moradores do lugar. Um dos manés teve a infelicidade de ficar com a perna presa num buraco no cais; pois não é que o crocodilo abocanha o pé do sujeito e puxa ele pelo buraco, fazendo jorrar um rio de sangue? E o heróico Kevin logo se atira no rio para enfrentar a fera no muque e salvar uma criancinha que ia ser a próxima a cair na pança do réptil. Para impedir a tragédia iminente, o corajoso rapaz crava uma enorme estaca na goela do bicho (ai!). Ele então se resigna a voltar para o fundo do pântano e esperar para fazer novas vítimas. Obviamente que o monstro ficou tão grande por causa do lixo tóxico depositado no rio por Folley e sua turma - embora o filme não se preocupe em explicar o fato.

A algazarra atrai a atenção de Joe (o veterano Thomas Moore, ou melhor, Ennio Girolami, pai do cineasta Enzo G. Castellari). Ele tem uma mágoa especial contra crocodilos, pois traz no peito diversas cicatrizes de um ataque dos carnívoros répteis. Alguém pensou no capitão Ahab, do livro "Moby Dick"? Pois é... E anos depois Jon Voight faria um personagem parecidíssimo em "Anaconda"! Bem, Joe fará de tudo para deter a ameaça, mesmo que o juiz e Folley tentem encobrir o caso para que ninguém descubra sobre o lixo tóxico depositado no pântano.

Porém, no momento mais ridículo do roteiro, o grupo de ecologistas resolve proteger o crocodilo, dizendo que não existe em qualquer lugar do mundo uma espécie tão grande (o bichão mede uns 20 metros), e que ele deve ser preservado, e não exterminado. Tá bom... Mas não se preocupe que eles vão mudar de idéia quando outros membros da expedição forem parar na pança do crocodilo! hehehehe.


KILLER CROCODILE é um típico filme italiano barato: o roteiro tem vários momentos chupados de outros filmes e muitas vezes os diálogos soam constrangedores - isso sem contar a dublagem em inglês, que às vezes é totalmente fora de sincronia com o movimento da boca dos atores italianos.

De Angelis é um produtor, não um diretor, e isso se percebe na mão pesada com que ele conduz a trama, que tem vários momentos enfadonhos e praticamente nenhum suspense ou tensão. Seus outros filmes são todos de ação, inclusive a trilogia "Thunder" (aquela do índio imitador de Rambo). O cara fazendo suspense ou terror é de uma nulidade fantástica, e assim o filme simplesmente salta de um ataque sangrento do crocodilo para outro, sem grandes emoções.

Mas sou obrigado a assumir que De Angelis faz um trabalho caprichado em alguns (poucos) momentos, como nas cenas em que usa câmera subjetiva aquática para representar a "visão do crocodilo" (o que também não é nenhuma novidade). Outros ângulos de câmera do diretor são no mínimo curiosos, como ao filmar através de uma máscara de mergulho, para representar o ponto de vista de um mergulhador, e ao posicionar a câmera dentro da boca do crocodilo, numa cena em que ele vai abocanhar uma vítima desprevenida! São pequenos momentos que salvam o trabalho do cineasta da mediocridade.

Além disso, KILLER CROCODILE é valorizado pela trilha sonora nota 10 do especialista Riz Ortolani (o mesmo que compôs as populares trilhas de "Cannibal Holocaust", "Mondo Cane" e vários westerns italianos). Ele imita a música composta por John Williams para "Tubarão", mas aparentemente ninguém contou para os executivos da Universal, já que a Fulvia Films nunca foi processada por plágio.


O filme tem também a maquiagem de um expert em sua área, o famosíssimo Giannetto de Rossi, amigão de Lucio Fulci. Giannetto criou e desenvolveu o monstruoso crocodilo, que é feito de borracha, totalmente inexpressivo, mas mesmo assim muito melhor que o monstro digital do filme de Tobe Hooper. Na verdade, o crocodilo está até bom demais, considerando a pobreza geral da produção. E Giannetto ainda brinda o espectador com diversas cenas gore, como o monstro arrancando o braço de uma vítima e o próprio destino do réptil, abatido com a hélice do motor de um barco, fazendo estrago semelhante a uma serra elétrica!!!

É claro que eu não poderia recomendar KILLER CROCODILE para quem gosta de filmes "normais": a produção é trash até a medula, com o crocodilo mudando de tamanho de uma cena para a outra (em alguns takes parece ter cinco metros de comprimento; em outros, aumenta para 20 metros!). Além disso, o monstro consegue levantar de pé (!!!) para atacar um sujeito na proa de um barco.

Mas o pior é a cena em que Joe descarrega tirambaços com cartuchos para matar elefante no couro do bicho e não lhe provoca um mínimo arranhão (!!!); desesperado, ele acha que a melhor solução é pular em cima do crocodilo (!), ficar de pé sobre a sua carcaça (!!) e tentar cravar-lhe um arpão no couro (!!!). Prepare-se para rolar de rir. São momentos como esses que fazem desta tralha não um filme de horror arrepiante, mas uma aventura barata e muito engraçada.


Além disso, o roteiro de Sacchetti e De Angelis segue à risca todas as normas do "Livro de Clichês para Filmes com Animais Assasinos Aquáticos". A saber:

1-) O ataque do monstro, seja crocodilo ou tubarão, deve ser anunciado com uma música que imite os acordes da trilha de John Williams para "Tubarão".

2-) O crocodilo ou tubarão pode arrebentar o fundo ou lateral de um barco com a boca para fazê-lo afundar.

3-) O corpo retalhado de pelo menos uma das vítimas deve aparecer boiando para que os heróis saibam com o que estão lidando.

4-) Ao analisar o tal corpo retalhado, o legista deve necessariamente dizer a frase: "Isso provavelmente foi feito pelo motor de um barco".

5-) As autoridades não devem dar bola para a ameaça do crocodilo ou tubarão - até ser tarde demais...

6-) O crocodilo ou tubarão deve atacar em um cais, abalando a estrutura para que as pessoas rolem para dentro da água.

7-) Aliás, durante todo filme as pessoas devem cair na água por qualquer motivo, para que as cenas de suspense e morte possam se desenrolar.

8-) Deve haver pelo menos uma cena onde o mocinho nada sendo perseguido pelo crocodilo ou tubarão, enquanto seus amigos gritam: "Mais rápido! Ele está logo atrás de você!".

9-) Pelo menos um animal de estimação deve ser morto pelo monstro.

10-) Se o monstro foi criado por experiências genéticas ou lixo radioativo, os vilões responsáveis por seu surgimento devem necessariamente ser mortos pelo próprio monstro, como forma de justiça poética.



E como picaretagem pouca é bobagem, enquanto KILLER CROCODILE era filmado por De Angelis, o maquiador Giannetto de Rossi aproveitava os intervalos para rodar cenas alternativas, que dariam origem a uma sequência (!!!), "Killer Crocodile 2", lançada no ano seguinte (1990), e novamente estrelada por Anthony Crenna (no segundo dos dois filmes da sua carreira) e Ennio Girolami. A seqüência inclui várias cenas em flashback, aproveitando material filmado por De Angelis, e também permanece inédita no Brasil. Na Europa a história é outra: os dois filmes foram lançados em DVD, e há até uma edição para colecionador (!!!) com os dois filmes em uma única caixinha. Vá sonhando com algo assim por aqui...

KILLER CROCODILE é tão mal-feito que se torna engraçado, e neste caso todo os pontos ruins do filme se transformam em qualidades. Se você é fã de filmes trash, não pode deixar de dar uma olhada. Se gosta de filmes com animais assassinos, deixe as bobagens modernas com crocodilos assassinos, como "Dinocroc" e "Surf Sangrento", mofando nas prateleiras da sua locadora e procure por esta tralha italiana. Agora, se o seu negócio é, digamos, mais sério, o negócio é esquecer KILLER CROCODILE e optar por algo mais convencional, tipo um "Pânico no Lago" ou o recente "Rogue".

Mas pense só por um minuto: em que outro filme você vai ver um crocodilo explodir (!!!) e pegar fogo (!!!) sem qualquer motivo aparente?

Trailer de KILLER CROCODILE



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Killer Crocodile (1989, Itália)
Direção: Fabrizio De Angelis
Elenco: Anthony Crenna, Ann Douglas, Thomas
Moore (Ennio Girolami), Wohrman Williams,
Sherrie Rose, Julian Hampton e Van Johnson.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

HORAS FATAIS - CABEÇAS TROCADAS (1987)


Você sabia que no Brasil dos anos 80, quando ainda havia cinema nacional fora do eixo Globo Filmes, um grupo de malucos refilmou "Desejo de Matar" no país? Foi mais precisamente em 1987, com um sósia de Charles Bronson no papel principal e uma overdose de tiros, explosões e mulher pelada na trama.

Pois é: HORAS FATAIS - CABEÇAS TROCADAS é mais um daqueles milagres do antigo cinema nacional, quando pequenos produtores e diretores ainda conseguiam fazer e lançar seus filmes em cinemas de bairro, longe do monopólio cinematográfico dos tempos modernos. Nesta época áurea, era comum os produtores brasileiros fazerem como os italianos no mesmo período: copiar a fórmula de sucesso de filmes americanos com um jeitinho brasileiro - normalmente, isso incluía mais sexo e mulher pelada, para atrair um público mais, digamos, "diversificado".

Assim surgiu este projeto com o bizarro título HORAS FATAIS - CABEÇAS TROCADAS, obra do corajoso Francisco Cavalcanti, que não contente em produzir e escrever o roteiro, ainda assumiu a direção e o papel principal, do sósia tupiniquim de Charles Bronson. Claro que o filme é uma bomba, mas uma daquelas bombas divertidas, onde Cavalcanti ainda tenta ousar, incluindo algumas cenas em câmera lenta (influência de Sam Peckinpah, talvez? hahaha) e até toques sensacionalistas de denúncia social de corrupção na polícia e na justiça.


Infelizmente, a produção é tão furreca que o resultado geral fica comprometido como filme sério: o elenco é ridículo, o roteiro é prolixo - com muitas cenas sem razão de existir, que apenas retardam a ação -, e há ainda a teimosia do diretor em filmar longos planos de navios e aviões, como se ele quisesse jogar na cara da platéia: "Olha só que produção caprichada, cheia de veículos, paisagens, externas...". Mas não funciona, e enche o saco.

Se como filme sério HORAS FATAIS pisa na bola, o fator trash - diálogos imbecis, interpretações pavorosas, situações toscas - faz com que o espectador bem humorado mantenha o interesse até o fim, mesmo que o caminho até lá seja meio tortuoso.

O filme começa com letreiros dizendo que a história é inspirada em fatos reais (sim, claro... assim como os filmes italianos sobre canibalismo). Francisco (que é interpretado por Francisco Cavalcanti, quem mais?), ou Chico para os amigos, é o dono do Bar da Praia, um cubículo com quatro mesas que está sempre lotado - e não, não fica na praia. Chico é um barman à moda antiga, com gravatinha borboleta preta e toalha no braço, como manda o figurino (ou o clichê?). E o cenário é o retrato da pobreza: parafraseando uma outra resenha bem humorada do filme, parece até que estamos vendo um episódio do seriado "Chaves", pois lembra o velho restaurante da Dona Florinda em alguns takes!

Certo dia, dois marginais invadem o apartamento de classe média de seu Chico e atacam brutalmente sua esposa e sua cunhada. Ambas são barbaramente estupradas e mortas, em cenas tão gráficas que lembram os estupros de "Desejo de Matar 2". A pornografia é total, com longos planos das duas mulheres totalmente peladas e os homens "mandando bala", closes na cara de agonia das vítimas, etc e tal. Enfim, todo mundo parece estar adorando mostrar aquela violência covarde - sensacionalismo pouco é bobagem.


Na saída do local do crime, os bandidos cruzam com o filho de Chico, que decora a placa do carro dos meliantes antes de entrar e encontrar mãe e tia mortas. Detalhe: o garoto é interpretado por Fabricio Cavalcanti, filho de Francisco na vida real, e o garoto é um pentelho de marca maior, que passa o filme todo chorando forçadamente, tipo "Uáááá, quero minha mãeeeeee!".

Não demora para o dono do bar ficar sabendo do acontecido. Ele vai até a casa e encontra o garoto abraçado no cadáver da mãe (acredite, o diretor teve a cara-dura de colocar mesmo um menininho abraçado na atriz completamente pelada, algo que hoje em dia as ligas de decência e moral e conselhos tutelares iriam adorar!).

Paralelamente, numa casa luxuosa (pero no mucho) do bairro chique da cidadezinha, encontram-se as duas autoridades máximas do local: o juiz e o delegado - sendo que este último, chamado Dr. Honório, é interpretado por José Mojica Marins, o Zé do Caixão, com suas longas unhas compridas (delegado de unha comprida?) e falando o texto de maneira decorada, numa participação meramente figurativa para ajudar o chapa Cavalcanti.

Sem grandes enrolações, descobrimos que tanto o juiz quanto o delegado são corruptos. Um dos estupradores é filho do juiz, e o Dr. Honório, obviamente, encobre os atos dos meliantes usando qualquer meio ao seu alcance. Quando Chico insiste em querer justiça, por exemplo, o delegado arma um flagrante e destrói seu bar, plantando cocaína atrás de uma das estantes, e fazendo com que o pobre comerciante seja preso e torturado. Ironicamente, o delega da área diz: "Quebra ele, Joca! Mas sem deixar marcas!", e no momento seguinte estão eletrocutando o infeliz com dois fios desencapados - como é que um negócio desses não iria deixar marcas???


Mesmo todo estropiado, Chico resolve continuar sua busca por justiça. Começa a aparecer num programa de TV local (tipo um "Linha Direta" da época), acusando delegado e juiz de corrupção. Detalhe: o apresentador do programa é Clery Cunha, figurinha carimbada da Boca do Lixo (dirigiu filmes como "Eu Faço... Elas Sentem" e o western "Chumbo Quente"), que é produtor de HORAS FATAIS. Tanto estardalhaço na mídia enfurece os vilões, que contratam um assassino profissional chamado Robledo - de onde é que tiram estes nomes?

O figuraça é cego de um olho e malvado até a medula. Chico teme pela segurança de seu filho e resolve procurar um amigo pistoleiro (Turíbio Ruiz, do "clássico" da Boca "Viciado em C...") para lhe ensinar os segredos da defesa pessoal. O cara de professor não tem nada, a julgar pelo momento em que diz: "A primeira coisa para você ser um pistoleiro é aprender a atirar" (não, sério?????). Mas em menos de cinco minutos, Chico já está atirando como um Rambo brazuca. E o amigo pistoleiro ainda lhe presenteia com uma arma projetada por ele mesmo (!!!), um canhão de cano longo que dispara mísseis altamente explosivos (!!!), também de fabricação caseira (!!!!).

Armado e perigoso, o Paul Kersey tupiniquim pode arregaçar as mangas e sair para castigar os responsáveis pela destruição da sua família, sem poupar ninguém.

Demora um pouco para HORAS FATAIS - CABEÇAS TROCADAS mostrar a que veio, pois o filme se perde em intermináveis diálogos sobre denúncia de corrupção (as cenas envolvendo o programa de TV do qual Chico participa são especialmente longas e dispensáveis). Mas quando o justiceiro parte para o acerto de contas, aí é que a coisa esquenta.


Vestindo uma afrescurada jaqueta vermelha e locomovendo-se Brasil afora de barco e avião na caça dos estupradores, que se refugiaram no interior, Chico passa a segunda metade do filme mandando bala e explodindo coisas. Para você ter uma idéia do nível de sangreira e sadismo, um dos estupradores, Alemão (Albert Kaminski, que trabalhou com Cavalcanti também no terror "A Hora do Medo"), toma cinco tiros no saco e é deixado para sangrar até a morte. Antes de encarar tal destino, ocorre um diálogo memorável: "Não faça isso, pelo amor de Deus!", argumenta o arrependido estuprador. Mas o Charles Bronson nacional simplesmente responde: "Não fale em Deus que você vai é pro inferno". BANG BANG BANG BANG BANG!!!

Porém, Cavalcanti deve ter gastado a maior parte do seu orçamento nos efeitos especiais de explosão. É a única explicação para o uso indiscriminado de cenas onde Chico usa seu lançador de mísseis caseiro, primeiro contra um carro (um velho Opalão!!!), depois contra uma casa e, num momento completamente gratuito, até no meio de um rio, aparentemente só para testar o equipamento durante uma viagem a Santarém em que pretende eliminar um de seus alvos!!!

A violência, pelo menos, rola solta, com tiros nas costas, no saco e até na cabeça (incluindo jatinho de sangue esguichando do buraco!), e ainda as repulsivas e sádicas seqüências de estupro. Em comparação com o recente "Confronto Final" (trama de vingança estrelada por Jackson Antunes), vemos como a ousadia dos cineastas nacionais diminuiu um monte: se HORAS FATAIS às vezes é tão hardcore quanto "Desejo de Matar", "Confronto Final", com sua violência mais comedida e ausência total de sexo e nudez, parece filme infantil!

É muito engraçado tentar acompanhar uma história de ação rodada no Brasil (e é uma pena que não se façam filmes assim com mais freqüência, porque atualmente todos os cineastas e produtores estão preocupados com histórias sobre as favelas ou sobre a miséria do Nordeste). Não tem como não cair na gargalhada, por exemplo, com a cena onde um dos vilões exclama, com a maior cara de pavor: "Oh não! É o Chico do bar! Ele veio para me matar!". hahahahaha. "Chico do bar"???


Pior é que os bandidos agem tão abertamente que só mesmo em filme para não serem presos. O delegado interpretado por Zé do Caixão, por exemplo, chega a puxar sua arma para uma criança no meio da rua, em frente a um bar lotado, e em outro momento interrompe uma entrevista coletiva, quebrando a câmera de um repórter e gritando: "Que merda de imprensa marrom, eu vou embora daqui que meu tempo é valioso!".

No fim, HORAS FATAIS - CABEÇAS TROCADAS é uma diversão trash de primeira linha, daquelas para assistir com os amigos e se mijar de rir. Difícil é encontrar a velha fita da CIC Vídeo em alguma locadora. Mais difícil é entender de que sonho ou viagem lisérgica Francisco Cavalcanti tirou o subtítulo CABEÇAS TROCADAS, já que seu filme não tem uma única cena de cabeças sendo decepadas ou algo do gênero...

O esforçado diretor/roteirista/produtor/ator sempre viveu à margem da indústria cinematográfica, rodando filmes com uma merreca de orçamento, como "Os Violentadores de Meninas Virgens" e "Padre Pedro e a Revolta das Crianças" (esse com Pedro de Lara, um jovem Gugu Liberato e Zé do Caixão!!!); seu último filme lançado comercialmente nos cinemas, numa época onde isso ainda era possível, chamava-se "Aberrações de uma Prostituta" (!!!). Ou seja: criatividade nos títulos sempre foi uma constante no trabalho do artista! Bons tempos que não voltam mais...

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Horas Fatais - Cabeças Trocadas (1987, Brasil)
Direção: Francisco Cavalcanti
Elenco: Francisco Cavalcanti, Osvaldo Cirillo, Clery
Cunha, Lilian Gonçalves, Henrique Guedes, Turíbio Ruiz,
Albert Karlinski, José Lopes e José Mojica Marins.